CLEANTHO SIQUEIRA
Jurandyr
Navarro
Do Conselho Estadual de Cultura
A despedida foi pesarosa no
último momento. A família e amigos se reuniram, no ritual religioso da
encomendação da alma de um justo.
Momento de reflexão e saudade,
dos anos passados. A evocação remonta o tempo decorrido, de floridas
primaveras. A casa da tia Aracy, na rua da Estrela, com o imenso salão, onde se
almoçava, ouvindo o melodioso gorgeio dos passarinhos, em viveiros encerrados.
As brincadeiras no imenso quintal, de paisagem bucólica, parecido mais com um
sítio. O futebol na rua Apodi. Os encontros, quase diários, na residência do avô Rodrigo Afonso,
na rua Camboim. As festas de aniversários dos irmãos e primos, sob o som da
saudosa vitrola.
Com a chegada do mês de
setembro, os preparativos eram feitos antevendo a descida da Praia da Areia
Preta, para os banhos de mar do veraneio. A estação quente trazia a pescaria
com o anzol e do aratú, esta, em noites de lua cheia, com a maré sêca.
E ele, sempre o guia, com o
facho de óleo aceso, a iluminar as locas dos caranguêjos.
As chuvas repentinas, do cajú,
marcavam a subida aos morros e a descida de prancha no morro do Pinto.
O futebol na praia e defronte
à casa do “velho” Rodrigo, nosso avô. A
saida, à madrugada, para a caminhada, à beira-mar, até Barreira-Roxa, local do
piquenique programado, e noutra data, na Fortaleza dos Reis Magos.
E a nataçao, nas ondas bravias,
na maré alta do mês de janeiro.
Dias, em que os ventos eram
favoráveis, para soltar corujas ou papagaios, com linha vinte, comprada na
bodega da turca, na Praia-do-Meio. Ou, então pregar corropios nas colunas de
madeira do alpendre da casa.
Quando soprava o vento norte,
trazendo frieza era sinal da volta à
cidade, para o início das aulas, no colégio Marista.
A sua vida é rica de fatos havidos, envolvendo a sua
pessoa, cheia de ardor cívico e dotada de índole pacífica.
Convocado para o serviço
militar, ele se apresenta como voluntário, para as fileiras da Força
Expedicionária. E participa da batalha de Monte Castelo, na Itália.
Anteriormente, três fatos
ocorridos com ele, gravados ficaram na minha memória.
O primeiro deles foi a queda
do alto do pé de genipapo, no quintal da sua residência, da mencionada rua da
Estrela, fraturando uma de suas costelas.
Outro, quando pescava numa
tarde na praia da Areia Preta. O peixe pescado foi ele mesmo. É que, ao fazer o
lance para atirar a linha com o anzol, na água, o dito anzol cravou-se-lhe nas
próprias costas. Inúteis as tentativas para a sua retirada. Até mesmo um
pescador, que passara na ocasião, impossibilitado ficou de fazê-lo.
Chegando em casa o meu pai foi
o “cirurgião”, retirando o anzol, cortando o couro das costas com uma
tesourinha, a crú, ficando a assepsia por conta de meio vidro de álcool e
fechado com iôdo, gase e esparadrapo!
O terceiro caso é pitoresco.
Numa frondosa mangueira do dito quintal da sua casa, ele têve a idéia de fazer
uma cama, sim, uma cama, nos galhos altos da árvore! Às vezes, à tarde, nela
tirava uma soneca!
A evocaçao gera a saudade, de
um tempo perdido no tempo e que não volta mais.
Tempo em que ele, o primo mais
velho, era o guia, em muitos momentos, o guia da parentela em idade juvenil.
E o tempo que manda em tudo,
vai mudando o rítmo dos acontecimentos e então chega a idade quase adulta,
responsável pela separação. E cada um vai tomando o seu rumo. Mesmo assim, a
união consaguínea permanece e esse vínculo natural mantém a amizade fraterna.
O tempo avança e mesmo na fase
adulta e subsequente, da “melhor idade”, os primos mais “moços”, em ocasiões
especiais, com ele se reuniam, para no encontro festejar e dele ainda ouvir
seus sábios conselhos.
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