27/02/2017

A Baronesa de Ceará-Mirim e os mártires de Uruassú

Por João Felipe da Trindade
jfhipotenusa@gmail.com




Na internet, tomamos conhecimento que as informações sobre o Barão de Ceará-Mirim continuam desencontradas. Tanto há discordâncias quanto ao nome do pai de Manoel Varela do Nascimento, quanto a data do seu nascimento. Por mais pesquisa que se faça, não se chega a um denominador comum. E mesmo com a divulgação do seu casamento, vários  escritos sobre o barão não corrigiram suas informações.
Minha família Trindade, lá de Angicos, vivia, em sua maioria, em Santa Luzia, onde se localiza uma das propriedades do barão. Encontramos, vários eventos religiosos onde Manoel Varela do Nascimento e seus familiares se apresentaram  como padrinhos ou testemunhas.
Para exemplificar, em 27 de dezembro de 1855, na Matriz de São José de Angicos, ocorreu o batizado de Francisca, filha legítima de João Batista da Costa Xavier e de Michaela Francisca da Trindade, esta minha tia-bisavó. A batizada tinha nascido aos 30 de novembro desse mesmo ano, e teve como padrinhos Manoel Varela do Nascimento e sua esposa Bernarda Varela Dantas, moradores em Extremoz, por procuração passada ao casal José Bonifácio da Trindade e Rosa Maria da Conceição.
As dificuldades para se fazer algumas genealogias aumentam quando uma mesma pessoa aparece com vários sobrenomes, e algumas vezes com nomes diferentes.
A ascendência de da Baronesa é mais rica em informações, pois vai até os mártires de Uruassú, Antônio Vilela Cid e Estevão Machado de Miranda. Ela era filha de Francisco Teixeira de Araújo e de Izabel Xavier de Sousa, que casaram em 8 de fevereiro de 1804. Esses pais de dona Bernarda eram parentes muito próximos, pois foram dispensados no 3° e 4º graus de consanguinidade. Os pais de Francisco Teixeira de Araújo eram o português José Teixeira da Silva e Thereza Duarte de Jesus, enquanto os pais de Dona Izabel eram o capitão Francisco Xavier de Sousa e Dona Bernarda Dantas da Silveira.
Para entender melhor esse parentesco dos pais de Dona Bernarda, que herdou o nome da avó materna, vamos avançar na sua ascendência. O português José Teixeira da Silva tinha como pais João Teixeira da Silva e Maria Joana, enquanto sua esposa, Thereza Duarte de Jesus, era filha de João Rodrigues Seixas e Dona Joana Rodrigues Santiago; já o capitão Francisco Xavier de Sousa era filho do baiano Francisco Xavier de Sousa e Thereza Duarte de Jesus, enquanto os pais de sua esposa, Dona Bernarda Dantas da Silveira, eram o mestre de campo, o português Sebastião Dantas Correia, e sua mulher Dona Ana da Silveira Freire.
As bisavós Joana Rodrigues Santiago e Thereza Duarte de Jesus, a primeira paterna, e a segunda materna, eram irmãs, sendo ambas filhas de Salvador de Araújo Correia e Isabel Rodrigues Santiago. Esse parentesco das bisavós é que gerou a dispensa de 3º grau entre os pais da Baronesa.
Isabel Rodrigues Santiago, trisavó da Baronesa, era filha de Manoel Rodrigues Santiago e de Catharina Duarte de Azevedo. Esta, por sua vez, era filha de Manoel Duarte de Azevedo e Margarida Machado de Miranda. Segundo o memorialista Manoel Maurício Correia de Sousa, no seu manuscrito sobre as famílias de Utinga, datado de 1840, Margarida era a filha do mártir Estevão Machado de Miranda e Dona Bárbara Viela Cid. Esta última, por sua vez, era filha do outro mártir, Antônio Vilela Cid e de Dona Ignez Duarte, irmã do Padre Ambrósio Ferro, também sacrificado em Uruassú.
Não foi possível identificar o parentesco de 4º grau entre os pais de Dona Bernarda, mas desconfio que se dá através das trisavós deles, Joana da Silveira, pelo lado paterno, e Domingos da Silveira, pelo lado materno. É possível que esses trisavôs fossem irmãos. Dona Joana era casada com outro João Rodrigues Seixas, enquanto Domingos era casado com Catharina de Amorim.
Completando nossas informações, o português Sebastião Dantas Correia era filho de José Dantas Correia e de Izabel Pimenta da Costa.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

O casamento do Barão de Ceará-Mirim

Por João Felipe da Trindade
jfhipotenusa@gmail.com

Ainda persiste na internet informação errada sobre os pais de Manoel Varela do Nascimento. Por isso, colocamos aqui o registro de casamento dele que, posteriormente, se tornou Barão de Ceará-Mirim.

Aos nove de outubro de 1839, na Capela, em casa de Francisco Teixeira de Araújo, se receberam em matrimônio, Manoel Varella do Nascimento, filho legítimo de José Félix da Silveira, e Ana Teixeira Varella, com Bernarda Dantas da Silva, filha legítima de Francisco Teixeira de Araújo e Izabel Dantas Xavier, presentes as testemunhas Felippe Varella Santiago, e Francisco de Souza Xavier, do que para constar, mandei fazer o presente assento, que assino. Cândido José Coelho, Vigário Encomendado

23/02/2017

ACADEMIA DE LETRAS INFORMA



ACADEMIA NORTE-RIO-GRANDENSE DE LETRAS-ANRL

A V I S O

A Academia Norte-Rio-Grandense de Letras - ANRL, para os fins e efeitos de direito, COMUNICA aos seus Membros Efetivos e TORNA PÚBLICO, a aprovação da reforma do seu Estatuto Social pela Assembleia Geral Extraordinária do dia 03(três) de novembro do ano de 2016 (dois mil e dezesseis), que substitui o anterior de 04 de janeiro de 1977, com alteração de 27 de novembro de 1979, contendo os TÍTULOS: I – DA INSTITUIÇÃO E SEUS SÓCIOS; II - DA ADMINISTRAÇÃO; III – DO PATRIMÔNIO E DAS FONTES DE RECURSOS; IV – DAS ALTERAÇÕES ESTATUTÁRIAS E DA DISSOLUÇÃO; V – DAS DISPOSIÇÕES GERAIS E TRANSITÓRIAS, num total de 29 (vinte e nove) artigos, bem assim a Reforma do REGIMENTO INTERNO correspondente ao Estatuto Reformado, contendo UM INTRÓITO e os TÍTULOS: I – DA ADMINISTRAÇÃO; II – DOS ACADÊMICOS E DO PROCESSO DE ESCOLHA; III – DISPOSIÇÃO FINAL, contendo 35 (trinta e cinco) artigos, este aprovado na reunião de Diretoria realizada no dia 06 de dezembro de 2016, passando a valer a partir da data da publicação deste aviso, estando os textos completos publicados no Quadro de Avisos da ANRL.
Natal, 20 de dezembro de 2016
DIOGENES DA CUNHA LIMA
Presidente
LEIDE CÂMARA
Secretária-Geral


EDIÇÃO DO DIA 
D. Oficial: 13874


HOSPITAL SAMARITANO

Valério Mesquita

O Hospital Infantil foi criado em 1917 pelo dr. Manoel Varela Santiago, com atendimento ambulatorial às crianças do Rio Grande do Norte, principalmente de baixo poder aquisitivo. Antes da sua morte, o dr. Sílvio Lamartine assumiu a direção do hospital, permanecendo nessa função por mais de 30 anos. Nos últimos anos o “Varela Santiago” ganhou significativo impulso, diversificando e ampliando o seu atendimento, através de mais de dezesseis especialidades, assistindo uma média de oito mil e quinhentas crianças por mês. A sua UTI, encontra-se permanentemente lotada. Sobrevive com a contribuição de algumas empresas, convênios com o governo do estado e com a ajuda financeira de pessoas que conhecem e acreditam na seriedade do trabalho desenvolvido pelo dr. Paulo Xavier, seu atual diretor.
Trata-se do único hospital pediátrico do Rio Grande do Norte que atende exclusivamente através do programa SUS. Ou seja, o SUS é porta única para se ter acesso ao mesmo. Caso raro, que merece não só o aplauso do povo norte-riograndense, mas, de igual forma, a plena aprovação ao trabalho do grande profissional e magnífico ser humano – dr. Paulo Xavier – que ali tem transformado os seus dias, em exercício de doação e permanente lição de amor.
A saúde do Rio Grande do Norte vive um quadro difícil de sua existência. O exemplo impactante é a situação do Walfredo Gurgel, mais conhecido como o “hospital dos mártires”, onde os doentes continuam jogados nos corredores. O Walfredo Gurgel não estaria sendo vítima da “ambulancioterapia” dos municípios interioranos? Por que não equipar e ampliar a estrutura de atendimento dos hospitais públicos da grande Natal para absorver essa clientela e livrar o Walfredo Gurgel desse fluxo de interminável agonia?
Cito o caso do Walfredo Gurgel porque me parece que os problemas de saúde não estão sendo tratados com racionalidade e disciplina. Digo, melhor: falta uma política descentralizada e investimentos maciços na área da saúde. Como um único hospital pediátrico, que atende somente pelo SUS, da rede privada, consegue equalizar, sistematizar e manter a sua qualidade de atendimento, como vem procedendo o Varela Santiago? Acrescente-se aí um dado importante: a demanda de pacientes que recebe do interior e da capital é geometricamente crescente, porquanto a população infantil desassistida tornou-se incalculável. Você conhece, por dentro, a ala das crianças que padecem de câncer? Eu vi e não pude controlar a emoção e um quase desespero. Foi aí que me lembrei dos que moram em mansões e palacetes de luxo, que vivem uma vida de dissipações com gastos supérfluos achando que nunca adoecerão.
Veio-me à cabeça um evento como o Carnatal, onde os promotores ganham rios de dinheiro e não se sensibilizam em ajudar a criança cancerosa. Antes, as damas da sociedade e dos clubes de serviço promoviam chás e festas em benefício do hospital infantil. Hoje, pagam caro a crônica social para exibir as suas futilidades e esquecem os inocentes pacientes portadores de tumores malignos.
Por isso, louvo e aplaudo o trabalho do dr. Paulo Xavier e toda a sua equipe de auxiliares que mantêm acesa a chama votiva do ideal hipocrático de Manoel Varela Santiago e seu sucessor Silvio Lamartine. Não significa dizer, com efeito, que o Hospital Infantil é autosuficiente e já dispensa ajudas. Absolutamente. O condão do meu reconhecimento tem o objetivo de registrar e agradecer as vidas salvas de milhares de crianças ao longo do tempo. E que a sociedade pode e deve ampliar esse apoio, esse auxílio, porque o Hospital Infantil Varela Santiago é um patrimônio de Natal e do Rio Grande do Norte. Meu Deus, o que seria das crianças pobres se ele não existisse!!


(*) Escritor

22/02/2017


TENHO A SATISFAÇÃO DE REGISTRAR QUE O BLOG DO IHGRN COMPLETOU HOJE 

Total de visualizações de página (ACESSOS)

Atenciosamente, CARLOS GOMES
106390

   
Marcelo Alves

 

Sobre “O julgamento de Nuremberg” (IV)

Finalizando nossa série de artigos sobre “O julgamento de Nuremberg” (“Judgment at Nuremberg”, 1961), hoje conversaremos sobre temas essencialmente jurídicos que estão presentes nesse famoso filme de tribunal. Como não são poucos, vou selecionar os dois que reputo os mais importantes. 

O primeiro deles diz respeito à natureza do Tribunal de Nuremberg, que é, na sua feição final, já composto apenas de juízes americanos, retratado no filme de 1961. Não resta dúvida de que esse Tribunal, em princípio composto por representantes das quatro grandes potências aliadas (Estados Unidos da América, Reino Unido, França e União Soviética), em seguida apenas pelos americanos, criado “ad doc”, após o fato (a ser julgado) e em caráter temporário, era um tribunal de exceção, algo que, hoje, não condiz com o Estado Democrático de Direito, estando expressamente vedado, por exemplo, na nossa Constituição Federal, no seu art. 5º, inciso XXXVII (“não haverá juízo ou tribunal de exceção”). 

Mas a pergunta é: à época, existiria uma melhor forma de julgar e punir os crimes cometidos pelos nazistas durante a 2ª Guerra Mundial? 

Levando em conta o contexto histórico, penso que não. Como já disse aqui, historicamente falando, a ideia por detrás dos “julgamentos de Nuremberg” era bastante louvável em termos civilizatórios. Com esses julgamentos, diferentemente dos tempos de César (100a.C.-44a.C.) ou mesmo de Napoleão (1769-1821), os nazistas seriam severamente punidos, mas com base em um processo judicial e de uma maneira digna, que serviria de exemplo para a posteridade. 

Em segundo lugar, já falando especificamente do “julgamento dos juízes” (que foi apenas um dos vários “julgamentos de Nuremberg”), retratado em “O julgamento de Nuremberg”, o filme tem com pano de fundo a velha dicotomia entre direito natural e direito positivo e, mais concretamente, discute a responsabilidade de promotores e de juízes na aplicação de um direito positivo, no caso a legislação nazista, que impunha a pureza racial, a esterilização de pessoas especiais, entre outras barbaridades, levando com a isso à prisão e mesmo à morte muitos inocentes, em ofensa a qualquer conceito mínimo de direito natural. 

Como bem explica Nicole Rafter, em artigo intitulado “American Criminal Trial Films: An Overview of Their Development, 1930-2000” (e que faz parte do livro “Law and Film”, editado por Stefan Machura e Peter Robson, Blackwell Publishers, 2001): “Levando à tela grande o julgamento, pós 2ª Guerra Mundial, de homens que serviram como juízes durante o regime nazista, o filme concentra-se, essencialmente, naquilo que um dos personagens chama de 'crimes cometidos em nome do direito'. A discussão fundamental é se os juízes devem obedecer ao direito positivo (no sentido de direito feito pelos homens) ou ao direito natural. É certo, como defende um dos advogados de defesa, que 'um juiz não faz as leis; ele aplica as leis do seu país', ou devem os juízes sempre ter em conta um tipo de lei superior, a Justiça, em si?”. 

Interessantemente, “O julgamento de Nuremberg” responde a esse questionamento principalmente por intermédio de um outro magistrado, posto assim no papel de herói do filme, o Presidente da Corte de Nuremberg (no caso do “julgamento dos juízes”), o juiz Dan Haywood (personagem de Spencer Tracy), caraterizado como um homem modesto, tolerante e justo, que quer primeiramente entender como os mais sábios magistrados da Alemanha puderam participar dos horrores do regime nazista e, se for caso, punir adequadamente esses “crimes judiciais” praticados “em nome da lei”. Como anotam Steve Greenfield, Guy Osborn e Peter Robson (em “Film and the Law: the Cinema of Justice”, Hart Publishing, 2010): “As dificuldades de julgar e impor uma pena correta aos réus em 'O julgamento de Nuremberg' ('Judgment at Nuremberg') nos é mostrada pelos olhos do juiz Haywood (papel de Spencer Tracy), um homem com os pés no chão e tolerante, que tem de lidar com dilemas do seu entorno e de sua época. Isso gera uma enorme simpatia para com ele, que ao contrário dos juízes nazistas, não se furta de lidar com os problemas que o ato de julgar justamente nos impõe”. 

A resposta nos é dada precisamente pelo anti-herói do filme, Ernst Janning (interpretado por Burt Lancaster), aquele jurista que, segundo é dito no filme, havia “dedicado sua vida à Justiça – ao conceito de Justiça”. Embora num primeiro momento não reconheça a autoridade do tribunal para julgá-lo, Ernst Janning acaba aceitando sua responsabilidade pelos graves erros do regime nazista, reconhecendo que tanto ele como os corréus sabiam que as pessoas que eles sentenciavam eram enviadas a campos de concentração. Na verdade, como também sugere Bruno Dayez (em “Justice & cinéma”, editora Anthemis, 2007), a tática da defesa cai por terra quando o próprio Ernst Janning, tomando o lugar do seu advogado (papel de Maximilian Schell, que lhe rendeu o Oscar de melhor ator), vem a reconhecer a sua responsabilidade no caso Feldenstein, que já estaria decidido antes mesmo da abertura dos debates. “Aquilo não foi um processo”, dirá Ernst Janning, “foi um rito de sacrifício”. Assim, ele mesmo se condena por haver optado pela “lei dos homens” em lugar do direito natural. 

Baseado nessa crença de que uma lei moral transcende o direito feito pelos homens, devendo ser seguida por todos nós, o tribunal condena os réus. Apesar da pressão internacional por uma sentença mais leve – a guerra já havia passado e era necessário reconstruir a Alemanha –, a pena é de prisão perpétua. No final do filme, num encontro entre herói e anti-herói, afirma ainda a personagem de Spencer Tracy: “sua culpa [e a dos juízes nazistas como um todo] teve início na primeira vez que você condenou conscientemente um inocente”. 


Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP

21/02/2017

A P E L O



ESTIMADOS CONFRADES, COMPANHEIROS E AMIGOS,

O INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO RIO GRANDE DO NORTE está em dificuldade financeira para conseguir R$ 12.000,00 como contrapartida de um convênio celebrado com a Prefeitura de Natal para recuperar o seu acervo histórico. Em razão disso venho apelar para a generosidade de vocês para com a cultura potiguar, fazendo um depósito na CONTA CORRENTE 34.283-1, AG. 0022-1 DO BANCO DO BRASIL S/A, CNPJ 08.274.078/0001-06. Os que atenderem ao meu apelo me informe pelo Whatsapp 99451-2560 ou e-mail mirandagomes1939@yahoo.com.br
Nosso prazo para completar o depósito é 28 de fevereiro próximo. 
OBRIGADO PELA ATENÇÃO,
CARLOS ROBERTO DE MIRANDA GOMES

18/02/2017

A N R L




   
Marcelo Alves

 
Sobre “O julgamento de Nuremberg” (III)


Como prometido no artigo da semana passada, hoje conversaremos sobre o direito no filme “O Julgamento de Nuremberg” (“Judgment at Nuremberg”, 1961). Entretanto, por ora, faremos isso ainda misturando esse direito com o cinema, focando naquilo que costumo chamar de aspectos “jurídico-performáticos” de um filme. 

Antes de qualquer coisa, devo dizer que “O Julgamento de Nuremberg” tem tudo o que se pode querer de um excelente “trial movie”. Grande parte da estória/história se passa perante uma corte de justiça em pleno funcionamento, com juiz, acusador, defensor, réus e testemunhas realizando suas performáticas peripécias jurídicas. E a dinâmica ali mostrada nos prende completamente a atenção. Aliás, não poderia ser diferente com a plêiade de grandes atores que, sob a direção de Stanley Kramer (1913-2001), desfilam sobre aquele palco (ops… tribunal), com destaque para Maximilian Schell (1930-2014), o advogado de defesa, que, por sua interpretação, ganhou o Oscar de melhor ator em 1962. 

No que toca a essas personagens jurídicas, algo muito interessante se dá em “O Julgamento de Nuremberg”. A regra é que os juízes, como personagens da trama, tenham papel limitado em filmes de tribunal. Normalmente, eles são personagens passivos, com pequenas falas, deixando o protagonismo para a acusação e a defesa. Mas “O julgamento de Nuremberg” é uma exceção: o enredo do filme foca essencialmente no juiz pensativo e ponderado Dan Haywood, personagem de Spencer Tracy (1900-1967). 

Outro aspecto talvez ainda mais interessante: do outro lado, no banco dos réus, também dominando o filme, está Ernst Janning, papel de Burt Lancaster (1913-1994), grande juiz e jurista, famoso, segundo é dito no filme, por haver “dedicado sua vida à Justiça – ao conceito de Justiça”. Ernst Janning, embora réu, mantém sua dignidade durante toda a narrativa. E, de fato, como apresentado no filme, uma figura solitária, de grande coragem moral, um anti-herói, Ernst Janning nos desperta certa simpatia. 

Aliás, certa vez, após assistirmos a “O julgamento de Nuremberg”, meu pai me perguntou se a personagem Ernst Janning seria inspirado no grande jurista Carl Schmitt (1888-1985), cuja biografia ficou para sempre marcada por sua ligação com o regime nazista, tornando-se, a exemplo do que se deu com Martin Heidegger (1879-1976) na filosofia, um pensador estigmatizado. Não soube, nem sei até hoje, responder. Mas, para quem não sabe, afora seu engajamento pessoal na causa nazista (ao que consta, filiou-se ao Partido em 1933, tendo assim permanecido até o fim da Guerra, sem qualquer retratação posterior), pelo menos duas das obras mais conhecidas de Carl Schmitt, “A Ditadura” (“Die Diktatur”, 1921) e “O Conceito do Político” (“Der Begriff des Politischen”, 1932), tiveram considerável influência para fins de legitimação progressiva do regime instituído por Hitler. No mais, é tema para lá de controverso até que ponto vai o envolvimento de Carl Schmitt – ou, melhor dizendo, qual a influência do seu pensamento – com as condutas dos que, de fato, empreenderam os crimes praticados pelo regime nazista. 

Ademais, ainda misturando direito e cinema, devo lembrar que filmes são produtos da imaginação. E os seus conteúdos são normalmente, em grandíssima parte, ficção. Mas há aqueles filmes que são baseados ou inspirados, com maior ou menor fidelidade, em histórias reais. Aliás, isso se dá com alguma frequência com os filmes de tribunal. É caso, por exemplo, de “O vento será a tua herança” (“Inherit the Wind”, 1960), sobre o qual escrevi, não faz muito tempo, aqui. 

Esse é também o caso de “O julgamento de Nuremberg”. Aqui com um adendo: o grande componente histórico que cerca o filme também ajuda nesse sentido. Como anotam Steve Greenfield, Guy Osborn e Peter Robson (em “Film and the Law: the Cinema of Justice”, Hart Publishing, 2010): “Eventos históricos, que podem ser adaptados ou interpretados de textos preexistentes, são geralmente produtivas fontes para o cinema. Isso pode ser visto em um bom número de casos. A guerra tem sido uma base óbvia para a dramatização cinematográfica – veja-se a plêiade de filmes baseados na 1ª e na 2ª Guerras Mundiais – centrados tanto em campanhas como em outros aspectos militares, como prisões e prisioneiros de guerra. No que toca aos filmes jurídicos, os eventos da 2ª Guerra Mundial deram azo a 'O julgamento de Nuremberg' ('Judgment at Nuremberg')”. No caso de “O julgamento de Nuremberg”, o filme chega a dramatizar casos/cenas que foram de fato relatados no “julgamento dos juízes” na Nuremberg pós-Segunda Guerra Mundial. Um deles, por exemplo, como lembra Paul Roland (em “The Nuremberg Trials: the Nazis and their Crimes against Humanity”, Arcturus Publishing, 2010), foi o caso de Leo Katzenberger (1873-1942), um comerciante judeu de sapatos, idoso, que teve suas lojas saqueadas e foi perseguido pelos Nazistas sob o Decreto de Arianização de 1938. Sem condições de emigrar, Katzenberger continuou a viver em um apartamento em uma de suas propriedades em Nuremberg. Em 1941, sua amizade com uma adolescente, Irene Seiler (1910-1984), foi denunciada como violadora das leis racistas que proibiam relações entre arianos e judeus. Esse senhor de 67 anos (à época), no julgamento, repetidamente negou qualquer relação sexual entre os amigos. A moça também. Mas seus protestos foram calados pelo juiz-presidente, Osvald Rothaug (1897-1967), que o chamou de “judeu sifilítico”. Resultado: Leo Katzenberger foi condenado à morte. E isso tudo, com boa dose de fidelidade, é exposto no nosso filme de 1961. 

Bom, dito tudo isso, quero registrar, antes de terminar, que não são somente os aspectos “jurídico-performáticos” de “O julgamento de Nuremberg” que nos interessam. Também nos interessa a sua temática essencialmente jurídica. Entretanto, isso ficará para o nosso artigo na semana que vem. O último desta série, prometo. 

Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP

17/02/2017




EM DIA COM A ACADEMIA Nº 36 DE 16/2/2017
Cuidando da Memória Acadêmica


Agenda

MARÇO
10 de março de 2017
Posse: Lívio Oliveira cadeira 15


30 de março de 2017

1 - Eleição cadeira 2 (último ocupante Ernani Rosado)
Candidatos inscritos:
Humberto Hermenegildo e Naide Gouveia




2- Necrológio de Dorian Gray
A Saudação In memoriam será proferida por Diogenes da Cunha Lima




3 -  Lançamentos da Revista da ANRL Nº 50




Vaga Cadeira 3 (último ocupante  José de Anchieta)
Inscrições abertas pelo período de 60 dias de  14-2 a  14-4-2017





 
Necrológio de José de Anchieta (14-2-2017)
A Saudação de Louvor a José de Anchieta Ferreira da Silva  foi proferida pelo Acadêmico João Batista Pinheiro Cabral.
  
Simone Souza Ferreira Azevedo, Zuleide Souza Ferreira, Diogenes da Cunha Lima, Leide Câmara e João Batista Cabral.

Necrológio de José de Anchieta (14-2-2017)



  


 
Necrológio de José de Anchieta (14-2-2017) Necrológio de José de Anchieta (14-2-2017)


 

Necrológio de José de Anchieta (14-2-2017)

Presença dos Acadêmicos:
Diogenes da Cunha Lima. João Batista Cabral, Manoel Onofre Jr.
Carlos Gomes, Jurandyr Navarro, Sônia Faustino. Paulo de Tarso, Eulália Barros, Leide Câmara, Armando Negreiros, Cassiano Arruda e Lívio Oliveira
(eleito)

Presença dos familiares:
Zuleide Souza Ferreira e  Simone Souza Ferreira de Azevedo

Convidados:
Daladier da Cunha Lima, Naide Gouveia, Francisco Rodrigues, Clauder  Arcanjo.




Acadêmica  Leide Câmara
Secretária Geral
e-mail: academianrl@gmail.com
e-mail: leide.camara@live.com

Fone  9.9982-2438


CNPJ: 08.343.279/0001-18
Rua: Mipibu, 443 – Petrópolis – Natal/RN  CEP 59020-250  -  Telefone: 84- 3221.1143
http://www.academialetras.com.br / E-mail: academianrl@gmail.com

FAZENDA UBERABA

Valério Mesquita*

Encontrei no beco das minhas saudades, rebuscando a memória,  o vocábulo Uberaba. Era a propriedade do meu pai em Sucavão, perto de Riacho do Mel, Mata Verde e Traíras, no município de Macaíba. Com a partilha dos bens do espólio de Alfredo Adolfo de Mesquita pelo falecimento de sua esposa Ana Olindina de Mesquita (mãe do meu pai), ele adquiriu no final dos anos quarenta essa fazenda. Construiu o açude, demarcou as terras e ergueu a imensa casa alpendrada num alto, mandando pintá-la toda de branco. A energia elétrica provinha de um gerador e a água servida era da cisterna e do poço à cata-vento, além do açude. Alfredo Mesquita plantava milho, feijão, agave, algodão e criava um plantel de gado leiteiro. Percorria a propriedade e os lugarejos próximos a cavalo. Nídia, minha irmã, também era excelente cavaleira, enquanto eu, ainda menino, montava um cavalo manso que “não desembestava” chamado “Boa Viagem”. Eu me sentia o próprio Durango Kid. “Uberaba” tornou-se o paraíso simples e bucólico de todos nós, o oásis que retemperava o meu pai para os embates políticos. Aqui e acolá, ele a hipotecava ao Banco do Brasil para pagar as dívidas políticas. E assim foi, até um dia perdê-la de vez, vendendo-a ao agro-pecuarista Adauto Rocha em 1961. 
Foi uma das maiores tristezas de nossas vidas. Minha mãe, Nídia e eu choramos a sua perda e todo um universo de gratas reminiscências. A fazenda foi palco de vaquejadas políticas com a presença de governadores, senadores e deputados: José Varela, Silvio Pedroza, Theodorico Bezerra, Georgino Avelino, Dioclécio Duarte, entre outros, pesos pesados do PSD. O exercício da política, foi, aos poucos, depredando a propriedade. Até ferrar novilhas para presentear afilhados de batismo se tornou um ritual do velho Mesquita em favor do compadrio político. Homem solidário e de largueza de gestos tornou-se presa fácil dos oportunistas da política e logo empobreceu.
A Fazenda Uberaba pertenceu depois de Adauto Rocha ao Sr. Manoel Flor que a vendeu, posteriormente, ao Sr. Vicente Flor, proprietário da Empresa Riograndense. Ao longo de certo tempo, seu Vicente sempre me convidava para revisitá-la. Desculpei-me inúmeras vezes, com receio de enfrentar as emoções daquele mundo perdido de minha infância. Certa vez, numa campanha eleitoral, passei ao longe, na estrada, num final de tarde. Pedi para parar o carro. Desci com alguns companheiros de peregrinação política para a contemplação da paisagem linda e quieta. Chorei copiosamente como se tomado e vencido por estranha força. Voltei ao veículo e em silêncio permaneci até chegar a minha casa em Macaíba. A saudade é dor pungente.
(*) Escritor

16/02/2017

Mais uma do PAPA FRANCISCO



"Você pode ter defeitos, ser ansioso, e viver alguma vez irritado, mas não esqueça que a sua vida é a maior empresa do mundo. Só você pode impedir que vá em declínio. Muitos lhe apreciam, lhe admiram e o amam. Gostaria que lembrasse que ser feliz não é ter um céu sem tempestade, uma estrada sem acidentes, trabalho sem cansaço, relações sem decepções. Ser feliz é achar a força no perdão, esperança nas batalhas, segurança no palco do medo, amor na discórdia. Ser feliz não é só apreciar o sorriso, mas também refletir sobre a tristeza. Não é só celebrar os sucessos, mas aprender lições dos fracassos. Não é só sentir-se feliz com os aplausos, mas ser feliz no anonimato. Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver a vida, apesar de todos os desafios, incompreensões, períodos de crise. Ser feliz não é uma fatalidade do destino, mas uma conquista para aqueles que conseguem viajar para dentro de si mesmo. Ser feliz é parar de sentir-se vítima dos problemas e se tornar autor da própria história. É atravessar desertos fora de si, mas conseguir achar um oásis no fundo da nossa alma. É agradecer a Deus por cada manhã, pelo milagre da vida. Ser feliz, não é ter medo dos próprios sentimentos. É saber falar de si. É ter coragem de ouvir um "não". É sentir-se seguro ao receber uma crítica, mesmo que injusta. É beijar os filhos, mimar os pais, viver momentos poéticos com os amigos, mesmo quando nos magoam. Ser feliz é deixar viver a criatura que vive em cada um de nós, livre, alegre e simples. É ter maturidade para poder dizer: "errei". É ter a coragem de dizer:"perdão". É ter a sensibilidade para dizer: "eu preciso de você". É ter a capacidade de dizer: "te amo". Que a tua vida se torne um jardim de oportunidades para ser feliz... Que nas suas primaveras seja amante da alegria. Que nos seus invernos seja amante da sabedoria. E que quando errar, recomece tudo do início. Pois somente assim será apaixonado pela vida. Descobrirá que ser feliz não é ter uma vida perfeita. Mas usar as lágrimas para irrigar a tolerância. Utilizar as perdas para treinar a paciência. Usar os erros para esculpir a serenidade. Utilizar a dor para lapidar o prazer. Utilizar os obstáculos para abrir janelas de inteligência.  Nunca desista....Nunca renuncie às pessoas que lhes ama. Nunca renuncie à felicidade, pois a vida é um espetáculo incrível". 

Papa Francisco.

15/02/2017

O tempo e o espaço dos amigos


Algumas ocorrências recentes provocaram em mim sentimentos daquilo que antigamente se costuma chamar de “emoção existencialista”. Explico. Essa atitude se caracteriza pela mistura do conceito do mundo real com especulações sobre a busca da racionalidade, por meio de um conceito abstrato da existência. Não, não é nada filosófico e chato. No meu dia-a-dia “pão-pão, queijo-queijo” não há espaço para Kierkegaard, Heidegger, Sartre, EspinosaDescartes e Leibniz. Isso eu deixo para os momentos de ócio absoluto, quando os pensamentos voam livres, desapegados da vida.
Foi assim que descobri algo que muitos outros já devem ter descoberto antes de mim: quando nascemos tem inicio um período em que pessoas, fatos e lembranças vão se agregando à nossa existência em uma velocidade e quantidade imensas. Pai, mãe, parentes, vizinhos, as brincadeira da infância, colegas da escola e do trabalho, as namoradas, as farras, as viagens, o que aprendemos nos estudos e pelo simples fato de viver. Alguns desses elementos permanecem vivos em nossa consciência, outros parecem desaparecer para inesperadamente reviverem, despertados por um incidente inesperado qualquer.
Em certa etapa da vida tem inicio um processo reverso. Começamos a perder lembranças de acontecimentos que no passado foram importante pera nós, nos distanciamos dos antigos vizinhos e colegas da escola e do trabalho e, o mais duro, começamos a perder para sempre parentes e amigos, ceifados pela inexorabilidade da morte.
Os últimos anos foram pródigos nessas perdas. Lá se foram minha mãe e minha tia Albinha, os últimos viventes de uma prole de vinte e um nascidos do casal José Rodrigues e de Dona Mariquinha, meus avós maternos. Da família de meu pai croata, nunca tive notícia a não ser de um primo, isso há quase sessenta anos. Perdi também vários amigos, entre eles Dorian Gray Caldas.
E agora recebo a notícia do falecimento de Assis Amorim. Esse um amigo especial. Tornamo-nos próximos nos encontros casuais havidos no coreto da Praça Antonio Joaquim, lá em Mossoró, quando discutíamos tudo, até o que não sabíamos nada de nada. Lá estava Assis e pontificar, com um vocabulário esmerado – depois descobrimos que ele se preparava para esses encontros e encaminhava a discussão para ai distribuir conhecimento. Pequenos pecados da juventude, mas que serviram para espalhar saberes.
Francisco de Assis Freitas Amorim (FAFA para os íntimos) era um ser com características variadas e peculiares. Idealizador e planejador de prédios sem ser arquiteto, construtor sem ser engenheiro, bancário do Banco do Nordeste – ocasião em que trabalhamos junto –, vereador, deputado estadual, economista, advogado e juiz. Acima de tudo era um ser de uma inteligência rara que só aqueles que desfrutaram de seu convívio podem aquilatar.
Lembro-me de uma série de conversa que uma vez tivemos. Nós, dois jovens inquietos intelectualmente, resolvemos entender a tal lei da relatividade de Einstein. Sempre empacávamos nos fatores “tempo” e “espaço”, os quais entendíamos como inseparáveis. Até que um dia resolvemos, por conta própria, separa-los e os projeta-los no curto e longo prazo. Isso sem ajuda de ninguém, nem  do Padre Sátiro – nosso eterno professor e diretor –, pois éramos jovens e, como tal, autossuficientes. Trazendo nossa especulação para nosso terreno, resolvemos que “tempo” era uma questão de escolha pessoal e que o espaço era coisa de Deus. Simples assim. Como era bom ser jovens e descompromissados; compromisso só com nós mesmo.
Lamento bastante não ter me encontrado com Assis mais vezes nos últimos anos. Mesmo recentemente quando fui a Mossoró proferir palestra na UFERSA, na Universidade Estadual ou na Maçonaria não tive tempo de visita-lo. Agora me penitencio e vejo que desperdicei o meu tempo ao não encontra mais vezes o meu amigo e com ele jogar conversa fora.