O beija-flor da Ribeira
Elísio Augusto de Medeiros e Silva
Empresário,
escritor e membro da AEILIJelisio@mercomix.com.br
Mais
uma vez ando pelo casario velho da Ribeira. Tudo em paz – e, como dizem os
poetas, é uma tarde gloriosa. Começo o passeio pela Rua Chile, repartida pelo
trilho de trem que não circula mais. Cruzo com diversos operários de uma obra
próxima em uma das empresas beneficiadoras de pescado.
Os
prédios antigos da Rua Chile sempre me provocam recordações. O cheiro forte de
maresia parece estar impregnado em todos eles. Poucos automóveis e caminhões
circulam pela rua estreita – mesmo assim, o tráfego é congestionado e confuso.
Chego
ao largo e detenho-me para observar o movimento do porto e o casario antigo,
com suas fachadas estreitas e coloridas. As obras do novo terminal de
passageiros marítimos continuam em ritmo acelerado. As lembranças embaçam, mas
não apagam os registros da memória. Sinto a ausência do Bar da Bandeira, de
Graça. Por onde andará “Loyde”?
Observo
o Potengi que, apertado em suas margens, corre manso em seu leito largo. Alguns
barcos descem rio abaixo, nos arrancos da correnteza. Ao longe, avisto o Iate
Clube, a ponte Newton Navarro, as areias da Redinha.
Volto
à Avenida Tavares de Lira, ao antigo Cais Pedro de Barros – no local, vários
meninos pulam no rio e tomam banho. Sigo em direção contrária e, mais à frente,
encontro um grupo de pessoas na esquina da Dr. Barata, comentando as novidades
do dia.
Lembro-me
do café Cova da Onça, do sebo de João Nicodemos, da alfaiataria do Laércio, do
caldo de cana, da Peixada Potengi, da Tipografia Lira, de Santos & Cia, do
cartório de Alínio Azevedo... coisas de outro tempo! Esses locais não existem
mais, e muitos dos prédios por eles ocupados estão maltratados, sem reboco,
deixando à mostra a intimidade dos tijolos brancos – em alguns um amontoado de
entulhos.
A
tardinha vem chegando, e o sol começa a esmorecer – o vento da tarde açoita as
ruas pouco movimentadas do bairro ribeirinho. Nesse momento, avisto um pequeno
beija-flor, que zumbia como uma abelha, sorvendo o néctar das flores de uma
árvore próxima, na esquina da Rua Frei Miguelinho. Sua cabeça diminuta ao
movimentar-se adquire tonalidades de cores que vão da púrpura ao verde; o peito
colorido “furta-cor” e as penas brilhantes de variadas cores.
Isso
nos dá uma sensação revigorante, embora perceba como muitos erros são cometidos
contra esse maravilhoso pedaço de nossa cidade.
Dali
encaminho-me pela Rua Dr. Barata estreita e sinuosa, que, nas décadas de
1930/40, era o centro do comércio da Capital. Impressiono-me com a quantidade
de prédios comerciais fechados - alguns quase a desmoronar. Todos estão
pichados pelo vandalismo.
Como
cronista apaixonado pelo bairro, apresso os meus passos em direção à Praça Augusto
Severo. Tive a sensação de que era seguido pelo beija-flor. Não encontro mais a
Confeitaria Delícia, O Tabuleiro da Baiana, a Importadora Omar Medeiros... No
entanto, o Teatro Alberto Maranhão continua firme na sua vigília centenária.
Vejo,
consternado, como o bairro precisa de novos investimentos públicos e privados.
Aqui fica o registro.
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