CALVÁRIO DAS LETRAS
Valério Mesquita*
“Help! De tanto esperar já nem sei mais pedir socorro em português”.
Assim falou conhecido intelectual da paróquia que habitamos. Viu ao derredor
tudo abandonado, sucateado. Um amigo pedira um catálogo do patrimônio cultural
da cidade para um grupo catarinense que visitava Natal. Em João Pessoa, Recife
e Fortaleza a agenda dos turistas fora inteiramente cumprida. A expectativa era
de que na cidade dos Reis Magos não seria diferente. Alguém do Rio Grande do
Norte, numa das capitais antes visitadas, fornecera algumas informações sobre
os pontos culturais a serem visitados. Deve ter sido um guia turístico
desinformado da realidade em que se encontram os bens culturais móveis e
imóveis do Estado.
Apesar dos esforços dos
órgãos de promoção cultural no enfrentamento dos problemas, não existem: dinheiro
nem vontade política superior. Como explicar a sociedade e aos turistas por que
o teatro Alberto Maranhão está interditado? O museu Café Filho saqueado e
fechado! A biblioteca Câmara Cascudo bloqueada, palco de tantas exposições de
artistas locais, além do rico acervo de coleções de obras de autores nacionais e
estaduais completamente entregues às baratas? O Palácio Potengi, sede da pinacoteca
precisa de uma urgente restauração, pois é cartão de visita dos que chegam à
cidade! O prédio centenário do antigo
Q.G. da praça André de Albuquerque é outro que carece de cuidados e de uma
conservação, tombado também pelo Patrimônio Histórico (Museu Câmara Cascudo). O
Instituto Histórico e Geográfico – IHGRN, fundado em 1902, guardião de todos os
documentos do Rio Grande do Norte colonial, imperial e republicano empenhou ano
passado uma dotação de duzentos mil reais, obtida de emendas parlamentares da
Assembleia Legislativa desde o ano passado, mas, em 2015, teve o documento
legal cancelado, o que prejudicou seriamente a digitalização do imenso acervo,
após a conclusão da restauração do prédio de 1906 com recursos advindos da
mesma fonte. Inimaginável, tal coisa!
Para sentar com as
autoridades e discutir o assunto, há quatro meses, a diretoria do IHGRN pediu
uma audiência através do gabinete civil. O fato é que, até o presente dia não
se recebeu nenhuma resposta, o que não condiz com o espírito e as propostas do
governante, que tanta sensibilidade revelou quando implantou no Poder
Legislativo o Programa “Assembleia
Cultural”, despertando na sociedade a admiração, pois estimulou a música, o
folclore, a arte, a pintura e as nossas tradições culturais.
A cultura potiguar está
a merecer o surgimento de vozes que despertem e unifiquem o pensamento e a ação
da classe, além das entidades públicas e privadas, em defesa do patrimônio
histórico, artístico, bibliográfico. Aliás, tudo isso pertence com mais
legitimidade ao povo do que as instituições. Aguarda-se, igualmente, que os
senhores parlamentares tomem consciência e utilizem as suas prerrogativas de
representatividade porque a cultura de um povo é o que fica, quando tudo o mais passar. É do conhecimento de
todos a crise econômica e financeira que se abateu também no nosso Estado. Mas,
as autoridades administrativas que acolhem todos os seguimentos da sociedade,
por que não consideram também dignos do diálogo, os responsáveis pelo contexto
cultural? Seria a ação dos órgãos culturais uma atividade inútil e marginal? A
cultura é uma atividade para sempre mendicante?
(*) Escritor
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