Sobre José Arno Galvão
Como alguns de vocês já devem saber, no último dia 17, tomei posse na cadeira 28 da Academia de Letras Jurídicas do Rio Grande do Norte, cujo patrono é o jurista Hélio Galvão (1916-1981). Sobre Hélio, inclusive, em reconhecimento da sua grandeza para o direito e para a literatura do nosso estado, escrevi aqui no domingo passado.
Hoje, homenageio o seu filho, o falecido advogado e escritor José Arno Galvão, o anterior ocupante da cadeira que tive a honra de assumir.
José Arno nasceu em Pedro Velho, à época chamada de Vila Nova, em 25 de julho de 1943. Foi seminarista e formou-se em Direito pela UFRN. Pai de três filhos (e já avô), faleceu, de um câncer no pulmão, aos 70 anos, em 2013. Deixou uma enormidade de amigos.
José Arno foi procurador do município de Natal, chegando a ocupar o cargo de procurador-geral na administração do então prefeito José Agripino Maia (fins do anos 70, começo dos 80), segundo nos informa o seu necrológico na Tribuna do Norte, jornal do qual ele era, assim como eu sou, colaborador semanal. Foi, também, biografo do pai com o livro “Hélio Galvão: um advogado” (de 2010). E foi, por muitos anos, assim como o pai, um respeitadíssimo advogado em nosso estado.
Para mim, entretanto, José Arno foi, sobretudo, o talentoso cronista dominical, na coluna “Quadrantes”, da Tribuna do Norte. Herdando o ofício do pai, ele escrevia sobre quase tudo. Um pouco de direito, como em “No escritório” e “O Supremo Tribunal”. Muito sobre livros, como em “O livro do futuro”, “Livros” e “Bibliotecas”. Nestas crônicas, narra suas leituras do nosso Otacílio Alecrim e sua “Província submersa”. Leituras de Raul Pompéia (em “O Ateneu”) e de Bernardo Guimarães (em “O seminarista”). De Camilo Castelo Branco, de Eça de Queiroz, de Machado de Assis, de José de Alencar e por aí vai.
Mas José Arno foi, a meu ver, como cronista, sobretudo, um memorialista, como, por exemplo, nas crônicas “Lembrando a infância”, “Depoimento”, “Cultivar as lembranças”, “Rememorando”, “Homenagens e memória” e “Sobrememória”. Às vezes rememorando cheiros, doces, comidas litorâneas, à moda de um Marcel Proust - em busca de um tempo, para muitos de nós, já perdido -, falava de sua infância em Vila Nova (hoje Pedro Velho), da estada da família em Penha (hoje Canguaretama), de Goianinha, da amada Tibau do Sul e de uma Natal que não enxergamos mais.
E sua contribuição, em forma de depoimento (na maioria das vezes de “ciência própria”, como dizemos no foro), para a história do nosso estado é notável. Em “A biblioteca”, por exemplo, ele narra o encontro amistoso entre o pai, Djalma Marinho e Aluízio Alves, em plena campanha para governador em 1960. Nessa eleição, Djalma, grande amigo de Hélio Galvão e candidato da situação, enfrentava Aluízio, de quem Hélio era, além de amigo, advogado. Narra José Arno: “Aluízio, sabendo do relacionamento de seu advogado com o antigo adversário e brincando com o fato, dizia duvidar de seu voto”. Já em “Uma relação de amizade”, sobre o laço que unia Hélio Galvão e Aluízio Alves, José Arno narra como se deu, em 1947, o covarde assassinato de Aristides Hortênsio, em Pedro Velho, uma das mais vergonhosas páginas (os mais velhos, digo experientes, devem saber) da história política do nosso Rio Grande do Norte. No episódio estavam envolvidos Hélio, Aluízio, Moacir Duarte, Ubaldo Bezerra, Dioclécio Duarte e muitos outros que já nos deixaram. E esses são apenas alguns exemplos dos “depoimentos” de José Arno.
Soube - e oxalá isso se concretize - que as crônicas de José Arno Galvão serão reunidas em livro brevemente. Uma iniciativa da Editora Sebo Vermelho. Mais um belo presente que essa corajosa editora dá, entre tantos outros por ela já dados, às letras e à história do nosso estado, estou seguro disso.
Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP
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02/12/2014
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