A vida de Jesus Cristo é um assunto de uma complexidade tamanha devido aos valores sagrados que envolvem a sua figura. Além disso, a grande parte dos registros que servem de referência para contar sua História está nos evangelhos bíblicos dotados de uma parcialidade perceptível na forma com que diferentes textos relatam um mesmo assunto. De forma geral, as informações sobre a sua vida ganham maior riqueza de detalhes na sua vida adulta, deixando sua infância e adolescência em aberto.
O nascimento de Cristo entra no conjunto dessa biografia desigual, tendo apenas os evangelhos de Lucas e Mateus enquanto fontes de compreensão. Em ambos os relatos, temos que realizar uma divisão entre os elementos míticos e históricos que envolvem o fato. Não se trata de estabelecer a distinção entre “verdade” e “mentira”, mas de privilegiar o rigor da pesquisa histórica mediante questões de cunho subjetivo e religioso.
Seguindo essas idéias temos que vislumbrar o fato de que os dois textos vão concordar na questão da virgindade de Maria e a noção de que José era o pai adotivo do Messias. Além disso, existe uma premissa de caráter religioso que vincula a linhagem de Cristo ao lendário e bem quisto rei Davi, considerado um dos maiores patriarcas da civilização hebraica e retratado no Antigo Testamento como um dos mais tementes servos de Deus. Levantando essas noções de caráter religioso, iremos seguir com a perspectiva histórica do assunto.
De acordo com os poucos relatos que falam de José, sabemos que ele era um artesão que viveu na Galiléia, na porção norte do território Palestino. Os diversos relatos que falam de Cristo lhe conferem a condição de Galileu. Naquela região, ainda podemos assinalar a influência das crenças e hábitos dos povos babilônicos e helênicos. Foi nesse período de diferentes processos de dominação que a religião judaica passaria a fixar a crença do fim dos tempos e a espera de um salvador.
No entanto, a verossimilhança destes fatos e dados sobre o contexto histórico judaico entra em conflito quando passamos a averiguar a data de nascimento de Jesus. O primeiro indício dessa imprecisão se observa mediante a idéia de que Herodes, governador romano de Jerusalém, teria vivido durante a época do nascimento de Cristo. Segundo as pesquisas recentes, esse representante do Império Romano faleceu quatro anos antes do início da Era Cristã.
Outro ponto de discórdia também pode ser observado no livro de Lucas, que relata no período do nascimento de Jesus a ordenação de um censo encomendado pelo Imperador César Augusto. Essa contagem da população seria de responsabilidade de Quirino, então governador da Síria. Essa informação entra em conflito com os documentos que assinalam a ascensão de Quirino ao posto de governador seis anos após o nascimento de Jesus.
Outra divergência também se relaciona com a questão dos três reis magos que foram visitar o recém-nascido. Os reis, mencionados apenas no livro de Mateus, teriam sido guiados por uma estrela cadente (que segundo alguns, seria o cometa Halley) que os levaria até o local em que Cristo nascera. Segundo os relatos bíblicos, os reis foram interceptados por Herodes que pediu aos mesmos que lhe contassem o local em que o já ameaçador Messias teria nascido.
Ao invés de obedecer a ordem do governador romano, os reis foram alertados por um anjo a seguir outra rota para casa. Notando a traição dos reis estrangeiros, Herodes teria ordenado uma grande matança das crianças menores de dois anos encontradas na cidade de Belém. Essa ordem de Herodes não possui nenhum tipo de relato ou documento que a comprove, colocando a mesma no campo especulativo.
As questões envolvendo o seu nascimento, de fato, comprovam como a investigação histórica deve se apartar dos itens fantasiosos e míticos encontrados no texto bíblico. No entanto, mesmo nessas partes onde a realidade parece ser superada, percebemos quais os valores e idéias que se fixaram no ideário do povo judeu e, até mesmo, a presença de culturas e crenças estrangeiras que entraram em contato com a civilização judaica.
Dessa forma, Jesus pode renascer de formas diferentes: uma sobre o rigor das pesquisas científicas e outra aos olhos do cristianismo. Não cabe dizer aqui que estas polêmicas derrubariam a fé alheia. Ao contrário disso, nos revela como a construção de nossas crenças podem se relacionar com o saber histórico, sem necessariamente criar uma relação de total exclusão com o campo religioso.
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