1944 - Festa no Grande Hotel
Elísio Augusto de Medeiros e Silva
O salão estava lotado de natalenses e americanos, que sorviam doses
generosas dos uísques Logan, White Horse, Chivas e Old Parr, e fumavam
Chesterfield, Kent e Malboro, em detrimento aos nossos Hollywood, Luís XV e
Pesela, da Cia Lopes Sá.
Natal respirava e vivia o período da guerra, tendo mudado os velhos
hábitos dos quase 60.000 habitantes, por influência dos contingentes militares
que aqui se encontravam, principalmente o norte-americano.
Na época, a música mais tocada era “To You”, nas radiolas de ficha, e já
conhecíamos a Coca-Cola, introduzida pelos americanos. A Ribeira vivia em plena
efervescência econômica e social. O comércio, as pequenas indústrias, tudo
estava em franca ascensão.
Na praça de carro, os Ford 42, Chevrolet e Packard reluziam nas mãos dos
velhos motoristas de praça da Tavares de Lira, que se divertiam, limpando as
faixas brancas dos pneus.
Nessa noite, Zé Areia passeava ao largo, esperando um gringo, para vender
um mico.
As notícias vinham pelos rádios e jornais dos Aliados, ou então eram
transmitidas por Luiz Romão, da Agência Pernambucana, desde 1938.
Na Rampa da Limpa, em
Santos Reis , o pouso e a decolagem dos hidroaviões tinham
sido intensos.
O Prefeito José Augusto Varela comemorava a inauguração do abrigo Juvino
Barreto, que tinha ocorrido no dia 26 de março último.
Nesse dia, em Natal, 29 de março de 1944, em plena 2ª Guerra, alguns
intelectuais da terra comemoravam os 42 anos de fundação do Instituto Histórico
e Geográfico do Rio Grande do Norte.
O terreno do Grande Hotel tinha sido adquirido pelo Interventor Mário
Câmara, e o projeto era do arquiteto George Munier.
O “Majó” não escondia a sua satisfação em ver que o hotel estava lotado.
A música, a todo ritmo, soava tranquila para os festivos participantes.
No saguão, todos reunidos ouviam o dedilhar perfeito do maestro, no velho
piano de canto. O lustre de cristal tcheco, com corrente de latão, balançava
cadenciado pela música da época.
As senhoras bem vestidas, de relógios da marca Longines, desfilavam a
última moda europeia, em vestidos de tecido de seda veludosa ou cetim de
organza plissada, e desdobravam-se em amabilidades, ao lado de senhores
austeros, de terno de tropical inglês: a fina flor da sociedade natalense.
Os cheiros de baton, rouge e pó de arroz misturavam-se aos cheiros dos
extratos femininos: Zero Cinco, Belles Flevas, Muggo Chine, Bond Street e
outros.
As mesas, com toalhas de linho branco, bordadas, exibiam as melhores
louças portuguesas, ricamente decoradas, e algumas faianças inglesas, marca
H&B.
Os garçons não paravam de rodar, no salão, com as bandejas de prata,
repletas de taças de cristal com champanhe francês, doses de uísque, água de
coco, refrigerantes e ponche.
O buffet tinha sido severo, desde os canapés, até os casquinhos de siri e
camarões empanados. Tudo perfeito!
O refrigério do Potengi atingia a sala de recepções do Grande Hotel,
levando aquele vento doce e salgado, aos convivas extasiados.
A noite, pelo jeito, iria demorar a fluir, na ampulheta do tempo, daquela
Natal do século 20.
Quando serviram o prato principal: caviar ao molho branco, pernil de
lagosta e peru, já se tinham gastado três horas do crédito da madrugada.
O velho prédio, em frente, onde depois foi o Bandern, a tudo assistia e,
conformado, concordava com quem comentava sobre a Rádio Poti, recém-inaugurada,
que sucedia à Rádio Educadora.
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Escritor falecido e artigo enviado pela filha Carina
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