A Coluna do General Miguel
Costa/Prestes em São Miguel/RN (III)
Luiz Gonzaga Cortez*
Fita do correio provou que o
telegrama informava
que bandidos sem munição iriam
atacar S. Miguel.
Enquanto o chefete político João
Leite e diversos familiares viram os revoltosos passarem no “aceiro” da
estrada, na cidade de São Miguel muita gente pensava que a situação estava
tranquila por causa da prisão de dois soldados do Exército Rebelde. Mas outros
alguns comerciantes, desconfiados da situação, isto é, que não existia
segurança nenhuma para seus familiares, providenciaram o transportes de cargas de alimentos para a zona rural. Uma delas foi a Vazante do
Jacó, a mandado de Manoel Vieira. José Guedes do Rego, que trabalhava com ele,
e “Doutor”, um homem negro que veio de Icó/CE para trabalhar com Manoel Vieira.
Na Vazante do Jacó, quando deixavam a primeira carga, eles foram surpreendidos
por “uma quantidade enorme de gente armada e muitos animais soltos no meio
daquele pessoal”.
“A gente que estava preocupada
com a chegada de 700 praças prometidos pelo Governador, ficamos animados e
achamos que eram os soldados mandados e apressamos os passos, mas aquela gente
entrar na cidade, ouvimos vários tiros
que partiam da cidade e dos homens que se aproximavam. Aí ficamos assustados e
com a continuação dos tiros, resolvemos voltar, correndo. Apesar de ser muito
moço, o velho Salviano, um marchante,
corria mais. O clima era frio. Os
homens voltaram, gritando “demore aí, canalhas, que a gente volta já e daremos
o troco a vocês!” Com o regresso daquela
gente, resolvemos prosseguir a viagem
para a cidade, avistamos a estrada da “Aba”, cheia de gente armada e montados,
sem animais soltos. Eram centenas e nessa marcha entraram na cidade. Voltamos
para a casa onde estávamos arrranchados e contamos a história, ficando todo
mundo assustado. A casa ficava num local
alto e de lá dava para ver a estrada com gente aos borbotões entrando na
cidade”, relatou José Guedes do Rego.
De frente com Prestes
Em dado momento, avistaram um
homem barbudo, vermelho, montado numa burra bonita, armado com um fuzil na
perna, com sela gaúcha, que se dirigiu ao grupo, deu bom dia e perguntou se
algum chimangue do governo. Nós, que não sabíamos o que era chimangue, ficamos
calados, mas Manoel Vieira disse que não passou. Aí ele perguntou quem mandou
nos atacar. Manoel Vieira respondeu que foi o chefe daqui, mas baseado num
telegrama do governador dizendo que rumava a esse município um grupo de 70
bandidos desmuniciados e para a defesa da cidade seguiam 700 praças, motivo
porque o chefe resolveu empiquetar a ladeira do Engenho, isto enquanto
chegassem os referidos soldados e até agora nada”. O homem era oficial sulista
e interrogou mais Manoel Vieira sobre as principais famílias e, ao final do
interrogatório, mandou que todos se dirigissem a cidade.
No retorno para São Miguel, o oficial do Exército
mostrou muitos feridos no chão e perguntou a Manoel Vieira se conhecia aquelas
pessoas . “È gente sua, não se interessa por essas pessoas?”, perguntou o
oficial. “Não conheço, mas deve ser gente daqui”, respondeu Manoel Vieira, e
seguimos para a casa dele, passando por todas as casas fechadas e ruas cheias
de revoltosos.
“O oficial parou e perguntou para
um que estava em cima do sobradinho, onde funcionava o telégrafo:”Ô Ramão, onde
estão os feridos?”. O Ramão respondeu: “estão aí, em frente a uma farmácia”.
Era o capitão do Exército Djalma Dutra, que foi para a Farmácia de Eliseu,
conhecido por Zezeu, onde estava Manoel
Tenório, deitado na calçada com uma coxa quebrada de bala e ao nos ver, gritou “Seu Vieira, me acuda se
não me matam”. Manoel Vieira chamou umas
pessoas e mandou o ferido para a sua casa e o oficial dizia “adiante tem mais”.
Ao passar na frente da casa do velho Doca Couto, agente do correio, Manoel Vieira foi levado para ser apresentado ao Estado Maior
da Coluna para dar depoimento sobre o ataque aos revoltosos. Não recordo os
nomes de todos, pois era um número bem elevado, mas recordo-me do capitão Luis
Carlos Prestes e todos o ouviam como superior; tinham também João Alberto,
Siqueira Campos e muitos outros. Então Manoel Vieira foi apresentado ao Estado
Maior , chamou-os para a sua residência e lá mandou preparar café e serviu a
todos do Estado Maior. Instalaram-se na casa de Manoel Vieira como se fosse o
seu escritório e começaram a ouvir todas as pessoas que conseguir prender fora
da cidade. A primeira pergunta que fizeram a Manoel Vieira foi como ele prova
que houve o telegrama do governador do Estado dizendo que tratava-se de bandidos? Ele respondeu: “Vão
ao telégrafo e examinem as fitas”. E assim, eles fizeram, tendo sido confirmado. (1)Disseram a ele que “se o senhor
falar a verdade, está garantido com sua família e tudo quanto lhe pertencer e
se nós provarmos qualquer mentira em vossa conversa, não se admire o que lhe
acontecer”. Continuou entrando gente na
cidade e começaram a derrubar as portas
das casas comerciais e a utilizarem do que entendiam, juntavam-se 5 r
mais homens e faziam carreira de uma só vez, barruando nas portas, que não
resistiam. Dado isto, Manoel Vieira pediu ao Prestes que garantisse o
estabelecimento dele, e Prestes respondeu: “ponha uma pessoa na frente do
estabelecimento e quem procurar arrombar, diga que está garantido pelo Prestes;
e assim ele fez, sendo que a pessoa foi eu, e já vi que medo, mas fui me
habituando com aquela cena horrível e passei o dia da porta do estabelecimento
para a casa de Manoel Vieira. Uma vez eu estava com ele a comentar aquilo e
ouvimos uma pancada numa porta do estabelecimento. Era um cabra mal encarado,
sem aparência de soldado, com uma mão de pilão que uma pessoa havia trazido
para venda no mercado. Manoel Vieira disse que o estabelecimento estava
garantido, mas o cabra respondeu que” eu não sei o está garantido e senhor
escreva na porta onde começa o estabelecimento” Ele marcou o
dele e mais estabelecimentos pequenos vizinhos, que eram do sacristão José
Pereira José Joaquim da Silva. O cabra disse que “este é que bom prá nós que é
grande”. Depois atacaram outro estabelecimento, mas Manoel Vieira disse que era
de um irmão dele,e o revoltoso suspendeu, mas virando-se de imediato para outro estabelecimento, que tinha uma
inscrição “Magalhães & Queiroz”, o revoltoso disse não, este tem o nome
Queiroz e esse cidadão foi nos atacar e, de imediato, botaram as portas dentro.
De todo o comércio da cidade só ficaram 4 estabelecimentos em paz. Vi o estabelecimento de Elinas Dias da Cunha
sendo derrubado e os revoltosos abrindo
sacos de arroz e latas de confeitos e de bolachas, despejando nas calçadas para os animais
comerem. A maioria da população da cidade ficou dentro de casas com portas
fechadas, presenciando pelas frestas das portas, como a família de Pedro
Pinheiro”.
1 – O Presidente da Província do RN era José Augusto Bezerra
de Medeiros.
Luiz Gonzaga Cortez *
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