28/01/2014

A Coluna do General Miguel Costa/Prestes  em São Miguel/RN (III)
Luiz Gonzaga Cortez*

Fita do correio provou que o telegrama informava
que bandidos sem munição iriam atacar S. Miguel.

Enquanto o chefete político João Leite e diversos familiares viram os revoltosos passarem no “aceiro” da estrada, na cidade de São Miguel muita gente pensava que a situação estava tranquila por causa da prisão de dois soldados do Exército Rebelde. Mas outros alguns comerciantes, desconfiados da situação, isto é, que não existia segurança nenhuma para seus familiares, providenciaram o transportes de  cargas de alimentos  para a zona rural. Uma delas foi a Vazante do Jacó, a mandado de Manoel Vieira. José Guedes do Rego, que trabalhava com ele, e “Doutor”, um homem negro que veio de Icó/CE para trabalhar com Manoel Vieira. Na Vazante do Jacó, quando deixavam a primeira carga, eles foram surpreendidos por “uma quantidade enorme de gente armada e muitos animais soltos no meio daquele pessoal”.
“A gente que estava preocupada com a chegada de 700 praças prometidos pelo Governador, ficamos animados e achamos que eram os soldados mandados e apressamos os passos, mas aquela gente entrar na cidade, ouvimos vários  tiros que partiam da cidade e dos homens que se aproximavam. Aí ficamos assustados e com a continuação dos tiros, resolvemos voltar, correndo. Apesar de ser muito moço, o velho Salviano, um marchante,  corria mais. O  clima era frio. Os homens voltaram, gritando “demore aí, canalhas, que a gente volta já e daremos o troco a vocês!”  Com o regresso daquela gente,  resolvemos prosseguir a viagem para a cidade, avistamos a estrada da “Aba”, cheia de gente armada e montados, sem animais soltos. Eram centenas e nessa marcha entraram na cidade. Voltamos para a casa onde estávamos arrranchados e contamos a história, ficando todo mundo  assustado. A casa ficava num local alto e de lá dava para ver a estrada com gente aos borbotões entrando na cidade”, relatou José Guedes do Rego.
De frente com Prestes
Em dado momento, avistaram um homem barbudo, vermelho, montado numa burra bonita, armado com um fuzil na perna, com sela gaúcha, que se dirigiu ao grupo, deu bom dia e perguntou se algum chimangue do governo. Nós, que não sabíamos o que era chimangue, ficamos calados, mas Manoel Vieira disse que não passou. Aí ele perguntou quem mandou nos atacar. Manoel Vieira respondeu que foi o chefe daqui, mas baseado num telegrama do governador dizendo que rumava a esse município um grupo de 70 bandidos desmuniciados e para a defesa da cidade seguiam 700 praças, motivo porque o chefe resolveu empiquetar a ladeira do Engenho, isto enquanto chegassem os referidos soldados e até agora nada”. O homem era oficial sulista e interrogou mais Manoel Vieira sobre as principais famílias e, ao final do interrogatório, mandou que todos se dirigissem a cidade.
No  retorno para São Miguel, o oficial do Exército mostrou muitos feridos no chão e perguntou a Manoel Vieira se conhecia aquelas pessoas . “È gente sua, não se interessa por essas pessoas?”, perguntou o oficial. “Não conheço, mas deve ser gente daqui”, respondeu Manoel Vieira, e seguimos para a casa dele, passando por todas as casas fechadas e ruas cheias de revoltosos.
“O oficial parou e perguntou para um que estava em cima do sobradinho, onde funcionava o telégrafo:”Ô Ramão, onde estão os feridos?”. O Ramão respondeu: “estão aí, em frente a uma farmácia”. Era o capitão do Exército Djalma Dutra, que foi para a Farmácia de Eliseu, conhecido por Zezeu, onde  estava Manoel Tenório, deitado na calçada com uma coxa quebrada de bala e  ao nos ver, gritou “Seu Vieira, me acuda se não me matam”.  Manoel Vieira chamou umas pessoas e mandou o ferido para a sua casa e o oficial dizia “adiante tem mais”. Ao passar na frente da casa do velho Doca Couto, agente do correio,  Manoel Vieira foi  levado para ser apresentado ao Estado Maior da Coluna para dar depoimento sobre o ataque aos revoltosos. Não recordo os nomes de todos, pois era um número bem elevado, mas recordo-me do capitão Luis Carlos Prestes e todos o ouviam como superior; tinham também João Alberto, Siqueira Campos e muitos outros. Então Manoel Vieira foi apresentado ao Estado Maior , chamou-os para a sua residência e lá mandou preparar café e serviu a todos do Estado Maior. Instalaram-se na casa de Manoel Vieira como se fosse o seu escritório e começaram a ouvir todas as pessoas que conseguir prender fora da cidade. A primeira pergunta que fizeram a Manoel Vieira foi como ele prova que houve o telegrama do governador do Estado dizendo que  tratava-se de bandidos? Ele respondeu: “Vão ao telégrafo e examinem as fitas”. E assim, eles fizeram, tendo sido  confirmado. (1)Disseram a ele que “se o senhor falar a verdade, está garantido com sua família e tudo quanto lhe pertencer e se nós provarmos qualquer mentira em vossa conversa, não se admire o que lhe acontecer”.  Continuou entrando gente na cidade e começaram a derrubar as portas  das casas comerciais e a utilizarem do que entendiam, juntavam-se 5 r mais homens e faziam carreira de uma só vez, barruando nas portas, que não resistiam. Dado isto, Manoel Vieira pediu ao Prestes que garantisse o estabelecimento dele, e Prestes respondeu: “ponha uma pessoa na frente do estabelecimento e quem procurar arrombar, diga que está garantido pelo Prestes; e assim ele fez, sendo que a pessoa foi eu, e já vi que medo, mas fui me habituando com aquela cena horrível e passei o dia da porta do estabelecimento para a casa de Manoel Vieira. Uma vez eu estava com ele a comentar aquilo e ouvimos uma pancada numa porta do estabelecimento. Era um cabra mal encarado, sem aparência de soldado, com uma mão de pilão que uma pessoa havia trazido para venda no mercado. Manoel Vieira disse que o estabelecimento estava garantido, mas o cabra respondeu que” eu não sei o está garantido e senhor escreva na  porta  onde começa o estabelecimento” Ele marcou o dele e mais estabelecimentos pequenos vizinhos, que eram do sacristão José Pereira José Joaquim da Silva. O cabra disse que “este é que bom prá nós que é grande”. Depois atacaram outro estabelecimento, mas Manoel Vieira disse que era de um irmão dele,e o revoltoso suspendeu, mas virando-se de imediato para  outro estabelecimento, que tinha uma inscrição “Magalhães & Queiroz”, o revoltoso disse não, este tem o nome Queiroz e esse cidadão foi nos atacar e, de imediato, botaram as portas dentro. De todo o comércio da cidade só ficaram 4 estabelecimentos em paz. Vi  o estabelecimento de Elinas Dias da Cunha sendo derrubado e os  revoltosos abrindo sacos de arroz e latas de confeitos e de bolachas,  despejando nas calçadas para os animais comerem. A maioria da população da cidade ficou dentro de casas com portas fechadas, presenciando pelas frestas das portas, como a família de Pedro Pinheiro”.
1 – O Presidente da Província do RN era José Augusto Bezerra de Medeiros.

Luiz Gonzaga Cortez * 

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