JOSÉ VARELA, UM
DEPOIMENTO
Valério Mesquita*
Há certos homens públicos que podem ser sintetizados numa palavra:
probidade. Na infante democracia brasileira dos anos cinquenta, conheci na casa
do meu pai (Macaíba), o então governador José Augusto Varela. O PSD vivia o seu
tempo áureo. Lá, os meus olhos de menino se maravilhavam com o porte
carismático de Georgino Avelino, com a oratória bacharelesca de Dioclécio
Duarte, com a sagacidade matuta de Theodorico Bezerra, com a fleugma britânica
de Sylvio Pedroza e outros tantos dromedários do velho e guerreiro partido
majoritário. Mas, José Varela era a figura espartana, retilínea,
personalíssima, cuja forte presença encantava os circunstantes. Alfredo
Mesquita Filho era seu amigo incondicional. Inclusive, o apoiou na memorável
campanha para governador de 1947 e repetiu na sua sucessão. Interessante
registrar o temperamento exacerbado dos dois. Quando enfezados ou desafiados se
tornavam agressivos e bravos. Nitroglicerina pura. A amizade de ambos era tão
fraterna, que Mesquita nos seus arroubos partidários, esbravejava a plenos
pulmões: "Eu sou cabra de Zé Varela!".
Ouvi meu pai, certa vez, um episódio ocorrido entre os dois. Ciente de que o deputado
Alfredo Mesquita estava no Palácio Potengi, José Varela pediu para chamá-lo ao
gabinete. Ao entrar, o governador foi logo fuzilando: "Mesquita, você quer acabar com o estado?”.
“Que história é essa, governador!",
protestou o deputado. "Você além de
me pedir para calçar a estrada Macaíba a Natal usando todo o paralelepípedo da
pedreira de Jundiaí (pertencia ao governo do estado e era administrada pela secretaria
da agricultura cujo titular era Enock Garcia), você ainda pede mais pedra para
obras urbanas da prefeitura de Macaíba? Isso não é possível!!",
complementa José Varela, afobadamente. Mesquita "pegou gás", como se
diz na gíria de hoje. De parte a parte, murros na mesa e ameaças de rompimento.
O deputado Israel Nunes, pessedista, viajor de muitas galáxias e profundo
conhecedor da personalidade dos dois, chama o garçom e pede água e café.
Ao cabo de dez minutos os ânimos serenaram. A paz é celebrada novamente.
Da parte de Zé Varela excesso de zelo pelo estado. Da de Mesquita exagero
patriótico por Macaíba. As pedras continuaram a sair de Jundiaí para fazer a
atual balaustrada e a praça Antônio de Melo Siqueira, além do grande parque à
margem do rio, todo urbanizado e que, ainda leva hoje nome de "Governador
José Varela". A amizade triunfara sobre o temperamento.
A celebração do seu centenário de nascimento, ocorreu há mais de dez anos
passados. Relembro o seu vulto de homem público modelar e em envaideço não só
de tê-lo conhecido mas, também, diante de tantas descrenças nos políticos de
hoje, contemplo com orgulho que um homem da sua estirpe existiu no cenário da
vida política do Rio Grande do Norte.
(*)
Escritor.
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