FAZENDA UBERABA
Valério Mesquita*
Encontrei no beco das
minhas saudades, rebuscando a memória, o
vocábulo Uberaba. Era a propriedade do meu pai em Sucavão, perto de Riacho do Mel,
Mata Verde e Traíras, no município de Macaíba. Com a partilha dos bens do
espólio de Alfredo Adolfo de Mesquita pelo falecimento de sua esposa Ana
Olindina de Mesquita (mãe do meu pai), ele adquiriu no final dos anos quarenta
essa fazenda. Construiu o açude, demarcou as terras e ergueu a imensa casa
alpendrada num alto, mandando pintá-la toda de branco. A energia elétrica
provinha de um gerador e a água servida era da cisterna e do poço à cata-vento,
além do açude. Alfredo Mesquita plantava milho, feijão, agave, algodão e criava
um plantel de gado leiteiro. Percorria a propriedade e os lugarejos próximos a
cavalo. Nídia, minha irmã, também era excelente cavaleira, enquanto eu, ainda
menino, montava um cavalo manso que “não desembestava” chamado “Boa Viagem”. Eu
me sentia o próprio Durango Kid. “Uberaba” tornou-se o paraíso simples e
bucólico de todos nós, o oásis que retemperava o meu pai para os embates
políticos. Aqui e acolá, ele a hipotecava ao Banco do Brasil para pagar as
dívidas políticas. E assim foi, até um dia perdê-la de vez, vendendo-a ao
agro-pecuarista Adauto Rocha em 1961.
Foi uma das maiores
tristezas de nossas vidas. Minha mãe, Nídia e eu choramos a sua perda e todo um
universo de gratas reminiscências. A fazenda foi palco de vaquejadas políticas
com a presença de governadores, senadores e deputados: José Varela, Silvio
Pedroza, Theodorico Bezerra, Georgino Avelino, Dioclécio Duarte, entre outros,
pesos pesados do PSD. O exercício da política, foi, aos poucos, depredando a
propriedade. Até ferrar novilhas para presentear afilhados de batismo se tornou
um ritual do velho Mesquita em favor do compadrio político. Homem solidário e
de largueza de gestos tornou-se presa fácil dos oportunistas da política e logo
empobreceu.
A Fazenda Uberaba pertenceu
depois de Adauto Rocha ao Sr. Manoel Flor que a vendeu, posteriormente, ao Sr.
Vicente Flor, proprietário da Empresa Riograndense. Ao longo de certo tempo,
seu Vicente sempre me convidava para revisitá-la. Desculpei-me inúmeras vezes,
com receio de enfrentar as emoções daquele mundo perdido de minha infância.
Certa vez, numa campanha eleitoral, passei ao longe, na estrada, num final de
tarde. Pedi para parar o carro. Desci com alguns companheiros de peregrinação
política para a contemplação da paisagem linda e quieta. Chorei copiosamente
como se tomado e vencido por estranha força. Voltei ao veículo e em silêncio
permaneci até chegar a minha casa em Macaíba. A saudade é dor pungente.
(*) Escritor
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