VALE A PENA PEDIR DE NOVO
Valério Mesquita*
O rio Jundiaí, no
trecho em que atravessa a cidade de Macaíba, perdeu o solo, o curso, o chão, o
cheiro, a visão e é ameaça a segurança dos habitantes. Entre o parque
governador José Varela e a praça Antônio de Melo Siqueira deixaram crescer no
leito poluído imensos manguezais que enfeiam um dos mais bonitos logradouros
urbanos. Essa selva esconde lixo doméstico, carcaças de animais, marginais do
tráfico de drogas em todo o seu percurso e os galhos já ultrapassam a altura da
ponte e das balaustradas.
A Tribuna do Norte
publicou ano passado, excelente matéria sobre tudo que ameaça e destrói os rios
Potengi e Jundiaí. Mas, o foco da minha questão e, creio, dos cidadãos
macaibenses, reside exatamente neste aluvião de perguntas: por que o Idema e o Ibama não
evitam, aparando, podando, somente nesse trajeto o “matagal” entre o antigo
cais do porto até a outra lateral da ponte? Por que não licenciam a prefeitura
para o fazer?
A praça e o parque
perderam o charme de antigamente. Ninguém enxerga ninguém, olhando de um lado
para o outro. A conscientização ambiental deve ser obedecida até onde não
prejudique a funcionalidade urbanística e o senso prático e plástico do mapa
citadino. Desde quando, em 1950, se planejou e se construiu a estrutura de
pedra e cal das duas margens, o choque do progresso jamais prejudicou a
superfície do rio. Nem, tão pouco, o molestaram, a expansão e o desafio do
crescimento habitacional. Pelo contrário, a construção ordenou a trajetória das
águas e defendeu as ruas periféricas contendo os transbordamentos. Contemplo,
hoje, que os problemas das inundações estão equacionadas com a construção da
barragem de Tabatinga. Por que o Idema e
o Ibama, tão preocupados com o meio ambiente, não permitem, apenas, nesse,
pequeníssimo trajeto fluvial o corte da poluição visual da paisagem urbana e
memorial de Macaíba?
Ali, a vegetação
gigantesca e desproporcional encobre um dos pontos históricos do município.
Refiro-me ao cais das antigas lanchas que faziam o percurso fluvial entre
Macaíba e Natal: a lancha do mestre Antonio, o barco de João Lau, além da
lancha “Julita” que transportou tantas vezes Tavares de Lyra, Eloy, Auta e
Henrique Castriciano de Souza, Augusto Severo, Alberto Maranhão, João Chaves,
Octacílio Alecrim e tantas outras figuras notáveis da vida social, cultural,
política e econômica. Todos se destacaram nos planos estadual, nacional e
internacional. Ali, o centenário cais, jaz sob os escombros de verdes balizas
envergadas e fantasmagóricas. A visão noturna é tétrica e arrepiante. Desfigura
e mutila os padrões estéticos do planejamento da urbe que a faz parecer
abandonada e suja. Até a lua cheia que nasce lá por trás do Ferreiro Torto foi
encoberta.
Assim como se deve
obedecer a educação ambiental, do mesmo modo, exige-se o tratamento e o corte
do matagal por parte do Idema e do Ibama a fim de evitar o represamento do lixo
no leito, exclusivamente urbano. Nas capitais e cidades importantes do Brasil
banhadas por rios não se vê tratamento tão dispersivo e indiferente da parte
dos órgãos responsáveis. Ao redimensioná-lo neste texto, cabe aos institutos prefalados uma reflexão, um reestudo
sobre o cenário dantesco do rio Jundiaí na parte descrita. O povo macaibense
tem o direito de ouvir e a coragem de duvidar que essa “selva amazônica” que
devora e perturba a todos seja explicada e resolvida, sem slogans, clichês,
palavras de ordem, lugares comuns, peças de marketing ou princípios dogmáticos.
Que venha à lume as boas intenções e que não fique Macaíba submersa na floresta
de manguezais, ocultando o passado de sua arquitetura urbana de quase setenta
anos: Parque Governador Jose Varela e Praça Antônio de Melo Siqueira (1950).
(*)
Escritor.
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