O museu e a biblioteca
Dividida em cidade velha e cidade nova, dominada pelo seu castelo e
pela Royal Mile (a cidade velha, me refiro, que é certamente a mais
interessante), Edimburgo, capital da Escócia, é uma urbe belíssima, com
poucas rivais, nesse quesito, na Europa. A depender da época do ano em
que você a visite, é um pouco escura, é verdade. E é também um pouco
triste – pelo menos essa foi a minha sensação –, sobretudo se você
prestar demasiada atenção (foi o meu caso na última vez que estive por
lá) na história do pequeno Greyfriars Bobby, um cãozinho terrier local
que, por quatorze anos, tomou conta do túmulo do seu amado dono.
Mas, reitero, Edimburgo é belíssima.
E como se isso não bastasse, para nós, amantes dos livros, Edimburgo
tem, embora pequenino, um “Museu dos Escritores”. Mais precisamente, um
museu dedicado à vida e à obra de três grandes literatos escoceses:
Robert Burns (1759-1796), Walter Scott (1771-1832) e Robert Louis
Stevenson (1850-1894, sobre quem, já faz alguns anos, escrevi aqui).
Hospedado numa casa que data de 1622 (renovada algumas vezes, por
óbvio), sita na rua/praça denominada “Lady Stair’s Close”, o museu está
caprichosamente decorado com primeiras edições, mobília e inúmeros
objetos que pertenceram aos três grandes escritores, além, claro, de
contar a vida e explicar um pouco da obra dos homenageados. E há também,
de vez em quando, pequenas exposições temporárias que dão ao museu,
como ele mesmo afirma, “a oportunidade de celebrar a vida e obra de
outros escritores que contribuíram para o desenvolvimento e para
diversidade da literatura escocesa”. Isso sem falar na lojinha que vende
artigos e livros sobre livros, onde você pode sempre encontrar algo do
seu agrado. Por exemplo, foi lá que, por precisas 12,99 libras, adquiri
algo que procurava desde o início da minha peregrinação pelas terras de
David Hume (1711-1776) e Adam Smith (1723-1790): “The Literary Traveller
in Scotland: a Book Lover’s Guide”, de Allan Foster, Mainstream
Publishing, 2007. Um livro/guia que, confesso, deveria ter usado mais em
minha estada na Escócia, mas que, de toda sorte, me está sendo útil
para elaborar este riscado.
E mais: Edimburgo sedia uma maravilhosa Biblioteca Nacional da
Escócia (“National Library of Scotland - NLS”, no original), cujo prédio
principal, de fachada belíssima, fica na George IV Bridge, bem pertinho
da Royal Mile, na cidade velha. Curiosamente, a NLS foi formalmente
criada em 1925, por ato do Parlamento do Reino Unido, a partir de doação
feita à nação, pela “Faculty of Advocates” (uma espécie de OAB
escocesa), de todo o seu acervo de livros não jurídicos. É a maior
biblioteca da Escócia e um dos seis depósitos legais de livros para o
Reino Unido e a República da Irlanda (juntamente com a British
Library/London, a Bodleian Library/Oxford, a University
Library/Cambridge, a Library of Trinity College/Dublin e a National
Library of Wales/Aberystwyth).
Seu acervo é contado em milhões: quinze milhões de livros impressos;
dois milhões de mapas, que datam de mais de setecentos anos; sete
milhões de manuscritos; dois milhões de documentos públicos originados
no Reino Unido, na Escócia, nos EUA e em muitos países da Commonwealth;
dezenas de milhares de periódicos; muitos milhares de gravações
musicais, de filmes e de fotografia; e por aí vai. Tudo isso aberto ao
público, in loco e online, da forma o menos burocrática possível,
gratuitamente.
No mais, como toda grande biblioteca, a Biblioteca Nacional da
Escócia é também um excelente museu. Parte do seu rico acervo, com suas
obras raras, é exibido, em local próprio, para nós pobres mortais. Sua
coleção de mapas é orgulhosamente propagandeada como uma das maiores do
mundo. Isso sem falar nos eventos e nas exibições temporárias. Por
exemplo, quando estive por lá no ano passado, uma dessas exibições –
“Playing Shakespeare: 400 years of great acting” – era comemorativa dos
quatrocentos anos da morte de Shakespeare (1564-1616) e tratava dos
muitos atores que, nesses quatro séculos de história e estórias,
interpretaram as personagens desse grande conhecedor da alma humana.
Outra exibição acontecendo por aquela época chamava-se “Praga! Uma
história cultural das doenças contagiosas na Escócia” (“Plague! A
Cultural History of Contagious Dideases in Scotland”), sobre a peste
negra, a cólera, o tifo e outras mazelas, muito interessante por sinal,
mas que dei apenas uma espiada, já ressabiado e triste que vinha com
outras histórias ou lendas (quem sou eu para decidir) de bruxas,
espíritos, cães e túmulos nessa cidade milenar.
Bom, minha sugestão final para Edimburgo: visite o Museu dos
Escritores, dê uma passada na Biblioteca Nacional da Escócia e,
principalmente, tente não pensar muito na história do fiel Greyfriars
Bobby, sobretudo se você já estiver na terceira ou quarta dose do uísque
nacional.
Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP |
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