25/12/2018

ANIVERSÁRIO DA CIDADE DE NATAL



N A T A L – História e estórias
CARLOS ROBERTO DE MIRANDA GOMES, da ANRL, ALEJURN, AML, UBE-RN e IHGRN



1.           
Fundação
A cidade de Natal ou do Natal, dos Reis, dos Três Reis Magos, Nova Amsterdan - já surgiu polêmica pela forma de sua denominação. Também assim o foi para se ter a certeza da data de sua fundação – 1) ao tempo da presença francesa no território potiguar, aconteceu a expedição comandada por Manuel Mascarenhas Homem chegada aqui em 25 de dezembro de 1597, com o fim de expulsar os invasores, construir um forte e fundar uma cidade, tendo designado Jerônimo de Albuquerque para demarcar o sítio onde seria fundada a cidade; 2) Segundo o Padre Serafim Leite S.J. – “chamou-se Natal por ter sido o tempo em que a armada entrou na barra do Rio Grande do Norte; 3) Francisco Adolpho Varnhagen escreve que a cidade se chamou Natal, em virtude de haver inaugurado o seu pelourinho, símbolo de poder e celebrado missa em sua igreja matriz no dia 25 de dezembro de 1599; 4) Frei Salvador, por sua vez, indica que após as pazes com os potiguares, fez-se uma povoação no Rio Grande uma légua do forte, a que chamaram cidade dos Reis; 5) com a nomeação de João Rodrigues Colaço em 9 de janeiro de 1600, este passou a governar a Capitania e assim deveria ser considerado o fundador da cidade.
Afinal Quem fundou Natal? Nas inúmeras pesquisas o assunto vai ficando mais confuso, inclusive atribuindo-se conclusões, nem sempre – que Luís da Câmara Cascudo, Hélio Galvão e Olavo Medeiros atribuíram a fundação a Mascarenhas Homem. Contudo, somente para os dois últimos há peremptória indicação: Natal foi criada em 25 de dezembro de 1599, cumprindo missão e sob a regência do capitão-mor de Pernambuco Manuel Mascarenhas Homem, que vinha erguer uma fortaleza e fundar uma cidade, trazendo aparelhamento para tanto, sendo uma das capitais mais antigas do Brasil. Em verdade. Não vislumbramos precisão na indicação de Cascudo, tanto que em sua História da Cidade do Natal, ao final do livro apresenta o capítulo XLIV, denominado “De Rebus Pluribus”, onde no calendário das efemérides da cidade do Natal registra: “25 de dezembro – 1599 – Jerônimo d’Albuquerque funda a Cidade do Natal”. Também Manoel Ferreira Nobre (1877), nosso primeiro pesquisador do assunto e Tavares de Lira (1921) apenas relatam os fatos, mas o primeiro chega a argumentar que Jerônimo e João Rodrigues Colaço eram simples prepostos. E agora? Quem fundou Natal?
Em nosso ver, deve ser atribuída a Manuel Mascarenhas Homem, porque era ele a autoridade possuidora dos poderes outorgados pela Coroa para a fundação da cidade, embora a execução tenha ocorrido pelo seu subordinado Jerônimo d’Albuquerque. Ora, não é o executor de ordens a quem deva ser considerado fundador, mas aquele que ostentava o poder de declarar a existência da cidade fundada.
Afinal, tudo só foi possível com o desempenho e autoridade de Mascarenhas Homem.
O assunto continua indefinido e não se queira o milagre de que possamos definir a questão no estreito espaço de simples artigo. Com a palavra os pesquisadores!

2.           Desenvolvimento

Natal pode ser dividida em épocas do seu desenvolvimento: no período de sua fundação em 1599, até o advento do século XVI tivemos a busca das primeiras atividades urbanas, evidentes a partir do século XVII e seu desenvolvimento cultural nos anos 1800, com um crescimento acelerado no século XIX e definição do seu perfil no Século XX, notadamente em suas duas primeiras décadas, resultado de acontecimentos inesperados, que deram rumos novos no caminhar manso de uma província nordestina.
A certo ponto de sua existência, Natal foi avaliada como propensa ao comodismo provinciano, como registram renomados estudiosos da nossa história:
Polycarpo Feitosa (Antônio José de Melo e Souza – 1867 – 1955), na sua longevidade e experiência de ex-Governador do Estado, por dois mandatos, confirma nossa índole preguiçosa, subalterna e desinteressada para o porvir:

... dividida em dois pequenos bairros de ruas impossíveis, ou sem calçamento ou grosseiramente calçadas de pedra bruta, sem edifícios, sem jardins, com pequeno comércio e nenhuma indústria, parecerá mais uma vila pacata de interior do que uma capital marítima.

Segundo ele, pelo que parecia, o potiguar sempre viveu na sombra de o Governo melhorar a qualidade de vida dos cidadãos, sem considerar a necessidade de uma participação ativa dos seus munícipes, sem o comodismo de ser apenas cidade dos negociantes, militares e servidores públicos, sem a participação substancial dos construtores e produtores do progresso, exagerada valoração ao estrangeiro, submetida ao domínio de oligarquias, iniciada com a dos Albuquerque Maranhão.
Embora prevalente a falta de solidariedade, remanesce evidente o individualismo, o egoísmo, com exagero na ostentação do luxo, ainda que para isso fosse apertado o cinto da subsistência, como parecia insinuar Rocha Pombo, em sua História do Rio Grande do Norte (1922): “Continuou Natal a sua vida mofina até além dos meados do século”. Os remanescentes das exceções, como Henrique Castriciano e Manoel Dantas permitiram, com outras inteligências da época, nos anos que se seguiram, principalmente no século XX, apregoar uma mudança de filosofia de vida e chegaram esses visionários intelectuais, a apontar um lugar ao sol para a sequência natural do engrandecimento da cidade.

3.           Uma mudança de rumo

O registro de maior importância, em nosso sentir, nasce com a Conferência de Manoel Dantas em 1909, que traçou o novo perfil para a cidade com seu discurso Natal Daqui a 50 anos.
Para a nossa sorte surgem os profissionais liberais formados nos estados vizinhos, os governantes progressistas como Alberto Maranhão, José Augusto e Juvenal Lamartine (ex-governadores) e Omar O’Grady (ex-prefeito de Natal), juntamente com jornalistas, literatos e pesquisadores, que deram nova roupagem à vida social, com influência da Belle Époque, no surgimento dos cafés como centros culturais, a teor do Cova da Onça, Café Potiguarânia, depois denominado de Magestic[1], Grande Ponto, o Natal Clube[2]. Em sequência aos costumes de cafés fomentadores de confrarias - registramos o famoso Café São Luiz, fundado em 1937, que resistiu a 2ª Guerra Mundial, vivenciou a ditadura militar e repercutiu a ida do homem à lua. Também presenciou o retorno da democracia por meio da abertura política no início dos anos 80 e se rendeu aos caprichos da tecnologia da virada do milênio, mas rendeu-se à conjuntura econômica e fechou em 2017.
Também releva registrar a criação de associações (Grêmio Polymathico, Grêmios Literários “Castro Alves”, “Carlos Gomes”, “Euclydes da Cunha” e “Le Monde Marche”, este possuidor de um veículo mensal de divulgação – a Revista “Oasis”), ainda, o Ginásio Dramático, o Congresso Literário, a Diocésia, dentre outros, das Revistas A Tribuna, Oásis e Bando, jornais A República, O Parafuso e dos Teatros (inicialmente cobertos de palhas - Cascudo chegou a escrever que em 1840 foi construído o primeiro e precário teatro de palha da cidade). Aliás, tudo leva a crer que o Teatro foi o primeiro veículo de exteriorização da cultura, com um grupo de artistas que formavam a Sociedade do Teatro Natalense, presidida por Matias Carlos de Vasconcelos Monteiro, além dos estudantes do Atheneu que criaram a Sociedade Recreativa Estudantil, em 1850, onde já despontava o grande poeta Lourival Açucena e ainda a Sociedade Dramática Natalense. Depois outros foram erguidos em alvenaria com destaque para o Carlos Gomes, hoje Alberto Maranhão em 1903-1904, alimentando novos grupos, como o Recreio Juvenil Dramático ao qual pertenceram Nestor dos Santos Lima e Francisco Ivo Cavalcanti (Ivo Filho).
Por ironia, Natal, hoje, está com seus Teatros fechados – o Alberto Maranhão em obras indefinidas; o Sandoval Wanderley extinto; o Riachuelo deve ser retirado desse rol, por ser um recanto eclético e particular, sem guardar a atmosfera natural do teatro tradicional. Resta-nos o modesto Teatro de Cultura Popular, da FJA, quebrando o galho.
O Atheneu Norte-rio-grandense merece uma capítulo especial – celeiro de grandes figuras, considerado verdadeira universidade do saber. E o Colégio Santo Antônio (Marista), fundado pelos padres da Diocese de Natal em 1903, fonte de inteligências que engrandeceram a cidade presépio.
Esses espaços de cultura logo influenciaram o natalense, com maior localização no bairro da Ribeira, berço da boemia, da política, do comércio em geral, lugar onde a infraestrutura portuária e ferroviária mais se desenvolveu.
A iluminação pública, o bonde, a urbanização muito contribuíram para o novo perfil de Natal. O surgimento de associações e agremiações desportivas como os clubes de remo, o Centro Náutico Potengi e o Sport (Esporte) Club de Natal, depois o dissidente, de duração efêmera - Clube de Regatas União do RN, com o surgimento da “bola”, artefato aqui trazido por marinheiros do navio Criméia em 1872, foram criados os clubes de futebol como o Sport Club Natalense (ou Natal Sport Club) em 1907 e, em 1915 em plena Primeira Guerra, os clubes ABC, América e Alecrim. Em 1918 foi criada a Liga.
Daí por diante a previsão de Manoel Dantas se realizou e a cidade cresceu vertiginosamente, tem economia definida, em especial no turismo, com cerca de 167 km² com aprazíveis praias e população estimada de 885.180 pessoas (2017), é bela e acolhedora, embora ainda resistam alguns costumes pouco lisonjeiros, como a soberba, a prevalência da individualidade de uma minoria intelectual e o uso de uma linguagem rançosa e desnecessariamente empolada!
Este trabalho tem o condão, apenas, de acender a luz do conhecimento da nossa história. Para tanto indicamos obras que efetivamente poderão iluminar o caminho e separar a história das estórias.


Referências bibliográficas consultadas:
ARRAIS, Raimundo (Org.). A Terra, Os Homens e o Sonhos. Natal: Sebo Vermelho – Edições, 2017.
_______ (Org.) Crônicas de Origem – Luís da Câmara Cascudo. Natal: EDUFRN, 2011.
A TRIBUNA. Revista mensal do Congresso Litterario. Natal: publicação independente, 1903 e 1904.
BANDO. Revista do Grêmio Literário Euclydes da Cunha. Natal:edição independente, 1951, 1955 e 1959.
BARROS, Eva Cristini Arruda Câmara e Diogenes da Cunha LIMA - (Orgs). Construtores da Ágora Soberana Potiguar – MÚLTIPLAS MEMÓRIAS. Natal: Edições Infinita Imagem, 2014.
CASCUDO, Luís da Câmara. O Tempo E Eu. Natal: Imprensa Universitária, 1968.
__________ Crônicas de Origem. 2ª Ed. Natal: EDUFRN, 2011.
__________ História da Cidade do Natal. Natal: Edufrn, 2010.
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GALVÃO, Hélio Mamede de Freitas. História da Fortaleza da Barra do Rio Grande.  Natal: 2ed. Fundação Hélio Galvão - Scriptorin Candinha Bezerra, 1999.
GUIMARÃES, João Amorim. Natal do meu tempo – Crônica da cidade do Natal. Organização de Humberto Hermenegildo de Araújo. Natal, SCB/FHG, 1999.
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Revista do IHGRN nº 96 – Natal, 2018.
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[1] O Café Magestic, localizado na Cidade Alta, dividia as preferências com o Salão Rio Branco, que regurgitava de gente, num movimento ensurdecedor. No mesmo perímetro a Diocésia (a ‘Roda Literária’) esgueirava-se pela escada acima e ia alojar-se no sótão e lá ficava, na alegria das palestras literárias ou difundindo histórias humorísticas.
[2] Natal Club, associação para jogos, artes, cultura e também de festas e danças, criado no ano de 1906, e, por incentivo do Governador Alberto Maranhão, tomou novos rumos, com a cessão de prédio estadual, reformado pelos associados e em lugar privilegiado no centro da cidade (local que hoje corresponde à Praça Kennedy.


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