João Gilberto Prado Pereira
de Oliveira, é um dos maiores nomes da música no Brasil. Para muitos, o maior. Pena que o Brasil sofra há
anos com a impossibilidade de ver e ouvir esse baiano de Juazeiro que, na
década de 1950, deu régua, compasso e modernidade para a música brasileira.
Além da impossibilidade de poder comprar edições oficiais dos álbuns que
compõem a santíssima trindade da
discografia revolucionária de João, há o sério risco de o cantor, compositor e
violonista, atualmente com 86 anos, não poder mais fazer shows por conta de
problemas de saúde decorrentes da idade avançada. Será que o Brasil vai
festejar os 60 anos da Bossa Nova em 2018 sem poder ver e ouvir João?
Disputas familiares em torno do patrimônio e dos direitos autorais de João estariam contribuindo nos últimos anos para fragilizar ainda mais o estado físico e emocional do artista e, consequentemente, retardando uma volta aos palcos que, por ora, já parece fora da linha do horizonte artístico – pelo menos até que chegue ao fim o processo de interdição aberto pela filha do cantor, Bebel Gilberto, processo que corre em sigilo na Justiça.
João poderia ter voltado aos palcos a partir de novembro de 2011 para série de shows que iriam seguir a rota traçada por turnê nacional intitulada João Gilberto 80 anos – Uma vida Bossa Nova. Contudo, a primeira apresentação, em São Paulo (SP), foi cancelada na semana do show, por alegados problemas de saúde. A turnê foi abortada antes mesmo de começar. De lá para cá, nunca mais se aventou a possibilidade de show de um artista desde sempre envolvido em aura mitológica.
Excêntrico pelo fato de ser perfeccionista, dono de temperamento reconhecidamente difícil, João mudou a música brasileira em 1958 ao sintetizar a batida do samba nas cordas do violão (depurado ao longo dos anos 1950) e ao integrar a voz com o arranjo, em fina sintonia. Nascia a célebre batida diferente que veio a ser rotulada de Bossa Nova.
A
revolução foi iniciada em agosto de 1958 com a edição do compacto que
apresentou a primeira gravação (na voz de João) do samba Chega de saudade (Antonio
Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, 1958), lançado em abril daquele ano pela
cantora Elizeth Cardoso (1920 – 1990) em gravação feita com o toque do violão
de João. Tal revolução foi perpetuada e consolidada nos álbuns Chega de saudade (Odeon,
1959), O amor, o sorriso e a flor (Odeon,
1960) e João Gilberto (Odeon,
1961) – discos que nunca foram reeditados oficialmente em CD e em edições
digitais porque já não pertencem mais à nenhuma gravadora.
Em 3 de dezembro de 2015, decisão irrevogável do Superior Tribunal de Justiça (STJ) proibiu a companhia fonográfica Universal Music – herdeira do acervo da Odeon (gravadora original dos discos) desde que encampou a EMI Music em 2013 – de comercializar esses álbuns fenomenais nos quais residem a melhor parte da obra e da bossa de João. Vitorioso na batalha judicial que travava com a EMI desde 1992, por discordar da edição (de fato, descuidada) de coletânea intitulada O mito (1988), João passou a ser o dono das matrizes desses álbuns, cujos direitos teriam sido parcialmente vendidos para um banco em troca de vultosa quantia em dinheiro.
Para o Brasil, a nota desafinada é que esses discos nunca foram reeditados, embora haja edições piratas produzidas e vendidas no mercado europeu. É triste que o Brasil não possa ver um show de João Gilberto. É mais triste ainda que o Brasil não possa ouvir um dos discos matriciais de João Gilberto em CD ou em qualquer plataforma digital. O Brasil merece a música de João Gilberto. E João Gilberto merece que a vida bossa nova que levou seja concluída com leveza, sem o drama folhetinesco de um samba-canção vulgar.
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