Procurador-Geral do Ministério Público de Contas do RN
Carlos Henrique Rodrigues
Promotor de Justiça em exercício na 47ª PmJ; Coordenador do CAOP Saúde, em substituição
“Quem
me dera, ao menos uma vez, ter de volta todo o ouro que entreguei a
quem conseguiu me convencer que era prova de amizade, se alguém levasse
embora até o que eu não tinha.
Quem me dera, ao menos uma vez,
provar que quem tem mais do que precisa ter quase sempre se convence que
não tem o bastante... Mas nos deram espelhos e vimos um mundo
doente...” (Índios, Legião Urbana)
Certa feita, um sábio
Procurador do Estado me disse que o Poder Executivo financiava o luxo
dos demais poderes, que iria desde o pagamento do combustível para os
carros oficiais rodarem, até generosas cessões de servidores, sem ônus
para quem o recebe – no máximo com um complemento salarial, deixando
para trás o custo de sua remuneração e o vácuo do trabalho que não
desenvolverá no órgão para o qual ele prestou concurso.
Ao ouvir
isso, inicialmente, imaginei que o problema não fosse tão grave, pois
estamos falando de diversos setores de uma mesma Administração Pública,
dividida apenas para fins de exercício do Poder, com a possibilidade de
apoio recíproco.
Mas a imagem real refletida no espelho está longe desta utopia doutrinária.
Enquanto
faltam policiais militares para fazer a segurança pública, sobram até
mesmo alguns para fazerem às vezes de recepcionistas e entregarem
crachás em alguns Poderes, isso quando não estão ocupados em ser
motoristas.
De um lado, o custo impacta a despesa com pessoal de
quem está eternamente acima do limite prudencial, nitidamente em
desequilíbrio com sua folha de pagamentos - que mal consegue honrar e vê
seu quadro de servidores deteriorar-se sem condições de fazer concurso;
de outro, subutiliza-se mão-de-obra qualificada e escassa.
Como
se isso já não fosse o bastante, eis que surge uma nova demanda de
cessões, desta feita em área tão sensível quanto à segurança pública,
com o agravante de que corremos o risco de nossa generosidade vir a
preencher uma lacuna na Administração Pública Federal - nosso primo rico
e com ares de colonizador, deixando as consequências financeiras para
os amistosos índios potiguares.
De fato, os Promotores de Justiça
atuantes na área de Defesa da Saúde e o Ministério Público de Contas do
Rio Grande do Norte foram surpreendidos, na aurora de 2015, com a
demanda da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares-EBSERH, a qual
requereu que a Secretaria Estadual de Saúde Pública-SESAP/RN colaborasse
para que a União cumprisse com obrigações federais, fornecendo recursos
humanos – notadamente médicos obstetras e pediatras.
Os
referidos médicos seriam lotados no Hospital Federal Ana Bezerra,
localizado em Santa Cruz/RN, pois a EBSERH não logrou êxito no concurso
por ela realizado, sobretudo, por inadequação à realidade local.
Ocorre
que a SESAP tem flagrante déficit de médicos e outros profissionais, o
que serve de justificativa para crescente contratação de cooperativas
médicas a altíssimo custo. Além de encontrar dificuldades para por em
pleno funcionamento unidades próprias da rede estadual, como é o caso do
Hospital Alfredo Mesquita de Macaíba, cuja maternidade há anos não sabe
o que é dar à luz um macaibense, por várias mazelas, déficit de
obstetras e pediatras entre elas.
Diante desta generosa troca de
ouro por miçangas, MP estadual e MPC/RN fizeram recomendação conjunta à
SESAP para abortar estas cessões, pois três já haviam sido feitas no
apagar das luzes do governo anterior.
Com todo este temor
reverencial, atendendo demandas próprias e alheias, será difícil
equilibrar receitas e despesas no Rio Grande do Norte, além de prestar
com a mínima dignidade e eficiência educação, saúde e segurança pública.
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