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17/02/2015

E ainda se troca ouro por miçangas!


Luciano Ramos
Procurador-Geral do Ministério Público de Contas do RN

Carlos Henrique Rodrigues
Promotor de Justiça em exercício na 47ª PmJ; Coordenador do CAOP Saúde, em substituição


“Quem me dera, ao menos uma vez, ter de volta todo o ouro que entreguei a quem conseguiu me convencer que era prova de amizade, se alguém levasse embora até o que eu não tinha.

Quem me dera, ao menos uma vez, provar que quem tem mais do que precisa ter quase sempre se convence que não tem o bastante... Mas nos deram espelhos e vimos um mundo doente...” (Índios, Legião Urbana)

Certa feita, um sábio Procurador do Estado me disse que o Poder Executivo financiava o luxo dos demais poderes, que iria desde o pagamento do combustível para os carros oficiais rodarem, até generosas cessões de servidores, sem ônus para quem o recebe – no máximo com um complemento salarial, deixando para trás o custo de sua remuneração e o vácuo do trabalho que não desenvolverá no órgão para o qual ele prestou concurso.

Ao ouvir isso, inicialmente, imaginei que o problema não fosse tão grave, pois estamos falando de diversos setores de uma mesma Administração Pública, dividida apenas para fins de exercício do Poder, com a possibilidade de apoio recíproco.

Mas a imagem real refletida no espelho está longe desta utopia doutrinária.

Enquanto faltam policiais militares para fazer a segurança pública, sobram até mesmo alguns para fazerem às vezes de recepcionistas e entregarem crachás em alguns Poderes, isso quando não estão ocupados em ser motoristas. 

De um lado, o custo impacta a despesa com pessoal de quem está eternamente acima do limite prudencial, nitidamente em desequilíbrio com sua folha de pagamentos - que mal consegue honrar e vê seu quadro de servidores deteriorar-se sem condições de fazer concurso; de outro, subutiliza-se mão-de-obra qualificada e escassa.

Como se isso já não fosse o bastante, eis que surge uma nova demanda de cessões, desta feita em área tão sensível quanto à segurança pública, com o agravante de que corremos o risco de nossa generosidade vir a preencher uma lacuna na Administração Pública Federal - nosso primo rico e com ares de colonizador, deixando as consequências financeiras para os amistosos índios potiguares.

De fato, os Promotores de Justiça atuantes na área de Defesa da Saúde e o Ministério Público de Contas do Rio Grande do Norte foram surpreendidos, na aurora de 2015, com a demanda da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares-EBSERH, a qual requereu que a Secretaria Estadual de Saúde Pública-SESAP/RN colaborasse para que a União cumprisse com obrigações federais, fornecendo recursos humanos – notadamente médicos obstetras e pediatras.

Os referidos médicos seriam lotados no Hospital Federal Ana Bezerra, localizado em Santa Cruz/RN, pois a EBSERH não logrou êxito no concurso por ela realizado, sobretudo, por inadequação à realidade local.

Ocorre que a SESAP tem flagrante déficit de médicos e outros profissionais, o que serve de justificativa para crescente contratação de cooperativas médicas a altíssimo custo. Além de encontrar dificuldades para por em pleno funcionamento unidades próprias da rede estadual, como é o caso do Hospital Alfredo Mesquita de Macaíba, cuja maternidade há anos não sabe o que é dar à luz um macaibense, por várias mazelas, déficit de obstetras e pediatras entre elas.

Diante desta generosa troca de ouro por miçangas, MP estadual e MPC/RN fizeram recomendação conjunta à SESAP para abortar estas cessões, pois três já haviam sido feitas no apagar das luzes do governo anterior. 

Com todo este temor reverencial, atendendo demandas próprias e alheias, será difícil equilibrar receitas e despesas no Rio Grande do Norte, além de prestar com a mínima dignidade e eficiência educação, saúde e segurança pública.

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