17/03/2014


A PALAVRA E SUAS CONVENIÊNCIAS
Por: Gileno Guanabara, advogado.

O sentido tradicional da expressão “patriarca” se aplica a quem exerce chefia, o juizado da família, do clã, da tribo, o padre, pai ou Pagé. No Brasil, se atribuiu a José Bonifácio o título de “O Patriarca da Independência”. A vinculação do título ao Conselheiro do Império não se deveu a historiadores da época, apesar da sua participação nos atos que antecederam e procederam a proclamação da Independência. Mas a causa maior foi uma graça. Um comerciante expôs na sua loja da Rua do Olvidor, no Rio de Janeiro, a tela, de autor desconhecido, que retratava José Bonifácio entre dois anônimos e onde estava inscrito na parte inferior: “Patriarca da Independência”. Quer se tratasse de mera brincadeira, quer fosse simples humor, no entanto, a ideia vinculada na obra ganhou repercussão entre os partidários do suposto homenageado, que não eram poucos, havendo também reações contrárias de parte dos seus desafetos.

José Bonifácio tivera papel político relevante, quando se incorporou ao Gabinete de D. Pedro I, superando contradições políticas com o Imperador. No entanto, se indispôs com a influência crescente da Marquesa de Santos junto ao monarca, ela que era simpática aos partidários da independência. Diferentemente, o Conselheiro perseguiu os carbonários, cuja ação conspiratória se dava na Maçonaria, na Igreja e na imprensa. No poder, José Bonifácio desencadeou intensa repressão e ordenou a prisão de José Clemente Pereira e do Cônego Januário da Cunha Barbosa, dentre outros. Joaquim Gonçalves Ledo, maçon, jornalista e panfletário, vivendo sob a iminência de ser preso, escapou vestido de padre e se exilou na Argentina.

Os adversários de José Bonifácio, participantes dos atos da proclamação ocorrentes em 1821 e 1822, após a sua demissão, trataram de desfazer o equívoco, de desmistificar a brincadeira inclusa na tela. Mesmo assim, sem querer, o termo “patriarca” ganhou um novo sentido e assim ficou no vernáculo nacional.

A pantomima referida na expressão atribuída ao paulista que ajudou o Brasil a fazer o Império, traduzia bem as contradições de sua prática naquele momento político. Afinal, faça o que eu digo, não faça o que eu faço. O patriarca costumava recomendar aos brasileiros a política dentro da razão e da moral. Contrariamente, no Ministério, mandou prender inocentes e adversários, libertou criminosos, perseguiu seus desafetos, destituiu a carreira de juízes que não lhe eram simpatizantes, e desviou verbas públicas a fim de custear seus partidários. Em cartas que endereçou ao Conde de Funchall, José Bonifácio afirmou que praticara o que as circunstâncias e as oportunidades o exigiram.

Outra expressão que viu alterado o seu sentido tradicional, foi o vocábulo emérito, cuja origem latina decorre do composto “ex”, fora, e da expressão méritus, merecimento. Dessa forma, emérito teria o sentido de imprestável, inútil, sem valor. Nas Catilinárias de Cícero, vê-se a expressão emeritus cônsul, no sentido de cônsul aposentado. Em Seneca, lê-se emérita dies, como dia acabado, dentre outras expressões referentes ao vocábulo.

Dicionários portugueses definem o termo emérito no sentido de:   aposentado, gozando os vencimentos do emprego; ou também glosado como: “Emérito, adj. Aposentado. Ex: soldados eméritos, isto é, reformados, jubilados.”.

A deformação ocorrida se deveu ao texto de um jornalista lusitano que ao legendar a foto de um político ementou: Emérito patriota. Afora a discussão que gerou, no entanto, a expressão cunhou um novo sentido. Deixou de se referir a aposentado, inútil, e passou a ser entendido como corruptela de ilustre, de notável (Significações Burlescas, Fialho de Almeida, Lisboa, 1885).

A renovação do conteúdo das palavras não tem fronteira. O caso de emérito chegou e foi adotado no Brasil, nos conformes do novo sentido. De igual forma, também chegou a Paris, cuja imprensa registrou “emérite”, referindo-se a Victor Hugo, como sendo um destacado escritor. Escusado dizer das manifestações ocorridas pró e contra aquela mudança.

Graciliano Ramos nas crônicas que escreveu, registrou um erro de grafia atribuído a um linotipista de jornal que, em consequência, distorceu o sentido da notícia a ser divulgada.  A nota rabiscada pelo redator e dirigida às máquinas dava conta da presença do Imperador D. Pedro I, na festa de um subúrbio carioca. O inusitado, porém, era o destaque, segundo o qual o Imperador, que havia caído de um cavalo, teria fraturado um dos pés. Daí ter saído amparado num par de muletas. A matéria foi publicada com equívoco: O Imperador D. Pedro compareceu a um baile no subúrbio. Ao se retirar, caminhava trôpego amparado num par de mulatas.

 Por descuido ou imperdoável mau humor, a notícia verdadeira dera lugar ao equívoco e provocou um mal estar governamental. O soberano tinha comparecido e se ausentara do baile amparado num par de muletas. Portanto, o sentido pejorativo da notícia tal o erro publicado, encontrou guarida no procedimento libertino do monarca, de todos sabido, que não podia ver rabos-de-saia na sua frente.

A radicalização da campanha política em 1960, no Rio Grande do Norte, notabilizou-se pelas passeatas populares em que os candidatos e os eleitores caminhavam nas ruas, durante noites inteiras. O então Governador, Dinarte Mariz, líder da UDN, posicionou-se ao lado da candidatura de Djalma Marinho. No vale tudo que prevaleceu, tencionando sensibilizar os eleitores numa avenida do bairro do Alecrim, reduto da oposição, Dinarte subiu o tom do desabafo e acusou o opositor, Aluísio Alves, da Cruzada da Esperança, de lhe fazer acusações indevidas. Do alto do palanque, o governador proclamou: “Foi numa noite como essa, nas Quintas, que Aluisio me desonrou”. A turba de eleitores oposicionistas, incrédulos, no entendimento precário e dúbio da revelação, respondeu: “vai casar ... vai casar”.

13/03/2014



Morre Dosinho, um dos principais carnavalescos do RN

Ele estava internado há quase 30 dias no hospital Promater, com quadro de infecção generalizada.

Gerlane Lima, 
Morreu na manhã de hoje (13), Claudomiro Batista de Oliveira – Dosinho, um dos principais carnavalescos do Rio Grande do Norte.
Dosinho estava internado há quase 30 dias no hospital Promater. Ele estava em coma, com quadro de infecção generalizada. A família ainda não definiu o horário, nem local do velório.
Claudionor Batista de Oliveira nasceu na cidade de Campo Grande no Rio grande do Norte. Iniciou sua carreira fazendo composições para campanhas publicitárias e políticas. Foi assistente de orquestra da Rádio Nacional no Rio de Janeiro. Trabalhou na Gravadora Copacabana como agente e na Mocambo como representante. Em Natal, nos anos 60, produziu e apresentou um programa na Rádio Trairy, aos domingos, denominado Fábrica de Melodias, onde tocava os últimos sucessos da gravadora Mocambo, que ele recebia com exclusividade.
Começou a compor nos anos 40, mas suas primeiras composições gravadas, datam de 1952: o samba choro "Há sinceridade nisso" e o baião "Se tocá eu danço" feitos em parceria com Manezinho Araújo e Carvalhinho e gravados por César de Alencar. No mesmo ano e com a mesma dupla fez o baião "Jica-jica" gravado em dueto por Cesar de Alencar e Heleninha Costa. Por essa época  compôs a música de carnaval "Marta Rocha" em homenagem a então miss Brasil, que visitava a cidade de Natal - essa música permaneceu inédita.
Em 1962  suas composições falavam da uma paixão maior do povo natalense - o Futebol. Compôs "O mais querido" - hino do ABC Futebol Clube sucesso até hoje entre a galera do "frasqueirão". Compôs ainda o hino do Alecrim Futebol Clube e um segundo Hino do América Futebol Clube de Natal, já que o primeiro era o mesmo do América Futebol Clube do Rio de Janeiro.
Ainda esse ano, Gilberto Fernandes gravou o samba-canção "Maltrapilha" e os Cancioneiros o samba "Sofredor". Em seguida foi a vez do lançamento do LP "Primeiro Ensaio", com o qual obteve grande sucesso e  elogios de Câmara Cascudo.
Entre seus LPs destaca-se "Carnaval de norte a sul" com 12 composições em parceria com Waldir Minone, interpretadas por Claudionor Germano. Albertinho Fortuna, Expedito Baracho, que cantou solo e como integrante do conjunto Os Cancioneiros e Carminha Mascarenhas.
Dosinho é considerado um dos grandes nomes do Carnaval ao lado de Capiba e Nelson Ferreira. Depois de atuar no Rio de Janeiro e no Recife, voltou pra Natal onde permaneceu até hoje.
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FONTE: Portal nominuto.com

Dozinho

Claudomiro Batista de Oliveira
 24/12/1927 Augusto Severo, RN 
morte: 13/3/2014

Dados Artísticos

Embora ficasse conhecido como compositor de frevos, sua carreira teve início com composições para campanhas publicitárias como também políticas. Compôs também sambas-enredo. Foi assistente de orquestra da Rádio Nacional no Rio de Janeiro. Trabalhou na Gravadora Copacabana como agente e na Mocambo como representante. Começou a compor na década de 1940. Em 1952, teve suas primeiras composições gravadas, o samba-choro "Há sinceridade nisso?", e o baião "Se tocá eu danço", feitos em parceria com Manezinho Araújo e Carvalhinho e gravados por César de Alencar, dois de seus maiores sucessos. No mesmo ano e com a mesma dupla fez o baião "Jica-jica", gravado em dueto por César de Alencar e Heleninha Costa. Por essa época compôs a música de carnaval "Marta Rocha", em homenagem à então miss Brasil, que visitava a cidade de Natal e que permaneceu inédita. Em 1955, Os Cancioneiros gravaram, de sua parceria com Genival Macedo, o baião "Menino de pobre". No mesmo, ano Déa Soares gravou o samba "Peço a Deus", parceria com Sebastião Rosendo. Em 1956, o Trio Puraci gravou dele e Hilário Marcelino a marcha "Vou de reboque" e Expedito Baracho o samba-canção "Beco da maldição". Em 1957, Os Cancioneiros gravaram os frevo-canções "Tempero de pobre" e "Fantasia de capim", que também figuram entre seus maiores sucessos. Em 1959, Gilberto Fernandes gravou o samba-canção "Trapo", parceria com Zito Limeira, e o samba "Só depende de você". Em 1962, Gilberto Fernandes gravou o samba-canção "Maltrapilha" e Os Cancioneiros o samba "Sofredor". Nesse mesmo ano, obteve grande êxito no lançamento do LP "Primeiro ensaio", que recebeu as seguintes palavras elogiosas do historiador Câmara Cascudo: "Dosinho tem a linguagem musical. Diz todas as suas emoções na linha melódica, doce, clara, fácil, com uma naturalidade de fonte. E uma grandeza espontânea de predestinado". Ainda no mesmo ano compôs "O mais querido", hino do ABC Futebol Clube, popular clube de futebol de Natal. Compôs ainda o hino do Alecrim Futebol Clube e um segundo hino do América Futebol Clube de Natal. Em 1963, Roberto Bozzam gravou o bolero "Se alguém me perguntar" e o frevo-canção "Só presta quente". Em 1964, Meves Gomes gravou o frevo-canção "Eu quero mais..." e José Alves "Me deixa em paz". Entre seus LPs destaca-se "Carnaval de Norte a sul", com 12 composições em parceria com Waldir Minone, interpretadas por Claudionor Germano, Albertinho Fortuna, Expedito Baracho, que cantou solo e como integrinte do conjunto Os Cancioneiros e Carminha Mascarenhas. Em 1965 lançou o compacto simples "A vez do morro" e "Ponta negra", como parte da campanha Pró-Frente de trabalho João XXIII. No mesmo ano Gilberto Ferandes gravou "Baião". Teve músicas gravadas, entre outros, por Claudionor Germano, Blecaute, Expedito Baracho, Trio Guarany com Orquestra Tamandaré e Paulo Marquez. É um considerado um dos grandes do carnaval ao lado de nomes como Capiba e Nelson Ferreira. Depois de atuar no Rio de Janeiro e no Recife, retornou para a cidade de Natal.
Memória da MPB
Fonte: 



 
JOSÉ BONIFÁCIO E A INDEPENDÊNCIA
Por: Gileno Guanabara, advogado.

                                               A explosão revolucionária da França chegou ao Brasil, no momento em que o ouro se exauriu. O “quinto” devido, impossível de saciar Portugal, era de 100 arrobas/ano. Em 1789 rebentaria a revolução das Minas. O movimento de Xavier, o “Tira-dentes”, delineou o espírito nacional.

                                               A chegada da corte portuguesa no Brasil – milhares de servos, conselheiros, desembargadores, marquesas, comendadores, padres e Carlota Joaquina - correspondeu ao expansionismo inglês, abrindo-se os portos às nações amigas e a conseqüente liberdade de produção, criação da imprensa, dos tribunais, banco e escolas superiores. A influência inglesa no governo da corte valia-se de dois áulicos: Linhares e Gauveias. Abarrotara-se a alfândega de mercadorias inglesas para até 10 anos.

                                               De uma gente trabalhadora que habitava as cidades, se antepôs uma horda de famélicos que antes devorara Portugal. Agora, tinha-se o caráter da corte dirigida por um príncipe indolente que governara em nome de sua mãe louca, tendo ao lado uma princesa debochada e pródiga, com quem não mantinha vida conjugal regular e de um filho estouvado e premeditado. À corrupção e a venalidade, tudo se somou à subserviência aos interesses ingleses. Eram contra isso as revoltas da Bahia e de Pernambuco.

                                               Há de se estranhar o fato de São Paulo e Minas não se terem filiado às revoltas do Norte. Eis o significado político da presença hábil de José Bonifácio, o Patriarca, o chefe do partido e o caráter que incorporou à independência, diferentemente dos revoltosos da Bahia e de Pernambuco: explorar a ambição de D. Pedro, tal a temerária nobreza de seu caráter; devolver D. João VI a Portugal, tal a pressão da Corte contaminada  pelo movimento de restauração de 1820.

                                               Vamos reconhecer a prodigalidade intelectual do Brasil do século XVIII. Citam-se diversos brasileiros, ao tempo da presença singular de José Bonifácio de Andrade. Nascido em Santos, em 1765, José Bonifácio, aos 15 anos chegou a Lisboa. Já aos 25 anos foi estudar na França. Época da revolução. Estudou as ciências de então e observou como as sociedades se rebelam, vencem e qual o papel dos chefes destemidos. Estudou com mestres na Alemanha, visitou Wegner, o geólogo de Freyberg, Conheceu as minas do Tirol, da Estíria. Na Itália, visitou  Pávia, onde tomou lições. Aprendeu com Bergmann em Upsala e com Abilgaard em Compenhaque. Dados os estudos e as descobertas, José Bonifácio tivera o mérito de ser reconhecido “mestre da ciência”. 

                                               De volta a Portugal, feito “desembargador”, atribuíram-lhe “todas as coisas”, dentre elas o de ensinar em Coimbra. No entanto, Portugal não estava nem aí para a mineralogia. Passada a crise da guerra com os franceses, Portugal postava-se à inutilidade da Regência de Beresford. A pobreza, a vileza e a corrupção decidiram a volta de José Bonifácio.

                                               Cauteloso quanto ao ideário da revolução, José Bonifácio possuía todos os ingredientes para sua participação no processo de Independência vivido no Brasil. Não era certamente um Bolívar. Era um estadista conservador.

                                               A eclosão da revolução de 1820, em Portugal, e a reclamada volta de D. João VI, acelerou, para os lados de cá, os ideais de Independência. Deu-se a correspondente criação dos partidos. A presença do príncipe Pedro, co-resultado da fragilidade de D. João VI nos fatos, prova a passividade e ambição que o movia, à falta de inteligência ao seu redor. De Portugal, o gênio da mãe que pariu dois filhos gênios díspares: um, institivo pelo poder, reacionário e ultramontino da Austria de Metternich. O outro, liberal, da maçonaria, da Inglaterra de Canning. O primeiro, dos sanguessugas do antigo regime. O segundo, a par da sorte renovada pelos sopros da modernidade da Europa.

                                               Como se avesso ao tio/irmão, D. Miguel, e ao pai, D. João VI, D. Pedro tivera cumplicidade com os republicanos de 1817, em Pernambuco, e era possuído da idéia de voltar a Portugal para assumir a revolução de lá. Idéia bem aceita pelos que não digeriam à autonomia do Brasil a residência do Rei no Rio, açodados pela possibilidade de volta à condição colonial.  De reconhecida incompatibilidade com D. João VI, em razão do gênio herdado da mãe, Carlota, assim era D. Pedro de Orleans e Bragança.

                             Mais para ambicionista e menos para revolucionário, D. Pedro postou-se ao lado dos rebeldes no Brasil, em que pesem os seus instintos absolutistas para com as idéias liberais. Da inutilidade da estada, D. João VI terminara de regresso a Portugal, movido sempre pela indolência e pelo medo das revoluções que cortavam cabeças dos reis, na Europa.  Para os sátrapas da coroa, o regresso era o louvaminho da derrota da colônia, a quem continuariam a explorar. Havia, por fim, o partido separatista de São Paulo e Minas, contrário aos portugueses, ungindo-se pela Constituição de 1815. Diante do embate, instado à frente da guarnição do Rio, D. João VI deixou o seu filho príncipe regente.

                               No ano de 1822, com o fim do período de Regência, diante do intuito das Cortes de restaurar a Colônia, ou D. Pedro retornaria à Europa, ou optaria em ficar no Brasil. A presença de José Bonifácio revelou o momento não de um Reino Unido, mas de um Estado independente de Portugal. De um lado, o partido dos Andrades, defensores do equilibro dos poderes (Bentham), do governo parlamentar, quase radical, que insuflara a D. Pedro não regressar a Portugal. A proclamação do “Fico” comprometeu o príncipe Regente. A sua decisão fez as tropas portuguesas rebelarem-se, em apoio ao plano de restauração colonial. De outro lado, os jacobinos da Bahia e Pernambuco, contrários a D. Pedro, que somaram a favor o posicionamento geral dos partidos brasileiros.                                                               D. Pedro expulsou as tropas portuguesas. Tratava-se de salvar a colônia das Cortes, que instigavam o seu pai e do intuito da re-colonização. Encarnou assim o ideário de Independência em proveito da sua dinastia. Mas esqueceram de indagar a José Bonifácio acerca das questões postas. No arrufo de arrogância, temerário, despótico por temperamento e formação, faltava a D. Pedro o tempero do estadista. Tornara-se vítima da armadilha posta de escolher entre Portugal e o Brasil.

                               Declarado “Defensor Perpétuo” em maio de 1822, proclamou guerra a Portugal. Convocou a Assembléia Constituinte. Bradou de São Paulo o grito de separação. Com a sua opção pelo Brasil, D. Pedro, a par da gratidão da nação recém-proclamada, dissolveu assembléias, subjugou os  Andrades, submeteu os revoltosos, aliciou os áulicos. Vadio nas peripécias amorosas, em pouco tempo foi-se o louvor de haver proclamado a Independência.

                               Produto de uma dinastia européia, D. Pedro não era brasileiro. Aprendeu pouco do gênio nativista: “Abdiquei a Coroa e saio do império, sejam felizes na sua pátria”, disse ao se despedir. Ressalvou “na sua”.  Não disse “na nossa pátria”. Desdenhou o significado que o povo que lhe reconhecia. Restou a figura de José Bonifácio, o “patriarca da Independência”.                            

12/03/2014

O Atheneu: múltiplas memórias

Publicação: 12 de Março de 2014 - Tribuna do Norte     
 
Ticiano Duarte
escritor

Foi com emoção que assisti, nas comemorações dos 182 anos de fundação do Atheneu, o lançamento do livro, “Construtores da Ágora Soberana Potiguar, Múltiplas Memórias”, organizado por Eva Cristini Arruda Câmara Barros e Diógenes da Cunha Lima. É um valioso testemunho das diversas fases de vida da nossa primeira Universidade, que por dever de justiça podemos nominá-lo, nosso mais tradicional e glorioso estabelecimento de ensino público, do Rio Grande do Norte.

Para Eva Arruda o meu testemunho e creio de todos que participaram da elaboração do livro, da sua abnegação, pertinácia, paciência e determinação para alcançar o objetivo de homenagear o Atheneu, sua história de cultura e inteligência, os antigos mestres, as gerações que por ali passaram, os diversos períodos de sua rica existência, o resgate de sua importância na formação de uma elite política e intelectual que serviu e ainda serve, não somente ao Rio Grande do Norte, mas ao Brasil.

O Atheneu está para mim, como no verso do poeta, “intacto, suspenso no ar”, com as suas salas de aulas, seus corredores, sua balaustrada, a presença inesquecível do velho diretor, Celestino Pimentel, sua roupa azul de todos os dias, a gravata vermelha, e os meninos cantando baixinho, em cadência: Lá vem Celé/na porta do pé/ligui/ligui/liguelhé...

Ainda ouço a voz de neurastênica e impaciente do bedel, Zé Bezerra. Não tinha a doçura dos seus companheiros de trabalho, Sérgio Santiago, João Elesbão de Macedo, Waldemar Pedrinha e Vicente Manga Rosa. Zé Bezerra era apelidado de Chamirranha. Udenista radical. Na eleição de 1947, disputada por José Varela e Floriano Cavalcanti, foi várias vezes às “vias de fato” com alunos simpatizantes do candidato pessedista, vitorioso. E Chamirranha levou desvantagem em todos os momentos que tentou impor-se pela força.

Mas havia uma figura que conheci em idade bem avançada, ainda trabalhando que era o inesquecível tio Emídio, o porteiro do Atheneu, nome oficial que se dava ao administrador do estabelecimento, que abria, fechava e zelava o prédio. Tio Emídio tinha histórias antológicas. Pertencia a uma família de tradição política. Fora deputado e o seu sogro, o vigário Bartolomeu Fagundes, antigo deputado provincial, assumira interinamente o governo por diversas vezes.

O Atheneu de tantas lembranças, de tantas histórias dos seus alunos e professores. O Atheneu de Cascudo e padre Monte. O Atheneu de Cipriano Barata, Dr. Barata, herói da revolução de 1917, apostolo da liberdade de imprensa, na luta pela independência do Brasil. Cipriano Barata que editava o jornal, “Sentinela da Liberdade”, escrito nas masmorras, onde viveu no mais longo período de vida, condenado pelos colonizadores portugueses.

O Atheneu dos meus melhores momentos de juventude. O Atheneu que me ensinou a amar a liberdade, que me fez conhecer os clássicos, o gosto pela leitura, a lição que aprendi que mais tarde Carlos Lacerda melhor definiu, o Brasil é como um homem que foi bêbado para a cama dormiu pouco e mal, mais que precisava acordar bem cedo pela manhã. Você tem que sacudi-lo, estapeá-lo. Se ficar fazendo festinha, ele não levanta. Daí porque às vezes me confundiram com alguns dos meus colegas mais radicais que sonhavam com soluções extremistas. Eu pensava que a agitação era necessária para sacudir o povo sonolento e alienado. Enfim, o Atheneu foi à grande escola de civismo de todos nós.


Renovado, mas com o mesmo DNA
Tomislav R. Femenick – Mestre em economia, contador e historiador

Três eventos alteraram profundamente a estrutura do capitalismo: a revolução bolchevique de 1917, a quebra da bolsa de New York em 1929 e a segunda guerra mundial.
O primeiro deles despertou os Estados Unidos e os países da Europa ocidental para as reivindicações sociais, resultando em um freio na ganância dos empresários que exploraram os trabalhadores sem que houvesse leis que lhes impusessem limites, inclusive nas longas jornadas de trabalho. Foi a partir dai que apareceram as primeiras legislações estabelecendo os direitos dos trabalhadores.
O colapso dos anos 1929/1930 evidenciou o fato de que o mercado não pode funcionar sem controle e que o governo não deve ficar ausente dos fatos econômicos. Somente com a ingerência do Estado, criando regras e intervindo diretamente no sistema produtivo, foi possível restabelecer a ordem socioeconômica nos países mais afetados pela crise.
A segunda grande guerra resultou em dois cenários totalmente diferentes. Os Estados Unidos dela saiu confirmado como a maior potencia mundial e os outros países do continente americano deram um salto quantitativo e qualificativo em suas economias. Por outro lado, foi o maior desastre econômico jamais acontecido na Europa e na Ásia, que dele saíram com sua infraestrutura e seu sistema produtivo destroçados, pois suas fábricas, portos e estradas eram alvos preferenciais dos aviões alemães, aliados e japoneses.  
A recuperação desses países deu-se graça a ação norte-americana em suas economias, via seus respectivos governos. Em valores atuais, cerca de 300 bilhões de dólares foram aplicados como assistência econômica e tecnológica. Além do mais, no Japão foi realizada uma reforma agrária e foram desmantelados os grandes zaibatsus (trustes), que controlavam a economia e as finanças do país.
Esses três acontecimentos terminaram por dar uma nova feição ao capitalismo contemporâneo, tirano de suas características o absolutismo do mercado e o reinado do laissez-faire. Essa visão de um novo capitalismo, reformado, mais humanizado e não totalmente livre para fazer o que quiser, teve repercussão em 1965, quando o economista, professor e jornalista britânico Andrew Shonfield, publicou sua mais famosa obra “O capitalismo moderno”. Nesse livro Sir Andrew diz que, embora as características básicas do capitalismo tenham permanecido intocadas (relações de produção, de trabalho e de renda, por exemplo), o impressionante ritmo do desenvolvimento tecnológico e a busca do pleno emprego para a população economicamente ativa deram um novo dínamo ao crescimento econômico, inclusive com maior distribuição da renda. Suas explicações para que o capitalismo continue sendo a mola mestra da economia incluem alguns outros pontos relevantes: a ingerência do Estado no planejamento e na execução dos projetos de desenvolvimento, o aumento da parcela dos recursos públicos destinados à promoção do bem-estar social e o crescimento da renda real per capita da população.
Foi dessa forma que os países desenvolvidos evoluíram e assumiram a ponta do crescimento econômico mundial, sempre tendo em vista que a grande massa de consumidores são os trabalhadores, que neles compõem a classe média.
Embora não seja a maravilha das maravilhas e apesar de suas crises cíclicas, o capitalismo tem se mostrado ser o melhor sistema possível no mundo real; sem empulhações, elucubrações enganadoras, sem contorções argumentativas, sem hipocrisias intelectuais. Enquanto isso por aqui ainda há saudosistas da utopia do socialismo pseudocientífico. No entanto, a realidade vale mais que mil palavras.
Tribuna do Norte. Natal, 09 mar 2014.

11/03/2014

João de Barros, Pirangi e o Porto de Búzios, 1564

João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
 
Professor da UFRN, membro do IHGRN e do INRG
Muitos documentos escritos, da História do nosso Brasil, encontram-se submersos em vários arquivos públicos ou privados, daqui e d’além mar. Encontro no nosso IHGRN um livreto, de apenas 30 páginas, de autoria do historiador natalense, Guarino Alves, com o título: Capitanias Hereditárias ou dissertações sintéticas de um historio-geógrafo, editado em Fortaleza. Traz informações muitas ricas para a História do Rio Grande do Norte. Entre outras obras desse autor, cito: Pequena história do Cabo de São Roque; Origem do nome histórico “Ponta do Mel”; João Rodrigues Colaço; O Verde Potengi e Designação amerígena da Ponta do Calcanhar.

Nesse livreto, um dos títulos é: Considerações sobre o Porto dos Búzios que transcrevo para cá:

Escritores cearenses trouxeram à baila a ideia de uma fronteira na capitania dos Potiguares pela ponta dos Búzios. O Sr. Thomaz Pompeu Sobrinho, por exemplo, diz, a propósito, o seguinte:

“Num documento curioso, “certidão referente a uma questão de limites da capitania de João de Barros”, de 3 de março de 1564, publicado por Antonio Baião, em 1917, verifica-se que o ponto lindeiro entre a capitania do feitor da casa da Índia, e a de Itamaracá não era a baía da Traição e nem o lugar dado por Gabriel Soares, porém uma ponta de terra que devia passar obra de meia légua do porto dos Búzios, o qual ancoradouro fica na barra do rio que os potiguares chamavam Pyramgipepe, segundo o mencionado documento, isto é, Pirangi. Realmente, deste ponto as 100 léguas vão terminar na enseada da Curimicoara, a Angra dos Negros dos antigos mapas.”

A questão de limites surgiu em consequência de o capitão de Itamaracá, João Gonçalves, haver explorado, sem mandado de ninguém, a costa vizinha à de Dona Isabel Gambôa, sucessora de Pero Lopes de Sousa. Houve protesto de Antonio Pinheiro, Procurador de João de Barros, na Vila dos Cosmes de Igaraçu, no dia 3 de março de 1564:

...”ho dito porto dos Búzios que pela língua dos imdios se chama Piramgypepe está fora da demarcação de dona Isabel e está na capitania e terra do dito seu constituinte he e seu he estaa de posse delle de muitos hanos há esta parte e como tal lho teve arremdado por certos hanos a Martim Ferreira de São Vicente e que ho houve de Pero de Goes comprado e que sempre ho dito seu constituinte deu licenças pera o dito porto em seus procuradores nesta terra arrendarem por as ditas licenças em dinheiro e escravos e em búzios.”

Conseguintemente, o protesto por si já mostra o direito de João de Barros.

Desde quando se explorava o Porto dos Búzios?

No dia 3 de março de 1564, Antonio Pinheiro, Procurador daquele muito distinto e erudito fidalgo, arrolou quatro testemunhas, Manoel Fernandes, Fernão d’Holanda, Gonçalo e Bartolomeu Royz, e a 4, as inquiriu Manuel Pereira, em presença do Juiz Ordinário, João Fernandes. Ficou esclarecido que o Porto pertencera a Pero de Góis, fora arrendado depois a Martim Ferreira, e que ali se coletava búzios desde aproximadamente vinte anos: “ave rahobra de vinte anos pouco mais ou menos”, disse perante o Juiz a testemunha Bartolomeu Rodrigues.

Segundo o depoimento de Manoel Fernandes, o fidalgo Pero de Góis “vendera o porto dos búzios que era seu com dez léguas de costa ao dito João de Barros, feitor da Casa da Índia, dizendo que lhas dera por quinhentos cruzados.”

Ignora-se a data dessa transação, mas é posterior à da donatária de Barros. Significa que Pêro de Góis já era dono do lugar muito antes da Carta de doação ao Feitor da Casa da Índia. E sendo assim, pergunta-se: em que ano adquiriu Pero de Góis as dez léguas de costa? Ninguém sabe, e no entanto há uma passagem em Frei Vicente do Salvador, dizendo isto:

“Em companhia de Pero Lopes andou por esta costa do Brasil Pedro de Góis, fidalgo honrado, muito cavaleiro, e pela afeição que tomou à terra pediu a El-Rei D. João que lhe desse nela uma capitania, e assim lhe fez mercê de cinquenta léguas de terra ao longo da costa ou aos que se achassem  donde acabassem as de Martim Afonso de Sousa, até que entestasse com as de Vasco Fernandes Coutinho.”

Ora, as viagens costeiras de Pero Lopes são de 1531-1532. A escolha e apossamento do Porto dos Búzios por Góis vem, portanto, dessa época, e feitos pelo que se deduz, à revelia do rei, já que a capitania oficial de Pero de Góis, estava encravada no sul do país. Dessarte, é de supor-se que acontecera o seguinte: doada a Costa dos Potiguares a João de Barros e Aires da Cunha, da Baía da Traição até a Angra dos Negros, viu-se empenhado o ilustre Feitor da Casa da Índia, em indenizar a Pero de Góis, pelas dez léguas do Rio Grande, na importância de quinhentos cruzados; e, posteriormente, arrendou-o a Martim Ferreira, sócio de Pero de Góis, em aventuras comerciais.

Fica bastante explícito que a questão de limites verificada na Vila dos Cosmes de Igaraçu não retifica os termos da Carta de doação da capitania de João de Barros e Aires da Cunha, nem deixa supor que a fronteira primitiva, segundo o critério adotado por alguns escritores cearenses, se fazia pela Ponta dos Búzios.

Como fronteira “primitiva”, se esta começou com a Carta de doação de 1535, na Baía da Traição? Como fronteira “primitiva”, se a nesga de costa de Pêro de Góis não se entrosara no sistema de doações de capitanias hereditárias? O fato é que a “estação” balneária de Pero de Góis vem dando margem a ideias fantasiosas. Aqui termina o texto de Guarino.

Esse Antonio Baião, citado acima, foi Diretor do Arquivo da Torre do Tombo e sócio correspondente da Academia das Ciências de Lisboa, e o título do seu livro que contém o documento curioso a que se refere Thomaz Pompeu é: Documentos inéditos sobre João de Barros. Há cópia no IHGRN.

Acredito que o francês João Lostau já atuava nessa área, que foi de Pero de Góis, antes de receber suas sesmarias, a partir de 1601.
 
Trecho do Rio Potengi que vai desaguar no mar

Trecho do Rio Pontegi, do outro lado da ponte

10/03/2014

        O REI MALVADO
Por: Gileno Guanabara, advogado

Ao final do século V, a ameaça de guerra com que D. João II, Rei de Portugal, se arvorou para exigir dos soberanos espanhóis uma terça das terras recém- descobertas no Ocidente, resultou na assinatura entre ambos do Tratado de Tordesilhas (1494) e, por isso, afinal, foi possível a existência de uma colônia portuguesa no Sul da América. Esse pedaço foi ampliado pelos bandeirantes e veio a compor o imenso território a que se chamou Brasil.
Não sei a que atribuir o fato de D. João II ter passado à História como o “Príncipe Perfeito”. No entanto, ele foi um psicopata, um assassino cruel, como confessou ao pedir ao Papado a absolvição pelas maldades que praticara.
Relatou com frieza indescritível que atraiu e matou, à punhaladas, D. Diogo, o Duque de Vizeu, seu aparentado, após convidá-lo para ter acesso ao camarim do palácio. O Bispo de Evora, D. Garcia de Meneses, teve pior sorte. O déspota ordenou  - alegando ser de melhor piedade  - que o bispo fosse jogado numa fossa cheia de sapos, para se divertir e se alimentar da carne macia dos batráquios. O sexagenário morreu de fome e pavor. Tal ignomínia, fê-la o malsinado rei, louvando-se no Rei Luis IX, de França, que trancafiou um desafeto numa jaula de ferro, como se presa mantivesse uma fera. Ou a prisão e o envenenamento do Bispo de Safim, D. João Sotil.
O fidalgo D. Fernando, Duque de Bragança, de linhagem nobre, foi atraído e preso em Palácio por D. João II. Acusado de traição através depoimentos forjados, segundo os quais conjurava contra o rei, foi condenado a morte, tendo a cabeça decepada em patíbulo, na praça pública e confiscada a sua fortuna em favor do soberano.
Outra vítima de D. João II foi o Conde de Haro que escapou inicialmente da ira do rei, cuja intenção confessa era extirpar-lhe o coração pelas costas. O Conde fugiu para a Espanha e depois para a França, onde foi achado e assassinado por um sicário, a mando do seu perseguidor.
Aos tantos homicídios cometidos, em número de oitenta, somam-se outros tantos executados a mando, em cadafalso, ao fio da espada, amputações, esquartejamentos, decapitações em praça pública, devorados por feras, como confessou. Para isso, forjavam-se as provas. Os testemunhos e confissões eram obtidos mediante tortura. Na súplica que dirigiu ao Papa Inocêncio VIII e renovada depois a Alexandre VI (Biblioteca do Vaticano, 14/10/1456 – in Hist. Genealógica da Casa Real portuguesa - Antônio Caetano de Sousa, 1746), o soberano malvado, já no leito de morte, confessou as simulações, a falsidade das correspondências, as provas forjadas para incriminação, os falsos testemunhos, a infâmia estendida às gerações futuras das vítimas, a peita impingida aos juízes e o confisco do patrimônio dos condenados. Por isso, Camilo Castelo Branco (Gaseta Literária, Porto, 1868) chamou o Rei João II de “Rei Carrasco”, porque fora cruel, mesquinho e hipócrita.
Trecho da súplica que o soberano dirigiu ao papado, com a confissão das centenas de crimes que cometeu - assassinatos; roubo; prevaricação; suborno; falsos testemunhos obtidos sob tortura; calúnia e sadismo, tal o nível de penúria que impingia às vítimas  - revela sua angústia final, quanto ao futuro que o aguardava no inferno: “... as terras de chistans os publicava por traidores, tomando-os a seus próprios herdeiros e avendo-as dava, e muitos que com temor de sua perseguição fugirão com vitupérios, e cartas defamatórias erão delle, suplicante, perseguidos, e, finalmente outros em Reynos extranhos padecerão morte, e de tal maneira que o Rey, suplicante, confessa que sob calor de título de justiça e por seu induzimento farão mortos oitenta homens ou mais” ... “mas na verdade sua Santidade fora falsamente informado, por cuja causa pede perdão a Deus e a V. Santidade.”
O historiador João de Barros (Décadas. Portugal) informa que Cristovam Colombo ofertou ao Rei criminoso seus planos marítimos de, através de caminho mais curto e seguro, na direção do ocidente, chegar às Índias Orientais. O Rei apelou aos conselhos de astrônomos judeus e de um Bispo de Ceuta que concluíram ser absurda a proposta de navegação. O Rei desconsiderou o projeto e despediu o navegador. Restou a notícia de uma provável tentativa de assassinato de Colombo em Portugal.
Colombo foi recebido em Castela (1484) quando relatou aos reis Fernando e Izabel o seu plano e, por isso, ficou retido. Quatro anos depois, em Granada, após a oitiva dos conselheiros reais, os soberanos espanhóis acolheram a empreitada. As esquadra de Cristovam Colombo, composta de três caravelas, partiu do Porto de Palos, em Andaluzia, no mês de agosto do ano de 1492. Atravessou o Oceano Atlântico e descobriu a América. Como consequência da desdita do Rei João II à proposta de Cristovam Colombo, a América deixou de ser inteiramente portuguesa, de Norte a Sul do continente.

Garcia de Rezende, cronista de época, relatou o remorso que teve o Rei malvado, pouco antes de sua morte. Registrou a sentença que ele mesmo ditou e se lhe reservou em forma de epitáfio: “Não me confortais, que eu fui tão mau bicho que nunca me acenaram que não mordesse”.