RELEMBRANDO CORTEZ
PEREIRA
Valério Mesquita*
Mesquita.valerio@gmail.com
Escrever sobre ele é
relatar uma odisséia. A travessia do sofrimento político, os algozes, os
coveiros do seu governo até a eutanásia dos seus sonhos. Recobro os instantes
felizes que presenciei ao lado de um homem de cultura, de uma cordialidade que
não encobria formas perversas de indignidade e traição.
Meu pai foi seu amigo
dileto e colega na Assembleia Legislativa, no período das turbulências entre o
PSD versus UDN. O velho Mesquita de pé, altivo e irreverente, apontava para a
bancada udenista e disparava ironicamente: “Dessa
bancada só quem presta é Cortez Pereira!”. A amizade dos dois se alimentava
também nos encontros semanais em Macaíba para impressões sobre a política e o
inverno, como dedicados proprietários rurais.
Quando Alfredo
Mesquita faleceu em abril de 1969, Cortez – sobre quem o meu pai vaticinava que
um dia seria governador do Rio Grande do Norte – foi escolhido no ano seguinte.
Lamentei muito ele não ter sobrevivido para contemplar a face desse dia. No seu
governo fui nomeado subchefe da Casa Civil, tendo ocupado, posteriormente, após
uma reforma administrativa, a coordenação de Assistência aos Municípios do Rio
Grande do Norte e a diretoria do Departamento de Serviço Social do Estado. Daí,
me exonerei para ser candidato a prefeito de Macaíba. Eleito, Cortez Pereira
levou a Telern para o município, comparecendo a duas posses: a minha e a de
Dix-Huit Rosado em
Mossoró. Inaugurou uma agência do Bandern em Macaíba, a Casa
do Agricultor, eletrificação rural, escolas e a alegria de receber em minha
casa o rei do baião Luiz Gonzaga.
Em 1973, foi padrinho
de batizado de minha filha Isabelle. Relembro, ainda, como seu auxiliar, os
memoráveis discursos e palestras. Uma das inesquecíveis, foi a da Federação das
Indústrias de São Paulo empolgando Amador Aguiar do Bradesco, Mário Amato,
entre outros. Era a pregação do “desenvolvimento econômico” do Rio Grande do
Norte, das suas riquezas e potencialidades nos porões do PIB da paulicéia
desvairada.
Recordo a sua altivez
ao enfrentar e resistir o autoritarismo do general Meira Matos, comandante da guarnição
de Natal, que armou estocadas com o objetivo de tirá-lo do governo.
Evoco Cortez Pereira
como professor universitário, orador, polemista, deputado estadual, diretor do
Banco do Nordeste, suplente do senador Dinarte Mariz que encantou o senado com
os seus pronunciamentos em favor do Nordeste e do Rio Grande do Norte. Relembro
o projeto camarão, do bicho-de-seda, do Boqueirão, do turismo (Centro de
Turismo, bosque dos namorados, cidade da criança e a duplicação da entrada de
Natal por Parnamirim). Relembro Cortez santificado pelo padecimento da dor, mas
redivivo na lembrança e na admiração de tantos que conheceram a pureza dos seus
sonhos. “Louvar o que está perdido torna
querida a lembrança”. Shakespeare. Mas, outra injustiça clama alto: Cortez
ainda não recebeu da classe política do Rio Grande do Norte o reconhecimento
merecido do seu nome constar na frontaria de uma obra oficial importante do estado
que amou e por ele foi imolado.
(*) Escritor
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