A Coluna Preste no Rio Grande do Norte -
III
Tomislav
R. Femenick – Membro da diretoria do Instituto Histórico e Geográfico
do RN
No início de 1926, quando da passagem de
integrantes da Coluna Prestes no Rio Grande do Norte, a cidade e o porto de
Areia Branca tinham importância vital para a economia do Estado. Muito mais do
que é hoje. Eram ligados a Mossoró pela Estrada de Ferro Mossoró-Porto Franco,
cujos trilhos serviam de rota para as exportações e importações do oeste
potiguar, da região jaguaribana cearense e, ainda, do alto sertão paraibano.
Segundo
Paulo Pereira dos Santos em seu livro “Evolução
econômica do Rio Grande do Norte: século XVI ao XXI”, por um longo período
que vai das décadas de 70/80 do século XIX até as três primeiras do século XX,
toda a atividade empresarial da região oeste do Estado, em especial dos
estabelecimentos industriais e comerciais localizados em Mossoró, se refletia
na intensa movimentação do porto de Areia Branca. De 1893 a 1895, cento e
cinquenta e seis embarcações atracaram naquele porto, enchendo seus porões com
mercadorias exportadas por firmas mossoroenses. Em 1911, cento e treze navios
nacionais e outros 153 estrangeiros levaram produtos negociados por empresários
de Mossoró, sendo 33 noruegueses, 30 ingleses, 50 alemães, 17 dinamarqueses, 10
suecos, seis holandeses, quatro portugueses, um americano, um francês e um
russo. O porto de Areia Branca movimentava anualmente entre 200 e 250 mil
toneladas de cargas, enquanto o porto de Natal movimentava cerca de 40 mil e os
de Fortaleza e Cabedelo, 90 mil cada um deles. Era o sétimo maior porto do
Brasil, em movimentação de tonelagem de cargas e contribuía com 58% das
receitas portuárias do Estado, enquanto que Natal contribuía com 40%, e Macau
apenas com 2%. Além de porto cargueiro, Areia Branca era também ponto de
escala de navios de passageiros (os chamados paquetes) e navios mistos – carga
e passageiros – da Companhia Nacional de Navegação Costeira, da Companhia
de Navegação Lloyd Brasileiro e de outras empresas marítimas.
Naquele começo de ano, a notícia que circulava na cidade era de que um
batalhão de Exército estava vindo de Fortaleza pelo navio Paconé (embarcação de
origem alemã, confiscada pelo governo brasileiro durante a Primeira Grande
Guerra e então agregado à frota do Lloyd) e de lá deveria seguir para Mossoró e
para o alto oeste, com a missão de defender as localidades ameaçadas de ataques
pelos integrantes de um pelotão avançado da Coluna Prestes, o mesmo que já
havia atacado cidades do interior do Ceará.
Envolta nesse clima, a cidade recebia uma multidão que era despejada
das embarcações que faziam a ligação entre Porto Franco e Areia Branca. Eram as pessoas vindas de Mossoró –
principalmente, mulheres, crianças e velhos –, fugidas de um possível ataque da
Coluna Prestes. Como as hospedarias já estavam cheias pelos passageiros que
esperavam a chagada do Paconé e que iriam embarcar para Recife, Maceió,
Salvador, Rio de Janeiro e Santos, os mossoroenses foram abrigados em casas de
parentes, amigos e até de desconhecidos.
Em uma localidade relativamente
calma, essa situação inusitada de agitação gerou uma serie de hipóteses e
especulações, envolvendo a cidade e o porto. Umas eram simples boatos. O mais
difundido dizia que entre os defensores das cidades atacadas haveria um herói
areia-branquense, José de Samuel, isso quando nem ataques ainda tinha havido no
Rio Grande do Norte e o impávido Zé de Samuel estava placidamente trabalhando
em uma máquina de beneficiar arroz, em uma fazenda localizada em Apodi. Outro
propagava que o popular “Geleia, muito conhecido nos círculos de jogatina”,
servia de indicador de caminho para os revoltosos.
Todavia as autoridades estudavam seriamente um sistema de defesa para o
porto, tendo em vista a possibilidade de que os militares rebelados, com a
habilidade de estrategistas que possuíam, optassem por um caminho alternativo
e, evitando atacar Mossoró, atacassem Areia Branca, o seu porto de
abastecimento. Seria uma maneira de garantir o reaprovisionamento das tropas e,
ao mesmo tempo, um grande tento que, certamente, teria repercussão nacional
como uma derrota das forças legalistas. Afora a invasão da multidão de
mossoroenses que foram se abrigar na cidade, nada mais aconteceu em Areia
Branca. No Rio Grande do Norte as lutas da Coluna Preste se limitaram a São
Miguel e Luiz Gomes.
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