29/12/2013


A Coluna do General Miguel Costa/Prestes (I)
Luiz Gonzaga Cortez.


Um dos poucos registros confiáveis sobre a passagem da Coluna Miguel Costa/Prestes, em São Miguel, no Oeste do Rio Grande do Norte, em 1926, é de autoria de José Guedes do Rêgo, que foi vice-prefeito de Pau dos Ferros, em 1957. Ele foi testemunha ocular dessa história. Escreveu um depoimento de cinco páginas datilografadas sobre o que viu e ouviu, sem embromações. Vou transcrever o longo depoimento da forma mais fiel possível cortando as repetições dos fatos e dos nomes das pessoas já devidamente identificadas, sem “livrar” a cara de ninguém, seja lá de quem  foi. Por isso, vou dividir em capítulos. “Zé Guedes”, como era conhecido em Pau dos Ferros e em Natal, como assim o seu relato:
“Aos dois dias do mês de fevereiro de 1926, o Chefe Político daquela cidade snr. João Pessoa de Albuquerque, conhecido por João Leite, recebeu do Governador do Estado (1) Dr. José Augusto de Medeiros, um telegrama, comunicando que, de acordo com telegrama recebido do Governador do Estado do Ceará, havia passado em Suçuarana, região do município de Iguatú naquele estado, 70 bandidos desmuniciados rumando a fronteira deste Estado e para garantia seguia naquele dia um contingente de 700 praças da policia, comandado pelo Tenente Joventino, para aquartelar-se em S. Miguel. Diante de tal telegrama, a população agitou-se e logo foram preparando para hospedar tão grande número de praças, coisa nunca vista pela população”.
Começam as divergências de interpretação, uns acreditando, outros combatendo e dizendo tratar-se da Coluna Prestes. Ouvi o comerciante Manoel Vieira de Carvalho, diser ao chefe, “o snr não pense nem de leve que é bandidos, é a coluna Prestes, pois venho acompanhando pelos jornais, a marcha dessa gente”.No dia 3 as 11 horas mais ou menos, chegava um cidadão conhecido por Antonio de Chica, que vinha de uma pescaria no sitio Malhada de Bois, pé da serra de Pereira, Estado do Ceará; vinha referido homem espantado e chegou a casa do chefe  político e disse: seu João Leite, o pé da serra está todo tomado de homens armados, o chefe respondeu: “Tu és tolo, isto os cangaceiros que passaram em Suçuarana; ele respondeu: seu João é os revoltosos, é gente que não cabe aqui dentro da cidade”.  Baseando-se o chefe no telegrama, reuniu seus amigos e concordaram em mandar uns homens armados empiquetar tal pessoal na ladeira denominada do Engenho, município de Pereiro, Estado do Ceará, embora o comerciante Manoel Vieira de Carvalho lutasse muito contra as demais opiniões, enquanto os outros concordavam para tal medida, ele era de opinião se preparar amigavelmente para receber aquele pessoal com recepção. Conseguiram juntar 25 homens armados e às 14 horas mais ou menos o seguinte o contingente, chefiado por Francisco Moreira de Carvalho, ex-genro do coronel João Pessoa, quase todo esse pessoal era gente das principais famílias daquela cidade, inclusive José Pessoa de Carvalho e Francisco Moreira Filho, filhos de Francisco Moreira de Carvalho e Francisco Queiroz, comerciante. Ao chegarem no sítio Engenho, distante 3 léguas de S. Miguel, propriedade de do snr. Manoel Pinheiro Barbosa, juntaram-se  mais  homens, que não recordo a quantidade, seguindo rumo a tal ladeira, numa serra muito difícil de passar, somente uma pessoa atrás do outro e para um lado e outro somente pedras e mato; aconteceu que antes de atingir ao objeto almejado- a ladeira – e no lugar chamado Canta Galo, ao passar uma curva da estrada, depararam com um contingente de homens armados, diante de tamanha surpresa, o elemento que vinha a frente dos inimigos, sacou de duas armas curtas e disparou-as de uma só vez. Travou-se o tiroteio, com poucos minutos, os revoltosos recuaram, isto ameaçando com gritos muito altos que já voltavam para dá o troco. Neste momento o pessoal de S. Miguel foi examinar o campo da luta e lá encontraram vários objetos, como cantis, manta de lã de ovelha, usadas no Sul, aí, então um dos elementos de nome José Felix, conhecido por José Ferreiro, alarmado disse “seu Chico Moreira, nós não estamos brigando com cangaceiros e sim com o exército e vamos embora se não nós não contaremos vitória”. Chico Moreira, um homem que não corria pouca coisa,  respondeu: “deixa de ser mole negro, esta canalha já correu a primeira vez e corre a segunda”. Quando  estavam nessa conversa, ouviram gritos alarmantes, avança, avança e então dizem eles que parecia um grande estrondo a procura deles e a estrada vinha cheia que não se contava três pessoas tamanha era multidão e por todos os lados, por dentro do mato, apesar de um pouco fechado, gritava gente  dizendo avança,  avança, tiveram que correr, como o chão era muito acidentado e pedregoso, bastava encubrir-se poucos metros mato adentro, ninguém via mais e foi assim que escapuliu a maior parte deles, tendo o Francisco Moreira Filho, recebido um balaço em um braço, coisa leve. Junto aos 25 homens foi também José Augusto Pessoa, filho do coronel João Pessoa, cidadão que nunca se envolveu em luta para ter quem corresse primeiro do que ele e foi o que aconteceu. A luta foi a tardinha e antes das 7 horas da noite passava ele de volta na cidade, noticiando o caso do Canta Galo e dizendo que o único que havia escapado tinha sido ele e passou direto”.

Notas – 1) Na época, o Governador do Estado era Presidente de Província.

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