Casa do Mestre Cascudo
13/06/2017
texto Gustavo Sobral e ilustração Arthur Seabra
Um canto de muro esconde muito coisa que só ele revela. Num canto de
muro habitam insetos, saltam pássaros, andam formigas, caem goteiras,
crescem ervas daninhas, passeiam e sonham meninos. Um canto de muro
feito assim vira literatura nas mãos de um Cascudo amigo que pela janela
do seu sobrado colecionava os fins de tarde do rio Potengi.
Casa na avenida com nome do dono, Câmara Cascudo, subida da Ribeira
para a Cidade Alta, Natal/RN. Na porta de entrada, a segurança
necessária: um cangaceiro pintado pelo artista completo de todos, e
amigo, Dorian Gray Caldas. Transposta a segurança, a escadaria leva ao
alpendre que ali toma nome de vento e sossego de um chão desenhado de
mosaico.
Na sala de entrada, retratos. Foto do zepelim, que sobrevoou a cidade
dos anos 1900 e jogou flores ao aeronauta Augusto Severo, e de Villa
Lobos, que oferece uma testa larga para um Cascudo amigo. E depois, na
casa, as paredes pintadas com as assinaturas de quem entrou porta
adentro e viu e viveu o mestre quando conversava no balanço da cadeira e
baforava a lentidão no charuto.
A máquina de escrever descansa mais de cento e sessenta livros e
plaquetes escritos e publicados sobre tudo, desde história, folclore,
alimentação a cultura, tanto que teve de virar livro, trabalho de toda
hora e de todo tempo para escrever sobre todas as coisas numa disciplina
da madrugada de leitura e redação que o aviso na porta advertia: o
mestre Cascudo só atende à tarde, que pela manhã dorme e à noite
escreve.
O endereço ficou marcado para que não se perdesse, recebendo o seu
nome, então a casa antiga ficou pertencendo à rua do dono, Avenida
Câmara Cascudo, 377. Dizem que sua forma é chalé, a que gosto de época
não se sabe, mas suas obras findaram em 1900, até ser comprada pelo
sogro de Cascudo em 1910, e depois por ele, em 1947. Os pedacinhos da
casa estão nas páginas dos seus livros, porque foi naquele chão e
embaixo daquele teto que livros e mais livros, e muita história com
sabor de quem conta, saíram por aí pelas páginas, provocando o encanto
da descoberta de ler o que Cascudo conta.
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