21/06/2015


AS ZONAS

 

Valério Mesquita*


 

Trata-se de um tema que vem sendo comentado com frequência, há décadas. Recrudesce sempre nas proximidades das eleições no Rio Grande do Norte. Áreas para instalação são apontadas e em seguida tudo fica no mesmismo. Seria trágico, se não fosse cômico, se investigar esse disse-me-disse de ZPE’s no agreste, no Seridó, no vale do Assu, no oeste ou na área da grande Natal. A reprise desse assunto no calendário eleitoral, além de confundir e enganar o povo – fazendo-o de estúpido – redunda em agressão a lei eleitoral, aos bons costumes, pela falsidade ideológica com que é impingido um investimento de ordem publico/privada sem uma discussão ampla dos grupos investidores com as classes produtoras do Rio Grande do Norte e governo do estado.

Essas zonas não significam o que alguns estão pensando. São as zonas de processamento de exportação do Rio Grande do Norte. Compreendam-me bem: não quero com isso que suponham que sou contrário as ZPE’s. Mas, sim, a propaganda enganosa de infligir a coletividade, a imagem de vítima de um capricho político vicioso e eleitoreiro. Alguns municípios – li na imprensa – já disponibilizam glebas desapropriadas com o dinheiro público, sem nenhum planejamento ou debate técnico sobre o assunto. São procedimentos açodados onde o tráfico de influencia e a captação subliminar e ilícita de votos estão tão explícitos quanto as irregularidades de ordem contábil com afronte a moralidade pública.

Esses artifícios curiosos e episódicos contam com a cumplicidade de alguns ministérios ligados a partidos aliados que atuam nos estados. O critério de escolha não parece técnico nem seletivo. Há um dano, um foco, um aparelho transformador, destinado a converter situações e imprimir resultados. A expectativa nossa é de que as zonas não se transformem em burlas para premiar confrarias, pelo tratamento vago, vadio e vazio em vez de avançar sistemicamente nas negociações com os grupos estrangeiros, os quais, nem ao menos se tem idéia de onde vêm. A ZPE é tratada como tema abstrato, oferecendo apenas um factóide publicitário que transparece como recompensa material em troca de voto. O receio reside na preocupação coletiva que essas regras facilitem a perpetuação da corrupção e do fisiologismo. O próprio capitalismo selvagem no mundo transformou-se num assombroso vampiro na Ásia explorando a classe proletária.

A implantação das zonas de processamento de exportação deve sair do palanque político para o auditório dos debates com os verdadeiros agentes produtivos do estado. Que as coisas não sejam decididas com festa do dinheiro público como se desenha na volta anual de cada pleito. Que as zonas representem na agenda do crescimento do emprego, melhor e maior credibilidade e não uma zorra implementada e operacionada por ministérios comprometidos com os interesses partidários e não com os objetivos da integração nacional.

No popular, zona é um vocábulo comum que inspira boas recordações. Casas de recursos e pousadas de lazer e divertimento. Não existem mais. Imperava nelas a servidão humana das mulheres. Mas, reservavam o prazer. E funcionavam bem porque processavam e exportavam o pecado, o mais antigo meio de comércio e indústria da humanidade.  O bairro da Ribeira em Natal e Ponte Negra são as “ZPE’s” mais citadas dos bons tempos às margens das águas fluviais e marítimas. A expectativa do articulista é de que os “corredores de exportação” de hoje, não fiquem, apenas, na saudade e no consumo dos pecados políticos: através de atos, fatos, omissões e oportunismos.

 

(*) Escritor.

 

20/06/2015


LOUVANDO AS ARTES PLÁSTICAS

HOMENAGEM ÀS TELAS DO SARRO - ARTISTA ÍTALO-BRASILEIRO

 

ESPUMAS NA AREIA

JANSEN LEIROS, escritor

 

Os peixes se multiplicam,

Nas redes dos pescadores,

Que na arte, são atores,

Nos laborais, se aplicam.

 

Curtem o mar, nas madrugadas

E as jangadas que fustigam

São as naus em que se abrigam

Em busca de mil pescadas.

 

Nasce o sol nos oceanos,

Quando estão em alto mar,

E no manejo, o cismar,

Os transforma em pelicanos

 

E peixes multiplicados

Enchem as cestas dos labores,

Cantam preces de louvores,

Sem textos elaborados.

 

Nem o canto das sereias

Tira o brilho do pescado,

Pois que está configurado

Nas espumas da areia.

19/06/2015


REVIVENDO GILBERTO AVELINO

Valério Mesquita*

Numa noite perdida das marés de Macau, diante do “mar aceso em lua”, lembro-me que proferi em louvor ao poeta Gilberto Avelino uma saudação de praxe e de apreço. Palavras sopradas pelo vento leste, que o poeta dizia ser o vento da resistência. Era o dia oito de setembro de 1983. A cidade inteira compareceu ao lançamento dos seus Pontos Cardeais. Disse naquela hora que o poeta Gilberto Avelino era um argonauta, um navegador impulsionado simultaneamente pelo lirismo e pelo desafio da descoberta de novos mundos. Seus instrumentos náuticos conduzia-o por um caminho de realizações poéticas marcadas por um amor onipresente à cidade de Macau, alfa e ômega de sua criatividade, porto seguro onde conseguia fundear sua temática, sua visão de vida e, sobretudo, a explosão do seu talento. Na cidade de Macau estavam, na realidade, fincados os seus PONTOS CARDEAIS – a rosa-dos-ventos do ser humano e do próprio poeta.
Ele navegava em busca de terras desconhecidas, de universos construídos por sua inesgotável inventividade. Não se conformava, como sempre faziam aqueles tocados pela vocação poética, com a rotina fácil e repetitiva de um mero artesanato exercido através das palavras. Nele vibravam uma chama, um calor, uma luminosidade que transcendiam as situações lineares em que se materializava o estéril cotidiano. Entendera que a vida se exauria em experiências efêmeras e toda a ação inútil e sem sentido não passava de movimento dirigido à conquista de bens perecíveis. O poeta é um ser que transcendia a si mesmo, que se ultrapassava, que se sobrepunha à sua própria contingência. E nisso consistia a sua grandeza. Nós todos estamos mergulhados na transitoriedade de nossas ocupações e preocupações, nascidas da própria vida prosaica a que estamos indissociavelmente presos por profundos condicionamentos. Gilberto Avelino rompia, num gesto de libertação espiritual, essas algemas e proclamava a integridade, a dignidade e percepção que somente nós, humanos, a temos.
Na verdade, o poeta resgatava a condição humana, vítima das distorções existenciais, da luta por objetivos aviltantes, das limitações geradas pela reiteração das mesmas atitudes, dos mesmos procedimentos e perspectivas. O poeta inaugurou um conduto de comunicação encantatória entre o ser e o seu destino, entre o ser e a vida, entre o ser e o contorno social em que se achova imerso. Daí a constatação de um genial poeta alemão: “o que permanece, criam-no os poetas”.
Conclui com a luminosa definição de Joanilo de Paula Rêgo sobre Gilberto Avelino: “O canto de Gilberto ficou para todo o sempre, atravessando gerações e gerações, a bater como um sino, a soar como uma bigorna, a ecoar como um trovão, a comover como uma canção. O seu canto é forte e eterno, é claro e belo. Se os tempos são breves e nebulosos, a poesia de Gilberto vence o calendário e as trevas”.
Hoje, o poeta e acadêmico Gilberto Avelino, está esquecido, somente vivo e renovado na beleza marítima de sua poesia.

(*) Escritor.


18/06/2015


   
Acla Pedro Simões Neto
 
A ACLA Pedro Simões Neto sente-se honrada em poder informar aos seus leitores e leitoras, informações preciosas sobre a vida profissional de professoras e professores em seu contexto educacional. O artigo em pauta, trás em seu bojo nomes de profissionais ausentes do nosso convívio aqui na terra. Portanto, aguardem a novidade que será publicada todas a quintas- feiras, fazendo jus a quem abraçou e amou o magistério. 
Não se pode abraçar a cultura, sem homenagear o professor.

EDUCADORES, MESTRES E INTELECTUAIS
Maria das Graças Barbalho Bezerra Teixeira.
Ocupante da Cadeira número 26 da ACLA

Retornemo-nos ao tempo dos iluministas (séc. XVII) todavia, deslocando-nos um pouco da racionalidade, do absolutismo, e do empirismo, mas nos cooptando com Voltaire em sua liberdade de pensamento, Rousseau em seus propósitos democráticos, Montesquieu em sua incansável defesa de um Estado com divisão do poder político, à época absolutista, de caráter centralizador e concentrador. Preambulando esses filósofos e pensadores franceses, penso em todos eles como o curso de um rio perene, pois graças às ousadias e destemores, nos legaram um patrimônio cultural, político, social e econômico, desencadeando mudanças significativas no processo histórico e político universal. Creio que Ceará-Mirim, mesmo tão distante do continente europeu, também teve seus iluminados e suas iluminadas, no que diz respeito à literatura poética, histórica, crítica, romântica, jurídica. Não só teceram em suas linhas do tempo a habilidade, a eficiência e eficácia no intercâmbio cultural, e sob diversos matizes legou-nos importantes conhecimentos. Citem-se, Madalena Antunes, Edgar Barbosa, Adele de Oliveira, Etelvina Antunes, Dolores Bezerra. Pertinente se faz, ressaltar a linhagem intelectual que descendeu, sequenciando uma maneira literata estrita de inclusão ao ensino e a aprendizagem. A nós cearamirinenses, cabe-nos o orgulho e o respeito em reverenciarmos tão ilustres conterrâneos, conterrâneas e que ao longo dos anos ficaram esquecidos, desconhecidos por muitas gerações. Tomemos como exemplo os professores e professoras, mestres e mestras que fizeram parte de nossa vida escolar, atualmente com pouca relevância para a sociedade de modo geral: Clotilde Guedes, Sotéra Arruda, Nalva Xavier, Conceição Campos, Floriano Ferreira da Silva, João de Castro, Lúcia Brandão, Padre Rui Miranda, Salete Cunha, Fernando Barros, Izulamar Costa, Tânia Xavier, Conceição Marques, Ulisses Campos, Darilene Brandão, Conceição Vilela, Francisco de Assis Rodrigues, entre tantos outros, embora aqui não nominados. A todos os professores e a todas as professoras que fizeram a história da educação em Ceará-Mirim, nossa gratidão mais profunda, pela responsabilidade e rigor em seus cumprimentos profissionais; pelo carinho, zelo e paciência em um tempo em que educar tinha como sinônimos, educação, respeito, conhecimento e competência.

17/06/2015


RELEMBRANDO O PROFESSOR JOSÉ GOMES DA COSTA

Valério Mesquita*
Mesquita.valerio@gmail.com


Uma vida em linha reta. Talvez, esta frase resumisse tudo o que eu possa dizer sobre a conduta pessoal e a vida profissional do saudoso Dr. José Gomes da Costa, juiz de direito, professor universitário, humanista, jurista e desembargador. Mas, seria muito pouco diante da grandeza moral e a cultura jurídica de um educador de gerações, formador de profissionais do Direito, da velha Faculdade da Ribeira de tanta tradição e brilho.
Conheci o Dr. José Gomes da Costa como juiz da Comarca de Macaíba, residindo à Rua Dr. Pedro Velho, nos anos cinqüenta. Eu era menino. Ao lado de Alfredo Mesquita Filho, Enock Garcia, Aníbal Délio (tabelião público), assisti-o discursar e participar de eventos cívicos integrando-se à vida da cidade, ainda de tardes silenciosas e manhãs contemplativas.
Dr. José Gomes da Costa era calmo. A sua bondade promovia-se tanto quanto a sua cultura jurídica. Um homem de claridades interiores. Como professor, na Faculdade de Direito, primava pela permanente disposição de ser disponível e útil  aos seus alunos. Boníssimo, era incapaz de perpetrar um mal a quem quer fosse. Ele era o nosso ícone. Sem nenhum demérito aos demais lentes de nossa formação acadêmica, com relação ao mestre do Direito Civil eu o separo e o destaco. Ao evocá-lo ainda o escuto através do eco das conversas amenas e das aulas dosadas de sabedoria, naquelas manhãs sempre inaugurais de ressurreição. Muito aprendemos com ele, ouvindo-o, imprimindo em nós marcas de eternidade pinceladas pela conduta e afetividade dos seus gestos. O seu andar lento, a sua postura de calma e sapiência diante da classe me infundia a impressão mística e espiritual de um capataz de profundos silêncios e longas esperas.
O professor José Gomes da Costa, que conheci e privei da convivência cinco anos na antiga faculdade, foi um ser simples, abordável, democrata nas intransigências e nas concessões.
No ensejo da passagem dia 17 de março dos seus 113 anos de nascimento, desejo ampliar as minhas impressões pelo mestre fraterno e amigo. Resgatar-lhe a memória, sim, mas, principalmente, dizer que toda construção preservada é a sombra projetada de um homem na posteridade. Isso porque ele dignificou o magistério e a magistratura do Rio Grande do Norte. E, acima de tudo, honrou a família como bom esposo e pai exemplar.
Na volta anual do seu dia deposito o ramalhete de homenagem. Ele é tecido de flores e frutos, nascidos das sementes que plantou ao longo do tempo.


(*) Escritor.

16/06/2015



FLORIDA

Jansen Leiros*

 

A natureza se projeta em cores!

Lindos matizes que perfumam as brumas;

Espatulando óleos nas espumas,

Num festival de luzes e amores.

 

E a natureza mostra seus encantos,

Perpetuando as cores nesta tela,

Novo momento, além da aquarela,

Cuja emoção vai muito além dos prantos!

 

Quem ao mirar a obra , se enternece;

e ao sentir o aroma dessas flores,

se introjetam  ao viver  amores,

e isso quase sempre acontece.

 

Em conjuntura cheia de emoções,

Mirar “Florida” é quase um desafio!

É o sentimento preso por um fio,

Qual forte impacto sobre os corações!

 

Teço louvores à feliz artista,

Abençoada pelos seus pincéis

Pois que transforma, seus belos painéis,

Em tons estéticos, de sua conquista!  

 

 

Da Academia Macaibense de Letras;

Da Academia Norte Rio-grandense de Trovas;

Da União Brasileira de Escritores;

Do Instituto Histórico e Geográfico do RN.

 

 

 

 

15/06/2015

.
 
   
Acla Pedro Simões Neto
14 de junho às 06:31
 
CARTA A NILO PEREIRA E SUA RESPOSTA
Ciro José Tavares.
Mestre Nilo:
Leio com entusiasmo sua Crônica do Velho Casarão, publicada no Jornal do Commercio e tomo a liberdade de enviar o meu poema Farewell Adelle. Fácil observar que o ambiente que me contagia é o mesmo, diferenciado apenas pela fantasia que me veste.
Depois que Adelle e Mariê partiram, minha mãe, Juraci, resistiu em rever suas antigas ruas e locais abençoados, não voltando nunca mais. Guardava a sensação, segundo me disse, da cidade adormecida permanentemente, como se estivesse morta.
Nas vezes em que lá fui, constatei a informação. À medida que o veículo descia, lentamente, a Rua São José até a estação ferroviária, margeando a linha férrea, conduzindo-me a casa, eu vislumbrava o largo pátio da Matriz e via a inexistência das mãos amigas que nos saudavam a chegada.
Para o lado do canavial, adentrado o vale, havia uma multidão de fantasmas no meio da qual rondava a realidade. O aspecto físico da cidade, no seu setor mais nobre e conhecido, não se modificou tanto. O espiritual, sim, volatizou-se, dando a impressão de que teria sido arrastado pelos que se despediram deste mundo, levando jardins, escadarias de acesso e terraços bordados de sancas e florões, suspensos nas colunas jônicas. Habituei-me a associar os velhos personagens da cidade à figura do Tio Spencer da novela O Chapéu Mexicano, de Aldous Huxley. Mansos de coração, eternizados na doce arquitetura.
Ciro José Tavares.

O poema que Ciro José Tavares dedica a Adelle de Oliveira é, para mim, a ressurreição da primavera da vida. Ela foi minha primeira professora no Ceará-Mirim. Tinha a fragilidade de um lírio e o encanto de uma alma pura, solitária, romântica. Seus versos rivalizam, em muita coisa, com os de Auta de Souza. Sempre a lembrarei, Como fiz na Academia Norte-rio-grandense de letras, ao ser empossado e saudado por outro cearamirinense, o realmente grande escritor Edgar Barbosa. É para este universo sentimental que Ciro me remete, numa hora de meditação e de quase êxtase. Hora da infância restituída. A aurora ainda indecisa da vida.
Nilo Pereira.

FAREWELL ADELE
Ciro José Tavares.

la etemidad espera en la encrucijada de estrellas.
JORGE LUIS BORGES – UM PATIO

Os sinos da matriz chamam
às vésperas os fiéis.
Galahad!
Galahad apressa-te!
Quando voltarmos verás
o trem das seis e meia
ganhando o rumo agreste.
Depois da ceia do senhor
(rogai por nós), a nossa.
Virgo, na cozinha,
permanece preparando
nosso magro pão de cada dia.

As oito, na praça Lateral à Igreja,
barracas, carrossel,
roda gigante iluminados,
empolgam feérica quermesse dos fiéis.
Há Verônica, Marias, Madalenas,
Tranças louras, vestidos rendilhados,
passando, por dois réis, rifas vermelhas
e azuis, na ajuda ao velho sacerdote.
Galahad, cuidado, não percas sobre alguém
o teu olhar perdido, nem sujes
a vistosa calça curta de algodão.
Na páscoa do domingo vais usá-la.
Se as dez a luz apaga, acende, é sinal,
logo silenciará o gerador.
Atento embala na ladeira, a noite,
assim como folguedos, é terminal.
Oramos antes de dormir, mantendo
brancas velas acesas no oratório.
Mesmo frágil, o lume guiará teus passos
Pelos silentes quarto e corredores.
Galahad, Galahad, penitencia-te,
Cristo é recrucificado sexta-feira.
Rangem máquinas, vagões, aguardando
que se processem embarques na estação,
antiga e fronteira à rua São José.

Reprime as lágrimas e logo saberás
que tua saudade é transitória.
Prometemos, crescido, repetir
nossas santas semanas no futuro.
Segura a bolsa e leva à bandoleira
tuas roupas, lembranças, brinquedos.
Cuidado na janela, o vento sopra
as cinzas para trás, Galahad, Galahad,
a direção é leste, hoje é contra o tempo.
Ouve, os sinos da Matriz parecem
dobrar em Jerusalém, Galahad,
Galahad, Galahad, alegra-te.
Aberto o santo sepulcro o Cristo
está ressuscitado, busquemos
reencontro na páscoa matinal.
Apesar dos muitos pecados, convidamos.

Quem sabe não queiras antes da missa
confessá-los ao jovem celebrante,
serão compreendidos e perdoados.
Esperamo-te na porta principal,
nossas pernas cansadas e franzinas
têm pela frente a ladeira e degraus.
Não tardes, guardião do sono, a toalha
está presa no varal, a jarra d’água cheia
no úmido banheiro do quintal,
as roupas na cadeira, os sapatos sob a cama.
Quanto ao café, na volta, arranjam-te
essas duas tias alquebradas,
porque faz muito tempo que partiu a doce Virgo.

Não vieste à Ceia do Senhor, ao pão do corpo,
ao cálice de sangue do Cordeiro?
No átrio montaste vigilância, perdido
de amores ou espanando a diáfana bruma
da aurora sonolenta, Galahad.
Para revê-la volta ao átrio amanhã cedo,
deitada indormida nos canaviais,
mágicos riachos, engenhos mortos,
nas moendas gastas e carros de boi
sumidos nos caminhos de verde rendilhados.
O trem, o trem podes perdê-lo, Galahad.
Se puderes faz breve longo regresso,
ou breves notícias apesar do espaço longo.
Sabes que somos as filhas puras da bruma
onde estaremos para sempre fixadas,
Galahad, Galahad.