"Se alguém não acreditar que
Maria é a mãe de Deus..."
Uma Visão histórica da formação do
dogma
Fonte: Maria, Um espelho para a
Igreja
Autor: Raniero
Cantalamessa
No Novo Testamento não encontramos explicitamente o título "Mãe de Deus"
dado a Maria. Encontramos aí, porém, afirmações que em seguida vão mostrar a
reflexão atenta da Igreja, guiada pelo Espírito Santo, já conterem In
Nuce esta verdade. Como já vimos, afirma-se que Maria concebeu e deu a luz
um filho que é o Filho do Altíssimo, santo e Filho de Deus (Cf. Lc 1,31-32.35).
Resulta dos Evangelhos , pois, que Maria é a mãe de um filho do qual se sabe que
é o Filho de Deus. Nos Evangelhos ela é comumente chamada de Mãe de Jesus, mãe
do Senhor (cf. Lc 1,43), ou simplesmente "a mãe"e "sua mãe" (Cf. Jo 2,1-3). Será
preciso que a Igreja, no desenvolvimento da sua fé, esclareça para si mesma quem
é Jesus, antes de saber de quem Maria é mãe. Evidentemente Maria não começa a
ser Mãe de Deus no concílio de Éfeso de 431, como Jesus não começa a ser Deus no
Concílio de Nicéia em 325, quando foi assim definido. Já antes era Mãe de Deus.
Mas aquele é o momento na qual a Igreja, no desenvolvimento e na explicitação de
sua fé, pressionada pela heresia, toma plena consciência dessa verdade e se
posiciona a respeito. Acontece como na descoberta de uma nova estrela : esta não
nasce no momento em que sua luz chega à terra e é percebida pelo observador; já
existia antes,talves milhares de anos luz é colocada no candelabro do credo da
Igreja.
Nesse processo, que leva à proclamação solone de Maria como Mãe de Deus,
podemos distinguir três grandes fases que agora vou apontar.
A maternidade "física"de Maria : Época
antignóstica
No começo e em todo o período dominado pela luta contra a heresia gnostica
e docetista, a maternidade de Maria é considerada quase unicamente como
maternidade física. Esses hereges negavam que Cristo tivesse um verdadeiro corpo
humano e se admitiam que ele tinha um verdadeiro corpo humano, negavam que esse
corpo tivesse nascido de uma mulher, negavam que verdadeiramente tivesse surgido
de sua carne e de seu sangue. Contra eles era , pois, necessário afirmar com
força que Jesus era filho de Maria e "fruto de seu ventre" (Lc 1,42), e que
Maria e a mãe verdadeira e natural de Jesus. de fato, alguns desses hereges
admitiam que Jesus tivesse nascido de Maria, mas que nao tivesse sido concebido
em Maria, isto é, da sua mesma carne. Segundo eles, Cristo tinha nascido através
da Virgem, e não da Virgem; "colocado pelo céu na Virgem, saiu dela mais como
quem passa do que como quem é gerado, através dela, nao dela, tendo na Virgem
nao uma mãe ,mas um caminho" (Tertuliano, Contra os Valentinianos 27,1 [CC2, p.
772] ). Maria "não teria trazido Jesus no ventre como filho, mas como hóspede"
(Tertuliano, Sobre a Carne de Cristo 21,4 [ CC2, p. 911] ).
Nesta fase mais antiga, a maternidade de Maria serve principalmente para
demonstrar a verdadeira humanidade de Jesus. Foi nesse período e neste clima que
se formulou o artigo do credo "Nascido (ou encarnado) do Espirito santo e da
Virgem Maria". Originalmente esse artigo queria dizer simplismente que Jesus é
Deus e Homem: Deus,enquanto gerado segundo o Espirito, isto é, por Deus; homem,
enquanto gerado segundo a carne, isto é, por Maria.
A maternidade "metafisica"de Maria :
época das grandes controvérsias cristológicas
Na fase mais antiga, quando se afirma a maternidade real ou natural de
Maria contra os gnosticos e docetas, surge o Título de Thetókos. De agora em
diante, o uso deste título levará a Igreja à chamar de maternidade divina mais
profunda, que poderíamos chamar de maternidade metafísica. Isto aconteceu na
época das grandes controvérsias cristológicas do quinto século, quando o
problema central sobre Jesus cristo já não era de sua verdadeira humanidade, mas
o da unidade de sua pessoa. A maternidade de Maria não é mais considerada só em
relação da natureza humana de Cristo mas, o que é mais correto , em relação a
única pessoa do Verbo feito homem. E como esta única pessoa divina do Filho,
consequentemente ela é verdadeira "Mãe de Deus".
Aduziu-se, a respeito, o exemplo do que acontece em qualquer maternidade
humana. A mãe dá ao filho o corpo, não a alma que é infundida diretamente por
Deus.Contudo não digo que minha mãe é mãe do meu corpo, mais simplimente que ela
é minha mãe, mãe de todo meu ser, porque em mim o corpo e alma formam uma única
natureza ou realidade. Assim analogamente , Maria deve ser chamada Mãe de Deus,
ainda que tenha dado a Jesus só a humanidade e não a divindade, porque nele a
humanidade e a divindade formam uma só pessoa.
Entre Maria e Cristo já não há uma só relação de ordem física, mas também
de ordem metafisica, e este fato coloca-a numa altura vertiginosa, criando uma
relação especial também entre ela e o Pai.
Com o Concilio de Éfeso, esta compreensão torna-se para sempre uma
conquista da Igreja :"Se alguém não confessar que Deus é verdadeiramente o
Emmanuel e que por isso a Santa Virgem, tendo gerado segundo a carne o Verbo de
Deus feito carne, é a Theotókos, seja anátema" São Cirilo Alexandrino,
anatematismo I contra Nestório, in Enchiridion Symbolorun, nr. 252, lê-se
num texto aprovado pelo mesmo Concílio. Foi um momento de grande alegria para
todo o povo de Éfeso, que esperou os Padres fora da sala conciliar e os
acompanhou, com fachos e cantos, até seus alojamentos. Essa proclamaçào
determinou, no Oriente e no Ocidente, uma explosão de veneração para com a Mãe
de Deus. Veneração que se concretizou em festas litúrgicas, ícones, hinos e
inúmeras igrejas a ela dedicadas.
A maternidade "espiritual" de Maria : A
contribuição do Ocidente
Essa etapa porém nao era definitiva. havia um outro nível, alem do fisico
e do metafísico, a ser descoberto na maternidade divina de Maria, Nas
controvérsias cristológicas, o título Theotókos era valorizado mais em função da
pessoa de Cristo do que de Maria, apesar de ser um título mariano. Desse título
nao se tirava ainda as consequências lógicas relativas a pessoa de Maria e
particularmente à sua santidade única. Havia o perigo de Theotókos tornar-se
arma de batalha entre correntos teológicas antes que a expressão da fé e da
peidade da Igreja para com Maria. Demonstra-o um pormenor que deve ser bem
acentuado. O mesmo São Cirilo de Alexandria, que na polêmica lutou como um Leão
pelo título de Theotókos, é entre os Padres da Igreja uma nota discordante na
apreciação da santidade de Maria.Foi um dos poucos que atribuiram fraquezas e
imperfeições a Maria, principalmente ao pé da cruz. Cirilo, acompanhando
Orígenes, não conseguia acreditar que uma mulher, ainda que fosse a Mãe de
Jesus, pudesse ter tido uam fé e uma coragem maior do que a de todos os
Apóstolos que, apesar de homens, vacilaram nbo momento da paixao! (Sao Cirilo
Alexandrino, Comentário do Evangelho de São João XII, 19,25-27 [ PG 74,661ss]
).
Essas palavras nascem da pouca estima que omundo antigo tinha pela mulher
e mostram como pouco adiantava atribuir a Maria uma maternidade física ou
metafísica, em relação a Jesus, se não se lhe atribuía também uma maternidade
espiritual, isto é, na alma e não apenas no corpo.
Esta foi a grande contribuição dos autores latinos e particularmente de
Santo Agostinho. A maternidade de maria é considerada como uma grande
maternidade na fé,como uma maternidade espiritual. Estamos na epopéia da fé de
Maria. A propósito da palavra de Jesus : Quem é minha mãe ...., Agostinho
atribui a Maria, em sumo grau, aquela maternidade espiritual que nasce do
cumprimento da vontade do Pai : "Por acaso não cumpriu a vontade do Pai a Virgem
Maria, que pela fé acreditou, pela fé concebeu, que foi escolhida para que dela
nascesse a salvaçao para os homens, que foi Criada por Cristo, antes que Cristo
fosse nela criado? É certo que santa Maria cumpriu a vontade do Pai e por isso,
para Maria, foi mais importante ter sido discipula de Cristo do que ter sido a
Mãe de Cristo" Santo Agostinho, Sermões 72A (=Denis 25), 7 Miscelannea
Agostiniana, I,p.162).
A maternidade fisica e a maternidade metafisica de Maria chegam assim ao
seu apice pelo reconhecimento de uma maternidade espiritual ou de fé, que torna
Maria a primeira e mais Santa filha de Deus, a primeira e mais docil discipulo
de Cristo, a criatura que -escreve mais uma vez Santo Agostinho- "pela honra
devida ao Senhor, nao deve ser mencionada quando se fala em pecado" (Santo
Agostinho, natureza e graça 36,42 [ csel.60, p. 263s] ). A maternidade fisica ou
real de Maria, criando uma relação única e excepcional entre ela e Jesus, entre
ela e toda a Trindade, de um ponto de vista objetivo é e permanece a realidade
maior e um privilégio sem igual ; isso porém porque, do ponto de vista
subjetivo, existe a fé humilde de Maria. Para Eva certamente era um privilegio
unico o fato de ser a "mãe de todos os viventes", mas como não teve fé, isso de
nada lhe adiantou nemlhe deu felicidade.
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PARABÉNS A TODAS AS MÃES DO MUNDO.
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