O parlamento e
seus desvios, opus 2
Tomislav R. Femenick – Jornalista – Do
IHGRN
O Brasil já teve várias duplas dinâmicas e
vitoriosas. Pelé e Garrincha, nas Copas de 1958 e 1962; Pelé e
Coutinho, no Santos, nas décadas de 1950 e 60; Rivaldo
e Ronaldo, em
duas Copas do Mundo, em 1998 e 2002; Romário e Bebeto, na Copa América de 1989.
Houve várias outras, mas nada supera a dupla Batoré e Nhonho, no Congresso
Nacional. Batoré, também conhecido como Davi Alcolumbre
(DEM-AP), é o presidente do Senado e, por decorrência, do Congresso Nacional.
Nhonho, ou Rodrigo Maia (DEM-RJ), é o presidente da
Câmara dos Deputados.
Ambos vieram do
baixo clero do Congresso, eram parlamentares com pouca
expressão política. O primeiro assumiu o cargo num movimento para evitar a
reeleição de Renan Calheiro, o esperto que foi engolido pela própria esperteza.
Davi responde a dois inquéritos no STF. Rodrigo foi investido na atual posição
na esteira do escândalo de Eduardo Cunha, que teve o mandato cassado
pelo plenário da Casa. E, também, responde a inquéritos na Polícia Federal. Em
síntese, nenhum dos dois teve mérito próprio para ocupar o cargo que tem. É
esse o Congresso que temos.
Esses senhores presidem instituições com
características ímpares. Ali todo mundo ganha muito e trabalha pouco. Nessas
duas casas do povo (pois somos nós, “os iguais, menos iguais”, que pagamos as
contas de suas senhorias) é praxe que só se trabalha dois dias por semanas; em
casos extras podem ser mais que isso. E ninguém tem o ponto cortado; eles são
“os iguais, mais iguais”. É por isso e por outras coisas que, de vez em quando,
alguém tem o desplante de chamar o nosso parlamento de “casa de mãe Joana”.
A Constituição Federal garante que “Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se [...] a igualdade...”. Lindo de se dizer e ouvir. Entretanto, igual à
história contada em A Revolução dos Bichos, de George Orwell (1980), há aqueles
iguais que são mais iguais que outros. Vereadores, deputados e senadores têm as
verbas de gabinete durante todo o seu mandato, têm uma penca de assessores
parlamentares que nada mais são (há exceções) que cabos eleitorais trabalhando
o tempo todo para sua excelência, têm as verbas dos fundos partidário e
eleitoral, bem como suas verbas orçamentárias. Tudo para se fazer presente à
memória e aos bolsos dos eleitores que se vendem por qualquer ilusão ou
qualquer “tostão furado”. Agora eu pergunto: como podem os outros cidadãos
competir com essa máquina de triturar novas lideranças?
Em nossa Câmara Municipal e em nossa
Assembleia Legislativa tivemos casos escabrosos que resultaram em condenações
de “representantes do povo” e prisões de funcionários de “altos escalões”. Vez
ou outra deputados e senadores são condenados e até perdem seus mandatos. No
entanto, tudo permanece como dantes no quartel de Abrantes.
Agora a pergunta que
está contida em nossa garganta: E o que fazer? Parafraseando Max Weber (1997), “todo conflito no
parlamento implica não somente numa luta por questões importantes, mas também
numa luta pelo poder pessoal”, mas “quer
amando, quer odiando a política parlamentar – não podemos afastá-la”. Em
outras palavras: ruim com as casas parlamentares, pior sem elas.
Então,
a tarefa é reformular nossos legislativos. Não é tarefa fácil, pois essa
transformação depende dos mesmos vereadores, deputados e senadores que
transformaram nossas casas congressuais em quase casas de tavolagem. Há que
montarmos uma estratégia. Primeiro não reeleger os fichas-sujas, os meio-sujos
e até os quase-sujos. Segundo, para receber o nosso voto, não basta que o
candidato tenha o viés ideológico igual ao nosso; ele tem que ser
explicitamente honesto (não devemos ter bandidos de estimação). Terceiro, e o
mais difícil, devemos também ser honestos e não vendermos nossos votos por
quaisquer duas colheres de mel coado ou dez mil reais autênticos.
Alguém
há de dizer que sou apenas mais um sonhador, um pobre inocente. A minha avó, lá
na quentura de nossa terra natal, já dizia: o idealista é uma besta quadrada, o
pessimista um chato de galocha e o realista é aquele que luta pelo que quer,
embora o que queira seja uma miragem refletida lá longe, no horizonte.
Tribuna
do Norte. Natal, 19 dez. 2019
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