01/08/2014

Marcelo Alves
Crônica/artigo:

O conselho francês

Originalmente construído pelo Cardeal Richelieu (1585-1642), o Palais Royal foi posteriormente incorporado à Coroa Francesa (e lá morou o jovem Luís XIV), passando, no século XVII, às mãos dos Duques de Orleans (que deram à França o Rei Luís Felipe). Foi ponto de jogatina e prostituição e, mais importante, epicentro da Revolução Francesa. Hoje, abriga a Comédie Française, lojas de luxo e antiquários. Com um jardim interno belíssimo, é um dos mais importantes palácios de Paris.

Pois é ali, no Palais Royal - que merece ser visitado, seja você jurista ou não -, que fica o famoso “Conseil Constitucionnel” da França (assim como ali também está o “Conseil d'État”, a Suprema Corte da Justiça Administrativa francesa), órgão essencialmente responsável por realizar o controle de constitucionalidade das leis naquele adorável país.

O Conselho Constitucional da França é composto por nove conselheiros. Três são indicados pelo Presidente da República, três pelo Presidente da Assembleia Nacional e três pelo Presidente do Senado. Não há requisito de idade ou de profissão para compor a Corte (ou seja, não precisa ser jurista ou bacharel em direito, sendo estes, pelo que sei, a minoria). O mandato é de nove anos, vedada a recondução (salvo do membro que tenha assumido, em substituição, um mandato tampão). A cada três anos, para não haver a mudança concomitante de todos os membros, três novos conselheiros são indicados (um por cada um dos Presidentes acima referidos). O Presidente do Conselho Constitucional é indicado pelo Presidente da República. Curiosamente, os Ex-Presidentes da República vivos - atualmente, Valéry Giscard d'Estaing, Jacques Chirac e Nicolas Sarkozy - são membros natos do Conselho, embora, por tradição, não exerçam os seus ofícios.

Tradicionalmente, diz-se que o controle de constitucionalidade exercido pelo Conselho Constitucional francês é político (e não jurisdicional), já que entregue a um órgão de natureza marcadamente política, cujas decisões têm efeitos eminentemente políticos. Razões históricas e principiológicas explicam essa visão peculiar francesa em desfavor do controle jurisdicional de constitucionalidade: um apego extremista ao princípio da separação dos poderes; a desconfiança para com Judiciário que, ao tempo da Revolução Francesa, representava o “ancient régime”; e da ideia de Sièyes (1748-1836) de um “Jurie Constitutionnarire” acima dos outros poderes do Estado. A França, assim, sempre foi o exemplo mais citado de país que adota o controle político de constitucionalidade das leis, sendo verdade que em nenhuma das várias Constituições que a França já possuiu, adotou-se, expressamente, um controle jurisdicional de constitucionalidade. Sempre o controle é confiado a um órgão com forte viés político. Sob o pálio da Constituição francesa de 1958, ainda em vigor, a responsabilidade deste controle é depositada no Conselho Constitucional.

Representando essa visão tradicional, certa vez argumentou Mauro Cappelletti (em “O controle judicial de constitucionalidade das leis no direito comparado”, publicado entre nós em 1984): “É suficientemente clara - e, de resto, mais ou menos reconhecida por numerosos estudiosos franceses - a natureza não propriamente jurisdicional da função exercida pelo Conseil Constitucionnel: e isto não apenas, como escreve um autor, pela natureza antes política que judiciária do órgão, natureza que se revela, quer na escolha e nos status dos membros que dele fazem parte, quer, sobretudo, nas diversas competências do próprio órgão e nas modalidades de seu operar; mas também e especialmente pelo caráter necessário, pelo menos no que diz respeito às leis orgânicas, do controle que se desenvolve, portanto, sem um verdadeiro recurso ou impugnação de parte (ubi non est actio, ibi non est jurisdictio!), bem como pelo caráter preventivo da função de ‘controle’ por aquele órgão exercida. Tal função vem, na verdade, a se inserir - necessariamente, no que concerne às ‘leis orgânicas’, e somente à instância de certas autoridades políticas, no que se refere a outras leis - no próprio item da formação da lei na França: é, afinal de contas, não um verdadeiro controle (a posteriori) da legitimidade constitucional de uma lei para ver se ela é ou não é válida e, por conseguinte, aplicável, mas, antes, um ato (e precisamente um parecer vinculatório) que vem a se inserir no próprio processo de formação da lei - e deste processo assume, portanto, a mesma natureza”.

Todavia, mais recentemente, tem-se enxergado por uma perspectiva diferente a situação do controle de constitucionalidade francês. É muito interessante a abordagem feita por Guillaume Drago (em “Contentieux constitutionnel français”, de 2006, publicação da editora francesa PUF), entre outros, no sentido de que, em virtude dos procedimentos legalmente adotados e de sua própria jurisprudência, o Conselho Constitucional Francês tem caminhado e se aproximado, cada vez mais (e quiçá já tenha alcançado), o modelo de Justiça Constitucional kelseniano ou europeu. Sem dúvida, outrora hostil por tradição política a toda forma de controle jurisdicional das leis, a França, em 1958, dá um primeiro passo em um caminho sem volta rumo ao modelo de Justiça Constitucional europeu. Tem-se, no Conselho Constitucional Francês, a essência do modelo kelseniano: um único tribunal, chamado Conselho (Constitucional), competente para apreciar, de modo concentrado, direto e em abstrato, a constitucionalidade de atos normativos, embora, não se negue, em caráter essencialmente preventivo (e não repressivo).

Não sei você, caro leitor, mas, de minha parte, tendo a concordar com essa abordagem mais recente, que chamarei de evolutiva. Sobretudo levando em conta o novo o art. 61-1 da Constituição francesa, inserido pela Lei Constitucional de 23 de julho de 2008. Com fundamento nele, desde 2010, caso surja, em processo perante uma corte - não importa se da Justiça Comum ou da Justiça Administrativa -, a alegação de que uma disposição legislativa viola os direitos e liberdades garantidos pela Constituição, o Conselho Constitucional pode ser provocado, pelo “Conseil d'État” ou pela “Cour de cassation” (a Suprema Corte da Justiça Comum francesa), a decidir prejudicialmente essa questão constitucional. Trata-se, claramente, de hipótese de controle repressivo ou “contrôle a posteriori” (como prefere chamar o próprio Conselho Constitucional francês).

E que tal conversamos mais sobre isso outro dia? Quem sabe num bate-papo nos jardins do Palais Royal...

Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP

31/07/2014

31 DE JULHO

Manoel Machado de Miranda Henriques

João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor da UFRN, membro do IHGRN e do INRG
 
Não sei de onde surgiu esse Miranda Henriques. Procuro seu rastro em vários documentos da nossa História. Infelizmente, há muitas lacunas nos registros, que impedem a formação de elos genealógicos. Era casado com Ignácia Francisca de Mello. Em 1817, aparece um filho do casal.  Era José Barbosa de Miranda, que foi batizado no dia 1º de maio daquele ano, tendo como padrinhos Bento Luis Gomes de Mello e Izabel de Barros Cunha. José casou, em São Gonçalo, em 18 de novembro de 1838, com Josefa Joaquina de Moraes, filha natural do capitão Lourenço José de Moraes Navarro e Bernarda Muniz de Souza.
Registramos dois filhos de José Barbosa e de Josefa Joaquina: Maria que nasceu aos 22 de abril de 1840, e foi batizada em 1º de maio do mesmo ano tendo como padrinhos Carlos Joaquim de Moraes Navarro, solteiro e Ignácia Francisca de Mello; e João, que nasceu aos seis de maio de 1843, e foi batizado aos dezessete de julho do mesmo ano, em São Gonçalo, tendo como padrinhos Manoel Machado de Miranda Henriques e Ursulina das Virgens de Miranda Henriques.
Ursulina das Virgens, filha de Manoel Machado e Ignácia Francisca, nasceu aos 25 de fevereiro de 1823, e foi batizada aos 25 de março do mesmo ano, tendo como padrinhos João Gomes Carneiro e sua mulher Joanna Baptista. Em um batismo de 1857, Manoel Machado de Miranda Henriques aparece como padrinho acompanhado da filha Ursulina das Virgens de Miranda Henriques. Nesse mesmo ano, outra filha, Amaraldina Carlota de Miranda Henriques, é madrinha e, seu pai, Manoel Machado, padrinho. Um outro filho de Manoel Machado e Ignácia Francisca era Belarmino Machado de Miranda Henriques.
Ignácia Francisca de Mello deve ter casado muito jovem, pois, 22 anos depois do nascimento de José Barbosa, nascia mais uma filha dela com Manoel Machado: Aos vinte e três de setembro de mil oitocentos e trinta e nove, na Vila de São Gonçalo, de minha licença, o coadjutor Alexandre Ferreira Nobre, batizou solenemente a Filonila, nascida a dez de agosto deste mesmo ano, filha legítima de Manoel Machado de Miranda Henriques e Ignácia Francisca de Mello, brancos e moradores em São Gonçalo, desta Freguesia. Foram padrinhos Manoel Gabriel de Carvalho e Marcolina Florentina Pereira da Silva, moradores nesta.
Com o nome de Philonila Tarquínia de Miranda Henriques, a batizada acima aparece como madrinha de Enéas, aos 28 de julho de 1859, filho legítimo de Manoel Gomes Carneiro e Dona Francisca Xavier de Miranda Henriques. Presente, também, Manoel Theofilo Alves Ribeiro, como padrinho. Talvez, essa Francisca Xavier fosse outra filha de Manoel Machado e Ignácia. Eles foram padrinhos, em 1843, de Manoel, filho de Manoel Gomes Carneiro e Francisca Xavier de Miranda Henriques.
Manoel Machado de Miranda Henriques aparece como cunhado de João Gomes Carneiro e Melo, em uma doação de sesmaria, no ano de 1821. Assim, sua esposa, Ignácia Francisca de Mello, deveria ser irmã desse João Gomes. Observamos, que aos quatro de novembro de 1800, na capela de São Gonçalo da Ribeira do Potigi, João Gomes Carneiro, filho legítimo do lisboeta João Gomes Carneiro, e de Anna Ferreira de Miranda, casou com Maria Thereza de Mello, filha legítima do Alferes Antonio Rodrigues Santiago e de sua mulher D. Ignácia Francisca de Mello (irmã de Bento José, o padrinho de José Barbosa de Miranda).  Talvez João Gomes Carneiro e Mello, e Ignácia Francisca de Mello, esposa de Manoel Machado, fossem filhos desses que casaram em 1800.
Manoel Gomes Carneiro e sua esposa Francisca Xavier de Miranda Henriques foram padrinhos, em 1854, de Martinha, filha de João Gomes Carneiro de Mello e Anna Joaquina Teixeira de Souza, ele de São Gonçalo e ela de Angicos. João Gomes tinha fazenda em Cacimbas do Vianna, hoje pertencente ao município de Porto do Mangue. Esse João Gomes, em alguns registros aparece como João Gomes Carneiro Junior.
Em 10 dez de julho de 1871, João Viterbino Gomes Carneiro, filho de Manoel Gomes Carneiro e Francisca Xavier de Miranda Henrique, casou no Sítio São Joaquim, da Freguesia de Angicos, precedendo dispensa de consanguinidade, com Maria Florentina Carneiro de Mello, filha de João Gomes Carneiro (falecido) e Anna Joaquina Teixeira de Sousa; Uma filha deste último casal, Maria Teixeira de Sousa, nascida em São Gonçalo, casou, em 28 de  novembro de 1861,   com José Odorico da Costa Ferreira, filha de Antonio Martins Wladislau e Anna Teixeira de Sousa, também, em Angicos, houve dispensa de consanguinidade. Outra filha do casal, Francisca Bela Carneiro de Mello, casou com Cosme Teixeira Xavier de Carvalho, meu tio-bisavô.
A relação entre os personagens, acima, com Manoel Machado de Miranda Henriques, somente, será mais precisa, caso apareçam outros documentos ainda não encontrados, como um inventário, por exemplo.

Antonio de Manoel Machado de Miranda Henriques

30/07/2014

CASCUDO RELANÇADO


Marcelo Alves
Marcelo Alves20 de julho de 2014 21:22


O tribunal espanhol
Na semana passada, conversamos aqui sobre o Tribunal Constitucional de Portugal. Hoje, sem irmos muito longe, trataremos do Tribunal Constitucional da Espanha. Os países são vizinhos na Península Ibérica. O primeiro, por sinal, já esteve sob dominação do segundo à época dos reis “Filipes” de Espanha (a propósito desse período, chamado de “Siglo de Oro” espanhol, vide a minha crônica “Ordenações e Literatura Filipinas”). De trem ou carro, vai-se facilmente de Lisboa a Madrid. E você, caro leitor, se fizer a viagem, vai gostar. Eu garanto!

Bom, o modelo constitucional espanhol de controle concentrado, previsto pela Constituição de 1978, foi inspirado, segundo se diz, nos exemplos alemão, italiano e francês, apesar de ter incorporado também a via de exceção, sendo um dos modelos mais completos da Europa.

Em conformidade com o art. 159 da Constituição de 1978, possui a Espanha um Tribunal Constitucional composto de doze membros (denominados “Magistrados”), nomeados pelo Rei, sendo quatro por proposição da Câmara, quatro por proposição do Senado, dois por proposição do Governo e dois por proposição do Conselho Geral do Poder Judiciário, todos juristas de reconhecida competência e com mais de quinze anos de exercício profissional. Não são vitalícios, sendo o mandato de nove anos, renovada uma terça parte a cada triênio. O Tribunal atua em Plenária, em “Salas” (que são duas, compostas por seis magistrados cada) e em “Seções” (duas para para cada “Sala”, perfazendo um total de quatro). A Presidência do Tribunal é exercida por um dos seus membros em mandato de três anos, renovável uma vez.

Dentre as várias competências do Tribunal Constitucional, previstas no art. 161 da Constituição, sobreleva a de conhecer o recurso de inconstitucionalidade contra leis e disposições normativas com força de lei (letra “a” do referido artigo). É importante lembrar, já que isso é muito comum na Espanha, que a expressão “recurso”, no caso, quer significar o que, para nós, é denominado de ação.

De conformidade com a Lei Orgânica do Tribunal Constitucional (arts. 1º e 13), as suas decisões através do seu Pleno (não por suas “Salas”) no controle de constitucionalidade - aquilo que se denominou de “doutrina constitucional” (melhor seria chamar de “jurisprudência constitucional”, eu acho) - têm caráter vinculante geral. Como intérprete supremo da Constituição e legislador negativo, o Tribunal, pelo Pleno, ao apreciar a constitucionalidade de uma lei e declará-la inconstitucional, profere uma decisão que tem a eficácia idêntica à da lei que ele apreciou.

Ignacio de Otto (em “Derecho constitucional: sistema de fuentes”, publicado pela editora Ariel), expõe a questão detalhadamente: “A força vinculante desta doutrina do Tribunal Constitucional provém da própria posição do Tribunal, que sua Lei Orgânica define como ‘intérprete supremo da constituição’ (art. 1º), qualificação que não se encontra expressamente na Constituição, mas que resume de modo expressivo as funções constitucionais do próprio Tribunal, conforme sua interpretação prevalece sobre a que tenha sido feita pelo legislador e sobre qualquer outra. Por isso mesmo há que dizer que, a rigor, o único que cria jurisprudência neste sentido é o Tribunal em pleno, não suas Salas, pois a posição de intérprete supremo da Constituição corresponde aquele, porquanto pode impor sua interpretação à do legislador, função que é unicamente da competência do Pleno. Devido a isto é que a Lei Orgânica do Tribunal dispõe, em seu art. 13º, que ‘quando uma Sala considere necessário afastar-se, em qualquer ponto, da doutrina constitucional precedente estabelecida pelo tribunal, a questão será submetida à decisão do Pleno’”.

À semelhança do que ocorre no controle concentrado de constitucionalidade no Brasil, a “doutrina constitucional” do Tribunal espanhol, assim entendida como aquela emanada do Pleno da Corte, se impõe aos tribunais do país. A isto alude a “Ley Orgánica del Poder Judicial” (LOPJ), de 1985, em seu art. 5.1, ao afirmar que os juízes e tribunais, vinculados obviamente à Constituição, “interpretarão e aplicarão as leis e os regulamentos segundo os preceitos e princípios constitucionais, de acordo com a interpretação dos mesmos que resulte das resoluções ditadas pelo Tribunal Constitucional em qualquer tipo de processo”. Com essa afirmação, entretanto, a LOPJ espanhola parece ir além do que se defende no Brasil: em essência, ela equipara a “doutrina” do Tribunal Constitucional à própria Constituição no que se refere ao seu valor normativo para a jurisdição ordinária, pois sempre que exista “doutrina constitucional” sobre um preceito da Constituição os tribunais haverão de interpretar esse preceito segundo aquela (a “doutrina constitucional”).

Interessante, não?

E que tal dar um pulo lá, no Tribunal Constitucional espanhol, para aprender mais? Procure pelo número 6 da Rua Domenico Scarlatti, bem pertinho do campus da gigantesca Universidade Complutense, onde fica, por sua vez, a saudosa (para mim, pelo menos) Casa do Brasil em Madrid. Nesta, em precisando, você terá um bom apoio. Com certeza!

Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP

29/07/2014


1959 – Atividades culturais em Natal

Elísio Augusto de Medeiros e Silva


Empresário, escritor e membro da AEILIJ


No ano do cinquentenário do escritor Euclides da Cunha aconteceram em nossa capital uma série de comemorações euclidianas, que contaram com o apoio de diversos órgãos: Academia Norte-riograndense de Letras, Secretaria de Educação e Cultura, Instituto Histórico e Geográfico, Escola Doméstica de Natal, Prefeitura do Natal, Governo do Estado, Colégio 7 de Setembro, as revistas Cactus e Bando, entre outros.

A convite da poeta Zila Mamede, esteve em Natal o sociólogo Gilberto Freyre, que autografou vários exemplares do seu livro Ordem e Progresso, na Livraria Universitária.

O promotor da Festa das personalidades, jornalista Paulo Macedo, recebeu em nossa capital o maestro Waldemar de Almeida. Também por convite de Paulo esteve em nossa capital o escritor Nilo Pereira, membro da Academia Pernambucana de Letras e da Academia Norte-riograndense de Letras.

Esteve em Natal o escritor Umberto Peregrino, diretor da Biblioteca do Exército, que aqui promoveu uma conferência na semana de encerramento das comemorações euclidianas na Escola Doméstica de Natal. Umberto foi homenageado com um almoço oferecido por Valdemar de Sá em sua residência.

Ainda nesse ano de 1959, a Faculdade de Direito da Universidade do Rio Grande do Norte concedeu o diploma de bacharéis à primeira turma, que teve como paraninfo o professor Edgar Barbosa, cujo discurso teve a melhor repercussão.

Também esteve em nossa Capital a escritora Carmen Annes Dias, autora de E o Nilo continua, que proferiu uma conferência sobre o Egito, nas dependências da Academia Norte-riograndense de Letras.

Nesse ano é lançado mais um livro de Câmara Cascudo – Canto de muro.

A persistência e dedicação de Aluizio Lemos, ainda mantinham em publicação a revista A Juriti, que na antiga edição publicou o livro de versos da poetisa Clarice Palma.

Hélio Galvão lança, na loja de livros de Luiz Gonzaga, o livro Mutirão do Nordeste.

O livro O ciclo do carro de bois no Brasil de Bernardino José de Souza recebeu do Instituto Nacional do Livro o prêmio de “Ensaio e erudição”.

Aguardava ser entregue a uma editora do sul do País o livro Trovadores Potiguares, do escritor Gumercindo Saraiva, que continha em suas páginas as mais belas modinhas do Rio Grande do Norte, escritas e musicadas por autores do Estado.

Nesse ano foi publicado no Rio de Janeiro um livro de Moreira Brandão, que dava uma grande e valiosa contribuição à história do Rio Grande do Norte.

A convite da Academia Norte-riograndense de Letras e do Governo do Estado recebemos a visita do escritor Milton Pedroza e sua comitiva, o crítico Waldemar Cavalcante, o editor Ênio Silveira, o escritor José Conde e o romancista Jorge Amado.

Após o desembarque no Aeroporto Augusto Severo, ficaram hospedados no Grande Hotel, no bairro da Ribeira. Foram recebidos pela Assembleia Legislativa, onde foram saudados pelo Deputado Luis Maranhão Filho.

Na Academia Norte-riograndense de Letras, Milton proferiu um belíssimo discurso, tendo antes sido saudado pelo acadêmico Raimundo Nonato da Silva.

Na sede do ABC Futebol Clube foram recepcionados com um almoço oferecido pelo Governador Dinarte Mariz, ao qual compareceram um grande número de escritores locais.

A comitiva permaneceu três dias em nossa Capital, de onde seguiu para Mossoró, onde foi recebida com grandes festas promovidas pela Prefeitura Municipal e o Instituto Cultural do Oeste.

27/07/2014

Praia




MARACAJAÚ


Jurandyr Navarro

Do Conselho Estadual de Cultura





A praia de Maracajaú derrama suas águas no sentido nor­te da Grande Natal, depois das bandas do Ceará-Mirim. é uma praia aconchegante, até agora em estado selvagem e de beleza natural, onde se ouve, ainda, o doce gorjeio dos pássaros, por se achar distanciada das ondas gasosas e sonoras da poluição.

Magníficos panoramas descortinam o seu firmamento que deslumbra os espíritos mais sensíveis.

À sua entrada, através do aldeamento dos pescadores, o visitante é recepcionado pelo murmúrio suave de sua brisa, balouçando as folhagens dos seus altos coqueiros, qual bosque encantado onde as aves de plumagem colorida cantam a sua feli­cidade.

Olhando o mar de frente, o viandante se depara com o seu Farol plantado dentro do oceano, que, além de despertar curiosi­dade turística, ilumina a vasta escuridão noturna, orientando quem nas águas navega, lembrando, também, gigantesco vaga-lume a atrair, com sua luz intermitente, as aladas falenas de asas brilhantes, para a dança esvoaçante da noite marinha.

Maracajaú se alonga por muitos quilômetros de areia alvinitente e começa a ser conhecida e visitada devido à sua solidão repousante, à sua natural beleza e por sua abundante pesca da lagosta e camarão, os deliciosos crustáceos da nossa costa pes­queira.

Dizem que no Verão passado repetiu-se, ali, a pesca mila­grosa, quando Pedro, o Pescador, lançou a rede do outro lado, puxando 153 peixes saltitantes, que o barco voltou à beira-mar inclinado de tanto peso.

Numa saliência da praia se avista gracioso espaço ocupado por  farfalhante  coqueiral e que se alonga por linda enseada, chamado Ponta dos Anéis.

Nascida numa concha de pérola, uma sereia encantada, de pele bronzeada e de cabelos de matiz aureovioláceo, imagino, foi trazida pela brisa perfumada até a pitoresca Ponta dos Anéis, de Maracajaú, como as ondas levaram Vênus à ilha de Chipre.

Tinha ela a ardência do Sol e a suavidade da Lua. Pela manhã, mergulhava no mar e ficava na linha d'água onde que­bram as ondas, para usufruir do banho refrescante e oxigenado das espumas. À tarde, sentava-se na pedra das caravelas lilases, semisubmersa, contemplando a vibração da ressaca das vagas, beijando os arrecifes de coral. E, à noite, com os olhos cinti­lantes de Minerva, costumava contar as estrelas do Céu, apon­tando para elas, chegando a criar uma verruga na ponta do dedo, confirmando a fábula.

No terceiro dia de lua cheia, as pedrinhas da praia que sua mão tocava se transformavam em colares de búzios para cobri­rem os ombros nus, nas noites de festa. E, numa manhã primaveril, essa sereia encantada metamorfoseou-se no cisne de Leda e deslizou, com o seu porte elegante e altivo, pelo grande lago azul salgado.

Soube-se, um dia, que um pescador daquela praia ficou vesgo e com os olhos de peixe morto, de tanto olhar para ela.

Uma canção de amor, entoada pela harpa do vento, embala os sonhos da bela sereia, nas noites quentes de Verão.