30/04/2016


   
Marcelo Alves
28 de abril às 15:18

Precedentes no NCPC: uma sistematização (II)

Como registrado aqui, o NCPC refere-se aos precedentes judiciais (em sentido estrito ou em sentido amplo) em diversas passagens. Às vezes o faz disciplinando especificamente a temática dos precedentes no “novo” processo civil brasileiro; outras vezes, em dispositivos referentes a institutos processuais que, de alguma forma, têm ligação com o tema. 

Na semana passada, tratamos aqui, resumidamente, dos artigos 926 a 928 do NCPC. 

Hoje conversaremos sobre art. 489 do NCPC, mais especificamente os incisos V e VI do seu § 1º, disposições que, relacionadas especificamente à fundamentação das decisões judiciais, se mostram cruciais para a utilização de precedentes (como fundamento de decisões judiciais) à luz do novo diploma legal. 

Em síntese, entre outras coisas, o art. 489 passa a exigir das decisões judiciais uma fundamentação mais precisa, afirmando, no seu § 1º: “Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento”. 

Trocando em miúdos, o inciso V do § 1º do referido art. 489 do NCPC afirma que não se considera fundamentada a decisão que simplesmente cita um precedente sem demonstrar a pertinência dos seus fundamentos determinantes (leia-se aqui, fazendo uso da expressão cunhada na tradição do “common law”, sua “ratio decidendi”) ao caso concreto, isto é, a pertinência entre a tese/princípio/regra do precedente e aquilo que se acha discutido no caso em julgamento. Na verdade, é pressuposto, para que o julgamento de um caso esteja obrigado (lembremos que o NCPC “criou” uma série de precedentes vinculantes no seu art. 927) ou mesmo persuadido pela decisão de um precedente, que seja demonstrada a identidade, no grau de generalidade adequado (já que uma identidade completa é algo difícil), entre fundamentos determinantes dos dois casos. 

No mais, se os fundamentos determinantes de um precedente não coincidem com os fundamentos determinantes do caso posterior em julgamento, os casos devem ser considerados, pelo tribunal ou juiz do caso posterior, como distintos. Consequentemente, o precedente não será seguido. 

E é aí que entra o inciso VI do § 1º do art. 489 do NCPC. Realçando a importância dos institutos do(a) “distinguishing” e do(a) “overruling”, ele afirma ser necessário, para a refutação de um precedente alegado no caso concreto, demonstrar: (i) que os pressupostos de fato e de direito do precedente e do caso em julgamento, no devido grau de generalidade, não são os mesmos; (ii) e/ou que o precedente alegado já foi devidamente superado por posterior decisão judicial de corte com competência para tanto. 

Como já disse certa vez, a doutrina do “stare decisis”, desenvolvida com o passar dos anos pela tradição do “common law”, prevê técnicas ou circunstâncias que, cuidadosamente analisadas, ensejam a não aplicação do precedente, muito embora, à primeira vista, pareça ser ele de seguimento obrigatório. Das técnicas utilizadas para a não aplicação de um precedente, a da distinção entre os casos – ou seja, do(a) “distinguishing” – é a principal ou, ao menos, a mais comum. Em linhas gerais, se os fatos fundamentais de um precedente, analisados no apropriado nível de generalidade, não coincidem com os fatos fundamentais do caso posterior em julgamento, os casos devem ser considerados, pelo tribunal ou juiz do caso posterior, como distintos. Consequentemente, o precedente não será seguido. Embora tenha relevância quanto aos precedentes obrigatórios, a distinção é importante não apenas como o meio de se evitar um precedente obrigatório, mas também como um meio de se evitar um que tenha caráter meramente persuasivo. 

No que toca ao “overruling” (ou superação do precedente, como afirma o NCPC), lembremos que a doutrina do “stare decisis”, aquela construída na tradição do “common law”, não exige obediência cega às decisões dos casos anteriores. Ela recomenda, com toda ênfase, que os juízes se abeberem da sabedoria do passado, mas permite, em alguns casos, que eles se afastem do que considerarem incorreto. Um dos mecanismos utilizados para tanto é denominado, pela literatura jurídica anglo-americana, precisamente, de “overruling”, que, segundo o “(The) Oxford Companion to Law”, pode ser definido como a atitude de uma corte superior de estabelecer que um precedente seu ou decisão anterior de uma corte inferior, posta a seu conhecimento, era uma afirmação errada do direito e não deve mais ser considerada como precedente. 

Para finalizar, uma constatação: cá entre nós, aplicar esse art. 489, § 1º, V e VI, vai dar um trabalho dos diabos. Imaginem o caso em que vários precedentes são alegados pelas partes, todos sem verdadeira pertinência com a questão em julgamento, devendo o julgador ter que demonstrar fundamentadamente a distinção para cada um deles. Muito bom na teoria, mas, para quem conhece a prática dos nossos juízos, algo praticamente impossível. 

Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP

29/04/2016


28/04/2016

HISTÓRIA INTERESSANTE



ANNE SULLIVAN

Violante Pimentel
A educadora Anne Sullivan, Annie Sullivan, ou Johanna Mansfield Sullivan Macy, (Feeding Hills, Massachusetts, 14 de abril de 1866 – Nova Iorque, 20 de outubro de 1936), tornou-se célebre por haver conseguido educar Helen Keller, uma menina cega, surda e muda, de família rica, e superprotegida. A menina não conhecia o mundo à sua volta. Sabia do que precisava para viver e terminou se tornando altamente agressiva com os familiares, transformando-se em uma verdadeira tirana em sua casa. Sua familia, por compaixão, dava-lhe todas as liberdades, por considerá-la inválida. Helen Keller tinha o domínio total de sua casa, e controlava o comportamento dos seus familiares. Todos temiam suas reações agressivas, principalmente durante as refeições. Ninguém, até então, dera-lhe a mínima educação. Ninguém lhe ensinara nada. Era impossível Helen Keller entender o que era uma pessoa educada. Nunca fora contrariada em nada e nunca ouvira um não dos seus pais ou de qualquer pessoa. Todos a temiam. Ao se deparar com Helen Kelller, a professora Anne Sullivan entendeu que estava diante do maior desafio da sua vida: o desafio de explicar a uma menina cega, surda e muda, como viver no mundo e como entendê-lo. Seu maior objetivo era que Helen Keller fosse tratada como uma pessoa normal. Para isso, a professora entrou em choque com os seus pais, que sempre sentiram pena da filha e nunca a trataram como uma criança normal.

Filha de Thomas Sullivan e Alice Cloesy, fazendeiros imigrantes irlandeses, Anna Sullivan também tinha sido deficiente visual. Contraíra tracoma aos cinco anos, o que quase a levou à cegueira definitiva. Após nove cirurgias, recuperou alguns graus da visão. Sua mãe morreu dois anos depois. O pai, então, abandonou a ela e ao irmão em um orfanato em Tewksbury. Seu irmão, que contraíra tuberculose morreu pouco tempo depois. Anne Sullivan sempre foi vítima da pobreza, e de maus tratos do pai alcoólatra, que chegou a violentá-la. 
Apesar de ter sido deixada em um orfanato, com poucas condições de educação formal, Anne Sullivan conseguiu se sobressair. Quando o presidente da secretaria estadual de instituições de caridade Frank Sanborn, visitou o orfanato de Tewksbury, Anne literalmente se jogou aos seus pés e chorando pediu: " Sr. Sanborn, eu quero ir à escola." 
Depois de recuperar alguns graus da sua visão após uma série de cirurgias, e de se graduar como a oradora da sala em 1886 no Instituto Perkins para Cegos, ela começou sua longa carreira como professora de Helen Keller.
A educadora usou o método da Língua de sinais, através do tato. Helen Keller tinha sete anos, quando Anne Sullivan ali chegou para ser sua mestra. Sua primeira reação, foi agredir a professora, jogando-lhe água no rosto. 
Imediatamente, a moça revidou, atirando-lhe também água no rosto. A discípula chorou, contrariada, pois, até então, ninguém havia reagido a uma agressão sua. A luta foi árdua. As agressões se sucederam e a professora sempre reagia à altura, apesar de falar com delicadeza, e sempre procurar dizer à menina que aquilo estava errado. No começo, os pais da garota se chatearam, mas a professora foi franca, dizendo-lhes que somente daquela forma, Helen Keller se tornaria sociável. O tempo passou, e Anne Sullivan conseguiu um verdadeiro milagre. Helen Keler passou a lhe obedecer e tornou-se dócil. Aos dez anos, aprendeu a falar através de sinais na mão e a ler pelo método Braille.
A senhorita Sullivan começou suas aulas a partir da obediência e do alfabeto ASL Língua de Sinais. Sullivan assistiu às aulas com Helen e monitorou-a através do Instituto Perkins, a Escola de Cambridge para Jovens Senhoras e a Faculdade de Radcliffe. Todos que entraram em contato com Anne Sullivan se surpreenderam com a facilidade de comunicação entre ela e a discípula Helen Keller. 

Alexander Graham Bell, Andrew Carnegie, Henry H. ogers e John Spaulding foram apenas alguns dos que as encontraram e apoiaram.
Ao longo do tempo, muitos duvidaram do êxito que Anne Sullivan teria nessa sua missão. Após Helen se formar, a senhorita Sullivan continuou a acompanhá-la em suas viagens e palestras. Quando Helen se formou em Radcliffe, Anne se casou com um jovem instrutor de Harvard, John Albert Macy, em 1905. Os três viveram juntos até 1912 quado os Macy se separaram. Anne e Helen tinham uma grande demanda de palestras para arrecadar fundos para a Fundação Americana para Cegos. No entanto, por vezes as pessoas eram caridosas e complementavam sua renda. Anne Sullivan não recuperou sua visão completamente, mas ao final de sua vida recebeu o reconhecimento da Universidade Templo , o Instituto Educacional da Escócia e a Fundação Memorial Roosevelt, pelo ensinamento a Helen Keller.

Graças ao grande empenho de Anne Sullivan, Helen Keller foi a primeira mulher cega, surda e muda, a ganhar um diploma, tornando-se apta a conviver em sociedade. Tornou-se escritora e ativista social.

27/04/2016

H O J E



FRANCISCO MARTINS HOMENAGEIA:

 DIULINDA GARCIA TRAZ ATÉ NÓS "ENTRENÓS" SEU NOVO LIVRO DE POEMAS


A arte
A arte expõe os paradoxos,
desconstrói,provoca
e aproxima olhares.

(Diulinda Garcia) 


A poeta Diulinda Garcia lançará no próximo dia 27 de abril, às 19 h, no Fran's Café, em Ponta Negra - Natal-RN,  o seu mais recente livro de poemas "Entrenós", que traz a marca editorial Sarau das Letras. Diulinda Garcia é uma poeta que afirma: "Fazemos parte da tripulação de uma nave de sonhos onde reina a fantasia, que transforma a saudade dos que partem e a solidão dos que ficam em um prelúdio sinfônico de louvor à vida".
Suas produções poéticas tem poetrix,  haikais, minimalistas e versos livres (onde estão a maior parte dos poemas). E uma poeta que canta ao mundo sua imortalidade e que diz ter a capacidade de ressurgir sempre, todo dia, independente da situação em que se encontra:

NÃO APRENDI A MORRER
Embora a vida me doa
Rasgo o tempo
Tiro as vestes
Começo tudo outra vez
Não aprendi a morrer

Eu confesso que não sei quais poemas estarão presentes no novo livro da poeta Diulinda Garcia, mas uma coisa é certa. Sejam quais forem, são belos e valerá muito ter nas mãos, degustar  e sentir prazer com a arte poética dessa mulher que procurar ser imune aos efeitos do tempo.

Parabéns poeta! 



26/04/2016



OS COMPROMISSOS COM O NOVO TEMPO

Valério Mesquita*

O que é intenção, já é deliberação. Os Tribunais de Contas se impõem na estrutura do Estado como ponto de sustentação e equilíbrio. As instituições são permanentes. Seus servidores passam e elas ficam. Devem se adequar ao determinismo da evolução social. Os governantes não podem se distanciar do povo, como se já não precisassem ouvir a sua voz.  Como se o poder não fosse um bem de todos e não tivesse nas suas tessituras mais nobres o dever de promover o bem estar coletivo sem ferir a liberdade e a legalidade. Assim se configuram, nos dias atuais, a responsabilidade e o papel do Tribunal de Contas como instrumento indispensável na democracia moderna. Ele tem que continuar a otimizar, decisiva e amplamente, a sua contribuição para o aprimoramento da vida institucional do Estado. A sua missão maior é lutar para eliminar duas chagas da administração pública: o desvio e o desperdício. E ser parte e artífice, ao mesmo tempo, da obra infindável, inesgotável e sempre renovada: promover a felicidade individual de cada cidadão e cidadã. Controlar não é só punir. É também prevenir, é detectar, é corrigir e orientar.
A trajetória de todo homem público se diferencia quando ele guarda, como titulação verdadeira, os caminhos exatos e insubstituíveis da bondade humana e da disponibilidade de servir neste mundo áspero e às vezes desumano. O fundamental é ter consciência de que é possível o milagre do compartilhamento para a vida ser sempre uma proclamação plena de convivência humana e funcional. Pois, como se vê, há muito a fazer para continuar os níveis de aperfeiçoamento da ação de um Tribunal, no cumprimento dos seus objetivos.
Acosto-me, sem restrição, ao sábio preceito segundo o qual “não são os cargos que dignificam as pessoas, mas as pessoas que dignificam os cargos”.
Relembro, aqui, o esplendor do pensamento do escritor Mário de Andrade (1893 – 1945), no seu “Valioso Tempo dos Maduros”:
“Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para a frente do que já vivi até agora. Tenho muito mais passado do que futuro.”
“Já não tenho tempo para lidar com o supérfluo.”
“Já não tenho tempo para conversas intermináveis...”
“Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas...”
“Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa…”
“Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade. O essencial faz a vida valer a pena. E para mim, basta o essencial!”
Chego à conclusão de que a missão maior do julgador é a de garantir a obediência à lei no uso dos recursos públicos. Deve lutar para realizar, assim, o possível. Não obstante a vontade de ver esse novo tempo seja imensa, mas o modelo do Brasil novo já se encontra à vista.
 (*) Escritor.

25/04/2016

A OBRA DE HENRIQUE CASTRICIANO


 PROJETO
RESTAURANTE LITERÁRIO

A deliciosa obra de
Henrique Castriciano de Souza
O Príncipe dos poetas
norte-rio-grandenses.

FEBRE
Por toda a parte rosas brancas vejo...
Rosas na fímbria loira dos Altares,
Coroadas de amor e de desejo...
Rosas no céu e rosas nos pomares.
Uma roseira o mês de Maio. Aos pares
Surgem, da brisa ao tremulante arpejo,
Estrelas que recordam, sobre os mares,
Rosas envoltas num cerúleo beijo.
E quando Rosa, em cujo nome chora
Esta febre cruel que me devora,
De si me fala, em gargalhadas francas,
Muda-se em rosa a flor
de meus martírios,
O som de sua voz, a luz dos círios...
O próprio Azul desfaz-se em rosas
brancas

 
* Em 1996 o poema “Febre” de H. Castriciano foi
incluído na Ema Enciclopédia, publicada
em Singapura, na Ásia.

 
LIÇÃO ERRADA
A Veríssimo de Toledo
... E o sábio disse:
“Meus senhores, esta
Mulher que vemos sobre a laje fria,
Foi como a noite vinda após um dia,
De cerração n’um ermo de floresta.
Seus olhos, verdes como verde a
glesta,
Tinham brilhos de fúnebre ardentia,
Fosforecentes como a pedraria
De um colar de princesa em festa.
Não teve coração! E, n’isto, o sábio
Rasgou-lhe o seio... E recuou.
Seu lábio
Contraiu-se n’um riso
estranho e lento...
No seio havia um coração partido,
Morto de amor, de lágrimas ungido,
E lacerado pelo sofrimento!

 
*O soneto “Lição errada” foi publicado
em 1997 na "Antologia de Sonetos", do
escritor Napoleão Valadares, em
Brasilia/DF.

PROGRAMAÇÃO  

De 01 a 30 de abril / 2016
CONVITE
O Diretor de Centro de Educação Rural Alfredo Mesquita Filho, juntamente com a Coordenação Pedagógica, Professores e Alunos, têm a honra de convidá-los a participar da Palestra do Pesquisador e Historiador Anderson Tavares de Lyra, e das atividades de Encerramento do Projeto “Restaurante Literário: a deliciosa obra de Henrique Castriciano de Souza.
Ivanildo Antônio de Lima
Diretor
Dia 26/04/2016 ( terça-feira)
 Hora: a partir das 14h00
 Local: Centro de Educação Rural Alfredo Mesquita Filho, CERU, Traíras
 Abertura;
 Apresentação Cultural;
 Leitura de poesias por alunos da escola;
 Palestra com o historiador e pesquisador Anderson Tavares de Lyra.
 Tema: Vida e obra de Henrique Castriciano.
Dia 27/04/2016 ( quarta-feira)
 Hora: a partir das 08h00
 Local: Centro de Educação Rural Alfredo Mesquita Filho, CERU, Traíras
 Abertura oficial do Restaurante Literário com:
 Apresentação musical com os músicos: Rafael Melo, Pâmela Araújo e Camille Teixeira (estudante do 9º ano).
 Apresentação da peça Teatral “A Promessa”, escrita por Henrique Castriciano e encenada por crianças em 1904, na abertura do Teatro Carlos Gomes
 Leituras de poesias, cordéis e crônicas escritas por Henrique Castriciano.


APOIO:
ACADEMIA MACAIBENSE DE LETRAS

24/04/2016

UMA FOTO DE SAUDADE DA UFRN




NOITE DA CRUVIANA, um repensar

Um amigo de Brasília perguntou-me como se poderia  pressentir os sinais de que em uma determinada noite a cruviana sairia. Ele havia lido um texto sobre o assunto e ficou interessado em passar para os filhos essa vivência.
Brasília é uma cidade onde predominam apartamentos em prédios de seis andares. Aqui nós temos pilotis barulhentos e áreas comuns movimentadas, além do barulho aborrecido dos elevadores, somado ao tagarelar das pessoas a todo momento. Imagino não haver condições propícias nem atmosfera capaz de atrair o inusitado, o sutil, que dependem de um conluio da alma com o inesperado para se manifestarem. Sem chance.
Em Brasília há também aqueles que moram em bairros onde predominam as casas que, aqui, guardam uma razoável distância entre si. Eu resido em um desses locais. Apesar de as pessoas estarem em casas bem cercadas, os níveis de violência se equiparam aos menores do Brasil.
Falar da cruviana é retornar à cidade da minha infância, com o verbo no pretérito, onde a usina de luz parava de funcionar às dez da noite. É se portar como criança em uma cidade por onde passa um belo rio repleto de embarcações, grandes e pequenas, com seus ruídos característicos. Na escuridão das noites estreladas, velas eram içadas e arreadas, sob o augúrio dos marujos, aqui chamados de barcaceiros, além dos movimentos próprios do rio cuja foz fica logo ali, com o mar tentando subjugá-lo a toda hora.
Para que se percebesse a presença da cruviana, formatada em noites onde o escuro absoluto dava abrigo ao bicho papão, acoitava lobisomens fugidios, e em que o barulho das serrações assombrava crianças inocentes  que tremiam em suas redes brancas com cheiro de carinho, parece-me de fácil entendimento.
Hoje, especialmente em cidades de grande porte, como imaginarmos ter sensibilidade e ambiente propício para perceber o assobio fino de um vento noturno que leva consigo uma aura de mistério, com uma estranha sensação de um frio que corre fino pelo corpo, tal qual uma pizza metafísica meio mágica meio mística? Na infância, nas noites da cruviana, as crianças percebiam um som agudo, fininho, tipo assobio, arrastando-se pela noite, fazendo com que se encurvassem ainda mais em suas redes, assumindo uma posição quase fetal.
Em Brasília, algumas vezes, despertado pelo som de uma ambulância em plena madrugada, já tentei perscrutar os ruídos característicos e os eflúvios sonoros atípicos das noites do Lago Norte, na tentativa de identificar os murmúrios da cruviana. Em vão.
Pelos mesmos motivos, já não se percebem os sacis, os gnomos, os duendes nem as mulas sem cabeça. Afinal, “é preciso chuva para chover”.
Os tempos são outros. Temo que a percepção dos movimentos da cruviana não seja para qualquer um, nem para qualquer lugar ou momento. Ao menos nestes tempos raivosos.
Temo que a maioria desta geração Whatsapp jamais consiga, em algum momento, agendar um encontro com o lado mágico da vida, onde mora a fantasia.
Evaldo Oliveira

Sócio Correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do RN

23/04/2016

EIDER FURTADO, UMA LEGENDA (*)


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            Na data de hoje a comunidade potiguar e o mundo cultural comemora os 92 anos de nascimento do eminente acadêmico e causídico EIDER FURTADO DE MENDONÇA E MENEZES, natalense nascido aos 23 de abril de 1924, filho de Gil Furtado de Mendonça e Menezes e D. Maria Emília Furtado, aos quais homenageou no livro “Audiência de um Tempo vivido” (2004), primeiro livro de uma série de trabalhos memorialistas.

        Iniciou seus estudos com a Professora Águeda de Oliveira Sucupira (Naná), numa escola municipal postada na Av. Rio Branco (local onde o BB construiu sua sede da cidade alta), nos idos de 1931 a 1934, sobre quem dedicou um capítulo especial no seu livro de memórias, alcançando as suas auxiliares  D. Helena, Preta e Auta, sobre as quais derrama suas emoções mais caras, aliada a um amor quase filial, incluídas também em suas permanentes orações, acrescentando “Por isso, eu também tenho saudades da minha primeira professorinha”.

Em 1935 foi para o Colégio Pedro Segundo, do Prof. Severino Bezerra de Melo, daí para a escola particular do Prof. Antônio Fagundes, posteriormente o tradicional Atheneu Norteriograndense, em 1937, aos 13 anos de idade, tendo concluído o Colegial em 1944 e, somente em 1955, com 30 anos de idade, submete-se ao vestibular da Faculdade de Direito de Natal.

Bacharel em Direito pela UFRN, 1ª Turma, em 9 de outubro de 1959, denominada “Turma Clóvis Bevilácqua”, paraninfo Edgar Barbosa e confererencista da Aula da saudade Paulo Viveiros.

Em 1968 iniciou o seu magistério universitário, nas lides do Direito Financeiro e Tributário, depois Direito Comercial, Direito do Trabalho e Mercado de Capitais, tendo ainda demonstrado os seus conhecimentos em outras searas do Direito, quando transferido para o Curso de Direito, lotado no Departamento de Direito Privado, até a sua aposentadoria em março de 1991. Recebeu a láurea de “Professor Emérito da URFRN” em 17 de dezembro de 1997.     

         Sua vida é pontilhada de atividades diversificadas, pois teve papel de relevo na radiofonia potiguar (Diretor da Rádio Poti, ao tempo em que, ainda, Rádio Educadora de Natal), não sem antes, nos idos dos anos 40, integrar, como músico, a Orquestra de Salão daquela rádio e o Quinteto “Alberto Maranhão” e teve passagem pelo teatro amador.

Foi jornalista consagrado e dirigente nas Rádios Poti e Nordeste.

Cidadão exemplar, que reparte o comando de uma bela família com o auxílio indispensável da sua eterna musa D. Helenita, cuja presença é uma constante em todos os momentos de sua existência e a ela dedica incontáveis registros da história de sua vida e sobre quem proclama ter sido a primeira e única namorada.
Membro da Academia de Letras Jurídicas do Rio Grande do Norte, do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte e da Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, além de honorário e benemérico de várias outras Instituições.
         Na advocacia se orgulha de registrar seu estágio com o jurista Hélio Mamede de Freitas Galvão e chegou a chefiar a Ordem dos Advogados, Seção do Rio Grande do Norte, num pleito memorável, que marcou a transição da velha Instituição para os novos tempos, substituindo o Dr. Claudionor Telógio de Andrade após 20 anos de presidência, ali permanecendo por 8 anos consecutivos (01/02/69 a 01/02/77), sendo hoje o mais antigo dos Membros Honorários Vitalícios. 
           É fiel à sua profissão até os dias presentes, compartilhando o escritório com filhos e netos. O mundo intelectual está de parabéns.


(*)Carlos Roberto de Miranda Gomes, escritor.