ARTIGO DO PREFEITO RAIMUNDO SOARES DE SOUZA PUBLICADO NO DIÁRIO DE PERNAMBUCO, EDIÇÃO DE 23.06.1068.
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CONTRADIÇÕES DO
DESENVOLVIMENTO REGIONAL
Raimundo Soares de Souza, prefeito de Mossoró.
O que sempre se temeu, afinal acontece. Aí está um Nordeste cada vez
mais pobre, ou pelo menos com crescimento hipertrófico, ao lado de
outro privilegiado que vem absorvendo, quase que totalmente, os
incentivos fiscais da SUDENE.
Não faltaram vozes sensatas que, dentro e fora do Congresso,
alertaram contra os riscos da discriminação dos recursos postos à
disposição do Nordeste, dentro de uma filosofia e uma pragmática algo
genial, trazidas por Celso Furtado da experiência do sul da Itália.
Faltou o necessário cuidado e a ausência de integração do
desenvolvimento está provocando contradições de um Nordeste pobre e
outro rico, capaz de gerar desníveis perigosos nesta faixa explosiva do
país.
Os protestos começam a surgir. Falando para os estagiários da
Escola Superior de Guerra, o Governador Walfredo Gurgel impugnou essa
distorção, fazendo com a veemência que tem faltado às suas intervenções,
ou do vice-governador, nas reuniões do Conselho Deliberativo da Agência
Regional de Desenvolvimento. Também o Presidente da Confederação
Nacional do Comércio demonstrou que 70% dos incentivos fiscais vêm sendo
absorvidos pela Bahia e Pernambuco, 10% pelo Ceará e os restantes 20%
para os sete estados que, juntamente com os primeiros, integram o
polígono definido como área de atuação da SUDENE.
Dito isto, a conclusão a que nos leva a análise mais isenta, é a
responsabilidade da SUDENE da qual, todavia, poderá ainda
penitenciar-se.
Não entendemos válido argumento, segundo o qual o privilégio
alcançado pelos Estados de Pernambuco e Bahia foi uma consequência
natural do esforço de se prepararem para o desenvolvimento, com maior
eficiência e velocidade. Exatamente ai surge nítida cumplicidade da
SUDENE, que, ao invés de adoção de critérios de equidade na distribuição
de recursos destinados à infraestrutura da região, reservou-se aos
dois, ao sabor de óbvias pressões. Podem ser as maiores forças política
dos Grandes Estados e sua mais expressiva representatividade; a
vinculação de determinados setores a interesses da terra natal, o que
seria legítimo; e mesmo a omissão ou comodismo de determinados
Governadores, indiferentes à partilha unilateral. O certo é que,
enquanto uns obtiveram o indispensável suporte financeiro para a
execução de projetos de infraestrutura, a maioria viu inveterar-se sem
solução toda sua problemática fundamental.
Por isso, alguns se preparam mais rapidamente que os outros, para receber o desenvolvimento.
Particularizando o caso do Rio Grande do Norte, a injustiça é tanto
mais clamorosa, envolvendo, porém, outras responsabilidades, não mais
omissivas.
No setor, por exemplo, de energia, cuidou-se com todo empenho de
executar um plano de eletrificação que, quase deliberadamente, deixou à
parte a zona mais rica do Estado, compreendida na já consolidada
microrregião de Mossoró, classificada como polo de desenvolvimento pela
própria SUDENE, pelo Serviço Geográfico do Exército e pelo Ministério do
Planejamento, por suas notórias influências e irradiações numa vasta
área que vai desde o estuário do rio Açu, em Macau, até a Paraíba e
baixo Jaguaribe, com o planalto intervalar do Apodi. O pouco interesse
do Governo do Estado e outras solicitações adiaram a solução regional
por cinco anos, entregues que ficaram, com seus próprios e limitados
recursos, às lideranças locais. Foi uma luta sem tréguas, em que tudo
aconteceu inclusive o desvio de material adquirido para a linha de
transmissão de Mossoró, com verbas orçamentárias específicas de nosso
sistema, mas desviado para as obras do Ceará.
João Gonçalves, cidadão honorário de Mossoró, foi o primeiro a
empolgar-se pela nossa luta, e, diante dos empresários do Paraná e Rio
Grande do Sul que trouxemos a esta cidade, afirmou que a SUDENE
destacaria verbas para as soluções da energia e do nosso saneamento
básico. Em Fortaleza, o mesmo João Gonçalves assegurou ao Ministro Mauro
Thibau que a SUDENE, atribuiria recursos para a total substituição da
rede urbana de distribuição, compromisso que foi honrado por Rubens
Costa e General Euler Bentes, de modo que tivemos afinal as linhas da
CHESF a 22 de dezembro do ano passado, em solenidade presidida pelo
Marechal Costa e Silva.
A solução, na verdade, tardou como vem tardando a implantação da
rede de esgotos sanitários e ampliação do sistema de abastecimento de
água.
Através do Departamento Nacional da Produção Mineral, do Ministério
das Minas e Energia, resolvemos o problema do manancial indispensável
ao abastecimento, encontrando, no rico aquífero de Arenito Assu
inferior, a uma profundidade média de 915 m, água de excepcional
qualidade, classificada pelo órgão competente mineral natural
hipertermal. Três poços foram perfurados e se acham em pleno
desenvolvimento, com um jorro de 264.000 litros horários que poderão ser
elevados para 540m3/hora, se equipados os poços com bombas de sucção e
recalque apropriados.
Mas a água que jorra há meses não foi aproveitada, provocando mal
estar e descrença que não podemos enfrentar à míngua de recursos
próprios. Enquanto isso, a população da cidade chega à beira dos noventa
mil habitantes, considerando nosso índice de crescimento que, num
espaço de 20 anos, se vem mantendo inalterado, à taxa de 7,1%,
implicando numa duplicação da população local de nove em nove anos e com
essa realidade demográfica não temos ainda um sistema de esgotos
sanitários. Entretanto, outras cidades encravadas em áreas
privilegiadas, com menores condições de liderança e porte, já dispõem de
saneamento básico, o que é mais uma contradição que não entendemos.
Como não entendemos que se tenha permitido o desvio de verbas destinadas
aos esgotos sanitários de Mossoró e Caicó para idêntico serviço em
Natal, o que é chocante e desalentador.
Entretanto, a despeito de todas estas contradições, não esmorecemos
na luta, nem nós que detemos parcela de responsabilidade da coisa
pública, nem o provo, através de uma salutar conscientização comunitária
que o distingue. Acreditamos numa melhor compreensão dos setores
responsáveis de forma a garantir, em curto prazo, a solução de todos os
problemas infraestruturais desta região, capaz de defini-la como área
prioritária para investimentos públicos e privados.
Na verdade, muito temos a oferecer ao Nordeste e ao Brasil. Basta
que se considere que, das cinco matérias primas básicas ao processo de
desenvolvimento industrial, temos o sal, o calcário e, provavelmente, o
petróleo que, há vários meses forra em plena cidade aguardando uma
definição, em termos comerciais, da Petrobrás que estuda o assunto com o
maior interesse. O fato revela-se como sinal altamente promissor da
presença de óleo em nossa bacia sedimentar. Temos, além disto, uma
reserva inesgotável de gipsita, aguardando uma unidade industrial
produtora de ácido sulfúrico, deixando o cimento “Portland” como
subproduto. Toda uma linha de produção industrial da mais nobre aguarda
os incentivos do Poder Público para que se transforme nossa abundante
matéria prima em riqueza para o país.
E a drenagem que antevemos próxima, está ligada a preocupações
orientadas para o fortalecimento de nossa estrutura agrária e
valorização de nossos recursos humanos.
Com esse objetivo, já criamos quatro faculdades de nível superior,
inclusive a Escola Superior de Agricultura, uma das mais bem instaladas e
equipadas do país, graças aos recursos aprovados pelo Instituto
Nacional de desenvolvimento Agrário, que, além disto, promove no momento
a eletrificação dos vales do Assú e Apodi, incrementa as cooperativas
agropastoris e parte para a implantação de usina de pasteurização de
leite, um matadouro industrial, nesta cidade, e do seu Distrito
Industrial.
Dispondo assim, de tantas condições favoráveis, em que se podem
incluir um hotel de primeira categoria, estância hidromineral a ser
explorada e sistema viário asfaltado, ligando-a a centros como Fortaleza
e Natal até 1970, a cidade de Mossoró tem de fato excelentes
perspectivas à sua frente.
Temos absoluta confiança no futuro, por acreditar que, conforme já
manifestou o atual Superintendente da SUDENE, homem equilibrado, justo e
patriota, uma reformulação dos antigos critérios do órgão possa
eliminar as negativas contradições de nosso desenvolvimento.