Estação ferroviária de Papary
02/12/2016
texto Gustavo Sobral e ilustração Arthur Seabra
Não vem mais o trem de ferro, comendo o espaço com fumaça esbaforida
de sua chaminé ambulante, trazendo carga, puxando gente, comendo léguas
no leva e traz da vida e das coisas que se precisa. Seu sossego é
temporário e se chama estação. É ali que, para embarque e desembarque,
se vê a vida, nos abraços de despedida, na alegria da chegada.
Só ele, trem máquina, sabe que a vida é uma plataforma, tem sempre
gente que chega, gente que parte, certo de que tudo flui e nada
perecerá, por isso silencia, se acalma, sossega o sopro quando para.
Nesse caminho, de ponto em ponto, serpenteia pela sua estrada de ferro,
caminho único e traçado que o leva sempre ao mesmo destino provisório e
temporário, o espaço da estação. Entre apitos assinalados de seu
movimento, uma parada numa pequena cidade foi seu pouso, Papary, que não
se chamava município de Nísia Floresta/RN, a augusta educadora
brasileira, e guardou a estação no tempo da memória.
O estilo antigo do prédio é de 1881, de um Brasil ainda escravo,
monarquista e à beira de mudar tudo isso para abolicionista e
republicano. Por ela todo esse movimento se passou no meio do canavial
que a cerca de verde e preserva o silêncio que hoje conserva como a
estrutura da estação, dizem que projeto e execução de engenheiros
ingleses por encomenda do presidente da província, tudo parte de um
plano de ligar o país por ferrovias e de se desenvolver o estado por
estradas de ferro.
Alvenaria e tijolo desenharam uma construção de sabor neoclássico e
com arcos, frontão triangular com óculo, platibandas, portas frontais,
duas maiores e outras menores, e janelas, cobertura de quatro águas,
patrimônio histórico tombado e restaurado nos detalhes, o piso é o
mesmo, a cor amarela, que brilha no canavial e a caixa d’água de ferro,
que rasga o céu plano, própria para abastecer as locomotivas. O trânsito
que se mantém depois de desativada, um século depois, é para o
restaurante, que lá funciona com mesas sobre os trilhos e comida
regional.