Notícia alvissareira foi recebida pelo IHGRN, a liberação de serviços e obras cuja autorização fora solicitada pela Casa da Memória ao INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL (IPHAN), conforme Parecer Técnico nº 084/2014, abaixo reproduzido:
27/08/2014
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Grande Ponto
Luís da Câmara Cascudo
O Grande Ponto tem uma história bem diversa da que suponhamos existir. É, incontestavelmente, a situação geográfica mais popular da cidade. Localiza, fixa, delimita. Todo natalense conhece o Grande Ponto. Nada recorda o nome. Entretanto, é inegável para toda população - "Você se encontra comigo no Grande Ponto", "Vamos chegar no Grande Ponto". Contudo, o que era denominado de Grande Ponto desapareceu há mais de meio século. Era uma casa comercial, de duas portas para a Rio Branco e três para a Pedro Soares, que, depois de 30, tomou o nome de João Pessoa. Essa mercearia era de propriedade do português Custódio de Almeida, mercearia afreguesada, com algumas mesas para se tomar cerveja; no salão ao lado, dois bilhares utilizados pelos devotos dos divertimentos. Não era o lugar freqüentado por meu grupo, que, nessa época, década de 20/30, preferia o Bar Majestique, antes chamado de Potiguarânia, o grande bar da minha geração, situado na rua Ulisses Caldas, e freqüentado por jornalistas, professores, literatos. Também freqüentamos o Bar Delícia, na Praça Augusto Severo. Estes eram os dois pontos mais freqüentados em Natal, na época. A minha geração toda passou por lá: Othoniel Meneses, Jorge Fernandes, etc.; era o bar - o Majestique - da bebida, da classe média, da intelectualidade. O Grande Ponto, ao contrário, era um lugar de passagem, uma fixação puramente topográfica. Era, na geografia da cidade, ponto fixo. Grande Ponto foi denominação daquela esquina e aquela esquina se tornou imóvel e catalisadora nas memórias. Havia, porém, uma outra esquina - para quem estuda trânsito, a posição das esquinas tem uma grande função delimitadora de bairro e fixadora de local - a qual Djalma Maranhão denominou-a de "esquina do mundo", a esquina da Tavares de Lira com a rua Dr. Barata. Ele a chamou de "esquina do mundo", pois era a Ribeira o bairro socialmente mais conhecido, e a esquina o ponto, além de um dos mais conhecidos também, o de mais fácil indicação. Dizia-se: "Você se encontra comigo na esquina do mundo." Era a esquina da Tavares de Lyra.
Quanto ao Grande Ponto, eu, muito acidentalmente, passava por lá; e quando isto ocorria, bebia-se cerveja assistindo ao jogo de bilhar - aí por volta de 23, 24, 25. O português Custódio de Almeida, dono da mercearia e casado com uma filha do Capitão, mais tarde Coronel Toscano de Brito, era exatamente relacionado, simpático, grande conservador, conversava muito, sempre vestido de branco, baixo, grosso; depois de 30, mudou-se para o Recife, onde abriu uma mercearia diante do mercado São José.
Mas o nome Grande Ponto permanecia na fachada de seu edifício, que dava para a Rio Branco. E era também um grande ponto. Por ali cruzavam-se os bondes elétricos. Pela rua Pedro Soares, então João Pessoa, vinham os bondes de Tirol e Petrópolis. Pela Rio Branco, chegavam os da Ribeira e Alecrim. Cruzavam-se todos no Grande Ponto. Era o ponto de encontro. Depois de 30, ficou famoso pelos políticos, partidários, eleitorado, que se reuniam no Grande Ponto. Era o chamariz. Os comunistas tentaram pôr o nome de Praça Vermelha, em 35. Djalma Maranhão chegou a chamar-lhe Praça da Imprensa. Mas o povo defendeu sua preferência, que era Grande Ponto. E o Grande Ponto marcava a situação topográfica da cidade. Todo mundo sabia as tabelas de táxis e o pagamento de bonde da Ribeira ao Grande Ponto, do Alecrim ao Grande Ponto, de Petrópolis ao Grande Ponto, do Tirol ao Grande Ponto. Não tinha outra localização. Não se falava na casa de Ângelo Roselli, onde está, hoje, o Hotel Ducal, que era um palacete, habitado por um parente dele, deputado e um dos primeiros advogados da cidade.
Também existia, nessa época, o Natal Clube, maior centro social da cidade, situado na outra esquina. À tarde e à noite, jogo de pôquer, copas. Porém o nome que de fato subsistia era o da mercearia de Custódio de Almeida, o Grande Ponto, que ficou.
Grande Ponto. Há 50 anos não se escutava a sua história. Mas o próprio Aldo Pereira aludia à situação topográfica dizendo, "Grande Ponto", e não existe, em Natal, topônimo mais conhecido que ele, mesmo nas gerações posteriores, e que não alcançaram aquele edifício de Custódio de Almeida - cujo caixeiro, Amaro Mesquita, trouxe outro episódio emocional: caixeirinho moreno, pobre, humilde, varrendo a calçada, parava o movimento da vassoura e dizia: "Nesse lugar vai ser o meu sobrado" ou "eu farei aqui o meu sobrado". E fez. Construiu um edifício de vários andares, botando abaixo a mercearia da esquina na época, o maior sobrado de Natal, e que ainda hoje está aí. O caixeirinho Amaro Mesquita chegou a ser um grande comerciante de Natal. Mesmo o sobrado, ninguém dizia: "Você se encontra comigo em Amaro Mesquita". Os cafés, os bares já existiam na rua João Pessoa. Também ninguém se referia a eles. Só se falava: "Você se encontra comigo no Grande Ponto". E o Grande Ponto não existia mais. Contudo, era uma presença e continuação. Este é o meu depoimento.
Natal, 11 de junho de 1981
Luís da Câmara Cascudo
In Grande Ponto - Antologia do Laboratório de Criatividade/UFRN - 1981
Luís da Câmara Cascudo
O Grande Ponto tem uma história bem diversa da que suponhamos existir. É, incontestavelmente, a situação geográfica mais popular da cidade. Localiza, fixa, delimita. Todo natalense conhece o Grande Ponto. Nada recorda o nome. Entretanto, é inegável para toda população - "Você se encontra comigo no Grande Ponto", "Vamos chegar no Grande Ponto". Contudo, o que era denominado de Grande Ponto desapareceu há mais de meio século. Era uma casa comercial, de duas portas para a Rio Branco e três para a Pedro Soares, que, depois de 30, tomou o nome de João Pessoa. Essa mercearia era de propriedade do português Custódio de Almeida, mercearia afreguesada, com algumas mesas para se tomar cerveja; no salão ao lado, dois bilhares utilizados pelos devotos dos divertimentos. Não era o lugar freqüentado por meu grupo, que, nessa época, década de 20/30, preferia o Bar Majestique, antes chamado de Potiguarânia, o grande bar da minha geração, situado na rua Ulisses Caldas, e freqüentado por jornalistas, professores, literatos. Também freqüentamos o Bar Delícia, na Praça Augusto Severo. Estes eram os dois pontos mais freqüentados em Natal, na época. A minha geração toda passou por lá: Othoniel Meneses, Jorge Fernandes, etc.; era o bar - o Majestique - da bebida, da classe média, da intelectualidade. O Grande Ponto, ao contrário, era um lugar de passagem, uma fixação puramente topográfica. Era, na geografia da cidade, ponto fixo. Grande Ponto foi denominação daquela esquina e aquela esquina se tornou imóvel e catalisadora nas memórias. Havia, porém, uma outra esquina - para quem estuda trânsito, a posição das esquinas tem uma grande função delimitadora de bairro e fixadora de local - a qual Djalma Maranhão denominou-a de "esquina do mundo", a esquina da Tavares de Lira com a rua Dr. Barata. Ele a chamou de "esquina do mundo", pois era a Ribeira o bairro socialmente mais conhecido, e a esquina o ponto, além de um dos mais conhecidos também, o de mais fácil indicação. Dizia-se: "Você se encontra comigo na esquina do mundo." Era a esquina da Tavares de Lyra.
Quanto ao Grande Ponto, eu, muito acidentalmente, passava por lá; e quando isto ocorria, bebia-se cerveja assistindo ao jogo de bilhar - aí por volta de 23, 24, 25. O português Custódio de Almeida, dono da mercearia e casado com uma filha do Capitão, mais tarde Coronel Toscano de Brito, era exatamente relacionado, simpático, grande conservador, conversava muito, sempre vestido de branco, baixo, grosso; depois de 30, mudou-se para o Recife, onde abriu uma mercearia diante do mercado São José.
Mas o nome Grande Ponto permanecia na fachada de seu edifício, que dava para a Rio Branco. E era também um grande ponto. Por ali cruzavam-se os bondes elétricos. Pela rua Pedro Soares, então João Pessoa, vinham os bondes de Tirol e Petrópolis. Pela Rio Branco, chegavam os da Ribeira e Alecrim. Cruzavam-se todos no Grande Ponto. Era o ponto de encontro. Depois de 30, ficou famoso pelos políticos, partidários, eleitorado, que se reuniam no Grande Ponto. Era o chamariz. Os comunistas tentaram pôr o nome de Praça Vermelha, em 35. Djalma Maranhão chegou a chamar-lhe Praça da Imprensa. Mas o povo defendeu sua preferência, que era Grande Ponto. E o Grande Ponto marcava a situação topográfica da cidade. Todo mundo sabia as tabelas de táxis e o pagamento de bonde da Ribeira ao Grande Ponto, do Alecrim ao Grande Ponto, de Petrópolis ao Grande Ponto, do Tirol ao Grande Ponto. Não tinha outra localização. Não se falava na casa de Ângelo Roselli, onde está, hoje, o Hotel Ducal, que era um palacete, habitado por um parente dele, deputado e um dos primeiros advogados da cidade.
Também existia, nessa época, o Natal Clube, maior centro social da cidade, situado na outra esquina. À tarde e à noite, jogo de pôquer, copas. Porém o nome que de fato subsistia era o da mercearia de Custódio de Almeida, o Grande Ponto, que ficou.
Grande Ponto. Há 50 anos não se escutava a sua história. Mas o próprio Aldo Pereira aludia à situação topográfica dizendo, "Grande Ponto", e não existe, em Natal, topônimo mais conhecido que ele, mesmo nas gerações posteriores, e que não alcançaram aquele edifício de Custódio de Almeida - cujo caixeiro, Amaro Mesquita, trouxe outro episódio emocional: caixeirinho moreno, pobre, humilde, varrendo a calçada, parava o movimento da vassoura e dizia: "Nesse lugar vai ser o meu sobrado" ou "eu farei aqui o meu sobrado". E fez. Construiu um edifício de vários andares, botando abaixo a mercearia da esquina na época, o maior sobrado de Natal, e que ainda hoje está aí. O caixeirinho Amaro Mesquita chegou a ser um grande comerciante de Natal. Mesmo o sobrado, ninguém dizia: "Você se encontra comigo em Amaro Mesquita". Os cafés, os bares já existiam na rua João Pessoa. Também ninguém se referia a eles. Só se falava: "Você se encontra comigo no Grande Ponto". E o Grande Ponto não existia mais. Contudo, era uma presença e continuação. Este é o meu depoimento.
Natal, 11 de junho de 1981
Luís da Câmara Cascudo
In Grande Ponto - Antologia do Laboratório de Criatividade/UFRN - 1981
Repassando...
O direito de receber cadeiras de rodas motorizadas
pelo SUS consta de uma Portaria de 25-06-2013
mas nem a mídia nem o governo divulgam.
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26/08/2014
LIVROS
Crônica/artigo publicada ontem na Tribuna do Norte (de Natal/RN):
Minhas livrarias em Paris (I)
Não faz muito tempo, em três crônicas (“Minhas livrarias em Londres I,
II e III”), escrevi sobre as livrarias da capital do Reino Unido.
Chegou a vez de “passearmos”, dando continuidade ao que eu chamei
naquela ocasião de “turismo literário”, pelas livrarias da capital da
França, a agradabilíssima Paris, onde morei/estudei faz alguns anos.
Novamente lá estive, em rápida passagem de estudos, em abril deste ano,
com papel e caneta sempre à mão, tudo anotando, já imaginando escrever
este riscado.
Paris está repleta de livrarias. Bem mais do que
Londres, pelo menos no que toca a pequenos estabelecimentos. Constatei
isso já no entardecer do primeiro dia dessa última estada, ao subirmos,
cansados mas felizes, a rua Monsieur le Prince, em direção ao pequenino
Hotel Saint-Paul Rive-Gauche, no bairro de Saint-Germain-des-Prés.
Em razão disso, para dar um “norte” à coisa, vou restringir nosso
“passeio”, basicamente, a duas regiões na margem esquerda do rio Sena (a
“rive gauche”), o Quartier Latin e o referido bairro de
Saint-Germain-des-Prés, as áreas da cidade a mim mais familiares, eu já
confesso. Assim como em Londres, deixo outras regiões de Paris de lado
repetindo a lição de Ludwig Wittgenstein (1889-1951): “sobre o que não
se pode falar, melhor calar”. E levando em conta as minhas preferências,
misturando livrarias com o turismo mais geral (porque “turistar” apenas
em livrarias “ninguém merece”), faremos esse “tour” em duas ou três
crônicas, não cansando muito o leitor, eu espero.
Comecemos
pela região de Saint-Germain-des-Prés. Por ali, tenho duas livrarias (e
dois programinhas de turista, porque ninguém é de ferro) a sugerir.
Uma delas é a Livraria La Procure (na verdade, uma das lojas dessa
cadeia), que fica no número 3 da Rue Mézières (se for de metrô,
recomendo descer na estação Saint-Sulpice). Ela é especializada em
religião (especialmente no cristianismo), filosofia, política, história e
nas ciências humanas e sociais como um todo. Mas possui também um bom
acervo de livros de arte, guias de viagens e de ficção em geral. Em
termos de volume e qualidade de acervo, é a melhor pedida em
Saint-Germain-des-Prés. De quebra, na imediações da livraria, você pode
fazer duas visitas maravilhosas. Primeiramente, à Église Saint-Sulpice,
que fica a dois passos da La Procure. Da calçada da livraria dá para ver
a imponente fachada dessa igreja que é muito referida na literatura,
como, por exemplo, recentemente, no balado “The Da Vinci Code” (2003),
de Dan Brown (1964-). Sugiro, também, dar um pulo nos Jardins de
Luxemburgo, que, com seu Palácio e suas fontes, ficam umas duas quadras
mais para o sul. E ali, talvez, tomar um chocolate ou um café lendo um
“Livre de Poche” comprado na La Procure.
No mais, sinceramente,
se você está interessado em livros, desaconselho ir à gigantesca FENAC
da Rue de Rennes, que fica não muito longe da La Procure. Se outrora
essa FENAC possuía um enorme acervo livros (era assim em 2006, quando
estudei, bem pertinho de dali, na Alliance Française Paris), isso foi
substituído, certamente por motivos comerciais, por uma profusão de
coisitas de som, imagem e informática em geral. Se você gosta de
megalivrarias, tem coisa muito melhor, como veremos, lá para as bandas
do Quartier Latin. Pode crer em mim.
Já se você gosta de
livrarias pequeninas, tenho um ótima dica em Saint-Germain-des-Prés:
L’Ecume des Pages, que fica no número 174 boulevard Saint-Germain (metrô
Saint-Germain-des-Prés). Ela é pequenina, basicamente um só ambiente,
com um acervo diversificado (literatura em prosa e poesia, tanto
francesa como estrangeira, crítica literária, filosofia, história,
livros sobre arte e cinema e por aí vai), mas selecionadíssimo.
Entretanto, o melhor da L’Ecume des Pages, devo dizer, é a sua
vizinhança. Ele está colada ao Cafe de Flore (número 172 do Boulevard
Saint-Germain), a dois passos do Cafe Les Deux Magots (que fica número 6
da Place de Saint-Germain-des-Prés) e defronte à Brasserie Lipp (número
151 do Boulevard Saint-Germain). Reza a lenda que por ali passaram - e
sentaram, para um café ou para um porre - os surrealistas Andre Breton
(1896-1966) e Raymond Queneau (1903-1976), Jean-Paul Sartre (1905-1980) e
Simone de Beauvoir (1908-1986), James Joyce (1882-1941), Ernest
Hemingway (1899-1961), Jean Genet (1910-1986), Albert Camus (1913-1960) e
um sem número mais de outros intelectuais.
Com ou sem um livro
na mão, pare por ali, escolha um dos três estabelecimentos e sente.
Peça um café e veja a rua passar. Fizemos isso em uma manhã de
primavera. Eu mais que recomendo: eu exijo, eu imploro.
E após
esse café, sugiro uma curta caminhada em direção ao Quartier Latin,
percorrendo o Boulevard Saint-Germain. É isso que faremos, em busca de
mais livrarias, na semana que vem.
Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP
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25/08/2014
Blog
Utilidade pública do IHGRN é reconhecida
Foi
aprovado em primeira discussão, na sessão ordinária desta segunda-feira
(25), o Projeto de Lei de autoria da vereadora Júlia Arruda que
reconhece de Utilidade Pública Municipal o Instituto Histórico e
Geográfico do Rio Grande do Norte (IHGRN). O objetivo é tornar pública a
importância do IHGRN para a história do estado.
Fundado há 112 anos, o Instituto
Histórico e Geográfico é a mais antiga instituição cultural do Rio
Grande do Norte e diariamente recebe pesquisadores, estudantes,
professores e membros de diversos outros segmentos que buscam
informações e subsídios para elaboração de trabalhos acadêmicos e
científicos, tais como: documentos, fotografias, cópias de atos
normativos estaduais, livros e demais objetos que retratam a história
potiguar.
“O IHGRN tem sido um verdadeiro
guardião da nossa memória, preservando um rico acervo que conta a
história do nosso estado, e, embora seja uma instituição de natureza
privada, presta relevantes serviços públicos”, destacou a vereadora
Júlia Arruda.
Ribeira – Década de 1940
Elísio
Augusto de Medeiros e Silva
Empresário,
escritor e membro da AEILIJ
Relembro em um lampejo da memória, e
inicio um passeio solitário, através de minhas recordações ribeirinhas. Lembro
de coisas daquela época.
As ruas da Ribeira ainda vestem uma
alma e são capazes de sentir e transmitir as lembranças dos sentimentos
antigos.
Ainda me lembro parcialmente como era
na década de 1940. Com o advento da Segunda Guerra, Natal passou a ser um
cenário urbano bem diferente. Contudo, os moradores ainda se conheciam e
cumprimentavam-se. O comércio era vibrante e havia intensa movimentação de
estrangeiros, em função da guerra. O progresso do bairro era visível! Lojas
modernas, casarões luxuosos e prédios imponentes na Avenida Duque de Caxias.
A Avenida Tavares de Lira, ainda calçada
por paralelepípedos, era entrecortada por várias ruas até chegar ao seu cais.
Os bondes elétricos a cruzavam e seguiam em direção à Avenida Junqueira Aires.
A cidade passou a ser violentada pelos
rumores diários das fortalezas voadoras e nas nossas ruas cruzavam milhares de
soldados em transbordo para as batalhas no norte da África e na Europa.
A Praça Augusto Severo com a estação
ferroviária repleta de pessoas, que chegavam ou aguardavam a saída dos trens a
vapor. A presença de homens famosos como Joel McCrea, Tyrone Power, Fredric
March, Humphrey Bogart e outros astros era comum.
Hoje, as ruas do bairro são pobres de
aparência, não muito movimentadas, mas mantém a sua história própria.
Naquela época, o rio Potengi tinha as
águas limpas, despoluídas, onde se podia mergulhar em segurança, tomar banho,
nadar, pescar...
Ali, o sol estacionava o seu fogo e
parecia conhecer todos os frequentadores e moradores do bairro pelo nome.
Os bate-papos rápidos nas portas dos
cafés, a conversa prolongada nos bares, e o trafegar incessante dos vendedores ambulantes
de rua. Não existem mais.
A presença americana mudara os hábitos
locais, os homens passaram a usar “slack” e, aos poucos, abandonaram a gravata
e o paletó.
A brisa do Potengi refrescava a
varanda do Grande Hotel nos dias de intenso calor. Como todos sabem, a Ribeira
é o bairro mais quente de nossa capital.
À tardinha, o badalar dos sinos da
Igreja do Bom Jesus chamava os fiéis à Praça José da Penha. A igreja, símbolo
do bairro, elegante, esbelta, por muito tempo foi a mais procurada da capital
para a realização de casamentos, batizados e primeiras comunhões.
À noite, depois do belíssimo pôr do
sol, a lua surgia com seu brilho prateado, invadindo as ruas, becos e avenidas,
para se banhar nas águas do Potengi.
Nas janelas das casas de família, as
moças suspiravam à espera dos seus namorados, sob olhares vigilantes dos pais.
Na saída do Teatro Carlos Gomes, a lua
observava a partida dos espectadores, parecendo aguardar os comentários do
espetáculo teatral.
Depois das nove da noite, as famílias
recolhiam as cadeiras das calçadas. As ruas desocupavam e todos procuravam o
aconchego de suas casas.
Pelas ruas ficavam apenas os bêbados e
notívagos, que se deliciavam com as cervejas geladas nos bares que permaneciam
abertos.
Nos bares da Ribeira ouvia-se as
músicas cantadas por Bing Crosby, Frank Sinatra, Louis Armstrong (...) que logo
foram aceitas pela população local.
As noitadas de luxúria dos cabarés da
Quinze de Novembro estavam apenas iniciando.
Pela madrugada, as ruas desertas do
bairro ribeirinho começavam novamente a se povoar – eram os costumeiros vendedores
matinais (leiteiros, padeiros, cuscuzeiros...) que começavam seu trabalho
diário.
O bairro é protagonista de dezenas,
centenas, milhares de histórias – algumas interessantes, outras nem tanto. Mas,
com certeza, ali ainda se assiste diariamente um esplendoroso pôr do sol. Vale
a pena conferir!
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