Casa Mariana
texto Gustavo Sobral e ilustração Arthur Seabra
Casa da poeta Elizabeth Bishop em Ouro Preto
Quando a chuva goteja descendo pelas águas da casa, o horizonte já é cinza. Aquela névoa forma uma cortina flutuante que encobre o tudo mais adiante. Quando a chuva goteja já se preparou o tempo que faz de Ouro Preto uma cidade suspensa nas nuvens. Tudo o que é sólido flutua no ar. Uma terra montanhosa, em poesia de aclives e declives, que a cada subida e descida revela uma paisagem no silêncio. Serras, montanhas, vales, tudo pontuado pelo casario.
A casa é uma casa de poeta, feita do singelo, do menor, com esmero, com cuidado e cercada pela simplicidade. Para a poesia, a residência é o encanto. Enquanto a bruma enevoa o tempo, o passado evoca a história dessa casa. Elizabeth Bishop, poeta norte-americana, vem viver no Brasil e compra uma casinha em Minas, Ouro Preto. 1965, ano da compra. E mais três anos de transformação de ruínas em casa. A amiga Marianne Moore, que insistia para a empreitada, foi homenageada, e ficou a Casa Mariana. Casa antiga, colonial do século XVIII, imprecisa data, quinhentos e treze metros quadrados.
Construída sobre um rochedo, desce em terraços, jardins, pomar, e cai num muro de pedra. Sua cerca é um rio que corre lá embaixo desenhando o terreno. O telhado, a poeta anotou que tinha a forma de uma lagosta emborcada. Assoalho de madeira, poucos móveis e antigos, todos úteis, poltronas para ler e escrever, uma cama confortável para amanhecer no pequeno quarto. Café da manhã e vista para o tempo pela janela de vidro; vaso com flores sobre a mesa, lareira de ferro trazida dos EUA para aquecer a sala.
Um abajur aqui, outro acolá, para brilhar à noite. Armário para livros. Chaleira na cozinha para água do café e experimentos de receitas. Gatos pela sala. Ali, quando a vida passava no sossego, nasciam poemas. E assim se escreveu na casa a fase de Ouro Preto na vida de uma poeta americana que, se viveu uma vida atribulada nos seus descaminhos, resolveu na poesia os retratos da vida.
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