03/09/2015


Natal, o patinho feio

. João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Matemático, sócio do IHGRN e do INRG.
 
Jerônimo de Albuquerque, quando recebeu a Fortaleza dos Reis Magos, tinha uma missão a cumprir: apaziguar os índios a fim de se poder instalar a cidade do Rio Grande. Em 25 de dezembro de 1599, dia do Natal de Jesus Cristo, a nossa cidade foi inaugurada.
Mas o berço da nossa cidade parece que não atraia as pessoas que vinham para cá, tendo muitas delas moradias nas redondezas. Os relatos dos nossos visitantes do passado não eram nada elogiosos, começando com Nassau, que já encontrou a cidade destruída pelos embates aqui travados, e sem nenhuma melhoria por parte de seus comandados. Alguns moradores solicitaram na época da presença dos batavos por aqui a construção de uma nova cidade. Tollenare e Koster também não fizeram nenhum elogio maior nas suas anotações.
Em um dos relatórios dos holandeses sobre o Rio Grande, estava escrito:Já teve uma cidade chamada Cidade do Natal, situada a uma légua e meia do Castelo Ceulen, rio acima, mas está totalmente arruinada, pelo que foi consentido aos escabinos e moradores levantar uma nova cidade em Potigi, pois é terreno fértil e melhor situado para os seus habitantes. Deverão construir de início um Paço da Câmara para aí terem o seu tribunal de justiça.
Koster, em 1810, quando aqui esteve, escreveu: Cheguei às 11 horas da manhã à cidade do Natal, situada sobre a margem do Rio Grande ou Potengi. Um estrangeiro que, por acaso, venha a desembarcar nesse ponto, chegando nessa costa do Brasil, teria uma opinião desagradável do estado da população nesse País, porque, se lugares como esse são chamados cidades, como seriam as vilas e aldeias? Esse julgamento não havia de ser fundamentado e certo porque muitas aldeias, no Brasil mesmo, ultrapassam  esta cidade. O predicamento não lhe foi dado pelo que é, ou pelo que haja sido, mas na expectativa do que venha a ser para o futuro.
Tollenare, que viveu em Recife, nos anos de 1816 e 1817, escreveu: Natal, conquanto capital, é ainda assaz insignificante; conta apenas 700 habitantes; mas, espera-se que chegará a um alto grau de prosperidade, porque o seu porto, que pode receber navios de 150 toneladas é excelente e próximo das regiões cultivadas.
Sendo um centro de defesa de nossa Costa, o Rio Grande do Norte e sua cidade, não merecera,, por isso, maior atenção, principalmente por sua dependência com a Bahia, Pernambuco e Paraíba.
Mais adiante, ainda no século XIX, quiseram mudar novamente a capital do Rio Grande. É o que encontramos no relatório com que abriu a 1ª sessão ordinária da Assembleia Legislativa Provincial do Rio Grande do Norte o Exmo. Sr. Governador Dr. Henrique Pereira Lucena, no dia 5 de outubro de 1872,  quando falou sobre a construção da estrada de ferro
“No relatório do meu antecessor encontrareis, em apenso, cópia do contrato que em 8 de junho último celebrou com o engenheiro da província João Carlos Greenhalgh e o major Affonso de Paula de Albuquerque Maranhão, em virtude de autorização que lhe foi concedida pela lei nº 630 de 26 de novembro de 1870, para a construção de uma estrada de ferro pelo sistema –Tram-way, que partindo desta capital se dirija ao vale do Ceará-mirim, passando pelo de S. Gonçalo, e de uma ponte de ferro de sistema misto sobre o Rio Potengi no lugar Refóles.
Conquanto o referido contrato esteja somente dependente de vossa aprovação na parte relativa à ponte, todavia  entendo que esta circunstância não impede que o aprecieis sobre todas as suas faces, a fim de verificardes, como é do vosso dever, se nele foram ou não consultados e devidamente protegidos os direitos e interesses  da província, principalmente no tocante à mudança da capital, que já tem preocupado mais de uma administração e ao próprio governo geral, e que em um contrato, como o de que se trata, não devia ser esquecida, mas sim tomada na maior consideração, e sujeita a um detido e refletido exame.
Pelos dados estatísticos que vos tenho apresentado, vê-se que a província do Rio Grande do Norte não é tão pobre, como à primeira vista parece, e compreende-se facilmente que em um futuro mais ou menos remoto que sejam removidas as causas primordiais do atraso de sua agricultura e comercio, facilitando-se-lhe, além disso, os meios de transporte, de que tanto precisa.
Posto que com mais de 80 léguas de costa arenosa e estéril possui ela, no entanto, terrenos de uma fertilidade assombrosa, apropriados à cultura de cana do açúcar, fumo, algodão e mesmo do café, que produz maravilhosamente nos lugares denominados – Extremoz e Arêz.
A exportação do açúcar e do algodão faz-se já em larga escala, competindo o primeiro desses produtos, muito superior ao da Paraíba, com o de Pernambuco, nos mercados estrangeiros;  outranto, porém, não pode dizer-se do fumo, que muito mal cultivado, é ainda pessimamente preparado, assim como do café, cuja cultura nem ao menos foi ensaiada.
É realmente para admirar, que uma província, que noutras áreas adquirira os foros de criadora, e que no tempo da guerra da restauração holandesa servia de celeiro à cidade do Recife, que ela extraía o gado e farinha de mandioca, de que precisava para sustento de sua população faminta, mande hoje aos talhos de sua capital número mais que limitado de gado bovino, magro, cansado e por preço elevadíssimo, chegando a importar diretamente das província limítrofes e algumas vezes mesmo do Rio de Janeiro a farinha precisa para seu consumo.
Além da geral incúria e falta de iniciativa de seus habitantes (é forçoso dizê-lo), cumpre apontar como uma as principais causas desse estado desanimador, em que se acham todas as fontes de produção e riqueza da província, a péssima posição topográfica de sua capital, o pior lugar, sem contestação alguma de toda a província, quer como cidade igual a outras do interior, quer como sede principal da autoridade e centro produtor donde se irradiem para as extremidades a civilização, comércio, indústria e artes.
Situada na margem direita do Potengi, ou Rio Grande, a uma légua pouco mais ou menos de sua foz, acha-se a cidade do Natal, por assim dizer, comprimida e asfixiada, do lado do Sul e Leste por alteroso morros de areia, mais ou menos movediça e improdutiva, e do lado de Este por um longo e imenso lençol d’água, que para o oceano conduz o Potengi.
O seu pequeno comércio acha-se inteiramente avassalado ao da praça de Pernambuco, e mais ou menos sujeito ao de algumas povoações circunvizinhas, onde a facilidade do transporte tem tornado mais cômodo e menos dispendioso o tráfico mercantil.
É-lhe pouco abundante a água potável, e faltam-se absolutamente as estradas regulares e fáceis que a ponham em comunicação com o interior da província  da qual se acha, por assim dizer sequestrada.
No exterior, em um raio de mais de duas léguas quase nenhuma cultura; no interior causa dó ver as suas ruas estreitas e tortuosas, compostas ela mor parte de palhoças, cercadas de matos, verdadeiras capoeiras, e de imundícies.
A ideia, pois, da transferência da capital para um outro local, para a planície denominada –Carnaubinha, por exemplo, fronteira a Guarapes, é por demais transcendente e de necessidade indeclinável, visto ser o único ponto conhecido que mais vantagens oferece para isso.
O lugar ali é inteiramente plano na extensão de uma a duas léguas quadradas; indo suave e gradualmente subindo para o interior das terras, a ponto de se tornar quase insensível o pendor do terreno. Acham-se à pequena distância, quase à mão, o barro, a areia, a cal e a madeira necessária para a construção, além de sofrível pedra de cantaria e pedra própria para o calçamento à meia légua pouco mais ou menos de distância. Possui considerável abundancia d’água potável da melhor qualidade, notando-se uma lagoa ou poço na Carnaubinha, uma fonte d’água cristalina e dois fortes riachos perenes em Guarapes, além do caudaloso rio Pitimbú, que corre à menos de uma légua distante; o Cajupiranga não menos caudaloso, poucas braças mais longe, e entre ambos a formosíssima lagoa Parnamirim.
Mudando para aquele lugar a capital, e lançada sobre o rio uma pequena ponte de madeira que, quando muito poderá custar uns 20:000$000, ficará a cidade admiravelmente situada, e para melhor me exprimir, colocada no centro de um vasto perímetro constelado de cidades e povoados mais ou menos distantes, tais como S. José e Ceará-mirim à cinco léguas, aproximadamente, cada uma com estradas traçadas em terreno plano e consistente; Extremoz, com sua extensa e piscosa lagoa; S. Gonçalo, Macaíba, Santo Antonio, Utinga, Ferreiro Torto e Pitimbú; e finalmente a cidade do Natal a três léguas por água, podendo muitas dessas povoações servi-lhe  de arrabaldes.
Além disso, convém notar que o tráfico mercantil em Guarapes, em tempo em que ali ainda residia o major Fabrício, lutou com vantagem  com o do Natal e sobrepujou o da Macaíba, apesar de ser Fabrício negociante único naquele lugar; afluindo de todos os lados compradores  aos seus armazéns, até mesmo do sertão da Paraíba e desta capital.
Como sabeis, da sua foz até o ponto de Guarapes, forma o Potengi uma verdadeira doca natural de mais de três léguas de extensão, e de profundidade mais ou menos considerável, servindo-lhe de segundo quebra-mar a ponta do morro e os bancos de areia denominados – As velhas - , fronteiros ao porto da Redinha; o que o torna de incontestável superioridade sobre o da Paraíba, e quiçá sobre o de Pernambuco, embora careça de melhoramentos.
Com uma profundidade variável de 3 a 7 pés acomodou o porto Guarapes por vezes galeras de mais de 500 toneladas de arqueação. Somente no exercício de 1869 a 1870 carregaram naquele porto para fora do Império vinte navios de diferentes lotações; ombreando desta forma com o porto do Natal, que dentro do mesmo período carregou vinte e um.
Como vereis pelo mapa, em apenso, a diferença entre as medidas dos carregamentos dos dois sobreditos portos nos dez últimos exercícios andou por 27/10 % (?); diferença que só por aí constitui um dos melhores argumentos a favor do Guarapes, principalmente se atender-se que até 1868 a casa comercial Fabrício & C. lutou com sérios tropeços, que posteriormente foram removidos, e que no penúltimo exercício de 1870 a 1871 resolveu ela acabar com todo o negócio por motivo de moléstia de seu proprietário.
Com relação à estrada de ferro contratada, a primazia de Guarapes sobre Natal não sofre discussão.
O capital orçado para a estrada de que se trata, é de 800:000$000 e a garantia que a província tem de pagar anualmente, na razão de 6% é de 48:000$000. Ora, se a capital for transferida para Guarapes a estrada custará apenas metade da quantia orçada, isto é, 400:000$000, descendo também a garantia à metade, que vem a ser 24:000$000. A ponte no porto do Natal, segundo o contrato, custará 250:000$000, enquanto que a que se fizer no de Guarapes não excederá talvez de 20:000$000.
Ainda com relação a ponte, nota-se que não devendo ela ser movediça, mas sim fixa, segundo o contrato, a navegação do rio por vapores e navios de alto bordo, na distância de três léguas, se tornará impossível; porquanto o rio ficará literalmente fechado para tais embarcações; inconveniente este que não se dará no porto de Guarapes, porque, desse ponto para cima, o rio só pode ser navegado por barcaças e canoas.
Considere-se mais, que a estrada de ferro devendo acompanhar uma as margens do rio, e sendo ambas alagadas, incultas e desabitadas, nenhum lucro dará aos empreiteiros ou à companhia, que se organizar, principalmente nos primeiros dez ou vinte anos; além de que quase todos os produtos  que atualmente tem saída pelo porto da Macaíba continuarão a vir por água para esta cidade,  por ser esta espécie de transporte mais cômoda e barata. Colocada, porém, a capital em Guarapes, e devendo dali partir a estrada de ferro, esta percorrerá uma zona toda povoada e cultivada, e nenhuma concorrência sofrerá da parte do rio para o transporte das mercadorias, que tiveram de ser conduzidas àquele mercado.
Eis, Senhores, o que me cumpria dizer-vos com referência a um assunto de tanta magnitude, e a que se liga tão estreitamento o futuro da província. Considerai, que são já 273 anos que a cidade do Natal é a capital da província. E que o seu aspecto é o de uma vila insignificante e atrasadíssima do interior.
Considerai, que a província é um corpo sem cabeça, e que é devido exclusivamente a esta circunstância que ela se conserva à retaguarda de todas as suas irmãs.
Cumpre arrancá-la desse estado de abatimento e de torpor. Não vos entregueis à inércia e ao indiferentismo, ao contrário, reagi com todas as vossas forças contra estas duas traças destruidoras de todo o progresso.

02/09/2015


PANDEMIA E PANDEMÔNIO


Valério Mesquita*

Mesquita.valerio@gmail.com


A vida da gente, hoje em dia, chega a doer e a enjoar. Sobrepondo-se à lógica, aí estão os mistérios do mundo. Ele parece apodrecer cotidianamente. E acho essas razões um tanto metafísicas mas, perfeitamente racionais e cabíveis à espécie. Apesar da revolução das ciências, em todos os campos de atividade, há uma angústia indagativa porque tudo piora quando a humanidade progride materialmente. Muito antes, nas esquinas do mundo, a fatalidade das guerras ditadas pela imprudência interrompia a esperança do ser humano no dia de amanhã. Tudo leva a crer, no crepúsculo dos nossos dias, que a escalada geométrica da dificuldade de se viver no planeta, hoje tão afetado pela superpopulação e a crise da falta de alimentos, é que ingressamos no corredor escuro do Armagedom.

A vida passa e diante dos nossos olhos segue um desfile barulhento de excessos. Excessos e abusos perturbadores provocados pelo braço do homem. Vejam só, por que surgem na atmosfera (o ar que respiramos) vírus gripais, infecciosos e contagiosos que se multiplicam e se transformam virando pandemia? No processo de mutação ultrapassam a eficácia da vacina e se propagam com surpreendente rapidez, induzindo-nos acreditar que a camada superior da terra e as defesas do corpo humano estão comprometidas por atos insanos do próprio homem. Os continentes, desde os mais industrializados aos mais

pobres, desérticos, quentes, superpovoados, até as  florestas tropicais em compasso progressivo de extermínio, incluindo os mares revoltos, revelam-me recôndita preocupação com o final dos tempos.

Igual em perigo à pandemia, mora vizinho o pandemônio. O tumulto do trânsito em Natal está trazendo estresse e hospitalizando muita gente. Avaliem as cidades maiores! Semana passada, entre 18h e 19h30, gastei de automóvel trinta minutos do bairro de Lagoa Nova ao Natal Shopping. O número de veículos hoje na capital resgata a “saudade de mim mesmo”, como disse o poeta português. Esse grave fato estatístico não preocupa apenas pelo dano físico de acidentes, mas igualmente, pela nova geração de ansiosos, psicóticos e depressivos. E haja consumo de benzodiazepínicos. Diariamente em Natal, acontece de dois a quatro acidentes com motos. A malha viária não comporta mais o enxame de ônibus, “ligeirinhos” antipáticos e imprudentes, automóveis e utilitários de luxo, que lembram a crise do Senado.

Todavia, o pandemônio não se encerra aí. O assalto à mão armada não apenas reside ao lado, mas está dentro de casa fazendo reféns. Com armas modernas e de grosso calibre os marginais já são um número maior que o efetivo policial. Segurança no Brasil é uma ilusão congratulatória. Somente os bobos acreditam e agradecem. Ainda iremos assistir, se não planejarem logo uma solução, desfilando nas ruas e bairros as forças armadas do país, envolvendo-se na estratégia de resguardar a cidadania que é vida e que significa tanto quanto a defesa da soberania do país. Igual ou pior do que a invasão do território nacional é o lar ultrajado, violentado e saqueado da família brasileira que, no dizer de Rui Barbosa, “é a pátria amplificada”.


(*) Escritor

01/09/2015

INICIAMOS SETEMBRO - VEJA O CALENDÁRIO

IHGRN



INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO RIO GRANDE DO NORTE – IHGRN
PROPOSTA DE CALENDÁRIO PARA O SEGUNDO SEMESTRE DE 2015



SETEMBRO
DIA 11 – PALESTRA ALUSIVA À SEMANA DA PÁTRIA (Jurandyr Navarro da Costa)e (POSSE DOS NOVOS SÓCIOS)
DIA 14 – COMEMORAÇÃO DA FUNDAÇÃO DA UBE-RN
DIA 14 – ÚLTIMO DIA PARA RECEBIMENTO DE COLABORAÇÃO PARA A REVISTA DO IHGRN nº 91/2015
DIA 30 – PRAZO FINAL PARA REGISTRO DE CHAPAS

OUTUBRO
SEMANA DO ENCONTRO DOS ESCRITORES
30 – LANÇAMENTO DA REVISTA Nº 91 DO IHGRN

NOVEMBRO
DIA 10 – DIA DA ELEIÇÃO

DEZEMBRO
DIA 11 – CONFRATERNIZAÇÃO NATALINA NO LARGO “VICENTE DE LEMOS”
DIA 28 – INÍCIO DO RECESSO

31/08/2015

LUTA PELA DESOBSTRUÇÃO
DO CANAL DO CURURU


Claudionor Barroso Barbalho
Sócio Efetivo

Há muito a população dos municípios de Arez e Papary reclamam pela abertura do canal do Cururu ou Camurupim, esgoto das águas das lagoas de Papary e Papeba.
Com a intenção de observar e verificar a utilidade e exeqüibilidade da obra reclamada, sua Excelência o Governador Dr. Pedro Velho visitou no  sábado 13 de novembro de 1893,  a vila de Papary  acompanhado do Desembargador Ferreira de Melo, do Engenheiro Junqueira Aires, do Tenente Cícero Monteiro, Theodózio Paiva e do ajudante de ordens Joaquim Lustosa.
Na Estação  o Dr. Pedro Velho foi recebido por um numeroso grupo de distintos cidadãos que o acompanharam até a residência do Chefe Republicano José Araújo, onde ficou hospedado juntamente com sua comitiva.  Tratados com a mais cavalheirosa gentileza, os visitantes foram constantemente cercados pelo povo e por pessoas vindas dos municípios vizinhos.
No dia seguinte a comitiva governamental deslocou-se até a Barra.  Eram cerca de 40 cavaleiros:  José de Araújo e José de Góis, do município de Papary, Joaquim Felismino de Albuquerque Maranhão, Joaquim de Oliveira, João Joaquim de Sales, Pedro Marques de Meneses e João Pegado Cortez, todos estes de Arez, além de muitos outros.
O percurso foi feito rapidamente até a povoação de Campo de Santana, onde a comitiva se demorou por alguns minutos, antes de prosseguir a viagem até o mar, que distava cerca de quatro quilômetros.  Esse último trecho da viagem, foram feitos, uns de canoa e outros a cavalo, chegando por volta de 11 horas da manhã ao Camurupim.
Verificou-se in loco, que a barra estava quase obstruída, e o canal, que há poucos anos era largo e profundo, achava-se agora reduzido a um pequeno fio d’água.
Segundo o Dr. Junqueira Aires se, o serviço projetado for concluído, certamente irá corrigir ou atenuar a situação de perigo em que vive o município de Papary, caso contrário se a obstrução da atual barra persistir e as dunas continuarem a avançar impedindo o escoamento das águas para o mar, não tardará que todo o município de Papary seja invadido pelo crescimento do volume d’água da lagoa, que não encontrando esgoto, avançará em direção da Vila.
Da Barra do Camurupim voltaram os visitantes á Campo de Santana, onde foram cavalheirosamente hospedados pelo cidadão Acioli, abastado proprietário do lugar, e que não poupou esforços para obsequiar o ilustre governador e sua caravana.  Pelas quatro horas da tarde regressaram todos a Papary, para a residência do senhor José Araújo.
Durante o jantar, uma excelente orquestra composta de exímios e conhecidos instrumentalistas de Papary e Arez, foram cumprimentar o Exmo. Governador, fazendo-se ouvir um belo repertório magistralmente executado.  Os músicos de Arez foram levados por João Pegado Cortez, que era o chefe político de maior expressão na região naqueles tempos.
Na manhã seguinte regressaram os viajantes para a Estação de São José de Mipibu, onde tomaram o trem de volta para a capital.





29/08/2015

A CASA DA CULTURA NAIR MESQUITA

Valério Mesquita*
Mesquita.valerio@gmail.com

Permitam que o testemunho evocativo presida as minhas palavras.
 A casa da rua Dr. Francisco da Cruz tem a força do resgate das estações. Quantos fatos idos e vividos, quantos passos e olhares perdidos no tempo posso recolher, nos compartimentos, no jardim impregnados nas folhas, nas rosas, nas pétalas dos “dedais de ouro” ou no jasmineiro debruçado há mais de sessenta anos sobre o muro da calçada e cansado de dar boa noite? A estátua da deusa Minerva, de louça portuguesa, chantada no centro do jardim, guarda sobranceira a beleza e o perfume das rosas. Mas a maior e mais antiga delas encantou-se. Deixando-a de cultivá-las associou-se, agregou-se a elas através do doce mistério contemplativo das manhãs, das repetidas manhãs de ressurreição, de que nos falou o escritor Nilo Pereira.
Câmara Cascudo, disse, certa vez, imerso nas brumas dos oitenta anos, que “era uma saudade em vida agarrada ao sonho de continuar a viver”. Não há força mais dramática na passagem do ser humano pela vida do que a do senso trágico da sua própria brevidade.
A residência em foco remonta ao final do século dezenove para o início do século vinte, quando foi adquirida pelo comerciante Alfredo Adolfo de Mesquita, filho de Manoel Carneiro de Mesquita, oriundo do estado da Paraíba. Alfredo Adolfo de Mesquita, meu avô, além de agro-pecuarista, proprietário das fazendas Arvoredo, Telha e Lamarão, exerceu atividade comercial em Macaíba no ramo de lojas de roupas, calçados e bijuterias, bem assim em Natal à rua Dr. Barata (Natal Modelo e Casas Rubi) na avenida Rio Branco.
Do seu casamento com Ana Olindina de Mesquita, da família Baltazar Marinho, nasceram José, Alfredo, Amélia, Vicente, Paulo e Nininha. Em 1929, Alfredo Adolfo de Mesquita faleceu, sendo sucedido nas atividades pelos filhos, como também na política.
Neste casarão residência, no dia 30 de maio de 2001, celebrou-se o centenário de nascimento de Nair de Andrade Mesquita, pois a história dele é a história da família durante todo o século vinte. Ela foi a heroína política anônima, ainda crédula na grandeza do último milagre do velho PSD dos anos cinquenta, revivendo e reinventando as recordações limpas e as ilusões legítimas que um dia viajaram com ela.
Por último, cabe assinalar que esta construção, passarela permanente de notáveis e de humildes, sempre esteve aberta para receber o povo, ao longo de todo esse tempo. Ela se tornou uma referência, uma tradição dentro da história política, social e cultural de Macaíba. A partir de agora, como sede da Casa da Cultura preserva a memória e abriga as manifestações culturais do povo, dos estudantes e dos artistas da terra de Auta de Souza. Foi tombada pelo Patrimônio Histórico e Artístico do Rio Grande do Norte, por decisão do Conselho Estadual de Cultura e do governo do estado, em 16 de setembro de 2005 (decreto nº 18.515).


(*) Escritor.

28/08/2015