A R E V O
L U Ç Ã O L I B E R A L M I N E
I R A
Por: GILENO GUANABARA, sócio efetivo do IHGRN
Os
anos que sucedem a década de 1840, superado o decênio conturbado da Regência,
já durante o Segundo Reinado, foi época de intensa agitação política, no
Brasil. Enquanto na província do Sul os planos de paz não vingavam, a
dissolução do primeiro ministério da maioridade apartou o campo entre liberais e
conservadores. De um lado, que se denominou liberal, apeado do poder, com Limpo
Abreu, Martim Francisco, os irmãos Holanda Cavalcanti, Diogo Feijó, para quem o rei reina, mas não governa. De outro
lado, os conservadores Itaborary, Vasconcelos, Paraná, Abaeté, Paulo Souza, o marquês
de Olinda e Paulino de Souza, dentre outros, que opunham: o rei reina, governa e administra. Para os últimos, era de maior valia
o papel do Poder Moderador, encartado na Constituição de 1824, apostado acima
dos demais poderes. Época liberal, apesar da virulência dos embates. Com mais
veemência do que Antônio Carlos: - Quem
for brasileiro, siga-me para o Senado -, Limpo de Abreu conclamava o povo à
rebeldia, à mão armada, justificando o direito do cidadão reagir pelas armas,
pela revolução. Criara um clube liberal, através do qual projetava sua fala nas
províncias, aclamando não serem acatadas as leis aprovadas pelos conservadores
no Senado.
O
que acirrou tamanha agitação no Senado foram três projetos oriundos do
ministério conservador, a serem convertido em lei, questões fechadas para o
governo, desde 1841. Primeiro, o que transferia para o governo o direito de
nomear os vice-presidentes das províncias e não mais eleitos pelas assembleias;
segundo, o que alterava o código de processo criminal; por fim, o que criara o
Conselho de Estado.
Com a nova
legislatura, exatamente no ano de 1842, os presidentes provinciais liberais, após
serem exonerados, foram substituídos pelos conservadores. Os liberais, no
entanto, articulados e com maioria, na primeira sessão legislativa, elegeram
Martim Francisco presidente da Câmara. Em represália, o imperador dissolveu a
Câmara, convocou outra, a ser eleita no prazo de seis meses. Intensificaram-se
os preparativos sediciosos. Em maio, rebentou a revolução liberal em São Paulo
e, um mês depois, eclodiu em Barbacena a revolução liberal mineira.
Pela madrugada do dia 10 de junho, ao repicarem
os sinos, o movimento aclamou presidente da província o revolucionário José
Feliciano Pinto Coelho, futuro barão de Cocaes, o qual conclamou o povo a
aderir. Theophilo Ottoni se fez presente e, diante da tropa, com a sua
autoridade, prestou solidariedade aos revoltosos. Caíram sucessivamente, à
força de bala, as cidades de S. João d’El Rey, Queluz, Sabará e Santa Luzia.
Restava Ouro Preto. Então, todos a Ouro Preto, a capital das Minas, foi a ordem
dada, onde o presidente Bernardo Jacyntho da Veiga organizara a resistência. A
vitória sobre Ouro Preto corresponderia à vitória completa e final.
Mas
o líder revolucionário recém aclamado ponderou suas responsabilidades, as consequências
que teriam os seus atos, e amarelou. Propôs secretamente acordo de paz, através
de emissários, ao futuro barão de Caxias, chefe das tropas legalistas. Em vez
de, pela vantagem que lhe era favorável, avançar suas tropas contra Ouro Preto,
ao contrário, liberou os soldados, desencorajando-os.
Numa noite, Theophilo Ottoni recebeu a visita
de líderes da revolta, incomodados com as vacilações do chefe: - O senhor vae ser aclamado vice-presidente e
tem de dirigir o movimento. Ottoni percebeu o imbróglio que, caso aceitasse,
poderia resultar na divisão dos revolucionários. Decidiu forçar José Feliciano
a assumir seu posto.
Acampados
em Santa Luzia, os revoltosos, sob a chefia do vacilante José Feliciano,
formularam a estratégia para os combates que não tardariam a ocorrer, haja
vista as tropas de Caxias terem acampado na cidade de Sabará que lhe era
próxima. Um fato abateu ainda mais o ânimo da revolução: Após planejar os
ataques, José Feliciano desapareceu na madrugada, fugira, sem deixar notícia.
Ao saber, furioso, Ottoni ameaçou: Ninguém
deve saber que Feliciano nos deixou. Metto uma bala na cabeça de quem der curso
à notícia.
Entretanto, a notícia correra de boquirroto, desestimulando ainda
mais a tropa. No dia 20 de agosto, Luiz Alves de Lima e Silva, vencedor quando
da revolução liberal em São Paulo, chefiada por Diogo Antônio Feijó, se deslocou
de Sabará em direção à Santa Luzia. Dividiu sua tropa em duas colunas, uma sob
seu comando, outra que confiou ao irmão, coronel José Joaquim de Lima, depois
conde de Tocantins, a quem foi ordenado aquartelar suas tropas na Lapa.
Apesar
do abalo sentido na moral das hostes revolucionárias, o comandante Antônio
Nunes Galvão resolveu encarar o adversário, iniciando os combates. Seus
soldados se lançaram sobre os legalistas com alvoroço, tal como fizeram os fanáticos
de Canudos, na Bahia, meio século depois, acuando as forças do Exército
republicano. Tamanha fora a insurgência que a sorte vacilou em se inclinar para
o seu lado. José Joaquim, ao sentir a gravidade dos fatos, atiçou sua coluna em
socorro a do irmão. Os revoltosos não esperavam a iniciativa do reforço. Surpreendendo
as tropas insurretas, sob o fogo cerrado das duas colunas, com
facilidade as tropas de Caxias destruíram Santa Luzia, abateram os sediciosos e
fizeram prisioneiro Theophilo Ottoni.
De
regresso ao Rio de Janeiro, abafada a revolução liberal mineira, ao passar por
Ouro Preto, rumo ao Rio de Janeiro, Caxias foi convidado a assistir a te-deum, oficiado pelo bispo local, em
ação de graça pela vitória. Surpreso com o convite, sem ser grosseiro, Caxias
respondeu: O officio do clero é rezar
pelos mortos. Não é congratular-se pelos resultados de uma luta fraticida que dividiu
irmãos e devia entristecer todos os corações brasileiros. Caxias não
compareceu ao ato.