30/09/2019





O INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO RIO GRANDE DO NORTE viveu na última Quinta Cultural, um dia de grande importância, 
com a palestra do Professor e Escritor TOMISLAV FEMENICK, discorrendo 
sobre o tema
"ABOLIÇÃO DA ESCRAVIDÃO EM MOSSORÓ



Compareceu uma seleta plateia, com a necessária atenção face ao empolgante tema.


PARABÉNS 

23/09/2019

Marcelo Alves

Dostoiévski e o seu cárcere



Fiódor Mikhailovich Dostoiévski (1821-1881) nasceu em Moscou, em uma família que podemos classificar como da nobreza decadente. Perdeu os pais muito cedo. Formou-se em engenharia. Fez jornalismo. Mas foi sobretudo um escritor. Um ficcionista que tratou com maestria da filosofia, da psicanálise e da religião. “Gente Pobre” (1846), “O Duplo” (1846), “Humilhados e Ofendidos” (1861), “Recordações da Casa dos Mortos” (1862), “Crime e Castigo” (1866), “O Jogador” (1867), “O Idiota” (1869), “O Eterno Marido” (1870), “Os Demônios” (1872) e “Os Irmãos Karamázov” (1881) são alguns dos seus títulos famosos. Simplesmente genial. Dostoiévski faleceu em São Petersburgo.
Mas não vou escrever aqui sobre “Crime e castigo”, “O jogador” ou mesmo “Os Irmãos Karamázov” (1880), embora considere estas as obras-primas do grande literato e pensador russo. Pelo menos não diretamente.
Minha intenção hoje é tratar de um aspecto – juridicamente relevante, aliás – da vida tormentosa de Dostoiévski. E das suas consequências. Para quem não sabe, acusado de conspirar contra o Czar Nicolau I (1796-1855), Dostoiévski foi, em 1849, condenado à morte. Pena essa que, apenas momentos antes do comando para o fuzilamento, foi anunciada como comutada para prisão com trabalhos forçados (diz-se que o próprio Czar exigira a encenação da falsa execução). Dostoiévski, então, com os seus grilhões, foi levado à Sibéria. Quatro anos de prisão. E coisa de dez anos de exílio nesse fim de mundo.
Esse padecimento – a partir da sua experiência de condenado numa prisão decadente, suja e intransponível em Omsk, na Sibéria – foi narrado de modo tocante por Dostoiévski, em “Recordações (ou Memórias) da Casa dos Mortos”, talvez como ninguém mais na literatura universal. De 1862, “Recordações da Casa dos Mortos”, construído a partir de uma coleção de fatos e eventos relacionados à vida nas prisões da remotíssima Sibéria, é um romance, é verdade. Mas só quem passou por esse “sofrimento inenarrável”, só quem ali esteve “sepultado vivo”, para usar de expressões do próprio Dostoiévski, seria capaz de descrever (se talento literário tiver para tanto, claro) as condições de vida e a personalidade daqueles que são condenados, culpados ou não, a viver ou morrer nessas condições.
O momento da prisão em si, a solidão do cárcere ou a promiscuidade com delinquentes perigosos, tudo isso é terrível, sobretudo para homens de caráter e de sentimento. Na verdade, como adverte Lemos Britto (1886-1963), em seu “O crime e os criminosos na literatura brasileira” (Livraria José Olympio Editora, 1946), quem passa em frente às masmorras “onde se cumprem penas não sabe o que de angústia e desesperos se passa na alma de seus habitadores. Ainda há quem veja o crime e esqueça que o criminoso é um homem, que a sua alma não se petrificou, que a sua sensibilidade não morreu com a prática do ato antissocial. E não adivinha também que do lado de fora se representam outros dramas, ligados àquelas existências esmagadas sob um número e um regime penitenciário, o drama das famílias dos condenados, tão doloroso muita vez quanto o das famílias das vítimas”.
De toda sorte, para além da própria composição de “Recordações da Casa dos Mortos”, podemos tirar algo mais de positivo da dolorosa experiência de Dostoiévski: o incontestável florescimento da genialidade literária do autor de “O jogador”. Afinal, como disse Friedrich Nietzsche (1844-1900), “o que não me faz morrer me torna mais forte” (dito que é uma versão mais chique do nosso “o que não mata, engorda”). Nietzsche, por sinal, dizem, considerava Dostoiévski o único “psicólogo” com o qual teve algo a aprender.
De fato, como nos recorda Lemos Britto, “é comumente aceito e afirmado pelo próprio Dostoiévski, que após a simulação da execução, ele passou a apreciar a vida de uma maneira muito diferente da anterior, iniciando um processo de transformação existencial, literária e política, que estaria terminada quando de seu retorno a São Petersburgo, 10 anos depois”. Aliás, em texto introdutório à recente edição de “Memórias da casa dos mortos” da Editora Nova Fronteira (2018), intitulado “Dostoiévski e a Casa dos Mortos”, Otto Maria Carpeaux também anota: “Comparem-se as obras que Dostoiévski escreveu antes do exílio siberiano – Gente pobre (1846) ou Noites brancas (1848) – com as obras pós-sibéria: Crime e Castigo, O idiota etc. até Os Irmãos Karamázov: a mudança não é somente de amadurecimento intelectual, espiritual e literário. O homem parece outro, o escritor parece outro. Foi, evidentemente, profunda a influência exercida pelos anos de trabalhos forçados na prisão de Omsk”.
Bom, eu nunca estive preso. Deus me livre de um dia ser. E nem que fosse para ser um novo Dostoiévski.

Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP

20/09/2019




OUTRA VISÃO DE TAIPU
Por: Carlos Roberto de Miranda Gomes, sócio do IHGRN

                Compulsando a recente publicação da Revista nº 98 (julho de 2019), do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, deparei-me com dois arquivos que se entrelaçam na história de dois municípios da nossa zona da mata – Taipu e João Câmara (Baixa Verde).
        Sem renegar as informações dos seus autores, respectivamente João Batista dos Santos e Aldo Torquato, senão o meu desconhecimento da inimizade entre João Câmara e o Desembargador João Maria, decidi complementar alguma coisa dos textos, pelo fato das minhas raízes com o lugar Pitombeira, então do meu avô, Coronel João Gomes da Costa, terra onde nasceu meu pai, Desembargador José Gomes da Costa.
        O nome Taipu, segundo alguns historiadores, vem da linguagem dos índios potiguares (primitivos habitantes): Itaipi (era um aldeamento indígena), consoante citação do padre Manuel de Morais, apud CASCUDO, localizada a sete milhas ao oeste do Rio Grande do Norte. Mas poderia ser, também, de Itaipu, que significa pedra preta, tipo de solo arenoso existente naquela região, de tabuleiro com partículas silicosas, pedras e minérios, nas terras do Tapuio.
        Noticia-se que em 1645, durante o domínio holandês já se convivia com aldeias indígenas chefiadas por Antônio Papapeba.
        Ainda invocando o Mestre CASCUDO, ali existia em 1709 um poço de Manoel Rodrigues Coelho, nas terras da Fazenda Tabuleiro do Barreto, de propriedade de Antônio Alves da Rocha, que chegou a possuir olarias. Mas igualmente possuía massapé, nos vales úmidos, com húmus de arisco que se prestava a cultivo de cereais – mandioca, fruticultura, sem desprezar a criação de gado. Também solo
        O nome inicial da povoação, já em fase de colonização era conhecido como “Picada”, abertura onde começa o sertão até o Mato Grande (zona da mata). O início do seu desenvolvimento aconteceu no século XIX, com a participação dos fundadores do povoado Jorge Pegado Galvão, Marcos Pereira dos Santos, Bernardo Gadelha, André Soares da Silva e Joaquim José da Costa, alcançando as cercanias das povoações Barreto, Poço Branco, Gameleira, Contados, Boa Vista e Pitombeira, chegando a alcançar terras das localidades Ceará-Mirim, Extremoz, Genipabu, Muriú e Taipu.
        Depós, são registrados alguns beneficiamentos: em 1851 foi concluída uma capela em louvor a Nossa Senhora do Livramento, após trinta anos de labuta, sendo anualmente comemorada desde novembro de 1913; em 1864 criou-se uma escola; em 28 de junho de 1889 o distrito de Picada mudou seu nome para Taipu, ganhando Delegacia de Polícia e sendo desmembrada de Touros para Ceará-Mirim.  Em 10 de março de 1891 a Vila foi desmembrada de Ceará-Mirim pelo Decreto nº 97 do então Governador provisório Francisco Amintas da Costa Barros, sendo seu primeiro intendente o Capitão Candido Marcolino Monteiro. Fez-se Freguesia em 18 de abril de 1913 e Comarca em 16 de janeiro de 1960.
        Contudo, o seu desenvolvimento efetivo só aconteceu no final do século XIX, mas sobretudo no começo do século XX, com atividade econômica sustentável na avicultura, agricultura, pecuária e exploração de pedreiras. A Vila tornou-se cidade (Município) em 29 de março de 1938, quando era prefeito Rosendo Leite da Fonseca.
Estudos mais aprofundados foram desenvolvidos pelos escritores da região, JOSÉ HUMBERTO DA SILVA e TEREZINHA DIAS DA SILVA que escreveram o livro “Genealogia e História de Quatro Famílias Taipuenses”, preservando fidelidade às raízes da Terra Taipu, mostrando a saga dos pioneiros que, pondo de lado as vicissitudes da região, deram seu suor e sangue pela esperança visionária de alcançar prosperidade econômica, política e religiosa, ao mesmo tempo em que lhes prestam um justo tributo. Afinal, quem não cultua o seu passado não encontrará rumo do futuro.
        Taipu fez-se Vila e foi conduzida gozando o respeito do povo e de Deus, gerando uma povoação rica de homens de bem, na concepção preconizada por Mateus, 5. 44 a 48, tanto que doou ao mundo alguns descendentes de Mártires de Cunhaú e Uruaçu.
        No entanto, é mister que se faça justiça a alguns taipuenses que se destacaram pela dedicação de suas famílias, em particular quatro delas, aqui retratadas como as famílias que se seguem, três das quais de um mesmo tronco: Miranda, desenvolvida do nascedouro português de João Gomes Carneiro, que se casou com Ana Ferreira de Miranda e alargou-se com os Rodrigues Santiago (da Silveira), Câmara (Boa e da Silva), Severiano da Câmara,  Azevedo, Peixoto, Torres, Arruda, Soares, Pereira, Paiva, Paula, Amaral Lisboa, Ferreira (da Cruz, de Miranda), Leite da Fonseca, Furtado Menezes e Gomes da Costa; a família Rodrigues Santiago que ampliou sua estirpe com os Gomes da Costa (da Silva), os Praxedes, os Melo, os Rodrigues da Silveira, posteriormente com os Raposo da Câmara, Rabelo Dantas, Alves de Medeiros, Rego, Galvão, Urbano de Araújo, Amaral de Andrade, Leite da Fonseca e outros, partidos dos embriões de Jerônimo Ferreira de Miranda e Felipa Rodrigues da Silveira; segue-se a família do Coronel João Gomes da Costa, da qual sou oriundo, do tronco Manoel Gomes da Costa e Cândida da Costa Gadelha, que se tornou dona dos povoados Gameleira e Pitombeira onde teve feira livre e parada de trem onde se deu o início da bela trajetória de João Severiano da Câmara, casado com Maria (AA), cujo patriarca entrelaçou-se com as irmãs Bernardina e Anna Rodrigues Santiago, construindo uma prole numerosa. Esta última, por sua vez, era viúva de Sérgio Guedes da Fonseca, tendo, ainda, o concurso dos Gomes de Araújo, vindos da Paraíba, os Gomes de Almeida, Borges, Cunha Lima, Nobre da Costa, Ferreira da Costa (da Cruz), Soares da Câmara (da Silva, Severiano, Arruda), Leite da Fonseca, Furtado, Menezes, Rodrigues da Silva; completando o estudo temos a família Ponte ou  Pontes, que tem origem espanhola/portuguesa de Bartolomeu Pontes casado com Margarida Ribeiro, cujas raízes nordestinas (Ceará) surgem de Gonçalo Ferreira de Pontes, casado com Maria de Matos Coutinho, ele filho de Cosme de Freitas Pereira e Joana Barros Rego Coutinho até Alexandre Ferreira de Pontes – o grande patriarca, sendo que o ramo de Taipu surgiu de Manoel Alexandre de Pontes e Francisca Florentino(a) de Pontes, com o entrelaçamento das famílias Vieira, Gomes Costa, Aguiar e Bezerra de Menezes, do Estado do Ceará.
        Com estas poucas linhas não tenho o atrevimento de apresentar nenhuma informação definitiva da terra taipuense, mas apenas apontar uma bibliografia mais consentânea com a realidade, com indicação de autores que efetivamente têm o peso necessário para traçar a história, os costumes e as tradições da terra dos papagaios.


_____________________________
Obras consultadas:
CASCUDO, Luís da Câmara. História do Rio Grande do Norte, Natal e Rio de Janeiro: Ed. FJA e Achiamé, 1984.
_________________ História de Um Homem (João Severiano da Câmara), Natal: DIRN, 1954.
LYRA, Augusto Tavares de. História do Rio Grande do Norte, Brasília: Gráfica do Senado, 2012.
MORAIS, Marcus Cavalcanti de. Terras Potiguares, Natal: Ed. Foco, 2004.
NOBRE, Manuel Ferreira. Breve História Sobre a Província do Rio Grande do Norte. Natal: Sebo Vermelho Edições, 2011 (reprodução da impressão de 1877).
SILVA, José Humberto da. Centenário de Fundação da Paróquia de Taipu – Ação e Fé, Natal, Ed. Do autor, 2013.
_______________ A Vila de Taipu e as famílias Ferreira da Cruz e Boa da Câmara, Natal, Ed. Do autor, 2011.
_______________ em parceria com SILVA, Terezinha Dias da. Genealogia e História de Quatro Famílias Taipuenses, Natal, 2019 (no prelo).




Índios do Rio Grande do Norte
Tomislav R. Femenick – Mestre em economia, com extensão em sociologia e história. Membro do Instituto Histórico e Geográfico do RN

As tribos ou sociedades indígenas são classificadas através de suas respectivas afinidades linguísticas, pela identidade cultural e pela homogeneidade de costumes, mas é a língua o principal elemento de aglutinação dos diferentes grupos. No Brasil há duas linguagens básicas principais: a Tupi, que possui sete famílias linguísticas, inclusive a tupi-guarani, e a macro-jê, com cinco, entre as quais a família jê. Afora essas duas, há as línguas aruak, karib, tukâno, pomo e guaykuru, que formam grupos independentes.
No início do período colonial existia no Rio Grande do Norte uma grande população de nativos das raças tupi e, principalmente, cariri. Do primeiro grupo, os potiguares. Cariris eram os paiacus, paiins, monxorós, pegas, caborés, icozinhos, panatis, ariús, janduís e outros grupos. Como resultado do apresamento, miscigenação, doenças exógenas e o extermínio promovido pelos colonizadores, houve um rápido decréscimo desse contingente. Exemplo foi o que ocorreu em 1597, quando uma epidemia de varíola se espalhou pelo Nordeste do Brasil, matando indistintamente colonizadores e indígenas. A sua violência foi de tal monta que retardou a colonização do Rio Grande do Norte.
            O extermínio dos índios no Estado teve início (e maior proporção) no século XVII. A guerra entre portugueses e holandeses, além de outras causas, forçou um grande contingente de indígenas do Rio Grande a emigrar para outros lugares; Paraíba e, principalmente, Ceará. O nível populacional silvícola já era crítico, conforme relata Nieuhof (1981): “Em 1640, a população aborígine de Ceará aumentou consideravelmente. [...] Por outro lado o Rio Grande se achava quase deserto Assim, André Vlijfs propôs ao Grande Conselho fundar uma aldeia no Rio Grande para lá instalarem os habitantes de Ceará que o desejassem fazer. Inteirado, o conde Maurício e o Grande Conselho, das aspirações de alguns habitantes de Ceará, desejosos de se estabelecerem no Rio Grande, sua terra Natal, [...] atenderam a sugestão.
Exemplo de liquidação planejada dos índios em solo potiguar foi a campanha de Afonso de Albertin na Ribeira do Açu, que visou dizimar os janduís. Os poucos sobreviventes foram aprisionados e levados para Recife como presentes ao governador de Pernambuco. Chegando ali foram comercializados em praça pública, como escravos. Os bandeirantes Domingos Jorge Velho e Matias Cardoso, também deixaram rastro, sendo os responsáveis pelo massacre e pela prisão de índios cariris, especialmente os janduís, em meados de 1689, durante a chamada Guerra dos Bárbaros, Guerra do Assú ou Confederação dos Cariris, que durou de 1680 a 1729 e atingindo quase toda a região nordeste da colônia, porém o principal palco das lutas foi o Rio Grande do Norte. “Os índios capturados durante a Guerra dos Bárbaros, por exemplo, foram vendidos na cidade de Natal” (HEMMING, 1999).   
            Falando sobre o declínio dessa população, a professora Fátima Lopes (www.pgr.mpf.gov.br) diz que, “de acordo com informações de Jesuítas, datadas do início da colonização ao século 18, havia uma grande quantidade de índios na região litorânea de nosso Estado. Só nas imediações de Natal, eram cerca de 6 mil nativos, em aproximadamente cem aldeias”. Diz ainda, que em 1603 vinte e seis aldeias dos potiguaras haviam desaparecido. Restavam apenas sessenta e quatro, na mesma região. Em 1613, dez anos depois, eram apenas oito aldeotas. Em 1627, Domingos da Veiga Cabral (Apud HEMMING, 1999) relata que havia “pouco mais de 300 flecheiros divididos entre quatro aldeias. Costumava haver uma quantidade tão grande deles que seus números não eram conhecidos”. O número de aldeamento foi corrigido em 1639 por Adriaen van der Dussen (Drussen) – (1947), em seu Relatório sobre as Capitanias Conquistadas no Brasil pelos Holandeses, eram cinco. O censo de 1844 registrou pouco mais de seis mil indígenas na Província.
           


17/09/2019


Lombroso e a literatura

Misturando direito e literatura, eu já escrevi aqui sobre a “vida imitando a arte” e a “arte imitando a vida”. Hoje, vou escrever sobre a “literatura imitando o direito”, mais especificamente sobre a literatura imitando a criminologia de Cesare Lombroso (1835-1909).
Lombroso foi – e ainda o é no nosso imaginário – um famoso médico, psiquiatra, antropólogo e criminologista italiano. Nascido em Verona, Lombroso formou-se em medicina pela Universidade de Pavia. Exerceu a profissão percorrendo o seu país, vinculado a hospitais e universidades. Cientista, finalmente juntou-se à Universidade de Turim. Ali, já mais para o fim do século XIX, tem o seu melhor período produtivo. Publicou bastante: de “Gênio e Loucura” (1874) a “O crime, causas e remédios” (1894), passando por “O Homem Delinquente” (1876), sua obra mais célebre. Lombroso é considerado o iniciador da antropologia criminal. E é também tido como o fundador da Escola Positiva do Direito Penal, formando, junto a Raffaele Garofalo (1851-1934) e Enrico Ferri (1856-1929), a tríade de expoentes dessa importantíssima corrente de pensamento jurídico-científico. Lombroso faleceu em Turim, em 1906.
Entretanto, no nosso imaginário – no meu, pelo menos –, Lombroso é sobretudo lembrado pela sua descrição do “criminoso nato”, como parte de uma classificação, toda sua, dos delinquentes. Aquele sujeito disforme, assustador até, que nos acostumamos a chamar de lombrosiano. Estaria Lombroso certo nessa sua imagem morfologicamente degenerada do tal criminoso nato? Como pergunta Lemos Britto (1886-1963), em seu “O crime e os criminosos na literatura brasileira” (Livraria José Olympio Editora, 1946): “Será mesmo que os indivíduos de mãos imensas, pesadas ou disformes, são tipos nos quais se observa uma regressão atávica ao homem primitivo, ao selvagem, e que trazem diluída no sangue a vontade mórbida de matar por estrangulamento?”.
É claro que Lombroso exagerou, para dizer o mínimo, no que diz respeito aos caracteres morfológicos dos criminosos. De fato, conhecemos inúmeros autores de crimes bárbaros que em nada se parecem com o criminoso nato lombrosiano. E a classificação do professor italiano não resistiu por muito tempo às críticas dos estudiosos.
Todavia, Lombroso teve seus méritos. Antes de mais nada, como reli estes dias no “Direito Penal” (Editora Saraiva, 1990), de E. Magalhães Noronha (e como escreviam bem esses penalistas de outrora), “o de haver iniciado o estudo da pessoa do delinquente. Com ele, este deixou de ser considerado abstratamente. Foi a antropologia criminal que pôs em evidência a pessoa do criminoso, procurando investigar as causas que o levavam ao delito, ao mesmo tempo que forcejava por indicar os meios curativos ou tendentes a evitar o crime”.
Lombroso teve ainda outro mérito especial: o de ter dado azo ou material para estudo e imaginação dos literatos, como é o polêmico caso do naturalista Émile Zola (1840-1902), o autor de “A besta humana” (1890). Durante muito tempo existiu a ideia na literatura – e isso, de certa forma, ainda hoje perdura – de que os grandes delinquentes, os criminosos cruéis, possuem, para além de uma degeneração psicológica, estigmas morfológicos à moda de Lombroso e da sua antropologia criminal. E obras literárias “lombrosianas” abundam.
Especialmente interessante é o caso do nosso Pedro Américo (1843-1905) e do seu “O Foragido” (de 1899). E aqui, quando uso o “nosso”, o faço com precisão, porque esse homem das letras e da ciência, e sobretudo virtuose do pincel, é paraibano de Areia. Pedro Américo vivia na Itália no tempo em que as ideias de Lombroso perambulavam pelos arredores civilizados de então. Escritor e genial pintor, certamente aí está a explicação para Pedro Américo fixar os pormenores “lombrosianos” de suas personagens literárias.
É o caso da curandeira Cericê, apresentada como um tipo degenerado à moda das velhas feiticeiras da Itália mística. Eis a descrição, quase fotográfica, que reproduzo do livro de Lemos Britto: “Era uma cabocla de seus quarenta anos, mas cuja pele incrustada, rugosa, amarela como uma cucurbitácea madura, e variegada na testa, em torno dos lábios e nos braços de arabescos de cor azul e roxa, parecia indicar sessenta. De baixa estatura, sem ombros, volumosa e roliça até a base do tronco, era, daí para baixo, magra, seca e como lignificada sobre os pequeninos pés, dos quais um tinha quatro dedos e outro apenas três. Ajunte-se-lhe um crânio deprimido, fortes zigomáticos, nariz quase hipotético, maxilares enormes, dentes alvos a saírem-lhe da boca e uns pequenos olhos vivíssimos sem esclerótica, porque recobertos dos babados e das bordas de saco a que ficaram reduzidos as antigas pálpebras tumefactas e os tegumentos infra-orbitários, e teremos uma fraca imagem da figura tenebrosa, achavascada e quase pré-histórica desse novo Hipócrates de cabeção e saiote”.
Bom, não sou um lombrosiano. Nem seguidor nem, muito menos, um criminoso. Mas reconheço que Lombroso foi um visionário. Para o direito e para a literatura. Devemos dar a Cesare o que é de Cesare.


Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/S


Belíssima palestra de André Felipe sobre os símbolos do Rio Grande do Norte


1abertura oficial feita por Joventina Simões, Presidente em exercício do IHGRN

Palestrante




Vista parcial da platéia


Projeções durante a palestra


Tela que inspirou Corbibiano Villaça na construção do 
Brasão de Armas do Estado do Rio Grande do Norte.



BRASÃO DO BRASIL HOLANDÊS


13/09/2019


Marcelo Alves
Coletiva e engenhosa

O crime é um ato reprovável que pode ser praticado por uma só pessoa. Entretanto, com relativa frequência, esse ato delituoso é praticado por mais de um indivíduo. A isso damos o nome de criminalidade coletiva. Um fenômeno que hoje vem ganhando cada vez mais relevância no cotidiano do direito.
Não que a criminalidade coletiva seja um problema novo. Pelo contrário. O grande Miguel de Cervantes (1547-1616) – que muitos apontam como superior a Shakespeare (1564-1616) no domínio da criminologia –, lá no comecinho do século XVII, já tratava do assunto. Como anota o nosso Lemos Britto (1886-1963), em seu “O crime e os criminosos na literatura brasileira” (Livraria José Olympio Editora, 1946), “Cervantes nos antecipou o conhecimento da criminalidade coletiva, exercida por intermédio das quadrilhas de salteadores e malfeitores, distinguindo-a nos seus dois aspectos ou formas principais, uma agindo no espaço rural, selvático, montanhês, outra urbana, cada qual adotando métodos e política diferentes. A primeira, nós a encontramos em Dom Quijote de la Mancha, quando este e Sancho, às portas de Barcelona, se defrontam com o bando ou a quadrilha de Roque Guinant; a segunda, sevilhana, aparece na novela Rinconete y Cortadillo (…). Quem quiser estudar a delinquência das associações de malfeitores, inclusive os chamados Sindicatos da Morte ou ‘mãos-negras’ das grandes cidades norte-americanas, há de procurar as novelas exemplares de Cervantes. Aí está, para exemplo, o grupo constituído por Maniferro, Chiquiznaque e Repolido, que são os executores das sentenças proferidas pelo bando ou por seus chefes, no século XVII”. Recomendo, por óbvio, a leitura do Quixote e das Novelas.
A questão é que a tal criminalidade coletiva tem se tornado cada vez mais engenhosa e frequente. Acho que disso todos nós já demos conta, com as pessoas falando diariamente das tais “Orcrims” (organizações criminosas), muito embora, com frequência, inadequada ou mesmo levianamente (e isso, em tempos de populismo, é um sério problema).
A ciência penal, claro, há tempos também se apercebeu disso, tentando normatizar e categorizar esse fenômeno – da criminalidade coletiva – da melhor forma possível.
O nosso Código Penal, por exemplo, disciplina o concurso de pessoas (em coautoria ou mediante participação) em seus artigos 29, 30, 31 e 62, afirmando, entre outras coisas, que, “quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade” (art. 29, caput).
O Código também tipifica, no seu art. 288, caput, um crime de “associação criminosa” (antes chamado de quadrilha ou bando): “associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes”. Dois elementos devem estar aqui presentes: (i) associação de três ou mais pessoas; (ii) com o fim específico de cometer crimes. Essa união estável dos agentes, com o fim específico de cometer crimes, distingue a associação criminosa do simples concurso de pessoas, acima referido.
Já a Lei 12.850/2013 (dita “Lei do Crime Organizado”) cuida da tal Orcrim. No seu art. 1º, § 1º, define: “Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional”. E cria, no seu art. 2º, o crime de organização criminosa: “Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa”, com pena severa que vai de 3 a 8 anos de reclusão. A associação criminosa e a organização criminosa não se confundem. Entre outras coisas, para sua caracterização, a organização exige pelo menos 4 agentes e uma estrutura ordenada, com hierarquia entre seus membros e divisão prévia das funções de cada um deles.
Por outro lado, ainda quanto à criminalidade coletiva, tem-se a atenuante do crime cometido “sob a influência de multidão em tumulto, se não o provocou” (CP, art. 65, III, e). Trata-se do crime multitudinário, do qual um bom exemplo seria aquele decorrente de briga generalizada em estádio de futebol. Justifica-se a atenuação da pena pela falta de serenidade transitória de que padecem os indivíduos sob a pressão de uma multidão amotinada.
Evidentemente, nos dias de hoje, em que tanto se fala de Orcrim, em que tanto se prática multitudinariamente crimes contra a honra, precisamos estudar melhor todas essas categorias. Para não cometermos impropriedades. Para não sermos populistas. Para não cometermos injustiças.
Por derradeiro, deixem-me fazer uma confissão saudosista. Os tratados de direito penal do meu tempo de graduação cuidavam desses temas muito bem. As coisas eram mais simples, é verdade. Mas como os antigos escreviam bem – talvez porque eles tivessem lido o engenhoso Cervantes.


Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo

12/09/2019


INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO RN IHGRN <ihgrn.comunicacao2017@gmail.com>

C O N V I T E


Caro sócio(a),

Estamos anexando o convite para a palestra desta QUINTA CULTURAL, proferida pelo confrade André Felipe Pignataro Furtado de Mendonça e Menezes, hoje.  dia 12/09/2019, no Salão Nobre do IHGRN.
Contamos com a sua importante participação.

ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO

07/09/2019


As pedras
Os antigos já diziam: “E por que reparas tu no argueiro que está no olho do teu irmão, e não vês a trave que está no teu olho? Ou como dirás a teu irmão: deixa-me tirar o argueiro do teu olho, estando uma trave no teu? Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho, e então cuidarás em tirar o argueiro do olho do teu irmão” (Mateus 7:3-5).
Embora essa lição jamais tenha sido razoavelmente aprendida na história da civilização, ela nunca foi tão esquecida como nos dias de hoje.
Nas ruas e, sobretudo, nas tais redes sociais, o que mais enxergamos agora são pessoas apontando o dedo para A ou para B, dizendo trocentos impropérios contra esses seus imaginados desafetos. Se o que dizem ou reproduzem é verdade, pouco importa. Fulano é canalha. Sicrano é ladrão. Não sei quem é maconheiro. Aquele lá é um vagabundo. Uma outra é vadia. E paro por aqui para não reproduzir as mais escatológicas estultices desses últimos tempos.
Acontece que muitíssimo disso é hipocrisia. Aquela hipocrisia direta, em que o indivíduo arrota virtudes e condutas que, em verdade, não possui ou não pratica. E sempre exige dos outros que se comportem dentro desses padrões estabelecidos, quando ele mesmo, dissimuladamente, repito, não os adota ou os extrapola. Por exemplo, em razão da minha profissão, eu mesmo já vi muita gente que sei investigada, denunciada ou mesmo condenada por crimes contra o patrimônio publico sair por aí denunciando, em manifestações ou nas redes sociais, irresponsável e hipocritamente, os mesmos crimes e pecados pelos quais responde, só que praticados (supostamente) por outrem. Como diria o velho Timbira, do “I-Juca Pirama” do nosso Gonçalves Dias (1823-1864), esse exemplo clássico de comportamento hipócrita, “Meninos, eu vi”. E bastante.
Mas há, também, a hipocrisia indireta do sujeito caolho. Ele pratica mil e um “pecados”. Só que são os seus pecados, que ele acha naturais ou, pelo menos, veniais. Mas os pecados dos outros são imperdoáveis, capitais. Ele dirige bebendo, mas tem por facínora aquele que fuma maconha (porque ele não fuma, claro). Ele sonega tributos e paga uma bolinha (aqui e acolá, apenas), mas pede pena de morte para o ladrão de galinhas. E se fossemos falar aqui da hipocrisia indireta quanto ao comportamento sexual dos outros, cem páginas não seriam suficientes. Talvez a coisa, nestes casos (de hipocrisia indireta), seja até mais perigosa, porque o hipócrita mente para si mesmo e acredita na sua própria mentira ao ponto de não mais conseguir distinguir o certo e o errado, se não com base na sua própria régua de vida.
E isso sem falar daquele que não cometeu (ainda) graves pecados porque ainda está em busca da grande chance para tanto. O crime, já se afirmou, é uma questão de oportunidade. E, como dizia o genial Millôr Fernandes (1923-2012), com sua fina ironia, “muita gente que fala o tempo todo contra a corrupção está apenas cuspindo no prato em que não conseguiu comer”.
A coisa chega ao ápice com os moralistas “profissionais” do Twitter, do Facebook e do Whatsapp. Aquele tipo que, parecendo um pregador ou uma espécie de juiz, se acha no direito de admoestar ou de julgar a todos a partir de uma moral supostamente absoluta. Ele divide o mundo entre os bons e os maus. Vive de plantão. Vive de apontar o dedo, de julgar e de condenar os outros. Mas, desconectado da realidade, cai sempre em contradição. É um ressentido. É desocupado. E quanto mais obtuso ou tolo, mais moralista, já que a tolice é direta, sem rodeios, sem sutilezas, certa de tudo. A sorte é que esse tipo de pessoa, no que realmente importa e para quem importa, nunca é levada a sério.
Na verdade, esses indivíduos são, quase sempre, falsos moralistas.
Até porque, acho que alguém já disse isso – estou na dúvida se foi H. L. Mencken (1880-1956) ou o nosso Millôr –, “a única diferença entre um moralista e um falso moralista é que o primeiro ainda não foi desmascarado” (e, se essa frase não foi dita antes, assumo a sua paternidade de muitíssimo bom grado).
Até porque, cá entre nós, quem nunca cometeu um pecado na vida, para poder, assim, honestamente, atirar esse montão de pedras (João 8:7)?

Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP


D I A     D A     P Á T R I A
Por: Carlos Roberto de Miranda Gomes




        Do sonho nativo ao ato real do governante nacionalista D. Pedro I nasceu a INDEPENDÊNCIA DO BRASIL.
        Estávamos, então no dia 22 de setembro de 1822, nas cercanias do riacho Ipiranga, quando após a leitura de mensagens descabidas do Governo de Portugal, nosso Imperador D. Pedro I proclamou a frase célebre: Independência ou Morte. Foi consumada a nossa separação da Corte Portuguesa.
        Esse fato histórico, todavia, teve precedentes de coragem e patriotismo desde a execução de Tiradentes, primeiro revolucionário da nossa independência e, mais adiante, quando o domínio português em Lisboa insistia em pressões sobre o nosso Príncipe Regente, este rebelou-se contra a exigência do seu retorno a Portugal, e em 9 de janeiro de 1822, externou seu desejo de rompimento com os laços da terra europeia, que ficou consagrado como o “Dia do Fico”, momento em que o governante fez seu voto de amor pelo Brasil.

        Dessa atitude resultou a convocação de uma Assembleia Constituinte, organização da Marinha de Guerra e obrigou as tropas de Portugal a voltarem para o reino. Determinou também que nenhuma lei portuguesa seria colocada em vigor sem o "cumpra-se", ou seja, sem a sua aprovação. Era o passo inicial para nossa hegemonia política. No mês de dezembro de 1822, D. Pedro foi declarado imperador do Brasil.
       
        Hoje, em plena República, renovamos em 2019 a nossa esperança de um Brasil melhor, com igualdade e prosperidade.

        EU DE AMO MEU BRASIL. INCONDICIONALMENTE.


        

05/09/2019



UM SONHO A MAIS NÃO FAZ MAL


Valério Mesquita*

O ano da graça de 2019 passou da metade. No ar, esperanças, perspectivas, novas manhãs de ressurreição e fadigas de longas e crepusculares esperas. Renova-se o tempo, desta vez mais e chuvoso, sem fartura de cajus. Com relação a Macaíba, quais as novidades, além dos políticos de carreira? Em cada esquina um líder, em cada rua um partido e todos se alvoroçando porque é ano de eleição. Ninguém presta atenção ao rio Jundiaí decomposto e sujo, morrendo de inanição na rasura dos dejetos. “O Ibama só atua em Natal”, disse-me um vereador do alto de sua prosopopéia. “Não aparece nenhum fiscal fuleiro”, completou amargo e verde como se tivesse bebido a água poluída.
Passado o governo enganoso e medíocre de Robinson Faria, tá na hora de cobrar o preço da fatura. De lembrar aquilo que devem a Macaíba. Cadê a restauração do Empório dos Guarapes, gemido sufocado da história econômica do Rio Grande do Norte, sepultado no alto de uma colina. Fabrício Pedroza, fundador de Macaíba, que doou terras para construírem a igreja e o cemitério e que no governo imperial a transformou no eldorado do comércio e da indústria extrativista que superou Natal – hoje jaz esquecido, apunhalado pelo desprezo oficial. Cadê a retirada das barracas da rua Nair Mesquita, no centro da cidade? Onde estão as luzes do canteiro central da Br-304, entre Parnamirim e Macaíba, de trevo a trevo, iluminando as fábricas e os operários contra as sombras do assalto e da insegurança.
Por que ninguém se lembra do vazio e do vácuo do Hospital Alfredo Mesquita, desabitado de médicos profissionais, de novos equipamentos e leitos, ao ponto de ser acoimado de “hospital dos mártires”? Antes, era uma unidade de saúde regional e hoje é municipal. E em Macaíba, qual o lugar, o bairro, a rua onde se vive sem violência ou sem droga? Mataram Cosme e Damião. Não os santos. Mas, os policiais das avenidas e praças. E nem motos e nem veículos trafegam mais porque o pânico, o medo e a diarréia sucumbiram ante o domínio da marginalidade dos capetas que manipulam as estatísticas criminais.
Diante de todo esse quadro trágico e parafernálico ainda vale dizer que um sonho a mais não faz mal, no entardecer de um novo ano? Acho que sim. É preciso que a governadora Fátima Bezerra assuma Macaíba, como no passado o fizeram outros governadores. O município tem importância histórica, cultural, além de significativa expressão comercial e industrial.
O rio Jundiaí, no trecho em que atravessa a cidade de Macaíba, perdeu o solo, o curso, o chão, o cheiro, a visão e é ameaça à segurança dos habitantes. Entre o Parque Governador José Varela e a Praça Antônio de Melo Siqueira deixaram crescer no leito poluído imensos manguezais que enfeiam um dos mais bonitos logradouros urbanos. Essa selva esconde lixo doméstico, carcaças de animais, e é ponto de fuga de marginais do tráfico de drogas em todo o seu percurso. Os galhos já ultrapassam a altura da ponte e das balaustradas. A Tribuna do Norte já publicou excelente matéria sobre tudo que ameaça e destrói os rios Potengi e Jundiaí. Mas, o foco da minha questão e, creio, dos cidadãos macaibenses, reside exatamente nesse aluvião de perguntas: por que o Idema e o Ibama não evitam, aparando, podando, somente nesse trajeto o “matagal” entre o antigo cais do porto até a outra lateral da ponte? Por que não licenciam a prefeitura para o fazer?
A praça e o parque perderam o charme de antigamente. Ninguém enxerga ninguém, olhando de um lado para o outro. A conscientização ambiental deve ser obedecida até onde não prejudique a funcionalidade urbanística e o senso prático e plástico do mapa citadino. Um sonho a mais não faz mal.
(*) Escritor