17/11/2014

A chegada do primeiro automóvel

Elísio Augusto de Medeiros e Silva (in memoriam) 

O grande acontecimento agitava, desde cedo, a pacata cidadezinha do sertão do Rio Grande do Norte, naquele início do século XX. O primeiro automóvel, procedente da Capital, iria chegar dentro em pouco.
Toda a população estava agitada. Os homens confabulavam nas esquinas e as mulheres se demoravam, em longas conversas, nas janelas. As crianças foram proibidas de ficar nas ruas, pois poderiam ser arrastadas para a morte.
Ninguém conhecia o tal veículo, diziam que andava só, como um trem, mas, não se parecia com ele.
– É uma coisa doida, diziam, ainda mais sem bicho para puxar!
Os mais velhos achavam até que isso era um sinal do fim dos tempos, que o mundo deveria estar prestes a se acabar.
– Como é que param uma carroça sem cavalos, sem chicotes e rédeas?... E se desembestar?!
Os poucos moradores que já tinham vindo a Natal sorriam e explicavam que, em todas as Capitais, já havia daqueles carros, e que o automóvel seria o meio de transporte do futuro.
– O tempo das carroças já passou! Só aqui se vê isso!
Embora afirmasse isso, eles também estavam um pouco apreensivos, pois, tinham que tomar cuidado com as crianças, elas poderiam se assustar e correr na frente do automóvel. Aí, seria um desastre.
Como as ruas da cidadezinha eram estreitas, e os freios dos automóveis ainda eram ineficientes, sempre existia o risco de o carro atropelar alguém. Outro receio era o de que o barulho que o veículo fazia assustasse os idosos.
Quando, finalmente, o veículo apontou na entrada da rua, com aquelas rodas altas, pneus finos, o assento lá em cima, pilotado por um homem de guarda-pó e óculos, produzindo explosões que pareciam tiros, a confusão se instalou.
Corria gente para todo lado, as mães alarmadas, as empregadas recolhendo as crianças. As ruas ficaram vazias.
– Cuidado para não serem arrastadas..., gritava um senhor, agarrado a um poste de madeira.
Diziam, na época, que o vento, produzido pelos 20 quilômetros por hora do automóvel, puxava as pessoas de cima das calçadas, jogando-as sob suas rodas.
As explosões do motor pareciam tiros de fuzil.
Como, coincidentemente, era dia de feira, a cidade estava cheia de gente dos sítios próximos, homens e mulheres que, alucinados, corriam assustados, sem rumo, tropeçando e caindo, em meio à gritaria geral.
Uns, mais rápidos, subiam em árvores, outros se jogavam no chão, porém, a maioria procurava abrigo nas casas mais próximas, de parentes ou amigos, que, por sorte, ainda estivessem de portas abertas.
– Corram! Fujam todos! Gritavam alguns, das janelas e portas das casas.
Os soldados do destacamento foram chamados e postaram-se, por trás do edifício da Prefeitura, de fuzil na mão, arriscando um olhar furtivo, de vez em quando.
Alguns meninos corriam desassisados, de um lado para o outro. Os idosos berravam, desesperados, nas janelas. O caos era total!
Alguns, que ainda estavam nas ruas, precisavam atravessar a rua para encontrar a segurança do lar. As beatas se benziam e corriam para a igreja. O automóvel se aproximando, mesmo à distância, não os encorajavam a atravessar a rua.
– É uma temeridade, diziam alguns.
De um lado da rua, uns gritavam: Corra, que dá tempo! Mas, os outros, do lado oposto, desencorajavam: Não! Não atravessem agora! Não vai dar tempo!
O carro avançava, explodindo e resfolegando, com raiva, pela ruazinha central da Cidade, em meio a uma nuvem de poeira e fumaça.
– Cuidado com o vento do carro! Alguém lembrou. Não se debrucem nas janelas, gritava, feito um louco, o dono da padaria, que, prudentemente, fechara as portas do seu estabelecimento desde cedo.
De repente, um rapazinho, que já se encontrava dentro de uma mercearia, apavorou-se com os estrondos, sentindo-se desprotegido e inseguro ali, e no desespero de chegar à sua casa, onde achava que seria mais seguro, precipitou-se porta afora, cruzando a rua a poucos metros do automóvel.
Houve pânico na população – gritos de horror se ouviram – mas, felizmente, o rapaz chegou são e salvo à sua casa, tremendo e muito pálido, no entanto, vivo. Foi necessária apenas uma garapa de açúcar bruto, seguida de um bom banho e de roupas limpas, pois aquelas...
Depois do ocorrido, o comentário geral na Cidade foi: Ele nasceu de novo!


16/11/2014

A G E N D E - S E


GRUPO DE ESTUDOS DE DIREITO TRIBUTÁRIO
EURICO MARCOS DINIZ DE SANTI
CONVITE 
PALESTRA
"KAFKA E TRANSPARÊNCIA" e o lançamento do livro 
"KAFKA , ALIENAÇÃO E TRANSPARÊNCIA".
LOCAL: Auditório da ESMARN
Rua Promotor Manoel Alves Pessoa Neto, 1000
Candelária - Natal
19 de novembro, 18,30 HORAS

Transparência fiscal é tema de palestra dia 19 com Eurico de Santi


A Comissão de Direito Tributário e Defesa do Contribuinte da OAB/RN, presidida por Evandro Zaranza, e o Grupo de Estudos de Direito Tributário “Eurico Marcos Diniz de Santi” promoverão no dia 19 de novembro de 2014, às 18h30, palestra gratuita sobre transparência fiscal  com professor Eurico Marcos Diniz de Santi, no auditório da Escola de Magistratura – ESMARN. Na oportunidade, será  lançada a mais nova obra do palestrante, intitulada “Kafka, Alienação e Transparência”.
Conforme Zaranza, a iniciativa se conecta com projetos desenvolvidos pela Comissão que tem se ocupado em desenvolver, perante o Governo do Estado e Prefeituras Municipais, iniciativas tendentes a forçar os entes políticos a permitir maior transparência e divulgação das informações fiscais necessárias para que o contribuinte possa cumprir seus deveres tributários.
Eurico de Santi 
É Mestre e Doutor em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Professor de Direito Tributário da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargase Coordenador do Curso de Especialização em Direito Tributário do GVlaw. É também vencedor do Prêmio Jabuti em 2008, na categoria de Melhor Livro de Direito, com a obra Curso de Direito Tributário e Finanças Públicas.
Nos anos de 1999 a 2001, por meio de Convênio entre o Instituto Potiguar de Direito Público e o Instituto Brasileiro de Estudos Tributários, Eurico Marcos Diniz de Santi coordenou, à distância, Curso de Especialização Profissionalizante em Direito Tributário que tinha lugar na antiga sede da ESMARN, do qual participaram vários profissionais do Estado atuantes na área, oportunidade em que um forte vínculo foi firmado entre o professor e os alunos, que decidiram, inclusive, continuar os estudos, fundando, em 2002, o Grupo de Estudos de Direito Tributário “Eurico Marcos Diniz de Santi”.
Atualmente, coordena diversos projetos de pesquisando Núcleo de Estudos Fiscais da FGV, dentre os quais pode-se destacar: (i) Reforma Tributária Viável; (ii) Gargalos da Tributação Internacional no Brasil; (iii) Novas Tendências da Tributação Mundial; (iv) Obrigações Acessórias e SPED: Problemas e Soluções para uma Efetiva Simplificação das Obrigações Tributárias; (v) História da Receita Federal; e (vi) Índice de Transparência e Cidadania Fiscal.
Kafka, Alienação e Transparência
A obra que será lançada no evento não pretende ser mais um compêndio de ciência do Direito que descreve e sistematiza a Tributação no Brasil. Muito pelo contrário, ele traz o resultado – bem ao estilo de Franz Kafka – de quem desperta do “sonho (ou pesadelo) dogmático”, orientado pelo estudo profundo das formas jurídicas para enxergar as deformidades do direito e da tributação no Brasil.

O objetivo é demonstrar, mediante o estudo de sete casos concretos, as deformidades institucionais que se processam em tais atos de aplicação do Direito. Seguindo o exemplo do narrador kafkiano, explicitado por Roger Garaudy, o autor ergue o pano de boca do palco sobre o drama, pretendendo despertar nas pessoas a consciência de sua alienação sobre a aplicação da legalidade tributária no Brasil: seja por parte do contribuinte que maneja a lei para obter desonerações ou que realiza evasão para pagar menos tributos, seja por parte do governo que flexibiliza a legalidade, usando a máquina fiscal com o objetivo obsessivo de arrecadar mais e manipular privilégios.

15/11/2014

A PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA NO BRASIL

No dia 15 de novembro de 1889, aconteceu a proclamação que transformou o Brasil em um país de regime republicano. Antes disso, nosso país era um império organizado a partir do rompimento dos laços coloniais com Portugal. A proclamação republicana foi resultado da ação de um grupo de militares, que se colocou contra o governo imperial que era liderado por Dom Pedro II.
A ação dos militares brasileiros realizou-se numa época em que os movimentos de oposição contra o império já aconteciam. No fim do século XIX, vários intelectuais e políticos acreditavam que o Império não era o melhor para o país. A ideia de um governo controlado por um imperador, portando muitos poderes, era entendida como algo que dificultava o desenvolvimento da nação.
Além disso, havia uma grande oposição ao governo imperial por conta do trabalho escravo. A escravidão era interpretada como um tipo de trabalho que impedia o processo de modernização de nossa sociedade, de nossa economia. Portanto, a escravidão deveria ser combatida. Contudo, esse mesmo regime era mantido pelo governo imperial. Com isso, muitos defensores do fim da escravidão também se transformaram em críticos do governo de Dom Pedro II.
Nesse conjunto de transformações, alguns militares engrossaram a fileira dos que não concordavam com o governo de Dom Pedro II. Após a Guerra do Paraguai, ocorrida entre 1864 e 1870, os militares brasileiros ganharam muito prestígio mediante a vitória do país nesse conflito. Valorizados pelo conflito, passaram a exigir maior valorização com melhores salários e a formação de uma carreira mais interessante. Na medida em que o império não cumpria todas essas exigências, importantes figuras do Exército passaram a se contrapor à ordem imperial.
Não bastando esse movimento, devemos destacar o problema surgido nessa mesma época entre o imperador e a Igreja Católica. No fim do século XIX, o papa havia decretado que os católicos envolvidos com a maçonaria deveriam ser expulsos da Igreja. O imperador, que era católico e simpático à maçonaria, acabou não seguindo essa exigência e impediu que os bispos brasileiros seguissem as recomendações papais.
Nesse período, essas tensões cresciam e a abolição da escravidão, decretada em 1888, acabou piorando a situação de Dom Pedro II. Os grandes fazendeiros proprietários de escravos se sentiram desamparados pela Coroa e também passaram a se voltar contra o rei. Nesse contexto de críticas e oposições, passou a correr um boato de que Dom Pedro II iria realizar uma grande reforma nas Forças Armadas, retirando da corporação os militares que se opunham ao Império.
Essa polêmica, alimentada ao longo do ano de 1889, acabou mobilizando um grupo de militares que exigiam a anulação dessa reforma. Alguns outros, já percebiam nessa oportunidade a situação ideal para impor a dissolução do Império Brasileiro. Foi entre essas duas propostas que o marechal Deodoro da Fonseca, líder do Exército, foi convocado para liderar a ação que deu fim à monarquia brasileira. No dia 15 de novembro daquele ano começava o regime republicano brasileiro.
A partir daquele momento, dava-se início a um novo tipo de governo político em nossa história. Na república, temos a organização de um governo que deveria dar mais autonomia aos estados e maior direito de participação política aos cidadãos do país. Apesar de esses serem os dois pilares do nosso regime, foram muitas ainda as lutas e transformações que viriam a garantir realmente essas duas mudanças em nossa realidade política. Ou seja, o 15 de novembro foi apenas um primeiro passo de uma longa estrada a se construir.

Por Rainer Gonçalves Sousa
Colaborador Escola Kids
Graduado em História pela Universidade Federal de Goiás - UFG
Mestre em História pela Universidade Federal de Goiás - UFG

14/11/2014

A casa onde moraram os pais de Henrique Alves 
e de Robinson Faria. Algumas coincidências
Luiz Gonzaga Cortez*

Na Rua Felipe Camarão, 467, Centro de Natal, há uma residência que foi ocupada por duas famílias de destaques na política potiguar, desde os anos 30/40 do século passado. Nela viveram lideranças políticas já falecidas, portanto, com os seus nomes gravados na História, enquanto outras estão no cume de suas carreiras.
Situada na esquina das ruas Felipe Camarão e Auta de Souza, a casa, hoje ocupada por uma empresa de planos de saúde, foi de propriedade do comerciante Manoel Alves, “seu Nézinho”, pai do ex-Governador e ex-Ministro Aluizio Alves, o maior líder político do Rio Grande do Norte em todos os tempos. Toda a família de “seu Nézinho” morou naquela casa até meados da década de 40. Nos fundos da casa ainda está edificado o apartamento de Aluizio e Agnelo, nos anos em que estiveram enfermos.
O segundo proprietário do imóvel foi o Sr. Juvenal Justiniano de Faria e sua esposa e prima, Pocina. Sr. Juvenal, natural do Ceará, ainda menino, fugiu de uma longa seca e migrou para Serra Negra do Norte, onde encontrou abrigo e ajuda de parentes. Dedicou-se a agricultura e pecuária e, quando os bons ventos sopravam a seu favor, transferiu-se para Natal e constituiu família. Pois é, o Sr. Juvenal, que conheci pessoalmente, era o avô do governador eleito, Robinson Faria, filho de Osmundo Faria, empresário já falecido.
Robinson Faria, o eleito, não morou na casa de Sr. Juvenal, mas deve ter visitado os avós paternos quando criança ou adolescente. Henrique Eduardo Alves, filho de Aluizio Alves, que não venceu a disputa pela governança do Estado, no último pleito, também não residiu na antiga residência de seu avô paterno e nunca esteve lá.
Quanto a Agnelo Alves, não é necessário dizer que o seu filho Carlos Eduardo Nunes Alves é o prefeito de Natal e com futuro político promissor. E mais: Carlos Eduardo é amigo de Robinson desde os anos 70, época em que estudavam, na mesma turma, no Colégio Salesiano São José, na Ribeira, ao lado de outros jovens que se destacaram na sociedade, como Raniére Barbosa, vereador muito ligado ao prefeito da capital.
Finalmente, a casa que serviu de moradia às famílias dos pais de Henrique Alves e de Robinson Faria, tem história. Quem se habilita a resgatar a sua história, ouvindo ex-moradores e testemunhas dos seus possíveis eventos sociais e políticos?


*Luiz Gonzaga Cortez é jornalista e pesquisador.

13/11/2014

Bento José da Costa Junior e Emília Júlia Pires Ferreira

João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor da UFRN, membro do IHGRN e do INRG

No dia 6 de março de 1817, teve início, em Recife, uma revolução, também conhecida como Revolução dos Padres. Teve curta duração, e dela resultou o assassinato de André de Albuquerque Maranhão, que chefiou, por curto espaço de tempo, os rebeldes do Rio Grande do Norte. Quem também pagou com a vida, por dela participar, foi nosso Frei Miguelinho, arcabuzado em Salvador, em 12 de junho de 1817. Nessa mesma data e lugar, também foi arcabuzado, outro líder desse movimento de independência, o capixaba Domingos José Martins.

Domingos, que vinha namorando escondido por cinco anos, Maria Theodora da Costa, casou, logo após a tomada do poder, no dia 14 de março, na Capela da Jaqueira. A noiva da Revolução, como ficou conhecida, era filha de Bento José da Costa e Anna Maria Theodora Moreira de Carvalho.   Bento e o sogro, Domingos Affonso Ferreira, além de participarem de várias arrematações de dízimos, aqui no Rio Grande do Norte, eram donos de muitas terras na Região das Salinas, incluindo aí, a Ilha de Manoel Gonçalves, Ilha de Macau, e Cacimbas do Vianna, fazenda de muitos gados. Com a morte de Domingos Affonso Ferreira, no começo do século XIX, Bento ficou com praticamente todas as terras, mas em 1834 faleceu, e as terras herdadas pelos filhos, principalmente as da região salineira, foram vendidas somente em 1868, por Bento José da Costa Junior e a esposa Emília Júlia Pires Ferreira para José Gomes de Amorim.

Esse casal foi padrinho em um batismo, aqui no Rio Grande do Norte, em 1845, como podemos ver do registro a seguir: Maria, filha do major José Martins Ferreira e sua mulher Dona Josefina Martins Ferreira, nasceu a dois de junho de 1845, e foi batizada a dezoito de agosto de 1846, no dito Comissário, por mim solenemente. Foram padrinhos Bento José da Costa (Jr.) e Dona Emília Júlia Pires Ferreira, por procuração ao capitão Pedro Alves Ferreira, e Dona Josefa Christiniana Ferreira, do que para constar fiz este assento, em que me assino. Manoel Januário Bezerra Cavalcanti, pároco colado do Assú.

O Comissário acima era em Cacimbas do Vianna, hoje pertencente ao município de Porto do Mangue, onde residiam nessa época meus trisavós, o major José Martins e sua esposa Josefina Maria. Os padrinhos de Maria moravam em Recife, onde casaram conforme o registro abaixo.

Aos vinte e cinco dias do mês de abril de mil oitocentos e vinte e cinco, com despacho do Ilustríssimo Senhor Vigário Capitular, Jerônimo Gonçalves dos Santos, pelas cinco horas da tarde nesta Freguesia, no Oratório da casa de residência de Gervásio Pires Ferreira, feitas as denunciações na forma do Sagrado Concílio Tridentino, nesta Matriz do Santíssimo Sacramento da Boa Vista, em três dias sucessivos, por despacho do mesmo Ilustríssimo Senhor Vigário Capitular donde a nubente é moradora, e nas suas Igrejas Paroquiais da cidade do Recife, donde o nubente é natural e morador, tendo a nubente justificada sua menor idade e sua naturalidade, e dispensados do grau de parentesco em que se acham ligados, sem se descobrir impedimento algum, de minha licença, em presença do Reverendo Vigário Virgínio Rodrigues Campello, e das testemunhas Gervásio Pires Ferreira, casado, morador nesta Freguesia, e o coronel Bento José da Costa, casado, morador no Recife, se receberam por palavras de presente Bento José da Costa Junior e Dona Emília Júlia Pires Ferreira, brancos; ele, nubente, filho legítimo do coronel Bento José da Costa e Dona Anna Maria Theodora Moreira de Carvalho, e a nubente filha legítima de Gervásio Pires Ferreira, e de Dona Genoveva Perpétua  de Jesus Caldas; e logo receberam as bênçãos nupciais conforme o Rito Romano, como consta da certidão, banhos, despacho, mandado de casamento e dispensa que ficam no arquivo desta Matriz; do que mandei fazer este assento que por verdade assinei. Vigário José de Sousa Serrano.

O português Domingos Affonso Ferreira era primo legítimo de Gervásio Pires Ferreira, pois sua mãe, Isabel Pires, era irmã de Domingos Pires Ferreira, pai de Gervásio. Daí o parentesco de Bento Junior com Emília Júlia, via Anna Maria Theodora, filha de Domingos Affonso.

Quando as capitanias foram transformadas em províncias, estas foram inicialmente governadas por uma junta governativa. Em Pernambuco, ela tinha sete membros e governou de setembro de 1821 a setembro de 1823, tendo entre seus membros, Gervásio Pires Ferreira, como seu presidente; Felippe Nery Ferreira, filho de Domingos Affonso Ferreira; e Bento José da Costa, genro de Domingos Affonso Ferreira.

Para finalizar, transcrevemos o batismo de uma filha do tenente-coronel Bento, irmã de Bento Junior: aos dezessete dias do mês de fevereiro do ano de mil oitocentos e cinco, na Capela de Nossa Senhora da Conceição das Barreiras (conhecida posteriormente com Capela da Jaqueira), de minha licença, batizou e pôs os Santos Óleos o Padre Antonio Gomes, da Congregação do Oratório, a Francisca, branca, nascida aos nove do dito mês e ano, filha de Bento José da Costa e sua mulher Anna Maria Theodora, esta natural da Freguesia de São Pedro Gonçalves do Recife, e neta paterna de Antonio José da Costa, e de Maria da Costa, e materna de Domingos Affonso Ferreira e de Maria Theodora Moreira de Carvalho. Foram padrinhos Bernardo José da Costa por procuração sua que apresentou Alexandre Affonso Ferreira e Maria Theodora Moreira de Carvalho, solteira. O vigário Gabriel Bezerra Bittencourt. A batizada devia ser Francisca Escolástica Josefa da Costa, que casou com Antonio da Silva Junior.

12/11/2014

Meu tetravô e o testamento de Domingos Affonso Ferreira Jr.

João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor da UFRN, membro do IHGRN e do INRG
Segundo Zilda Fonseca, em “Desbravadores da capitania de Pernambuco, seus descendentes, suas sesmarias”, Domingos Affonso Ferreira Jr. nasceu em 1781, filho de Domingos Affonso Ferreira e Maria Theodora Moreira de Carvalho. Enquanto Maria Theodora faleceu aos 9 de dezembro de 1803, seu marido, Domingos,  faleceu, no ano seguinte, aos 5 de fevereiro, menos de dois meses depois. O inventário destes dois últimos durou muitos anos. Em 1810, o inventariante, Bento José da Costa, ainda pedia avaliações das terras e bens, aqui no Rio Grande do Norte, sendo seu representante e administrador das terras do Assú, José Álvares Lessa.
Aos 28 de março de 1814, Domingos Jr. fez seu testamento, iniciando com as seguintes palavras: Digo eu, Domingos Affonso Ferreira (Jr.), que estando de cama temendo a morte, não sabendo a hora, e por estar em meu perfeito juízo ordeno meu testamento pela maneira seguinte. Primeiramente encomendo a minha alma a Santíssima Trindade que me criou e queira receber minha alma no céu, assim como fez a Jesus Cristo, unigênito do Padre, que uniu os homens, encomendo-me a Maria Santíssima, Anjo de minha guarda, Santo do meu nome queiram ser os medianeiros diante de Deus.
Nomeou como seus testamenteiros, o cunhado, coronel Bento José da Costa, Dona Joanna Cândida de Lima, e Dona Izabel Maria Ferreira. Declarou que era natural da Vila do Recife, filho de Domingos Affonso Ferreira e Dona Maria Theodora Moreira de Carvalho. Disse mais, que do melhor da sua fazenda fosse para o afilhado José Affonso Ferreira. Deixou mais ainda, quantia em dinheiro, para as tias D. Catarina Angélica, Dona Joaquina da Conceição e Dona Joanna Cândida, e para sobrinha e afilhada Dona Maria, filha de sua irmã Izabel Maria Ferreira. Nomeou como seus herdeiros universais seus irmãos machos e fêmeas.
Afirmou, ainda, que de posse dele havia um sítio na Ponte de Uchoa, com casa de vivenda, por conta do que lhe ia tocar por herança dos seus falecidos pais, cujos bens se achavam pro indivisos. Declarou que tinha contas com seu cunhado Bento José da Costa, com outro cunhado, José Antonio Alves de Souza, e com sua irmã Izabel Maria Ferreira.
Aos 23 de abril de 1814, pouco tempo depois do seu testamento, Domingos Jr. faleceu, solteiro, na Boa Vista, sem deixar sucessão.
No seu inventário, o que chama a nossa atenção é o número de pessoas que lhe deviam. A quase totalidade dos devedores estava, também, no inventário dos seus pais. É possível que ele tenha herdado essas dívidas ativas. Na lista, em ordem alfabética, aparecem, entre os muitos devedores, Antonio Lopes Viegas, Francisco Antonio Teixeira, lá do Assú,  e Bernardo José da Costa, irmão de Bento José da Costa.  Algumas dívidas já estavam a cargo de outras pessoas, entre elas o  inventariante Bento.
Em 1815, José Álvares Lessa, já era falecido, como se poder ver, em “Questão de Limites”, de um ofício do vereador Manoel Ignácio Pereira do Lago para o escrivão geral da Vila Nova da Princesa, Manoel de Melo Montenegro Pessoa. Por isso, nas dívidas ativas de Domingos Affonso Ferreira Junior, encontramos, que a cargo de João Martins Ferreira (meu tetravô) ficou uma dívida do falecido José Álvares Lessa, administrador das Fazendas do Assú, e consta da conta que com ele se ajustou em dezesseis de outubro de mil oitocentos e onze, o qual não deixou bens e sim algumas dívidas. Mais ainda, a cargo do dito João Martins, parte das dívidas que deviam as fazendas do Assú, de mil setecentos e noventa e oito a mil oitocentos e quatro, e mais ainda, as dívidas que deviam outras fazendas desde mil oitocentos e quatro a mil oitocentos e onze.
Além das terras compradas por Bento José da Costa e seu sogro,   Domingos Affonso Ferreira, em 1797, havia mais duas Sesmarias recebidas por este último em 1798, tudo aqui no Rio Grande do Norte. O capitão João Martins Ferreira foi administrador das terras do Assú, com base na Ilha de Manoel Gonçalves, e pelo visto deve ter assumido com o falecimento de Lessa. Outro detalhe é que a esposa de João Martins Ferreira se chamava Josefa Clara Lessa, possivelmente, filha do falecido José Álvares.
Felipe Neri Ferreira, irmão de Domingos

11/11/2014



MIGUELINHO – (1)


Jurandyr Navarro
Do Conselho Estadual de Cultura

O patrimônio histórico-cultural do Rio Grande do Norte é possuidor de perfis hu­manos os mais ilustres e ilustrados: o Padre Miguelinho é um deles. Santificou-se como Mártir da Pátria. Santo e herói. Herói pela coragem e santo pela dignidade. Ninguém mais digno na sua atitude de idealista. No martírio ninguém mais corajoso.
Este, o valor da sua alma e a força do seu coração. Contudo, sobressai-lhe outros méritos incontestáveis. Um deles gerou frutos da sua inteligência: o de Orador.
No seu tempo, o discurso era, regra geral, gongórico, adornado de enfeites retóricos, períodos intercalados de transparências exclamativas, com suas expressões sentimen­tais; acentuações do que se diz, na interjeição; as apóstrofes; a exageração das propor­ções naturais, na hipérbole, etc. A tudo isto acrescentava-se o exórdio e a peroração. Hoje, tornar-se-ía cansativo e enfadonho. O nosso século é o século da velocidade, do pragmático, do objetivo. Porém, para a época era um primor literário, o gênero da orató­ria rebuscada.
O tempo atual mudou o seu aparato bombástico. O discurso dos dias presentes é mais enxuto, substantivado, objetivo. Tem visos de alocução. Mais direto, sem insinua­ções, nem arrodeios. Não se parece mais com a conferência, que precisa conferir... e sim com a palestra, simples e breve.
Diversa a época de 1817 quando a tribuna se ataviava de encantos literários. O valor conotativo da oratória era mais rico.
E o padre Miguelinho foi um grande orador, via por onde desaguava a vasta erudi­ção de suas letras clássicas. A sua Orasam Acadêmica foi um dos marcos iniciais da Universidade Brasileira, uma verdadeira Aula Magna de cultura humanista.
Diz Daniel-Rops, da Academia Francesa, que o púlpito foi implantado nas Igrejas pelos Dominicanos, em Toulouse, quando se iniciou a Pregação. São Bernardo, o mon­ge branco; Francisco de Assis; são Domingos, atraem multidões. O mais famoso des­ses pregadores - Santo Antônio de Pádua. Seguem-se são Boaventura, Thomaz de Aquino, Pedro, o Eremita... Gilbert de Nogent, Urbano II e Inocêncio III.

"Os dois Testamentos são os peitos. Pregadores, bebei!" exclamava Hildeberto... “Todos os Sermões medievais transbor­dam de vida, de matiz, e terminam com uma mensagem edificante, facilmente compreensível".

Tal a fonte que iria beber Miguelinho para tornar-se Pregador, que o foi culminando com a láurea de respeitado docente de Retórica, no Seminário de Olinda.
Como político, nas reuniões secretas que tomou parte, o verbo de Miguelinho deve ter sido inflamável como inflamável era o seu nacionalismo, o seu patriotismo, o seu idealismo. A oratória vibrante devia possuir a flama ardente de um Raul Ardent, sacer­dote, cuja "palavra era um gládio".
Além de grande tribuno foi também professor de Teologia. Foi ele um dos primei­ros a levantar a chama ardente da inteligência pátria nos currículos universitários. A História registra o seu nome glorioso de intelectual e orador com o mesmo carinho e veneração que o faz em relação ao seu martírio heróico.

A sua coragem diante dos juizes do seu julgamento traçou-lhe o tristonho fadário, mas transformado em glória. Idealismo glorioso o dos mártires heróicos!
Dando continuidade ao artigo anterio, recordando o vulto memorável do Padre Miguelinho, na passagem de mais um ano do seu martírio, pela causa da independêcia pátria, apresentamos mais alguns tópicos da sua biografia.
Miguel Joaquim de Almeida era natalense, nascido no bairro da Ribeira a 17 de novembro de 1768.
Filho legítimo de Manoel Pinto de Castro, de origem portuguesa e de d. Francisca Antônia Teixeira, natural de Natal. Seus irmãos Inácio e Manoel, sacerdotes e José Joaquim, paroquiano, e a irmã Clara. Batizado na Matriz da Apresentação, um mês depois de nascido.
Miguelinho, em plena adolescência viajou para a Capital pernambucana. Pertenceu  à Ordem Carmelita. Depois empreendeu viagem a Portugal para prosseguir nos estudos religiosos e literários, lidando com inúmeros intelectuais lusitanos e brasilieiros, dentre sacerdotes eleigos.
Em 1800, aos trinta e dois anos, requereu a chamada secularização, deixando de ser frade para torna-se padre, condição que permaneceu pelo resto da vida.
Como foi dito no artigo anterior, tornou-se aplaudido orador sacro, lecionando Retórica no Seminário de Olinda, quando do seu retorno ao Brasil.
Patriota convicto, assumiu destacada posição no grupo político conspiratório imbuído de idéias libertárias, fazendo parte de reuniões em Recife e Olinda.
Tomou parte do então governo Provisório, por ter sido um dos líderes da Revolução de 1817.
Após, como a História registra, o movimento foi contido pela chamada contra-revolução, tendo sido preso e fuzilado no Campo da Pólvora, na Bahia.
Teve um martírio heróico, ao assumir a responsabilidade dos atos revolucionários, livrando, assim, muitos outros adeptos do movimento político abortado.
Entretanto, esse movimento conspiratório serviu de semente que germinaria cinco anos depois, em 1822, quando brotou do solo, ainda ensanguentado, a árvore da liberdade.
A sua Estola é uma das relíquias raras guardada no nosso Instituto Histórico e Geográfico e o seu retrato, em pintura, de fina arte, do pintor Parreiras, segundo o pesquisador Cláudio Galvão, cuja criaçao deu-se na atmosfera de Paris de 1916,e que adorna uma das paredes da Presidência da nossa Casa da Memória.
Opadre Miguelinho tinha inclinaçao pelas alturas. Perseguiu sempre as realizações enobrecedoras do espírito humano, as grandes coisas, como se diz: a grandeza da Religião envolta no seu mistério imponderável, a sabedoria na arte retórica e o idealismo político, traduzido no sublime ideal pátrio. Preciosidades estas advindas da instrução intelectual sob a proteção dos valores da ética e da moral.
A sua formação educacional foi perfeita e plena, pois partiu da sua primeira idade, a primavera da vida, o que é importante, no pensar de ilustrados educadores, já que a planta tudo produz através da sua raíz.
Em respaldo a essa argumentação aduz Sêneca ser ridícula um velho estudando na escola primária. E conclui: “ao jovem compete preparar-se e ao velho realizar-se”.
Elogiável a vida de Miguelinho por ter sido plena por atividades corajosas, de disciplina espiritual e de grandeza de carater.
Em carta ao amigo Lucílio, diz o autor de “Aprendendo a Viver”, acima citado: “a vida deve ser medida pelas ações e não pelo tempo”.
Dessa passagem histórica, quase dois seculos decorridos, o Brasil se encontra com sua independência consolidada e seu potencial energético e econômico causam inveja a muitos paises civilizados, graças a têmpera de pessoas como padre Miguelinho, cuja decisão partriótica iluminou o caminho.


MIGUELINHO  -  (2)


Dando continuidade ao artigo anterio, recordando o vulto memorável do Padre Miguelinho, na passagem de mais um ano do seu martírio, pela causa da independêcia pátria, apresentamos mais alguns tópicos da sua biografia.
Miguel Joaquim de Almeida era natalense, nascido no bairro da Ribeira a 17 de novembro de 1768.
Filho legítimo de Manoel Pinto de Castro, de origem portuguesa e de d. Francisca Antônia Teixeira, natural de Natal. Seus irmãos Inácio e Manoel, sacerdotes e José Joaquim, paroquiano, e a irmã Clara. Batizado na Matriz da Apresentação, um mês depois de nascido.
Miguelinho, em plena adolescência viajou para a Capital pernambucana. Pertenceu  à Ordem Carmelita. Depois empreendeu viagem a Portugal para prosseguir nos estudos religiosos e literários, lidando com inúmeros intelectuais lusitanos e brasilieiros, dentre sacerdotes eleigos.
Em 1800, aos trinta e dois anos, requereu a chamada secularização, deixando de ser frade para torna-se padre, condição que permaneceu pelo resto da vida.
Como foi dito no artigo anterior, tornou-se aplaudido orador sacro, lecionando Retórica no Seminário de Olinda, quando do seu retorno ao Brasil.
Patriota convicto, assumiu destacada posição no grupo político conspiratório imbuído de idéias libertárias, fazendo parte de reuniões em Recife e Olinda.
Tomou parte do então governo Provisório, por ter sido um dos líderes da Revolução de 1817.
Após, como a História registra, o movimento foi contido pela chamada contra-revolução, tendo sido preso e fuzilado no Campo da Pólvora, na Bahia.
Teve um martírio heróico, ao assumir a responsabilidade dos atos revolucionários, livrando, assim, muitos outros adeptos do movimento político abortado.
Entretanto, esse movimento conspiratório serviu de semente que germinaria cinco anos depois, em 1822, quando brotou do solo, ainda ensanguentado, a árvore da liberdade.
A sua Estola é uma das relíquias raras guardada no nosso Instituto Histórico e Geográfico e o seu retrato, em pintura, de fina arte, do pintor Parreiras, segundo o pesquisador Cláudio Galvão, cuja criaçao deu-se na atmosfera de Paris de 1916,e que adorna uma das paredes da Presidência da nossa Casa da Memória.
Opadre Miguelinho tinha inclinaçao pelas alturas. Perseguiu sempre as realizações enobrecedoras do espírito humano, as grandes coisas, como se diz: a grandeza da Religião envolta no seu mistério imponderável, a sabedoria na arte retórica e o idealismo político, traduzido no sublime ideal pátrio. Preciosidades estas advindas da instrução intelectual sob a proteção dos valores da ética e da moral.
A sua formação educacional foi perfeita e plena, pois partiu da sua primeira idade, a primavera da vida, o que é importante, no pensar de ilustrados educadores, já que a planta tudo produz através da sua raíz.
Em respaldo a essa argumentação aduz Sêneca ser ridícula um velho estudando na escola primária. E conclui: “ao jovem compete preparar-se e ao velho realizar-se”.
Elogiável a vida de Miguelinho por ter sido plena por atividades corajosas, de disciplina espiritual e de grandeza de carater.
Em carta ao amigo Lucílio, diz o autor de “Aprendendo a Viver”, acima citado: “a vida deve ser medida pelas ações e não pelo tempo”.
Dessa passagem histórica, quase dois seculos decorridos, o Brasil se encontra com sua independência consolidada e seu potencial energético e econômico causam inveja a muitos paises civilizados, graças a têmpera de pessoas como padre Miguelinho, cuja decisão partriótica iluminou o caminho.