14/10/2014

IHGRN

 
CONVOCAÇÃO PARA SESSÃO DE ASSEMBLÉIA GERAL ORDINÁRIA.
 
EDITAL
 
 
O Presidente do INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO RIO GRANDE DO NORTE – IHGRN, na conformidade das disposições combinadas dos artigos 10, parágrafo único e 15, letra “d” do Estatuto vigente, convoca os seus sócios que estejam em pleno gozo de seus direitos sociais estabelecidos no referido Estatuto, para se reunirem em Sessão de Assembleia Geral Ordinária, que se realizará no dia 15 de outubro (quarta-feira) de 2014, no auditório da Instituição, à Rua da Conceição, 622 – Cidade Alta, nesta Capital, às 15,30h (quinze horas e trinta minutos) em primeira convocação, com presença da maioria absoluta dos sócios; trinta minutos após, em segunda convocação, com qualquer número dos sócios, a fim de discutir e deliberar sobre a seguinte Ordem do Dia:

A) Apreciação do Relatório de Gestão e Demonstração de Resultado da Diretoria do IHGRN – período de 15 de março a 31 de dezembro de 2013;
B) Apreciação da Resolução nº 01/2014, de 04 de julho de 2014, de aumento da anuidade para o exercício de 2015;
C) Outros assuntos correlatos.
Natal/RN, 29 de setembro de 2014
 
Valério Alfredo Mesquita
Presidente
 
 

13/10/2014

Economia


O paradoxo da reforma agrária

Tomislav R. Femenick – Contador, mestre em economia e historiador.


Plantar e colher alimentos foram ações determinantes para a evolução do processo civilizatório da humanidade. A posse da terra teria sido decisiva para a formação das famílias, dos clãs e das nações. Inicialmente propriedade comum a todos os componentes do grupo, depois a propriedade da terra tomou o caráter individual; isso em decorrência da imposição das armas ou das leis. Friedrich Engels, o amigo mais intimo de Karl Marx, aborda esse assunto em seu famoso livro “Origem da família, da propriedade privada e do Estado”.
Todavia, os excluídos da posse da terra sempre se insurgiram contra essa situação. A historiografia registra lutas de camponeses em diversas épocas, sendo a mais citada a liderada pelos irmãos Tiberio e Caio Graco no século II, antes de Cristo. Os detalhes dessa revolta é que são importantes e, paradoxalmente, geralmente ocultados: embora plebeus, Tiberio e Caio eram integrantes de uma importante e aristocrática família romana e a reforma por eles pregada era a distribuição das terras tomadas pelas invasões romanas (notadamente nas regiões de Tarento e na Cápua), que estava concentrada nas mãos da nobreza.
Durante toda a Idade Média, a Igreja adotou a postura de limitar o direito de propriedade com base no bem comum e no direito do indivíduo a uma vida digna, porém ela mesma era uma das maiores detentora do direito sobre a terra. Essa contradição, bem como o enfraquecimento da autoridade dos reis e o fortalecimento do poder dos senhores feudais sepultaram as frágeis tentativas de conquista de posse da terra pelos trabalhadores rurais. O resultado foi um retrocesso no desenvolvimento da economia.
Esse estado de coisa começou a mudar no século XVIII com a Revolução Francesa, que aboliu a servidão rural, reformulando as relações de trabalho no campo. Outro grande avanço ocorreu em 1862 nos Estados Unidos, quando foi sanciona a lei que concedeu terras públicas a pequenos fazendeiros, a baixo custo. Não por acaso ainda hoje a França é considerada o celeiro da Europa e os Estados Unidos são os maiores produtores agrícolas do mundo; claro que à solução do problema fundiário se somaram a facilidade do crédito e o desenvolvimento tecnológico.
Na Ásia, até a Segunda Guerra, Japão, Taiwan e Coréia apresentavam sérios problemas de concentração da posse da terra e de escassez de alimentos. O problema japonês foi resolvido pelas forças de ocupação norte-americanas que impôs a reforma agrária, modelo que foi transplantado para Taiwan, onde em poucos anos foi transferido aos agricultores o equivalente a 13% do PIB. Na Coréia do Sul o governo forçou os proprietários a transferirem a posse da terra aos antigos arrendatários, o que provocou recorde na produção de alimentos e grãos.
De volta a Europa, há que se citarem os êxitos obtidos com a redistribuição da terra na Itália, Finlândia, Alemanha e Países Baixos – sempre acompanhada de assistência técnica e juros baixos. Porém, não se poderia deixar de falar nas reformas agrárias promovidas nos países de governos socialistas, principalmente na antiga União Soviética e China. Na URSS houve duas fases distintas. Na primeira os camponeses ocuparam as terras dos antigos latifundiários em nome da revolução, depois o governo as expropriou em nome da coletivização, uma experiência que custou a vida de cerca de seis milhões de pessoas e resultou numa colossal ineficiência produtiva. Na China de Mao de Mao Tse-tung, a reforma agrária obrigou os camponeses a se agruparem em gigantescas “comunas agrícolas”, o que teria causado a morte pela fome, de 20 a 40 milhões de pessoas, até 1962.
Essa conjunção de fatos históricos nos leva a uma conclusão: a reforma agrária é necessária, deve vir com assistência creditícia e tecnológica e só dá certa quando realizada sob a ótica do capitalismo.
 

12/10/2014


As causas da deposição do jornalista Pedro Avelino

João Felipe da Trindade
jfhipotenusa@gmail.com

Este artigo complementa dois outros, aqui publicados, de uma entrevista que o jornalista Pedro Avelino deu, após seu retorno de Acre, onde exerceu o carto de Prefeito do Departamento do Alto Juruá.

Após a descrição do Acre e do Departamento do Alto Juruá, na entrevista para o jornal " A Imprensa", o major Pedro Avelino fez nova pausa.
- O Sr. Já falou ao Sr. Presidente da República e ao Sr. Ministro do Interior? Perguntamos.

- É justamente por não o ter feito que estou a pensar até onde iremos com esta palestra.

Perdão! Tendo o Sr. sido deposto, é natural o nosso desejo de saber as causas e os autores desse golpe, na pessoa do Prefeito que foi... E não seria indiscreto indagar?

- Ora, eu lhe conto: essa ideia de autonomia do Acre é o eixo em torno do qual giram as explorações e conclama aos magotes aqueles aventureiros de vasa moral de que lhes falei, encabeçados por meia dúzia de indivíduos que sabem, com artimanhas de todo o feitio e despudor galvanizado, fingir importância.

Em lá chegando, encontrei as explorações dessa horda, a título de autonomia:acabaram de depor o prefeito, Sr. João Cordeiro, iniciando um tremendo movimento desorganizador do governo; este movimento foi sufocado pelo Sr. Capitão Guapindaia, comandante da força federal que à frente da mesma e armado de metralhadoras, o dominou, arvorando-se com a fuga do Sr. João Cordeiro, em prefeito. Substituiu o Sr. capitão Guapindaia, no comando da força federal, o Sr. capitão Júlio Serpa, que por seu turno, se fez prefeito; recebi o governo da Prefeitura deste militar, que me acolheu sem nenhuma solenidade, nem mesmo do estilo, numa parcimônia da manifestação, que traia com clareza, o seu dissabor em se ver despojado do cargo que não era seu, como não era do seu colega antecessor.

Logo que tomei posse, este Sr. capitão Júlio Serpa exigiu o meu endosso aos atos que praticou na qualidade, que não tinha, de prefeito – e exigindo clamava em tom de gabolice – “ o povo me adora”!; protelei o endosso, examinando os papéis que eram de nomeação, substituições de cargos, de concessões, de favores; enquanto protelava, em dias  que se seguiram, o Sr. capitão Serpa andava a apregoar pelas ruas, em rodas de seus amigos e conhecidos, que eu lhe havia de aprovar os atos, porque a força era ele e a ele o povo adorava. Naturalmente, tratei de observar, de indagar, de sindicar dos hábitos das autoridades e das suas relações públicas e particulares com a população e concluí, e lá toda gente vê e sabe, como eu vi e sei, que a mais desenfreada desordem reinava permanentemente entre os comandados e o comandante da força federal; os soldados indisciplinados são comparsas dos magotes políticos e tomam parte nas suas festas e são seus comensais, sendo tidos como personalidades de muito valor. 

Nem se diga que os soldados figuram nessas festas e nesses banquetes apenas decorativamente, não: um soldado aqui é amigo intimo e do particular carinho de um político ali; outro soldado acolá é amigo intimo e companheiro assíduo de outro político adiante; daí a indisciplina que o próprio comandante não corrige, porque o político amigo particular  do soldado intervém, cumulando o comandante de agrados e de presentes caros, de obséquios repetidos: e suborna pela bajulação. O Acre é o paraíso do soldado.

Compreendendo a situação aprovei os atos do Sr. capitão Serpa, contemporizando e procurando com jeito restabelecer o princípio de autoridade. Neste trabalho obtive a instauração de inquérito contra os soldados recalcitrantes na indisciplina e os remeti presos para o comandante da região militar, em Manaus, o Sr. coronel Rego Barros; aos soldados indisciplinados porém, este coronel não deu corrigenda alguma, caso que ocorre no Alto Juruá. No dia 14 de julho do ano próximo findo, o Sr. capitão Serpa, mancomunado com os Srs. Djalma Mendonça, juiz substituto, Carlos Gomes Rebello Horto, promotor público; João Craveiro Costa, solicitador, Borges de Aquino, solicitador, chefiando os chamados revoltosos autonomistas, que são aquele pessoal,  que conhecemos, excluindo o coronel Mâncio Lima, que é homem de bem, tentou a minha deposição. O movimento, felizmente, falhou, devido as precauções que tomei, por ter conhecimento do que se tramava e pela coincidência da chegada do Sr. capitão José Menescal de Vasconcellos, que, a meu pedido ao Sr. coronel Rego Barros, vinha substituir interinamente, o Sr. capitão Serpa.

O Sr. capitão José Menescal de Vasconcellos foi um militar sisudo, correto e digno, mantendo sempre uma nobre linha de independência  e prestigiando a minha autoridade de prefeito.

Aqueles elementos de subversão, entretanto, não desacoroçoou ante o insucesso do golpe que iam dar com a chefia do Sr. capitão Serpa, e nos dias 7 e 8 de novembro do ano próximo findo, tentaram, mais uma vez, a minha deposição; falho mais este golpe, e falhou porque o Sr. capitão Menescal de Vasconcellos, comandante interino da companhia  da força federal, e o Sr, João Júlio da Silva, comandante da policia do departamento, sufocaram, com energia, o movimento.

Cooperou do seu lado pelo malogro da pseudo revolução, a chegada do Sr. capitão Polydoro Rodrigues Coelho, comandante efetivo da companhia da força federal e de  seu imediato no comando, Sr. tenente Cândido Thomé Rodrigues. Retirou-se, pois, o comandante interino, Sr. capitão Menescal de Vasconcellos. 

Gorado o movimento, os seus cabecilhas, em 11 de novembro, três dias depois abandonou o departamento, e os que ficaram, temendo o justo castigo aos seus atos, impetraram ordem de ”habeas corpus” – dezoito pedidos – ao juiz de direito da comarca, dr. Lymério Celso da Trindade, que é um íntegro magistrado.

O Sr. capitão Polydoro Rodrigues Coelho, - continuou o Sr. major Pedro Avelino, - de índole autoritária e violenta, logo após a sua posse no comando, aparentou correção no cumprimento de seus deveres para com a prefeitura; à proporção, porém, que passava o tempo, se foi ele a imiscuir, e conviver com os indivíduos da amizade do Sr. capitão Serpa, e o seu companheiro de armas, Sr. tenente Cândido Thomé Rodrigues, fez tamanha relação com o solicitador Borges de Aquino, conhecido elemento subversivo da ordem, que passou mesmo a morar em casa deste.

Deste ponto em diante a situação mostrava outras faces: eu compreendia, eu estava farto de compreender, que os tais autonomistas não passavam, nem passam de uns embaçadores, que se aproveitavam de uma falsa compostura política regional para explorar, à vontade, todos os meios de lucros, favorecendo simultaneamente, os baixos instintos da patuléia dos aventureiros inferiores e à vaidade de alguns seringueiros e a ignorância dos soldados de “pret” da força federal e o espírito autoritário dos comandantes dessas praças. Todavia, agi como me foi possível e como me aconselhava a consciência: semanas após minha chegada, verificando a existência do Lyceu Affonso Penna, estabelecimento secundário, mantido pela prefeitura e consumindo cento e quarenta contos por ano, fui visitá-lo. Nessa visita inteirei-me de que o estabelecimento não possuía o número de alunos suficiente que justificasse a sua existência, tanto que, para esconder este grave fato, mantinham curso de primeiras letras.

Feita a visita e cientificado do que sucedia, nomeei uma comissão dos Srs. Dr. José Joaquim de Oliveira, Belizário de Sousa Junior, Antônio de Salles Ferreira, e tenente Luiz Souto, todos altos funcionários da Prefeitura, a fim de inspecionar o estabelecimento sob todos os aspectos e me apresentar o relatório.

Ante este relatório, que acusava a inutilidade do estabelecimento, suspendi a função do mesmo, submetendo o meu ato ao governo federal, que o aprovou.

Originou-se deste caso a campanha de ataques e de difamações à minha administração promovida pelo solicitador Craveiro Costa, e outros professores do Lyceu, que se viram privados da pensão do governo, que recebiam sob pretexto do exercício do magistério, sendo estes cavalheiros membros da Associação Comercial de Cruzeiro do Sul, fizeram desta uma das suas melhores armas contra mim. Foi uma campanha tenaz, sistemática, aproveitando todos os precedentes da administração da prefeitura com os meus antecessores, captando solidariedade da força federal por meio de adulações, presentes ao comandante, aos soldados, campanha que fazia a sua tecla mais alta, para efeitos de descrédito da conduta do ex-prefeito Sr. coronel João Cordeiro, meu antecessor, que, como é sabido, dos quatrocentos contos de réis da verba “material”, do exercício de 1910, apenas aplicou ao departamento do Alto Juruá, cento e tantos contos, conforme consta da escrituração arquivada na prefeitura.

Assim correram os acontecimentos até o dia 2 de dezembro do ano próximo findo, quando o Sr. capitão Polydoro Rodrigues Coelho, iniciou uma espécie de impertinência, enviando, a qualquer propósito, ofícios em termos insólitos à minha pessoa na qualidade de prefeito, até que ousou, finalmente, alegando a instauração de inquérito, exigir que lhe mandasse apresentar o comandante da policia da prefeitura, sob pena (isto ele fizera constar nos pontos de palestra, para que me chegasse ao conhecimento), sob pena  do comandante comparecer à sua presença ainda que arrastado.

Era demais, e como não desejasse eu entrar em luta, porquanto possuía só vinte homens, ao passo que ele possuía oitenta, bem armados e municiados, alem das metralhadores assestadas provocantemente  para o edifício da prefeitura, resolvi no dia 5 de dezembro enviar a ele, Sr. capitão Polydoro Rodrigues Coelho, por intermédio do juiz de direito e do Sr, coronel Félix Fleury, um ofício comunicando-lhe que me sentindo desautorado, retirava-me do Cruzeiro do Sul, abandonando o cargo de prefeito do departamento do Alto Juruá.

No dia seguinte embarquei para Manaus, chegando a 21 de dezembro e de Manaus parti a 18 de janeiro ultimo, chegando ontem no Rio de Janeiro: o Acre odeia e repele o regímen prefeitural não de um ódio decorrente de uma serena convicção, mas o ódio preparado, fomentado por uma sinistra soborte (talvez sorte) de tenebrosos exploradores.

11/10/2014


AFLIÇÃO E MORTE NA PRAIA (1)

Jurandyr Navarro

Do Conselho Estadual de Cultura


O mar tem vida e dá vida. Tendo vida, sofre e ama. Quem soluça a sua dor, senão, as suas vagas noturnas? Quem exprime a alegria do seu coração inquieto, senão as "espumas sorridentes" das suas ondas matinais?!
O mar, que dá vida, pode, também, ocasionar a morte ou causar o desespero.
Das praias natalenses a mais perigosa delas é a chamada Praia do Meio, compreendendo a orla marítima que se derrama da Ponta dos Morcegos à Praia do Forte, pontos extremos das praias de nomes: dos Artistas e do Poço do Dentão.
Desde menino que ouço falar em afogamentos de banhistas por aquelas bandas. A minha mãe guardava um recorte de jornal, do seu tempo, em que narrava um afogamento não consumado, ali, em  que papai figurava como salvador de uma pessoa. Depois, muitos casos havidos de salvamentos por intervenção miraculosa de terceiros.
Parece existir, nessa área, uma nova Medusa fabulosa, habi­tando aquelas locas e caldeirões, petrificando os nadadores incau­tos que lhes miram os olhos ardentes, arrastando-os para o rede­moinho da morte. Ou, então, caravelas róseas-violáceas, envene­nando com seus raios e tentáculos letais, a quem se adentra no oceano bravio.
Quantos não já perderam a vida, em minutos, dominados pelo pânico paralisante e tragados pelas ondas traiçoeiras; e que, meio submersos, com os pulmões cheios d'água, foram levados pela correnteza até a distante Praia da Redinha!
Quantos amigos e parentes, que alegres vão desintoxicar o corpo e o espírito na Praia e são sobressaltados com os afogamen­tos, retornando aos lares envoltos pelo véu da tristeza.
Narro, aqui, três episódios diferentes e verídicos em que a morte e o desespero rondaram aquela área litorânea.
Conheci Milu, rapaz cheio de vida e de alegria contagiante. E presenciei o seu mergulho para a morte. Foi numa manhã de domingo de Verão. Pilotava ele um pequeno avião Teco-Teco, como era chamado, na época, nos idos de 1950, mais ou menos. Depois de algumas acrobacias e voos rasantes, numa curva rápi­da, o vento forte partiu-lhe uma das asas. E o pássaro metálico rodopiou, vertiginosamente, mergulhando nas águas frias da Ponta dos Morcegos, ali perto dos negros rochedos, como ícaro precipitou-se, derretidas as asas, no mar Egeu.
Vi o lance como se fora numa tela de cinema. E nadei com alguns amigos até bem perto do local e só vimos os destroços da pequena aeronave e o alvoroço da tragédia.
O cadáver do co-piloto fora resgatado. E Milu teve o mar como sepultura, como os têm os heróicos marinheiros. Jamais o seu corpo aflorou às águas...
Este caso isolado não se configurou num afogamento natu­ral, por ter sido um desastre.
Porém, incontáveis são os registros de afogados naquela linha d' água.
Outro caso foi o da poetisa Zila Mamede. Minha com­panheira de praia, nos verões da Areia Preta, nos anos quarenta, Zila, com seu corpo esguio, era uma exímia nadadora.
Igualmente aos outros, o seu pálido corpo foi arrastado pela correnteza à Praia da Redinha; boiando, qual o de Ofélia shakespeariana, com os cabelos amarfanhados e de rosas cobertos; e, como a meiga Ofélia, inconscientemente cantando estrofes de antigas árias...
Não houve notícia de alguém ter presenciado a sua agonia, desfalecendo no mar. Continua envolta em mistério, como os caprichos da urna da fatalidade, a deusa da Noite.

A sua dor a todos aturdiu. E a cidade chorou o pranto amar­go pela morte inesperada e misteriosa da sua poetisa maior.

10/10/2014

Presos Políticos


MOSSORÓ E OS PRESOS POLÍTICOS DO 1º DE MAIO

Por: Gileno Guanabara, sócio efetivo do IHGRN

A cidade de Mossoró já não se lembra, não faz ideia de como aconteceu, nem faz tanto tempo. Foi na madrugada do dia 1º de maio, Dia do Trabalhador, do ano de 1970. Ao amanhecer o dia, a notícia se espalhou: dois bancários e três que se diziam camponeses tinham sido presos juntos, durante a madrugada, por policiais do esquadrão militar. O flagrante se dera no instante em que distribuíam um manifesto apócrifo, em comemoração ao dia do trabalhador, cuja cópia era enfiada nas brechas das portas de quem era trabalhador e, naquela hora, dormia. O texto do panfleto exaltava a comemoração da data e exortava os trabalhadores a resistirem à ditadura. Os bancários eram Jonas e Ricardo, filhos de famílias simples, natural de Aracati e de Natal, respectivamente, ambos escriturários do Banco do Brasil, lotados na Agência de Mossoró. Hoje passado tanto tempo, estão aposentados.  Os camponeses atendiam pelos codinomes Baraúna, Santa Cruz e Da Fé, e seus nomes verdadeiros eram: Francisco Aurélio, Lourival Alves e José Henrique. Dois nascidos no povoado de Jucuri e, o terceiro, na cidade de Apodi, nos altos da Chapada que tem o mesmo nome. Deles não se teve mais notícia.

Cientificado da prisão, Cortez Pereira, então Governador do Estado, deslocou o Coronel Edmilson Holanda, chefe do Gabinete Militar, para efeito de, ainda pela manhã trasladar os presos para Natal e alojá-los em celas do Quartel da Polícia Militar. Dado o caráter atentatório aos preceitos da Lei de Segurança Nacional então vigente (Decreto-Lei nº 898/69), a ocorrência foi imediatamente comunicada as autoridades da 7ª Circunscrição da Justiça Militar, no Recife, a quem competia processá-los e julgá-los.

A denúncia que o Auditor Militar da 7ª Auditoria atribuiu aos acusados referia-se à infringência da Lei de Segurança Nacional. A defesa coube as Dra. Mércia Albuquerque e, no final, a Dra. Elizabeth Diniz. Ocorreram as audiências de instrução, no Recife. No mês de agosto, o Conselho Judiciário da Auditoria se reuniu e decidiu pela improcedência da denúncia e absolveu os três camponeses e um dos bancários, Jonas, os quais foram libertados imediatamente. O bancário Ricardo foi condenado a dez meses de reclusão, preso recorreu ao Superior Tribunal Militar-STM. Em relação a parte da sentença que os absolveu, o Ministério Público Militar também recorreu.

Somente em fevereiro de 1976, o STM, reunido em sessão secreta, sob a Presidência do Ministro Tenente-Brigadeiro do Ar, Carlos Alberto Huet de Oliveira Sampaio, (Apelação Nº 38.216/70), por maioria de votos, negou provimento ao recurso do Ministério Público e manteve a sentença na parte que não condenou. Para os Ministros Faber Cintra, Honório Magalhães e Sylvio Moutinho, que manifestaram votos divergentes, mas foram vencidos, era de ser mantida a parte condenatória da sentença em relação a um dos acusados, como também se proclamaram pela sua reforma, a fim de rever a absolvição dos demais e condená-los a igual pena. Ao apreciar o recurso impetrado por parte do bancário apenado, a decisão do STM foi pelo acolhimento, para efeito de também absolvê-lo da acusação, contrariamente aos votos divergentes. O bancário Ricardo já cumprira integralmente a pena e já se achava em liberdade.

Integravam a composição do STM e participaram do julgamento os Ministros Amarílio Salgado (Relator), Jurandyr de Bizarria Mamede (revisor), Alcides Carneiro, Syseno Sarmento, Faber Cintra, Rodrigo Octávio Jordão Ramos, Honório Pinto Pereira de Magalhães Neto e dos Ministros cujos votos foram vencidos.

Durante a prisão, os réus receberam o conforto de amigos comuns, alguns deles subscreveram e recolheram declarações de pessoas ilustres da cidade, em que afirmavam a conduta profissional, o coleguismo dos bancários, tudo para efeito de defesa junto à Justiça Militar. O Banco do Brasil, através de sua direção nacional, não demitiu os servidores, os quais, ao final da instrução e com a sentença de absolvição, retornaram aos seus cargos naquela instituição bancária.

Dos camponeses presos e absolvidos não se tinha conhecimento de quais ideias os movia, a razão ideológica que os inspirava, ou até da influência nas lides da política sindical. Nem mesmo eram sabidas as suas filiações partidárias, da militância clandestina que os vinculasse à causa dos bancários. Durante os interrogatórios, os acusados bancários portaram-se com dignidade, não acusaram. De outro lado, os camponeses que se fingiam incapazes de entender e explicar os fatos a que respondiam. Utilizando-se de uma artimanha convincente, no momento em que eram submetidos à inquisição, as respostas articuladas que davam era de não entenderem, de serem inocente útil dos acontecimentos. No Recife, durante uma audiência, um Auditor Militar, que procedia o interrogatório, esgotou a paciência diante da leniência de um acusado. Encarou-o e perguntou: O senhor conhece um Volkwagem? ... O camponês, a par do seu fingimento, retrucou de bate pronto: Eu nunca vi Volkwagem, quem é doutor? ... O Auditor abufelou-se, deu um murro na mesa e dirigindo-se aos demais juízes: Trata-se de um inocente. Se num dia de hoje ele não sabe, nem nunca viu um Volksawem na rua, não pode saber de nada. Estou satisfeito. Nesse diapasão, os camponeses foram inocentados, por ausência de dolo e por se mostrarem incapazes de reconhecer o objeto do crime cometido. A absolvição foi uma mera decorrência.

A conduta romântica de fazer política por contaminação foi determinante nos atos praticados por aqueles militantes, presos no dia 1º de Maio de 1970, na cidade de Mossoró. A improvável existência de uma aliança operário/camponesa não possuía substância de aliar aos anseios românticos da classe média os arrufos pseudo/revolucionários de camponeses não letrados e pouco politizados, ainda que bem intencionados, para contestar o poder militarizado e, ainda mais, de forma clandestina. Durante o governo do General Médici, a luta armada a que setores da esquerda aderiram tornou a repressão mais seletiva e implacável. Não foram poucos os militantes desviados pelo espontaneismo cego, pela insensatez do radicalismo infantil, que se deixaram conduzir para a lamentável reta da confrontação política desigual. Pela dignidade da causa que os moveu, no entanto, saúdo a todos eles.

 

09/10/2014



XXII Conferência Nacional dos Advogados
Constituição Democrática e Efetivação dos Direitos
Onde?
Riocentro - Pavilhão 4
Rio de Janeiro/RJ

Quando?
20 a 23 de outubro de 2014

Economia



ÊXITOS E PROBLEMAS DA FRUTICULTURA
Tomislav R. Femenick – Contador, Mestre em Economia.
vinheta114
No ano passado as exportações realizadas pelo Rio Grande do Norte representaram 15% do total de frutas vendidas pelo Brasil ao exterior. O fato tem sua importância exponencialmente aumentada se levarmos em conta que essas frutas foram produzidas nos vale dos Rios Mossoró e Assú, na região do semiárido; periférica à caatinga nordestina. Esse quase milagre só tem sido possível graças ao sistema de irrigação que é adotado pelos agricultores locais.
Outro grande e relevante feito foi a recente 17ª EXPOFRUIT-Feira Internacional da Fruticultura Tropical Irrigada, que teve lugar no final de setembro passado em Mossoró. Esse evento reúne anualmente produtores rurais, empresários, distribuidores, atacadistas, exportadores e importadores de frutas frescas produzidas em solo potiguar e é resultado de uma parceria entre o COEX-Comitê Executivo de Fruticultura do Rio Grande do Norte, o SEBRAE-RN e a UFERSA-Universidade Federal Rural do Semiárido. Em sua última edição, EXPOFRUIT contou com a participação de delegações da Europa (Alemanha, França, Itália, Holanda, Espanha, República Tcheca, Bélgica, Noruega e Rússia) e também dos Estados Unidos. Devido à esperada realização de negócios na casa de R$ 20 milhões, o evento contou com a participação de expositores que ocuparam 300 stands; 180 de empresas nacionais e 70 de outros países.
Todavia o cenário não é somente de bonança. Há um conjunto de fatores que pode ameaçar essa conjuntura. O primeiro deles e o mais premente é a seca dos últimos anos, que reduziu a oferta de água para irrigação das plantações; tanto a disponibilidade nos leito dos rios, com a dos reservatórios e dos lençóis aquíferos – água do subsolo que é captada por meio de poços. Outro problema está ligado ao aspecto financeiro, dado que a produção de frutas exige investimentos cada vez mais altos, em função da adoção de tecnologias compatíveis com as exigências dos compradores estrangeiros. A isso deve ser somada a esperada elevação das taxas de juros, tão logo passem as eleições.
O terceiro percalço diz respeito à falta de incentivos governamentais e, por mais contraditório que seja, a alta incidência de impostos que recai sobre a produção e comercialização de frutas, num contrassenso inexplicável. Por último, porém não menos importante, há o obstáculo da deficiência da infraestrutura, principalmente no sistema viário para escoamento da produção. Não é por acaso que grande parte das frutas produzidas no Rio Grande do Norte é exportada pelos portos dos Estados vizinhos.
Todas essas dificuldades, que não são novas, fazem com que os plantadores, distribuidores, exportadores e todos os envolvidos na cadeia produtiva de frutas do RN tenham noites de pesadelos constantes e repetitivos. Empresas locais, nacionais e mesmo estrangeiras já abandonaram o agronegócio potiguar e o fantasma do desemprego atinge os trabalhadores do setor.
O próximo governo do Estado há que encarar todos esses problemas de frente, sem tangenciar, sem postergar soluções, sem fazer figuração. Se a seca propriamente dita não pode ser evitada, há ações que podem ameniza-la e devem ser tomadas: aumentar a capacidade e o número de açudes e barragens, por exemplo. A redução do alto custo financeiro e a isenção fiscal para os equipamentos com novas tecnologias têm que ser discutidas e resolvidas nos escalões federais, incentivos fiscais têm que ser concedidos pelo Estado e os gargalos da infraestrutura viária têm que ser estudados e solucionados.
Os pioneiros da agricultura irrigada no Rio Grande do Norte – José Rodrigues de Lima, Dom Eliseu Simões Mendes, Tarcísio Maia, Humberto Mendes, José Nilson de Sá e muitos outros – não desejariam que seu idealismo seja perdido pelo descaso e inércia governamentais; muito menos o menosprezo pelo suor do trabalhador rural.