06/07/2021
Estudante ou aluno?
Padre João Medeiros Filho
Atendendo a solicitações de leitores, revisamos e reeditamos o presente artigo, publicado em 2013, no extinto Jornal de Hoje. Não nos arrogamos o título de mestre em latim ou latinista, mesmo porque somos eternos aprendizes. O interesse e o gosto pelo seu estudo despertaram, durante nossa formação eclesiástica. Sabemos de sua importância na origem do idioma pátrio. Outrora, integrava os componentes curriculares da educação básica. Não obstante a sua relevância e contribuição para a aprendizagem do português, Olavo Bilac exclamou: “A última flor do Lácio, inculta e bela”. Indagado sobre o significado do adjetivo inculta, no primeiro verso do soneto, o poeta parnasiano respondeu: “o termo fica por conta de todos aqueles que a maltratam, mas que continua a ser bela”. O que diria o vate atualmente? Sem o ensino da língua latina, atropela-se ainda mais o vernáculo.
Quantas vezes, deparamo-nos com afirmações e fatos, partindo de modismos e sem base histórica. Surgem do nada e de repente obtêm trânsito livre nos “campi” universitários e até em gabinetes de órgãos educacionais. Adotou-se ultimamente a moda de usar o termo estudante, em lugar de aluno. Tenta-se transformar um sofisma em verdade, consagrando-o como certo, no intuito de convencer incautos. Trata-se do conceito inexato ou distorcido sobre a palavra aluno, divulgado por alguns intelectuais.
A nova conotação vem ocupando espaço. Propaga-se que aluno significa sem luz. Para os adeptos dessa teoria, a palavra é formada pelo prefixo grego “a” (partícula de negação), unido ao elemento “lun”, corruptela de “lumen” (luminosidade). E, por significar ausência de luz, aluno torna-se uma palavra depreciativa e antipedagógica. Assim sendo, não seria apropriado o seu emprego. Cabe lembrar primeiramente que “lumen” é um termo técnico, indicando medida de luminosidade e não designando a luz em si mesma. Nesse caso, a palavra exata seria “lux”. No entanto, convém recordar que em português os vocábulos derivam do acusativo latino. Este, em quase todas as situações, requer a partícula “ad” e não “a”, característica do ablativo na declinação latina. Na hipótese de aluno derivar de “lumen” (substantivo neutro), deveríamos ter “ad lumen” (junto à luz), como é a regra gramatical. No caso de “lux”, ter-se-ia “ad lucem” (perto da luz). No entanto, o étimo aluno não deriva de “lumen” ou “lux”, mas de “alumnus”, já conhecido, antes de Cristo. Significava criança, que se nutria unida a sua mãe. Daí, o sentido figurado. Aluno é alguém vinculado e alimentado intelectualmente por outrem.
De acordo com o professor Ernesto Faria (catedrático de latim da antiga Universidade do Brasil), Cícero empregou “alumnus”, em suas obras “Verrinas” e “De finibus”. Segundo renomados latinistas, etimólogos e lexicógrafos lusos e brasileiros, dentre eles, Antenor Nascentes, padre Augusto Magne, Cândido de Figueiredo, Carolina Michaëlis, Leite de Vasconcelos e Serafim da Silva Neto, “alumnus” provém do verbo latino “alere”, conjugado numa variante da primeira pessoa do plural do pretérito perfeito. O verbo significa: alimentar, desenvolver. Metaforicamente, tomou a acepção de crescimento ou desenvolvimento intelectual. É nesse sentido usado pelo tribuno romano em “De natura Deorum” e nas Catilinárias. Assim se verifica também nos Dicionários da Língua Portuguesa, de Houaiss e Aurélio, bem como no Dicionário Etimológico, de Antônio Geraldo Cunha. Há que se preservar a origem e a semântica do vocábulo, evitando-se que seja proscrito o seu uso secular. Do contrário, resultaria no aviltamento do idioma nacional e empobrecimento da história da educação.
Ressalte-se que na tradição brasileira, nas culturas hebraica, greco-latina e anglo-saxônica, aluno é alguém vinculado a uma instituição de ensino ou a um mestre. Por isso, são consagradas expressões como: aluno do Ateneu, Salesiano, Marista, Diocesano, dos cursos de Medicina, Filosofia, Direito, de Câmara Cascudo etc. Do ponto de vista ético e etimológico, um conceito equivocado é nocivo, pois, além da agressão ao vernáculo, poderá acarretar graves consequências. Certa feita, Dom José Adelino Dantas, exímio latinista, proferiu esta frase: “Sem conhecimento do latim, podemos nos tornar apedeutas e com certa pavonice”. É oportuno citar o apóstolo Paulo “Digo-vos isto para que ninguém vos iluda com discursos enganadores” (Col 2, 4).
O MEMORIAL DE MURILO
Valério Mesquita
mesquita.valerio@gmail.com
Terminei a última página do livro "Testemunho Político" do saudoso jornalista e acadêmico Murilo Melo Filho. Desde os estertores da República Velha (1930) até 1965, foram trinta e cinco anos de dança de vampiros. Nele qualquer leitor aprenderá a redefinir a política, o jogo ambíguo, farsante, da luta pelo poder. Já vi muita coisa na atividade pública ao longo do tempo, mas Murilo desvendou outras facetas com excepcional precisão cirúrgica. Um verdadeiro teatro shakeaspereano no qual, não é a política que é narrada somente, mas o ser humano que é caracterizado nas suas fraquezas, ambições, venerabilidades.
"Testemunho Político" não é apenas a história pedagógica e sequenciada daqueles anos tumultuados mas a exposição caracterológica dos seus protagonistas que Murilo deixou a cargo do próprio leitor descobrir. Depreendi que todos os grandes líderes ou chefes de Estado desse país morreram agarrados a sua própria angústia. Assim, aconteceu com Getúlio, Café Filho, Juscelino, Jânio, Jango, Lacerda, Tancredo, Castelo, Costa e Silva, Médici e Geisel. Quem não diagnosticaria também Figueiredo e Collor como depressivos, angustiados? E até Sarney, Itamar Franco e Temer. E mais ainda, os torturados Brizola e Lula, dignos dos cuidados do Dr. Salomão Gurgel. Isso tudo sem falar nos generais Lott, Denys, Zenóbio da Costa, Kruel, Mourão Filho, Gois Monteiro, Murici e Jair Bolsonaro, todos pacientes dessa república de sobressaltos. A ordenação dos fatos políticos entremeados com a própria história do autor, conferiu um sentido especial e estilístico a narrativa com o selo da autoridade de quem não apenas foi espectador privilegiado da cena, mas, em algumas vezes, protagonista.
Após a leitura, lembrei-me do saudoso jornalista João Batista Machado. A nível de Rio Grande do Norte, ele foi o nosso reporte político, testemunha e analista dos nossos embalos paroquiais e já comprovou isso com o lançamento de três livros. Murilo, veterano no campeonato nacional e Machadinho aqui, no estadual, representavam as duas melhores vertentes jornalísticas do memorialismo político da contemporaneidade brasileira e potiguar, respectivamente. Ambos foram historiadores dessa atividade enfermiça. Sim, porque não posso deixar de crer que todo político é um fronteiriço.
A ambição, a vaidade, corrompem o homem por dentro e por fora. O político recebe poderosas deformações caracterológicas no desabrido jogo pelo poder. Não me julgo nenhuma autoridade nesse assunto até porque fui político, interno também do mesmo hospital. Mas a visão global da política que o livro de Murilo nos resgata ou nos restitui, é de uma dramaticidade inquietante. Aqui, vale, contudo, lembrar a história, me contada pelo professor Alvamar Furtado. Ainda no limiar dos anos sessenta, o Dr. Creso Bezerra, ex-prefeito de Natal, ex-deputado estadual, deixou inopinadamente a política. Indagado pelo seu amigo Alvamar sobre o motivo tão repentino da sua atitude, ele explicou que fora a frase de um matuto da Paraíba. "Dr. Creso", disse o filósofo sertanejo, "política é negócio só para rico besta e pobre sabido".
04/07/2021
Pequeno Tributo ao Café São Luiz
Café São Luiz, tradicional ponto da Cidade Alta, em Natal – Foto: Brechando
Gutenberg Costa – Escritor, pesquisador e folclorista
Hoje, venho lembrar de um finado que não teve o direito a uma missa de corpo presente. De sétimo dia e nem de mês ou ano. Em sua calçada, nem uma vela acesa, bilhetes ou flores de despedidas e lamentos. O sino da catedral nem dobrou. Literalmente, nem choro, nem velas ou fitas amarelas, apenas lamentações dos seus antigos frequentadores. Natal não rima com tradicional. O que eu vi no meu tempo de criança e adolescência, só em raras fotografias em preto e branco. Digo sempre aos mais chegados que na terra em que nasci, só estou vendo escapar fedendo o seu Forte dos Reis Magos, isso porque não é de ferro, como aquela velha ponte ‘rapinada’ que servia de minha saída para Macau e Pendências.
Fico demasiadamente envergonhado quando sou indagado pelos amigos e amigas ligadas a cultura, que vêm a também cidade de Câmara Cascudo: “Gutenberg, aonde fica o tradicional Café da cidade do Natal?”. Assim faço quando chego em uma cidade e procuro pelos seus tradicionais mercados, feiras e Cafés. O que dizer-lhes, sobre tantos monumentos demolidos? Eram particulares? E o nosso velho estádio de futebol ou o Hotel dos Reis Magos? Não tenho motivos sérios para desculpas sobre meu passado quase todo destruído! O que justificar aos meus netos disse tudo? Como ficarei ao mostrar-lhes as fotografias que guardo como velhas recordações do que já existiu da ‘Natal do já teve’…
Demolição do Estádio Machadão, em Natal/RN
Recentemente, o amigo pesquisador César Barbosa, um dos assíduos degustadores do cafezinho fraterno do saudoso Café São Luiz (o finado de quem hoje estou lamentando o desaparecimento nesse meu pequeno relato), me mandou uma foto histórica de 2005, na qual estávamos em uma mesa para um bate papo e cafezinhos, incluindo o professor Normando Bezerra e o folclorista Severino Vicente. Todos ficamos indignados com o descaso aos prédios particulares e públicos, os quais desapareceram nas caladas das noites, sob o silêncio oficial dos que ganham em nome da cultura do município e do Estado. O machado e a picareta não andam sozinhos. Todo crime tem executor, mandante ou indiretamente os omissos. Pilatos preferiu lavar as mãos e por pouco não foi canonizado.
César Barbosa, Gutenberg Costa, Severino Vicente e Normando Bezerra
Arquivo: César Barbosa
Juro que não acreditei em seu assassinato e fui correndo ainda ao Grande Ponto da Cidade Alta, na rua Princesa Isabel, em 2017. Infelizmente encontrei a sua derrocada aos pedaços. Até lembrei na ocasião daquela canção tão triste e realista, cantada pelo grupo Demônios da Garoa, chorando a debandada da saudosa maloca:” …cada tábua que caia, doía no coração…”. Mas, em Natal, parece que não adianta reclamar a mãe do bispo, nem antes ou depois das ferramentas pararem as demolições. Vou sugerir aos meus amigos fotógrafos, um museu da fotografia do que já desapareceu nos últimos tempos. E diga-se que lei no Brasil tem pra tudo. O que talvez não se tenha é uma lei para se criar ‘museus de memórias’ de nossos santuários arquitetônicos e tradicionais de uma cidade beirando seus 500 anos, que existiram há poucos anos.
Demolição do Hotel dos Reis Magos, em Natal/RN
Em cada bairro nosso, centenas de lugares históricos já foram demolidos. Em cada rua, dezenas. Crimes sem ‘BO’, sem processos e, o pior, sem culpados. Eu tenho até medo de ir para a cadeia ao ficar do lado dos tradicionalistas e saudosistas ainda de plantão. Hoje é crime, nessa desgraceira da modernidade até perguntar: O que funcionava nesse terreno de estacionamento? Um edifício? Um Casarão de fulano de tal? Aqui era o Bar do seu sicrano? Era a casa em que nasceu ou morou aquele escritor Beltrano?
Mas o nosso querido finado ‘Café São Luiz’, que em vida, cujo pai em seu registro foi o empresário Luiz Veiga, teve sua história biografada pelo padre e escritor José Luiz Silva (1928-1991). Este religioso irreverente, contou sua história do nascimento até os anos 80, do século passado, em livro intitulado ‘Na Calçada do Café São Luiz’, edição de 1982.
Café São Luiz – Foto: Brechando
Nos anos 70, o amigo padre referido me apresentou a muita gente naquela famosa calçada, entre elas: Chisquito e Chico Traíra. Chico, ex tocador de viola e vendendo seus folhetos em cordel. Chisquito, mesmo com sol forte, óculos de grau bem forte e todo empalitozado, sempre baforando seu inseparável cachimbo.
Várias autoridades foram fotografadas tomando o seu cafezinho, como o governador Monsenhor Walfredo Gurgel. Diz ainda o primeiro historiador que esse já teria nascido no rastro do acirramento político entre Dinarte Mariz e Aluízio Alves: “A Calçada do Café São Luiz é o território livre dos potiguares… é doce escutar os passos da vida. E onde reside a vida? Não é nas calçadas?”.
Governador Monsenhor Wanfredo Gurgel, no Café São Luiz
Reprodução do livro de Zé Luiz (1982)
Não posso esquecer o meu tempo e os amigos que lá me faziam companhia e conversas. Existia o grupo da ‘porrinha’, mas eu como nunca gostei de jogos, ficava na roda das conversas culturais com o intuito de ouvir e aprender. Sei que não dá para enumerar tanta gente boa e, em parte, já saudosa. Ali, naquela universidade realmente democrática, nunca paguei sequer um cafezinho quando o jornalista Eugênio Neto estava presente. Esse distribuía amizade e fichinhas aos amigos.
Fui um dos privilegiados desse e de outros afetos gestos amigos. Ouvi aulas sobre música popular brasileira quando chegava perto do doutor Grácio Barbalho, inclusive depois passando a ser o seu mais novo confrade no centenário Instituto Histórico e Geográfico do RN, em 1997. Ouvi verdadeiras palestras e conferências sobre literatura do RN e mundial.
Marcos Maranhão e Gutenberg Costa, no lançamento do livro
‘Personagens Populares em Natal (1999)
Marcos Maranhão, Gutenberg Costa e Leide Câmara, no lançamento do livro,
na calçada do Café São Luiz (1999)
Aprendi muito com Pedro Grilo, Edmilson de Andrade, Palocha, Osório Almeida, Meroveu Pacheco, Chico Macedo, Francisco Bezerra, Franklin Jorge, Jarbas Martins, Severino Vicente, César Barbosa, Normando Bezerra, Vital Oliveira, Severino Galvão, Catolé, Mery Medeiros, Luiz Rabelo e o guerreiro Miranda Sá, outro pagador contumaz de meus cafezinhos.
Ali perto, comprei alguns poemas feitos na hora do poeta Milton Siqueira. Escutei a rabeca do Zé André, em sua esquina. Quando precisei de um advogado, chamei o Sebastião Soares, que lá vivia falando sobre poetas e suas memórias vividas no Rio de Janeiro. Presenciei desafetos discutirem e quase que se atracando. Ouvi discursos de direitistas e esquerdistas. Tudo depois se transformando em abraços e cafés. O milagre da amizade e respeito visto no passado. Lia os jornais independentes de Osório Almeida, Marcus Otonni, César Barbosa e Astral, entre outros.
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Calçada do Café São Luiz – Arquivo: César Barbosa
A calçada do Café São Luiz era minha espécie de concentração. De lá ia lanchar no pontinho de Zé Treco, fazer compras no comércio e ver as novidades literárias chegadas na livraria dos irmãos Cortez, na rua Felipe Camarão. Foi ponto para marcar encontros e também comprar as bugigangas importadas de Carrapicho: “Esse relógio é suíço legítimo, juro de pés juntos. Essa caneta veio dos Estados Unidos, pode conferir”. Tudo verdade, mas sem nota fiscal alguma. E o diabo era quem duvidava do maior vendedor do mundo, vindo de Pedro Avelino e ainda está vivinho da silva, beirando os 90 anos e, acreditem, em plena atividade comercial.
Naquele finado Café vi Miranda Sá quase chegar ao senado. Zé Luiz quase ser deputado Federal. Osório Almeida e Deodato Dantas quase tomarem assento em nossa Câmara Municipal. Em Natal quem não tem dinheiro ou família ilustre, vira quase. Ali ouvi piadas engraçadas da boca do amigo de infância, humorista conhecido nacionalmente como ‘Espanta’. Recebi aulas de folclore com os mestres Gumercindo Saraiva e Veríssimo de Melo. Tinha sempre de plantão um doido calmo e os contadores de histórias mirabolantes, os quais tinham visto coisas de cem anos passados.
Os escritores Franklin Jorge e Gutenberg Costa, no Café São Luiz (1999)
Muitos amigos vindos de Mossoró, lá eram encontrados, como o fotógrafo José Rodrigues e o historiador Raimundo Soares de Brito, entre outros. E não tenho como esquecer os cordiais atendimentos de duas mulheres que me serviam os cafezinhos e guardavam minhas encomendas que ali iam deixa-las em minhas ausências: Francisca e Ritinha. Duas santas da paciência com tanta gente, com tantos gostos.
Lá, vi inúmeras tardes chegar à prostituta ambulante e desdentada dona Maria Edite, a famosa apelidada Rocas Quintas. A única com esse apelido que toda Natal conheceu até a era de 2000. Esta chegava com um rótulo de um antibiótico e pedindo ajuda financeira, podendo terminar até em sexo, se aparecesse um pretendente. Desde 1959, que nunca ouvi falar em outra pobre Rocas Quintas. E a sua famosa calçada era também apelidada pelos que lá não iam, como a ‘calçada da maledicência’. Papai, que frequentara na Ribeira outro finado Café, o ‘Café Cova da Onça’, dizia-me rindo, que esses ambientes só serviam para aposentados fofocarem…
Eugênio Neto – Foto: blogchicolima
E esse Café do Grande Ponto da Cidade Alta, foi tema de trabalho acadêmico na UFRN, do jovem Augusto Bernardino de Medeiros, que foi além das xícaras, entre 1950 e 1980, o qual me entrevistou, como também vários frequentadores, entre eles, Eugênio Neto e Mery Medeiros. Ali, como o padre Zé Luiz também lancei o meu livro ‘Natal, Personagens Populares’, de 1999, em um sábado, com festa e carnaval comandado pelo saudoso Mainha, me restando dezenas de fotos com muita gente ilustre que ali compareceram.
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Gutenberg Costa e o saudoso músico ‘Mainha’, na calçada do Café São Luiz (1999)
Vou encerrar essa pequena homenagem com um trecho do poema do velho Chisquito do Assu: “… Se acaso o São Luiz fechar-se um dia;/ A boa prosa, cordial, sadia, / Eternizar-se-á numa saudade”. E como dizia minha mãe, que descanse em paz o já esquecido finado Café São Luiz, em nossas memórias! Amém!
Morada São Saruê, Nísia Floresta/RN
O eixo cognitivo da sustentabilidade
Tomislav R. Femenick – Jornalista
Rios, que antes eram fontes naturais de águas límpidas, foram transformados em verdadeiras cloacas a céu aberto, em vertentes de agrotóxicos, e tiveram seus leitos aterrados. Florestas, antes verdejantes, são devastadas e transformadas em campos desnudos de flora, onde os animais silvestres estão ausentes. Mares e oceanos transformados em depósitos de lixo. Lagos que secam, pelo consumo descontrolado das águas que os alimentam. O ar que se respira em certas cidades está carregado de elementos danosos à saúde.
Isso não é catastrofismo. Este é um cenário dantesco do nosso planeta, neste século XXI. Os rios Tietê e Pinheiros, em São Paulo; Pium e Potengi, em Natal; Beberibe e Capibaribe, no Recife, e o canal do Mangue no Rio de Janeiro, são alguns exemplos de vários estágios de transformação de cursos de água em esgotos. O Brasil é campeão mundial em desmatamento de florestas. A Baia da Guanabara recebe diariamente toneladas de dejetos e detritos domésticos ou industriais.
No meado dos anos 1980, estive na região centro-ocidental do continente africano, estudando a antiga rota de escravos que, partindo do sul do Saara, atravessava o deserto em direção ao Mar Mediterrâneo. É uma região extremamente seca e de altas temperaturas, onde o Lago Chade destoa pela sua grandeza. É a única fonte de água potável numa das regiões mais secas do planeta, que possui a terceira maior concentração de água doce da África. Mas está morrendo, seca dia a dia. É tão importante, que é ponto de encontro das fronteiras de quatro países: Chade, Camarão, Nigéria e Níger. Originalmente com cerca de 350 mil quilômetros quadrados; em 1963 tinha 25 mil e hoje tem apenas 1.300 quilômetros quadrados de superfície. Essa redução ocorre paralela aos processos de desflorestamento e desertificação, ocasionados por dois fenômenos: uma enorme redução da quantidade de chuvas nas últimas décadas e o aumento da demanda de água para abastecimento da população e para irrigação, que quadruplicou desde o começo dos anos 1960.
O mesmo problema atinge o Mar Morto, que já perdeu um terço da sua superfície, em um processo que se iniciou em 1960, pelo desvio das águas do Rio Jordão, o maior vertedouro de água no Mar Morto – 60%, por Israel, através do Aqueduto Nacional, e o restante por barragens construídas pela Síria e pela Jordânia. Com a conclusão da Unity Dam, um empreendimento conjunto sírio-jordaniano sobre o rio Yarmuk, maior afluente do baixo Jordão, este poderá ter a sua vazão reduzida em mais 25%.
Em todo o mundo a urbanização da população e o desenvolvimento industrial vêm ocasionando um aumento crescente da emissão de poluentes atmosféricos. Cidades como São Paulo, Belo Horizonte e México são exemplos típicos desse fenômeno. Nas cidades chinesas o problema é bem maior. Nelas o ar que se respira é um dos piores do mundo. Essa poluição atmosférica afeta a saúde de milhões de pessoas, transformando-as em vítimas de doenças respiratórias, como bronquite, rinite e asma.
Londres, quando foi o centro do mundo capitalista e capital do Império Britânico, era também o exemplo marcado da poluição, com a putrefação do Tamisa e o seu célebre fog, um nevoeiro espesso carregado de fuligem. Hoje, Londres e o capitalismo são outros. Tanto os governos dos países capitalistas como as grandes corporações mais conscientes, lutam contra o custo da depredação da natureza. Londres voltou a ser exemplo e hoje é referência pela recuperação da pureza das águas do seu rio e pela quase ausência de poluição atmosférica.
Por outro lado, uma das maiores obras de engenharia do mundo socialista, na finada União Soviética, foi o Canal Volga-Don, ligando o Rio Volga ao Rio Dom. O problema dessa obra gigantesca é que o governo soviético não levou em conta o Mar Cáspio que, entre 1930 e 1978, teve o nível das suas águas do Mar Cáspio diminuído continuamente.
Ambientalista de esquerda ou de direita é balela. Nas questões ecológicas, as posições políticas tradicionais perdem terreno e se transformam em projeções pessoais, desprovidas de base e eixo cognitivos.
Tribuna do Norte. Natal, 04 jul. 2021
01/07/2021
O ATHENEU
LEMBRANÇA QUE O TEMPO NÃO DESFEZ
Valério Mesquita
mesquita.valerio@gmail.com
Naquele tempo, o nosso mundo começava no Atheneu, um nome bonito, sonoro, poético. Era o tempo da felicidade na sua forma mais simples; dos primeiros alumbramentos; dos gestos inaugurais dos amores clandestinos. Falar sobre o Atheneu dos idos 50 e 60, é caminhar numa procissão de relembranças. "Seu Babau, quantas declinações existem no Latim". "Sei não, professor". "Sente, zero. Nominativo, genitivo, dativo, acusativo, vocativo e ablativo." Era o Cônego Luiz Wanderley arguindo o saudoso Raimundo Torquato, apelidado de Babu, mas o padre já declinava no acusativo: "Babau". Vascaíno fanático, só havia um jeito da turma se livrar da terrível chamada oral de latim da segunda-feira: elogiar o Vasco e comentar a sua vitória. No caso de derrota: delenda est Babau! Sem nenhum demérito aos atuais mestres do Atheneu norte-rio-grandense de hoje, mas será que o tempo poderia restituir essa seleção de ouro? Floriano Cavalcante (que ensinava história proferindo discurso); Protásio Melo (que nos influenciou o interesse pelos autores ingleses e americanos); Esmeraldo Siqueira professor de francês (com o seu indefectível charuto, cuja fumaça desenhava no ar os perfis de Hugo, de Daudet, de Vigny, de Balzac, de Gide, etc); Álvaro Tavares (modesto, simples, erudito); Cônego Luiz Wanderley (grande orador sacro e latinista), só para citar aqueles que nos ensinavam diretamente. Nesse universo perdido havia outras figuras inesquecíveis que não travaram contato conosco mas povoaram a mesma amorável galáxia que vai ficar na memória e na moldura do século.
Mensurar o quanto a intelectualidade do Rio Grande do Norte deve ao Atheneu é uma tarefa impossível. Desde o tempo do inexcedível professor Celestino Pimentel, de Alvamar Furtado (o Clark Gable dessa Hollywood Potiguar), Câmara Cascudo (o mais sedutor dos mestres), e toda uma plêiade de professores quase todos absorvidos mais tarde pela Universidade Federal, nos faz deduzir que o Atheneu não foi, apenas, uma usina preparatória e
educadora de gerações mas também de mestres que ajudaram a erigir o edifício de um novo tempo: uma instituição de ensino superior.
O Atheneu de Petrópolis tem o dom da dimensão entre o efêmero e o eterno. Nele há algo mais para se sentir do que para se dizer. O Atheneu é a história de uma fé que se fez realidade. Concebido pelo arrojo arquitetônico extra época, insignes diretores deram vida e estabilidade definitivas ao idealismo renovador do ex-governador Sylvio Piza Pedroza. "Ver bem não é ver tudo, é ver os que os outros não vêem". Nessa frase perfeita de José Américo, Sylvio Pedroza, quem sabe não estaria enxergando longe o embrião
da futura Universidade? Só sei que o tempo respeitou o que nele construiu para depois os próprios mestres, ao longo do tempo, se encarregarem da materialização do seu sonho. Isso porque, é na própria criação que o homem faz descobertas. O mestre Protásio Melo que teve uma vida inteira consagrada ao ensino de gerações, hoje nada "tendo nas mãos que foram pródigas", não viu a hora do silêncio e nem se calou. Abriu as asas de sua pesquisa sobre a História do Atheneu, a história de todos nós. E já entardecia para que se pudesse resgatar esse acervo rico de humanismo e tradição. Só Protásio mesmo, que cresceu nas ervas de Walt Whytm para ainda hoje, nos respingar da água benta de uma aurora, onde foi um dos protagonistas dos mistérios circundantes.
(*) Escritor
30/06/2021
Minhas Cartas de Cotovelo – versão de 2021-32
Por: Carlos Roberto de Miranda Gomes
Ao iniciar o dia 29 de junho, logo cedo, passei a ler mensagens e acessar os sites que informam a história de pessoas, santos e comemorações e vi que hoje São Pedro e São Paulo são os Santos do Dia, as verdadeiras ROCHAS da Igreja, o primeiro, como o seu primeiro mandatário (Primeiro Papa) e o segundo o Consolidador da Doutrina da Igreja.
A origem desta celebração é muito antiga e, supostamente, ocorre em 29 de junho, pois teria sido a data do aniversário de morte e do translado das relíquias de ambos os santos.
Essas festas dão continuidade ao período conhecido como junino, inspiradas nos rituais de comemoração da fertilidade da terra, no período pré-gregoriano durante o solstício de verão na Europa.
Adotadas pela Igreja Católica, então, para homenagear os santos do mês. No Brasil, os registros históricos apontam que desde o século XVII as festas juninas eram comemoradas.
A indicação desta data visam imortalizar São Pedro e São Paulo e, por isso, são celebrados no mesmo dia, pois estavam unidos no mesmo propósito.
Por consequência, é considerado, também, o Dia do Papa, pois São Pedro, segundo a doutrina católica, foi o primeiro Papa da Igreja, além de ter sido o que permaneceu por mais tempo com esse título (37 anos).
Para rememorar, Pedro era um pescador no Mar da Galileia e largou sua vida para seguir Jesus, sendo apontado como seu sucessor, entre os doze apóstolos, com a missão de construir uma igreja que continuasse a obra do Messias: “Tu és pedra, e sobre essa pedra edificarei a minha igreja” (Mateus 16:18), apesar do acontecimento ter sido vaticinado pelos profetas - Pedro apóstolo negou Jesus três vezes quando o seu Senhor foi preso, sendo tomado pelo arrependimento em seguida. Tudo isso fazendo parte da profecia para servir de exemplo para o mundo.
Em outra circunstância, Paulo de Tarso, perseguidor ferrenho dos cristãos, teve o milagre de sua conversão quando estava em direção a Damasco, conforme os registros de Atos 9:3-5: “Durante a viagem, estando já em Damasco, subitamente o cercou uma luz resplandecente vinda do céu. Caindo por terra, ouviu uma voz que lhe dizia: ‘Saulo, Saulo, por que me persegues?’. Saulo então diz: ‘Quem és, Senhor?’. Respondeu Ele: ‘Eu sou Jesus, a quem tu persegues.”
Paulo não foi discípulo que seguiu Jesus mais de perto, pois a sua conversão ocorreu após a morte de Cristo. No entanto, tornou-se um dos grandes evangelizadores da igreja primitiva, tornando-se o maior responsável pela sua expansão.
Pedro e Paulo tiveram destino semelhante, morreram martirizados. São Pedro foi crucificado, mas pediu para que a cruz ficasse de cabeça para baixo, pois não se sentia digno de ter a mesma morte que seu mestre. Já São Paulo foi degolado em Roma.
São pequenos traços em que pretendo homenagear esses Santos da Igreja Católica, registrando a magnífica festa comemorativa realizada na Igreja Matriz de São Pedro Apóstolo, aqui em Natal, sob a liderança do incansável Padre Francisco Motta, com a presença do Arcebispo D. Jaime e dos mandatários do Estado (Professora. Fátima Bezerra) e do Município de Natal (Doutor Álvaro Dias), registrando-se um emocional pronunciamento do médico Pedro Cavalcanti.
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