A festa da Imaculada Conceição
Padre João Medeiros Filho
No dia 08 de dezembro de 1854, na Basílica de São Pedro (Roma), o bem-
aventurado Papa Pio IX proclamou, pela Bula “Ineffabilis Deus”, o dogma da
Imaculada Conceição da Virgem Maria. Esta é venerada pelos católicos como o templo
santo e ilibado, no qual Cristo veio habitar. Ao celebrar a festa da Imaculada Conceição,
a Igreja faz-nos refletir sobre nossa origem e destino. Exemplar da humanidade isenta
de pecado, Maria recorda-nos como seria o ser humano se não tivesse havido a rebeldia
contra Deus. Este quis nos mostrar a criatura perfeita e oferecer-nos um modelo de vida.
É o sentido da festividade, que recorda a doutrina, segundo a qual somos chamados a
acreditar que a Virgem Santíssima, desde o primeiro instante até o último átimo de sua
existência terrena, nunca foi corrompida pela maldade dos homens. A Imaculada
Conceição da Virgem Mãe é fruto da plenitude da graça divina.
A devoção à Imaculada brotou cedo no solo fecundo da piedade popular. O
Ofício de Nossa Senhora (escrito pelo frade franciscano Bernardino de Bustis, no século
XV) é uma demonstração do culto mariano e do amor dos fiéis Àquela que é Mãe de
todos, oferta de Cristo no alto da Cruz. “Eis a tua Mãe” (Jo 19, 27), dissera Jesus ao
apóstolo João. Antes mesmo de ser proclamado pela Igreja, o dogma já era vivido e
celebrado na fé dos católicos, na sensibilidade dos corações que desconhecem reflexões
teológicas, mas percebem a ação amorosa do Senhor.
Maria é a expressão da benevolência de Deus. Na plenitude da graça em Nossa
Senhora, temos a certeza de que o Pai não nos abandonou à própria sorte. Ela é a
afirmação de que o Onipotente não se arrependeu de ter criado o ser humano. O Anjo,
quando anunciou à Virgem que seria a Mãe do Salvador, disse-lhe: “Alegra-te, cheia de
graça, o Senhor é contigo” (Lc 1, 28). Isto significa que Ela estava toda envolta pela
vida sobrenatural. Entregando-se totalmente ao Todo-Poderoso, foi tomada pelo
mistério do amor divino. Essa plenitude em Maria representa a sua isenção de pecado.
“Cheia de Graça”, toda pura, foi esta a Mulher que o Pai Celestial escolheu para ser o
sacrário corporal e terreno de seu Filho Unigênito. E Ele não iria unir a Segunda Pessoa
da Trindade – de forma infinita e perene, no mistério da Encarnação – com o pecado.
Começou a surgir, deste modo, a reflexão teológica da Conceição Imaculada de Maria.
Segundo o teólogo e cardeal dominicano Yves Congar, “Nossa Senhora é a
reconciliação de Deus com o ser humano. Sem desmerecer, no entanto, o papel de
Jesus Cristo como Redentor, na pessoa da Virgem de Nazaré, Deus fez as pazes com o
homem”. Nela foi retomada e recriada a humanidade plasmada com tanto carinho na
origem do universo. Por esta razão, o apóstolo Paulo e a teologia subsequente chamam
Nossa Senhora de “Nova Eva”, isto é, a nova Mulher, portadora da Vida. Pela Mãe do
Redentor, o Verbo se tornou carne como nós. Por isso, a celebração da Festa da
Imaculada Conceição acontece no tempo do Advento, perto do Natal, quando
comemoramos o mistério da encarnação e do nascimento do Filho de Deus. A Virgem
Santíssima foi a pessoa escolhida para possibilitar ao Salvador assumir a condição
humana, sendo a portadora do Filho de Deus na face da terra.
Maria viveu a Eucaristia quando carregou dentro de Si Cristo, a hóstia viva. Em
sua encíclica “Ecclesia de Eucharistia”, promulgada em 2003, São João Paulo II
proclama Nossa Senhora “Mulher Eucarística”. O Corpo de Cristo presente no Pão
Sagrado, também descende Dela. A divindade real no sacramento do altar habitou o seio
da Virgem Santíssima. Por isso, este sacrário vivo é eternamente santo e imaculado.
Entoemos um tradicional e belo cântico mariano, evocando a festa da Imaculada
Conceição, cuja autoria é atribuída a Lamartine Babo, quando era aluno do Colégio São
Bento (Rio de Janeiro): “Ó Maria, concebida sem pecado original, quero amar-vos
toda vida com ternura filial.”.