14/11/2020
10/11/2020
Centenário de Dom Eugênio Sales
Padre João Medeiros Filho
No dia 8 de novembro, transcorreu o centenário de nascimento de Dom
Eugênio de Araújo Sales, primeiro e único potiguar elevado à dignidade
cardinalícia. A tradição eclesiástica denomina os cardeais “Príncipes da
Igreja”, título dado pelo Papa Bonifácio VII, cujo pontificado decorreu
entre 1294 e 1303. Ao longo da história da Igreja, foram criados três graus do
cardinalato: cardeais bispos, presbíteros e diáconos. Os primeiros são
responsáveis por dioceses circunvizinhas de Roma. Em geral, desempenham funções
em órgãos do Vaticano. Há os cardeais presbíteros, titulares de algumas
basílicas e igrejas romanas, não necessariamente residentes nos territórios
pontifícios. Dom Eugênio foi cardeal
presbítero da Igreja de São Gregório VII. Nomeado por Paulo VI, no consistório
de 28/04/1969, tornou-se cardeal primaz do Brasil. À época, era arcebispo
metropolitano de Salvador, na Bahia. Dois anos depois, foi transferido para o
Rio de Janeiro, conservando a mesma igreja cardinalícia, apesar dos dignitários
cariocas, por tradição, ocuparem a Basílica de São Bonifácio e Santo Aleixo, em
Roma. Por antiguidade, Dom Eugênio tornou-se cardeal protopresbítero entre os
155 pares. Os cardeais diáconos, primitivamente vinculados a igrejas dos
arredores de Roma, eram encarregados de tarefas sociais e caritativas.
Atualmente, há 219 purpurados (nove brasileiros), sendo 120 eleitores do papa,
prelados com idade inferior a oitenta anos.
Etimologicamente, a palavra príncipe vem do latim “princeps” e significa
o primeiro. Não precede apenas na ordem cronológica ou ritual, antecede na
medida em que cria, sugere e renova. O Cardeal Sales foi príncipe, precursor em
vários assuntos eclesiais. É extensa e profícua a sua atividade pastoral,
religiosa e até política, voltada para o Povo de Deus. De forma discreta, firme
e corajosa, teve uma atitude humanista, diplomática e de verdadeiro pastor com
perseguidos, presos políticos e refugiados, brasileiros e estrangeiros. Inovou
no plano educacional com o ensino a distância pelas escolas radiofônicas.
Dom Eugênio foi indubitavelmente um grande benfeitor do clero
brasileiro, obtendo com seu empenho muitas conquistas para os sacerdotes,
religiosos e ministros de todas as denominações. Estes viviam sem amparo e
direitos da previdência e aposentadoria. O então arcebispo do Rio de Janeiro
sensibilizou o parlamento nacional para aprovar um projeto de lei, sancionado
em 08 de outubro de 1979 (Lei 6.696/79), equiparando os clérigos, ministros de
culto (católicos ou não), frades e freiras aos trabalhadores autônomos,
possibilitando a contribuição previdenciária oficial. Muitos foram beneficiados
com essa norma, cuja ideia partiu de nosso eminentíssimo conterrâneo. Talvez
poucos tenham conhecimento disto. É
sabido que os cursos de seminários e formação sacerdotal, por mais conceituados
que tenham sido no passado, não gozavam do reconhecimento do Estado. No final
dos anos 60, pouco antes do AI-5, apesar do clima tenso entre a Igreja do
Brasil e o Governo Militar, Dom Eugênio conseguiu a edição do Decreto-Lei
1051/69 (revogado pela Lei 9394/96), prevendo o aproveitamento dos estudos
realizados em seminários, conventos etc.
Uma das grandes preocupações de alguns bispos era a assistência de saúde
para os padres. Dom Eugênio foi pioneiro ao firmar contrato coletivo com uma
operadora de plano de saúde, dando cobertura ao clero do Rio de Janeiro,
estendendo o benefício ao presbitério da diocese de Caicó. E, diante das
dificuldades financeiras de alguns bispados, estendeu a abrangência a presbíteros
doentes. Inquietava-se com o
deslocamento dos sacerdotes. Com a ajuda da “Adveniat” (organismo alemão,
dirigido, à época, por Dom Franz Hengsbach) elaborou – quando administrador
apostólico de Natal – um plano de motorização do clero. Recomendou
enfaticamente aos párocos, vigários e capelães: “Não afrontem a pobreza de nossos irmãos com carros de luxo. O povo de
Deus precisa, sobretudo, de seu testemunho de simplicidade, fé e caridade”.
Cabe-nos lembrar ainda que, quando arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Eugênio
concedeu bolsa de estudos também a seminaristas das dioceses de Natal e Caicó,
dentre outras, para cursar filosofia e teologia no Seminário São José (RJ). Certa
feita, um teólogo (outrora, nosso colega na Bélgica) afirmou: “Dom Eugênio é um homem de Deus, íntegro,
autêntico, corretíssimo, desprendido e de profundo amor à Igreja!” Viveu em
plenitude o seu lema episcopal: “Impendam
et superimpendar” (2Cor 12, 15) – “Dar-me-ei
inteiramente por vós.”
04/11/2020
Um caipira
esperto que nem um caipira
Tomislav R. Femenick – Auditor e
jornalista
Por
ser um imbróglio que envolve direitos de propriedade industrial, registro de
patente e outros assuntos correlatos ainda em disputa, aqui serão omitidos os
nomes dos personagens, da empresa e mesmo da cidade envolvidos na história que
vou contar.
Quando
eu era diretor adjunto da Campiglia Auditores e Consultores, lá em São Paulo, um
dia fui chamado para uma reunião com o professor Américo Oswaldo Campiglia e seu
filho, Roberto Campiglia. Resumo da ópera: teria que ir (com uma equipe)
reestruturar o setor de custos de uma fábrica de chapas de madeira aglomerada,
localizada no interior do Estado. O trabalho não era difícil nem fácil, pois já
tínhamos experiência, expertise, sobre o assunto.
Ao
chegarmos à empresa, vimo-nos envolvidos em uma nuvem de poeira que, na
verdade, era pó de madeira. O pátio, o espaço que ficava entre a fábrica e a
ala administrativa e que servia de estacionamento, estava coberto por aquela
nuvem. Visando evitar que a poeira entrasse no prédio da administração, para se
alcançar os escritórios, tinha-se que passar por dois vãos, onde nunca as respectivas
portas ficavam abertas ao mesmo tempo. Aqui preciso explicar o que era aquela nuvem
de pó. As chapas de aglomerado são fabricadas em três fases principais:
trituração da madeira; colagem dos fragmentos e lixamento das placas. O pó era
resultado da última etapa.
Ao
passarmos pela recepção, notamos (até porque era a única pessoa ali presente)
um senhor humilde, de braços cruzados e sentado em uma das cadeiras. Nos dias
seguintes, sempre que passávamos pela recepção, ali estava o mesmo senhor. Quem
diz que não é curioso é mentiroso. Um dia perguntei ao diretor da unidade: “Quem é aquele senhor que sempre fica na
recepção?”. Ele também não sabia e perguntou à secretária, que respondeu
que era o encarregado da turma que varria o pó. Estava de férias e todos os
dias vinha, querendo falar com alguém da diretoria.
“Passando
por cima da secretária”, o diretor mandou o senhor entrar em seu gabinete e perguntou
o que ele desejava. Ele, o encarregado da varredura, queria vender uma ideia
que acabaria com o pó de madeira na fábrica, em troca de uma casa para si,
outra para o filho e mais uma viagem à Flórida (com tudo pago) para ele,
mulher, filho, nora e dois netos conhecerem a Disney. O diretor quis saber como
era isso. O funcionário exigiu que se escrevesse tudo em um papel, explicando
que, se a empresa aplicasse suas ideias, teria que cobrir suas exigências. Foi
escrito uma espécie de documento e ambos assinaram o acordo que, em síntese,
era: as máquinas deveriam ser acopladas a capas plásticas maleáveis, junto às
correias de lixa, colhendo o pó, que seria levado por dutos, impulsionados por
exaustores, até os caminhões que o levaria aos aterros. Uma solução simples,
que ninguém tinha pensado.
Um
ano depois, de volta à empresa, de cara notei que o pátio estava relativamente
limpo e que o corredor de entrada estava desativado. Dei os parabéns ao diretor
e perguntei pelo seu funcionário prodígio. “Está
na Europa, conhecendo a terra dos seus avós, por conta de sua nova ideia” –
respondeu. Aí contou-me o que aconteceu. Seis meses depois de implantada sua
primeira sugestão, o funcionário havia lhe levado uma nova; em troca de um
carro para ele e outro para o filho e, mais, uma viagem para a Itália (com tudo
pago) para ele, mulher, filho, nora e dois netos conhecerem a cidade de Carpineto,
terra dos seus avós (ou de sua esposa, não me lembro bem).
Novamente
a ideia era relativamente simples: em vez de jogar em aterros sanitários o pó
resultante do processo de lixamento, ele, o pó, deveria ser reciclado e misturado
com cola aos fragmentos de madeira, dando-lhe mais consistência e aderência e,
ao mesmo tempo, resultando em superfícies mais planas e, portanto, exigindo
menos lixamento. Um caipira esperto que nem um caipira. Pena é que, anos
depois, tudo foi parar na justiça, como é moda hoje em dia.
Dizem
que até pedido de casamento já é feito via oficial de justiça.
Tribuna
do Norte. Natal 04 nov. 2020.
LÁGRIMAS DO SOL
Valério Mesquita
O planeta que hospeda a humanidade está aflito. Não por causa de Deus ou
dos elementos naturais que Ele criou. Mas por culpa do maior predador do
universo: o homem. Deus sempre foi misericordioso com o mundo. Tanto antes
quanto depois de o seu Filho unigênito ser mutilado na cruz para remissão dos
nossos pecados. Sacrifício vicário a fim de que se cumprissem as Escrituras.
Segundo os cientistas e pesquisadores geofísicos o clima na terra em
2100 estará insuportável. E prevêem daqui pra lá uma série de catástrofes
terrestres. O aumento das águas dos oceanos invadirá os continentes em virtude
do contínuo degelo polar. Não são eles profetas do Apocalipse, pois seriam logo
contestados e ironizados pelos céticos e agnósticos.
Avisaram, ainda, que a Amazônia se transformará paulatinamente num
cerrado, vítima da desertificação promovida pelos insensatos. Advertem,
igualmente, sobre a falta de alimentos que virá como conseqüência dos
transtornos climáticos e atmosféricos. O ecossistema global entrará, por fim, em
colapso.
E Deus, o Pai supremo sabe de tudo. Porque, pelo lado espiritual todos
esses fatos fazem parte das previsões tanto do Antigo como do Novo Testamento.
A cavidade da camada de ozônio já é bem maior que a ganância dos países ricos e
os desvãos das civilizações pecadoras através dos tempos. O homem é um predador
natural. Não, apenas, do ecossistema, mas da família, das instituições
públicas, do sistema judiciário, da atividade política através da corrupção dos
costumes e da exploração dos mais fracos. O ser humano é o devastador e
ceifador de vidas desde a era pré-histórica, das guerras da Antiguidade, da
Idade Média, da Idade Moderna até a fase contemporânea. Sempre o homem será o
lobo do homem. Porque não permitem que nele atue o Espírito Santo de Deus e sim
o instinto diabólico. E assim caminha a humanidade para a autodestruição numa
encruzilhada que nem o gênio e a sabedoria científica dos geógrafos, geólogos,
oceanógrafos, geobotânicos, astrônomos, biólogos, ufólogos e ecologistas podem
deter ou evitar a catástrofe.
O Sol imutável, intangível, inatingível, obra de Deus, continua rei da
galáxia. A ele devemos o brilho dos nossos dias, todos os dias. Não fossem os
seus raios luminosos, a Terra seria congelada e escura. O seu calor faz parte
da vida humana e animal desse corpo celeste. Mas o buraco-negro na atmosfera
terrestre é da autoria criminosa do homem, hóspede predador da terra. As águas
que vão aumentar o nível dos oceanos e os tsunámis que assolarão as cidades são
lágrimas inconformadas de Jesus. O planeta Terra suicidou-se.
03/11/2020
26/10/2020
Tomislav
R. Femenick
– Jornalista
Nos meus quase
quarenta anos morando em São Paulo, realizei alguns trabalhos que eu realmente
nunca esperei fazer; quer pela sua magnitude (por exemplo: gerenciar a
auditoria externa do Banco do Brasil, em todo o país); quer pelos seus aspectos
inusitados (outra vez, por exemplo: dar consultoria a um grupo empresarial
italiano na instalação de uma fábrica de fábricas de papel higiênico). No
primeiro caso eu fazia parte do corpo diretivo da Campiglia Auditores; no
segundo, da Deloitte/Revisora Consultoria. Houve outros casos insólitos, como
da vez em que fui chamado a participar de uma reunião para ajudar na solução de
um caso de chantagem amorosa, promovida por uma amante casual de um diretor, ou
de outra em que encontrei mais de três mil geladeiras que haviam “sumido” dos
estoques de uma grande loja de departamento.
Tudo isso foi estranho
e não usual para mim. Mas, nada foi tão insólito quanto meu encontro com o
verdadeiro Sinhozinho Malta. Sim, você não leu errado: o “verdadeiro Sinhozinho
Malta” – e olhe que não estou falando do maravilhoso ator Lima Duarte e sua personagem na novela Roque
Santeiro, da TV Globo.
Um certo dia do ano de 1973 – e
lá se vão quase 50 anos –, bem cedinho recebi um telefonema de José
Pedro Canovas, meu colega de
trabalho na Deloitte/Revisora. Tinha um recado para mim, de parte
de nosso diretor Ernesto Marra: quando eu fosse para a firma, levasse maleta e
bagagem para um trabalho especial fora da cidade, que poderia demorar uma semana,
um mês ou mais.
Mensagens como essa não eram surpresas. Surpresa foi, sim, saber que o
professor Marra (ele, que não saía do escritório) iria comigo para Araçatuba,
iniciar uma auditoria. Só por isso, eu avaliei a importância do cliente.
Também, não era por menos, o cliente era o Frigorífico T. Maia. Dito assim,
hoje isso não significa nada. Mas, há cinquenta anos a história era outra.
O
Frigorifico T. Maia pertencia a Sebastião Ferreira Maia, o celebre e conhecido Tião Maia, então o rei do gado do Brasil. Mineiro, com primário incompleto e boiadeiro. Sabido, explorou o jeito
caipira de falar e de se comportar e fez amizade com empresários e políticos de
altos níveis. Conseguiu ser o maior criador de gado do Brasil e montou um frigorifico,
no interior de São Paulo.
Passada a “porteira” do frigorifico, fomos
recebidos pelo próprio Tião Maia, que estava sentado na calçada do prédio da
entrada. E alí também ficamos sentados. O professor Marra, eu, Tião e dois de
seus funcionários (um era contador e outro, advogado). Em suma: ele queria
saber o que a auditoria especial iria fazer. Algumas questões,
de caráter informativo, foram respondidas e outras,
por se tratarem de matérias relacionadas às investigações propriamente ditas, foram
resguardadas. Aí foi que nós, o célebre Tião Maia e eu, começamos a falar
diretamente. Ele não queria saber como a auditoria seria realizada, queria
mesmo era saber o “porquê”, qual razão, de se fazer de um jeito e não de outro.
Depois disso, fomos lanchar. Mas, como era
por volta das onze horas, o lanche foi um churrasco, ocasião em que, de tão
relaxados, esquecemos-nos do trabalho e começamos a jogar conversa fora. E,
então, o célebre Tião Maia olha para mim e pergunta: “você é russo”? Eu respondi que não, que era de Mossoró, no Rio
Grande do Norte, e filho de croata.
Foi então que ele falou da sua amizade com
Mota Neto, quando este último fora superindentende do Instituto Brasileiro do
Sal. Foi Motinha quem convenceu o maior pecuarista do Brasil a usar sal grosso
misturado à ração de seu imenso rebanho, comportamento que passou a ser copiado
por outros criadores. Depois falei disso com o meu primo (Mota Neto era meu
primo) e ele confirmou o fato.
Por
motivos políticos e econômicos, o ex-boiadeiro mineiro deixou o Brasil em 1976
e foi para a Austrália. De lá foi para os Estados Unidos, para Las Vegas; não
para jogar, mas para construir residências. Quando morreu deixou, entre outras
coisas, cerca de 170 mil cabeças de gado, duas fazendas na
Austrália e um conjunto de casas em Las Vegas – somente este no valor de 30
milhões de dólares.
Tribuna do Norte. Natal, 25 out. 2020