As escravas do Islã
Tomislav R. Femenick – Mestre em Economia, com extensão em sociologia e
historia – Do IHGRN
Os fiéis muçulmanos identificam o
Alcorão como sendo a palavra de Deus, revelada ao profeta Maomé – equivalente à
Bíblia, para os cristãos. E o Alcorão, na sura (versículo,
capítulo)
16, reconhece a escravidão como uma instituição legítima: “Deus citou em exemplo um escravo que nada possui e em nada manda e um
homem livre [...]. Podemos considerar
os dois iguais? Não! Louvado seja Deus!” (O ALCORÃO, Tradução de Mansour Challita, s.d.). Em
vários outros capítulos, há citações que coonestam o escravismo: quando
determina a aplicação da lei de Talião para os homicídios (escravo por escravo); quando reconhece a preferência por uma
escrava crente no Islã sobre os descrentes; quando permite ao um homem ter as
escravas que puder comprar, com o direito de ter relações sexuais com um número
ilimitado de escravas e concubinas, inclusive as casadas; ou quando recomenda
tratar os escravos com benevolência etc.
A mesma forma de aceitação
explícita e implícita da escravidão está no Hadice, ou Hadith (coletânea de
palavras e atos de Maomé, que complementa o Alcorão), quando prega a guerra
contra aqueles que não aceitam a conversão ao islamismo, sua captura e
escravização, bem como quando recrimina as fugas dos escravos. Entretanto, a
maioria das citações versa sobre a escravidão de mulheres. Por exemplo: não se
deve açoitar a esposa, como se fosse uma escrava; o pai pode dar uma escrava ao
filho, como um presente sexual; após casar, ao comprar uma escrava ou um camelo,
um homem deve rezar, nos dois primeiros casos, e procurar o refúgio de satã, no
último; quando os seus donos morrem, as escravas devem esperar dois meses e
cinco dias para casar novamente; se as escravas engravidarem de seus donos,
estes podem determinar o aborto, se assim desejarem; se as esposas ciumentas
fizerem algo de mal às escravas de seus maridos, as esposas devem ser punidas e
os senhores devem continuar a possuir as escravas; as escravas que se dedicarem
à feitiçaria podem ser executadas; os crimes de adultério, quando cometidos por
homem, não podem ser compensados pela doação de uma escrava; as mulheres e
crianças dos inimigos vencidos em guerra podem ser transformadas em escravas,
porém não devem ser estupradas e recomenda-se que se tomasse banho depois de
fazer sexo com escravas. O próprio Maomé tinha escravas e escravos, fato
registrado na sura 33 do Alcorão e no Hadice
Mishkat 470. Ali ibne Abi
Talibe, genro de Maomé e líder dos xiitas, teve dezessete
escravas como concubinas. No tocante à mulher escrava, em certos aspectos, o
próprio Alcorão deixa margem a interpretações dúbias. Em uma sura está
prescrito: “Não constranjais vossas
escravas à prostituição se preferem a castidade. Já se forem compelidas, Deus
lhes perdoará”.
Todavia, o escravo sempre teve
reconhecida a sua condição de ser humano. Uma sura diz: “Certamente, Deus vos fez os seus amos, se Ele quisesse, teria da mesma
forma vos submetido a eles como escravos”. Em outra está escrito: “Sede bondosos com vossos [...] escravos. Deus não ama os presunçosos e os
soberbos”.
Agora a pergunta que se faz é:
qual a real extensão do envolvimento do islamismo, religião e forma de vida,
com a escravidão? Realmente a prédica religiosa e a prática eram conflitantes
entre si. No caso específico da África Negra, quando os maometanos lá chegaram,
venceram, conquistaram e converteram povos com uma longa tradição de escravismo
e continuaram “o padrão de incorporar
escravos negros da África às sociedades ao norte do Saara e ao longo das costas
do oceano Índico [...]. Durante mais
de setecentos anos antes de 1450, o mundo islâmico era praticamente o único
eixo de influência externa na economia política da África [...]. As províncias islâmicas centrais constituíam
o mercado para os escravos; o abastecimento vinha das regiões de fronteira”
(LOVEJOY, 2002). O
tráfico de escravos africanos, praticado pelos islamitas, dava-se em duas
vertentes principais: nas várias rotas transaarianas e na costa leste africana,
pelo Oceano Índico e pelo mar Vermelho. Com base em levantamentos efetuados por
alguns historiadores, estima-se que os muçulmanos foram os responsáveis pela
venda de aproximadamente onze milhões de africanos escravizados (LOVEJOY, 2002), maior
que o tráfico efetuado por europeus. Os fatos falam por si mesmo.
Tribuna
do Norte. Natal, 12 fev. 2020.