16/12/2018

SAUDADES, DONA SÍLVIA! – 

Berilo de Castro


SAUDADES, DONA SÍLVIA! –
O Largo do Atheneu, mais uma vez, entristeceu e se enlutou. Com pouco mais de 1 ano da perda do seu confeiteiro  Odeman Miranda, agora, foi a vez de Dona Sílvia, sua esposa e sua armígera maior; figuras admiradas que conduziam com muito carinho e abnegação a Confeitaria Atheneu.
Eu a conheci na década de 1950, ainda solteira, já atuando no ramo comercial. Integrava e atendia em uma Mercearia em frente ao Grupo Escolar Áurea Barros, na rua Afonso Pena, esquina com a rua Açu, Tirol, onde terminei o meu curso primário. Uma figura sempre alegre, atenciosa e que tratava todos com muito apreço.
O tempo passou, fui fazer o meu curso ginasial no Colégio Estadual do Atheneu Norte-Riograndense, onde passei a frequentar com assiduidade a Confeitaria Atheneu, que atendia na esquina da rua Seridó com a Claúdio Machado, bairro de Petrópolis, já capitaneada pelo casal. Teve mudanças em sua trajetória de localização. Hoje, definitivamente fixada na rua Seridó, número 515.
Dona Sílvia tinha a Confeitaria como a sua segunda residência, era lá que recebia visitas de suas  amigas, suas irmãs, que, nas tardes calmas, ainda sem muito movimento, jogavam conversa fora, relembrando as coisas  boas e saudáveis da vida.
Mesmo quando adoecia, pedia que suas filhas a deixassem lá. Não se habituava ficar em casa, pois achava que piorava se não fosse para a Confeitaria. Em casa, ficava  ligando e perguntando se os clientes conhecidos já tinham chegado —  recomendava ela: “Não esqueça que a paçoca de Dr. Berilo não leva manteiga do sertão”. Não perdia a oportunidade de sempre mandar lembranças para os seus clientes amigos. Era o seu jeito incomparável de ser e de servir. Tratava todos pelo nome e já conhecia as suas preferências.  Se preocupava muito quando percebia que o seu cliente se excedia nas doses de uísque ou nos copos de cerveja, a ponto de diminuir o ritmo no atendimento e de logo procurar alguém para conduzi-lo  até em sua residência . Assim era Dona Sílvia, sempre preocupada com o bem-estar dos seus amigos clientes, deixando de lado a visão lucrativa, atitude de pura afeição e carinho que somente ela sabia tão bem fazer.
Partiu, nos deixou. Seguiu caminho para o mundo desconhecido. Foi  ao encontro do seu amor e parceiro maior – Odeman, que juntos deixaram para trás um tesouro familiar e uma rica e numerosa legião de clientes e amigos.
Saudades, Dona Sílvia!

Berilo de CastroMédico e Escritor –  berilodecastro@hotmail.com.br
As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores

14/12/2018




RELEMBRANDO JOSÉ DISTINTO

Valério Mesquita*

Ainda revejo no seu rosto uma saudade suspensa no ar de tempos idos e vividos. Constituiu-se como a enciclopédia ambulante da ascensão e queda da fauna e do fausto da cidade. Conviveu com ricos e pobres. Mas, foi como gerente de um bar que surgiu o apelido Zé Distinto, pela cordialidade de trato abrangente e superlativa. Aí ele passou a se incorporar à geografia humana e sentimental da cidade. Era homem simples por trás do balcão de um amplo bar, no comando de fregueses heterogêneos, desde deputados, prefeitos, vereadores, funcionários, operários, motoristas, jogadores de baralho e vagabundos que a todos conhecia pelo nome, resumidos à humanidade comum. Relembrava fatos e guardava fotos de 1929, da visita de Washington Luiz a Macaíba, e de Getúlio Vargas em 1933, para inaugurar a antiga sede da prefeitura local.
Os exemplos deixados por Zé Distinto, de humanidade, de valorização da vida, de amor à cidade, de preocupação com a preservação da história cultural do município não poderão ser esquecidos. Como macaibense, não há alumbramento maior para mim do que caminhar com a sua memória pelas ruas desertas a conversar mentalmente com os fantasmas da cidade ou sonhar os sonhos dos casarões que ruíram. O seu desaparecimento me conduz a tudo isso como batedor fiel, timoneiro, ator e protagonista do passado e do presente. Um personagem extraído do Cine Paradiso, tenho certeza. Inesquecível.
Mas, o velho “historiador” Zé Fradinha encantou-se. Teve duas famílias. Com a primeira enviuvou de D. Bastinha. Empobreceu quando deixou o comércio e ficou sem recursos suficientes para viver. Daqui, conclamo os macaibenses que o conheceram, para não olvidarem o atendimento expedito e afetuoso, o seu bar repleto de frequentadores e o seu comando eficiente e ágil. Que se lembrem nesse instante de sua humildade e bonomia. Quem tanto serviu antes precisa ser homenageado para que o nome fique evocado numa rua da cidade. Onde o seu vulto hoje já passeia e se queda na Praça Augusto Severo, local do seu comércio.


A amiga Angela Dieb, sempre zelosa quanto aos aspectos de cultura, arte e tradição, me enviou o áudio da famosa valsa “Royal Cinema”, dando conta de que hoje seria a data natalícia de sua composição, pelo Tonheca Dantas. E ainda opinando que eu elaborasse algo em alusão. Assim, pus mãos à obra, me propondo a cumprir a tarefa sugerida.
Na esquina das ruas Ulisses Caldas e Vigário Bartolomeu se erguia o Royal Cinema, única casa de espetáculos do gênero existente na Cidade Alta. Foi inaugurado em 1913, dois anos depois do Polytheama. No início apenas se assistiam a películas do cinema mudo, somente no ano de 1931 é que passou-se a exibir filmes sonoros. Na época dos filmes mudos, e na quase totalidade dos cinemas nacionais, havia sempre a presença de músico (normalmente um pianista), que tocava seu repertório, não só nos intervalos das sessões como também em meio às exibições das fitas. Entre aqueles que se apresentavam no Royal podem se destacar os pianistas Garibaldi Romano, Generosa Garcia, e o popular Paulo Lyra. Em dias especiais, com festa e solenidade, era costume se apresentar um conjunto musical, como o composto por Paulo Lyra ao piano, Manoel Prudêncio Petit na flauta, Cândido Freire no saxofone, Calazans Carneiro no contrabaixo e João Cosme na bateria. Um grupo que se exibiu por longo período no Royal era formado por Eduardo Medeiros no violão, Tibiro no saxofone e Tonheca no clarinete. Certa feita, o proprietário do cinema encomendou a este último, já bem conhecido como compositor, uma valsa para ser tocada na abertura das sessões. E foi assim que surgiu a célebre “Royal Cinema”, em 1913, e que, durante a II Guerra Mundial, ficou famosa no mundo inteiro, através das transmissões da rádio BBC. Quanto ao Royal, deixou de funcionar antes mesmo do início da década de 40, por não ter conseguido enfrentar os concorrentes, mais modernos e com novas tecnologias.
Antônio Pedro Dantas, mais conhecido como Tonheca Dantas, nasceu em Carnaúba dos Dantas/RN a 13/06/1871, e faleceu em Natal/RN no dia 07/02/1940. Sertanejo de origem humilde, filho de escrava alforriada e oficial militar, Tonheca contrariou todos os prognósticos ao se tornar um dos compositores potiguares de maior projeção internacional de todos os tempos. Autor de mais de mil músicas, sua obra mais famosa, a valsa "Royal Cinema", que em 2018 completou 105 anos de composição, é considerada peça obrigatória no repertório de qualquer banda sinfônica que se preze, inclusive no âmbito internacional. Despertou o gosto pela música desde criança, aprendendo com os irmãos em uma banda da sua cidade. Jamais teve formação superior como músico, era autodidata. Em 1898 foi contratado como maestro da Banda de Música da Polícia Militar do Rio Grande do Norte, função que exerceu por três anos. Em 1903, mudou-se para Belém do Pará, sendo contratado como regente da Banda de Música do Corpo de Bombeiros. Em 1910, foi para a Paraíba, onde regeu as bandas de música das cidades de Alagoa Grande e Alagoa Nova. Retornou definitivamente em 1911 para Natal, para integrar a Banda de Música da Polícia Militar. Suas composições eram principalmente valsas, mas também dobrados, maxixes, hinos, xotes, polcas, marchas e outros gêneros musicais orquestrados. São obras famosas também a valsa “Delírio”, a suíte “Melodia do Bosque”, a valsa “A Desfolhar Saudades”, a marcha solene “Republicana”, e o dobrado “Tenente José Paulino”.
O ex-prefeito de Natal na década de 60, Djalma Maranhão, costumava chamar Tonheca Dantas de Strauss Papa-Jerimum. O governo do Estado do Rio Grande do Norte prestou-lhe uma homenagem com a inauguração da Sala Tonheca Dantas, no Teatro Alberto Maranhão. Cláudio Galvão, em sua biografia sobre o músico, conta esse episódio ocorrido no teste para maestro da Banda de Música da PMRN, em 1898: “Em seguida foi a vez de Tonheca Dantas. O comandante lhe entregou uma partitura diferente da primeira e perguntou ao candidato qual o instrumento que iria escolher. ‘Qualquer um…’ respondeu, ‘o senhor diga qual o que quer’. Os membros da comissão se entreolharam, surpresos com a audácia daquele sertanejo moreno e franzino, e resolveram por à prova  seus conhecimentos, mandando que fosse tocando a peça nos diversos instrumentos da banda.” A citação se encerra aqui, mas é de se supor que o Tonheca tenha tido completo êxito na empreitada.
youtube.com
Antônio Pedro Dantas, conhecido como Tonheca Dantas nasceu em Carnaúba dos Dantas em 1871…
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Com muita honra, este blogueiro ocupa a cadeira 33 da ANRL, onde Tonheca é o Patrono.

06/12/2018


COEFICIENTE ELEITORAL

Valério Mesquita*

Jesus Cristo, o amado mestre, falava através de parábolas. O ser humano comum, quando muitas vezes quer dizer uma verdade, escreve por linhas tortas. Esse preâmbulo indefectível vem esbarrar num assunto que desejo abordá-lo via deduções preterintencionais, comparativamente a uma bula medicamentosa. Repleta de disse-me-disse. Falo do famigerado coeficiente eleitoral, a mais afiada faca de dois gumes do processo eleitoral brasileiro. Modelo injusto e antidemocrático, que eleva ao podium o lanterninha em detrimento do mais votado. O resultado, muitas vezes, de uma eleição, não reflete a manifestação da maioria, principio fundamental de qualquer processo decisório.
O escorre das votações ou proclamação de resultados, em qualquer atividade institucional ou não, baseia-se na lógica numeral dos sufrágios. Nos plenários do Legislativo, do Judiciário, dos Tribunais de modo geral, no placar das competições esportivas, no Vaticano, no sindicato, na OAB, no ABC, no grêmio escolar, enfim, em qualquer seguimento coletivo a expressão dos mais sufragados – é a respeitada. Até a lei de Gerson é a da vantagem. Somente o processo eleitoral brasileiro é liquidificado, diluído, triturado, para inverter e subverter a escolha popular que deu três mil votos a um candidato mas o que se elege é aquele dos quinhentos. Acho perverso esse sistema. A maioria dos pequenos partidos que abunda o elenco eleitoral é useira e vezeira na prática de registrar candidatos fajutos apenas com o intuito de alimentar a legenda.
O coeficiente eleitoral, assim, é semelhante a bula medicamentosa. Esta tem efeitos colaterais pois ofende a todo organismo da eleição. Elege quem não devia. Retira do eleitor a primazia de escolher o melhor, retirando do túmulo do processo o opaco e o onomatopaico. Envia para a casa do povo o que não deve ir – o lôgro. Verifique o resultado das urnas, à luz mortiça das reações adversas que o coeficiente eleitoral tem provocado nos legislativos de modo geral só para atender ao cálculo equivocado que premia o caricato partido político e derruba o valor pessoal, humano e majoritário do candidato. Ainda dentro da posologia sobre o assunto as minhas precauções residem no fato de entender que o homem deve ficar acima da agremiação. A proliferação das legendas tem trazido mais problemas para a democracia do que o político solitário. Afinal, o mensalão e outros escândalos foram obras da proliferação de partidos, de legendas.
A superdosagem de corticóide no coeficiente eleitoral mascara o exercício da democracia. Além de alarmante, a sua aplicação penaliza, deturpa a face das urnas, a liquidez da escolha, a lisura da lei. Vamos construir um Brasil eleitor. Respeitando o direito da maioria do povo e não o artifício matemático, algébrico, trigonométrico do computador eleitoral. O voto é algo numeral e ordinal. Sentar na cadeira do eleito o menos votado é invenção escabrosa. É gambiarra, “morcego” e tapeação. Voto é maioria e não medicamento controlado e manipulado. Tarja preta para o coeficiente eleitoral! Aceito tudo o que for eletrônico numa eleição menos o coeficiente digitalizado porque nega o direito da maioria
(*) Escritor.


05/12/2018



[Palestra] Uma casa, a história

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Uma casa, a história
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Numa pequena cidade, 
que há pouco tempo desfrutava de luz 
elétrica, transporte 
público, que era o 
bonde, e água 
encanada...
1/12/2018



Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte. Trabalho lido no I Encontro de Cultura e Turismo do RN: O IHGRN no cenário histórico-cultural local. Natal/RN, 01 de dezembro de 2018. Palestrante, Gustavo Sobral, sócio do IHGRN.

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Creio que só devemos e podemos avançar, quando conhecemos a história.

Comecemos. Comecemos por onde estamos, esta casa. Construção de 1906, estilo neoclássico, elevada da rua, amplas janelas com luz e ventilação, vista para a primeira praça da cidade, de um lado; e, do outro, pela rua por onde adentramos nós, há mais de 300 anos os holandeses desceram para tomar a fortaleza; e não podemos esquecer as horas!, salvos pelo sino da matriz, badalando há tanto tempo, todo o tempo que já passou e o que virá.

Repare que a exposição começa no largo, com a Coluna Capitolina, presente de Mussolini, anos 1930, e veio da Itália; o Pelourinho, na sacada, lembrança de que um dia fomos colônia; o brasão do Império e o da República.
 
Observe o museu, ali ao lado, são relíquias de diversos tempos, registros de diversos fatos. A primeira pia batismal, o primeiro aparelho de telefone de Natal, bustos, retratos, etc, etc, um mundo, a história, em permanente exposição, para conhecer, se interessar e se sentir parte. Encontrar suas raízes, lugar, passado e história.

O instituto andou diversos endereços até aqui se fixar definitivamente em 1938. No passado, dividiu as instalações com o Tribunal de Justiça e, nesta sala em que estamos, no sossego da tarde, talvez; e em cadeiras de balanço, descansavam os desembargadores das acaloradas sessões. Outros tempos, outros ventos.

Quando o Instituto brasileiro é criado em 1838, a preocupação era escrever a história de um país que nascia para que se pudesse criar uma identidade e uma nação. Os estudos do Brasil colonial, da cultura indígena, o papel dos viajantes estrangeiros, em expedições, conhecendo a fauna, a flora, tudo foi essencial para que começássemos a escrever a história do Brasil.

Repare que a escrita da nossa história não tem 200 anos!

A República instaurada, os estados, com o auxílio do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, vasculhavam documentos, papéis, mapas, o que houvesse para finalmente pacificar as fronteiras. Eram as questões lindeiras. No Rio de Janeiro, Rodolfo Garcia, o historiador do Brasil, auxiliava o Conde de Afonso Celso em outros limites.

E o Rio Grande do Norte?
Havia a disputa com o Ceará.
História que passou como a “questão de Grossos”.

Nós, norte-riograndenses, dizíamos: é nosso! E os cearenses, não poderia ser diferente, a dizer o mesmo: não é de vocês, é nosso! É nosso! Não, é nosso! Eles diziam que era deles; e nós, que era nosso. Mas não bastava o dizer. Alguma coisa teria que auxiliar a vitória da causa que chegou ao Supremo Tribunal Federal.

Mas o que seria?

Não pensem, que foi o grande orador, tribuno, causídico, a sensação brasileira, ministro que foi, figura lendária, autor de um discurso que ninguém esquece e repete: Ruy Barbosa da oração aos moços! Ruy foi nosso advogado e o fim da história é que vencemos, mas o é preciso contar que não é só isso. É outra, a parte da história que precisamos conhecer.

É graças não a Ruy Barbosa, mas a necessidade de documentos, livros, registros, para simplesmente sustentar a argumentação e a tese jurídica e provar o que ficou provado, e mais que isso, para escrever a história do Rio Grande do Norte, que era necessário e imperativo fundar um instituto histórico local.

Fundado por um grupo de intelectuais da época, que eram os que sabiam ler e escrever, professores, bacharéis, políticos, este instituto nasceu numa pequena cidade que há pouco tempo desfrutava de luz elétrica, transporte público, que era o bonde; e água encanada, e era apenas Ribeira e Cidade Alta. Foi nesta pequena cidade que o instituto histórico se fez.

O primeiro jornal em circulação em Natal, fundado em 1832, pelo Padre Guerra, era impresso fora; não tínhamos tipografia e, ainda era assim em 1877, quando a considerada primeira história local, por Manoel Ferreira Nobre, também se mandara imprimir fora.  Um sopro veio com a revista norte-riograndense, mas já era o fim do século XIX e durou poucos números e, então, veio o século XX, o Instituto e a sua revista até hoje publicada, e o depois.

Tivemos também uma vida breve e sobressaltada de bibliotecas. A história registra que a biblioteca estadual chegou a funcionar nas dependências do instituto por falta de espaço e de quem cuidasse.

E tudo isto aqui se construiu por trabalho voluntário e doações. Assim chegaram os primeiros livros, documentos e peças de museu que reúnem mais de 400 anos de história colonial, imperial e republicana.  O instituto teve e tem a sua importância que precisa ser registrada. É a mais antiga instituição cultural do Estado e a biblioteca mais antiga.

E assim a história da casa se confunde com a própria vida e com os que nos antecederam. É certo que o tema da história não é a vida, pois a vida é finita. A história é mais antiga que a escrita, mais antiga que Homero e Heródoto e começa com os poetas que foram capazes de torna-la, em contraste com a fugacidade da vida, maior que o tempo. Infinita.

E os historiadores se formaram nos arquivos do instituto...
José Augusto Bezerra de Medeiros (1941), registra:

Abro aspas

“O Rio Grande do Norte possui atualmente dois filhos justamente reputados entre os maiores cultores das letras históricas do Brasil: Rodolfo Garcia e Tobias Monteiro.
Os estudos de ambos, porém, abrangem o país em seu conjunto: um, Rodolfo Garcia, esmiuçando e esclarecendo as origens mais remotas da nossa pátria, esse período colonial cujas principais etapas ele tem descrito à luz de vasta documentação, interpretada pelos mais severos e seguros métodos de investigação histórica; o outro, Tobias Monteiro, já agora consagrado o mais voraz e autorizado conhecedor da história brasileira, a datar dos albores da nossa independência.
A história particular do Rio Grande do Norte tem encontrado também investigadores ilustres, não só entre os filhos da terra, como entre os nascidos em outros trechos do Brasil.
Ferreira Nobre, o primeiro na ordem cronológica, Rocha Pombo, Vicente de Lemos, Luiz Fernandes, Meira e Sá, Pedro Soares de Araújo, Manoel Dantas, alguns outros, entre os que já não pertencem ao número dos vivos, deixaram obras de conjunto ou monografias especializadas do melhor e do mais puro quilate.
Tavares de Lira, ao mesmo tempo um dos mais autorizados historiadores nacionais, Nestor Lima, Antônio Soares, Câmara Cascudo, são atualmente os continuadores esforçados dos que foram buscar nos arquivos, para conhecimento dos contemporâneos, a documentação que esclarece o perpassar da vida do pequeno Estado do nordeste desde a hora primeira do seu povoamento”.

Fecho aspas.

Reflito. Reflitamos

Em tempos difíceis, quando a leitura e o conhecimento são desprezados, os jornais desaparecem, bibliotecas perecem, museus incendeiam, não se pode deixar de acreditar que o futuro sempre foi e, sempre será, o conhecimento, os livros e o instituto histórico e geográfico.

Biblioteca, arquivo, museu, os institutos são importantes, relevantes, necessários, imprescindíveis. Utilidade pública. Hoje, constam dos 26 estados brasileiros, 21 institutos ativos, responsáveis pela história local, documentos, arquivos, etc.

Embora escrevamos a cada dia uma nova página, a história desta instituição ainda está para ser contada. Passados mais de cem anos em que aqueles fundadores se reuniram, embora não soubessem que aqui hoje estaríamos, acredito que, que estariam certos que haveria a continuidade.

Como na passagem do escritor português,
José Saramago:

“Imaginemos por um momento que estamos numa praia: o mar está ali, e continuamente aproxima-se em ondas sucessivas que chegam à costa. Pois bem, essas ondas, que avançam e não poderiam mover-se sem o mar que está por detrás delas, trazem uma pequena franja de espuma que avança em direção à praia onde vão acabar. Penso, continuando a usar esta metáfora marítima, que somos nós a espuma que é transportada nessa onda, essa onda é impelida pelo mar que é o tempo, todo o tempo que ficou para atrás, todo tempo vivido que nos leva e nos empurra. Convertidos numa apoteose de luz e de cor entre o espaço e o mar, somos, os seres humanos, essa espuma branca e brilhante, cintilante, que tem uma breve vida, que despede um breve fulgor, gerações e gerações que se vão sucedendo umas às outras transportadas pelo mar que é o tempo. E a história, onde fica?”

E aqui, termino eu.


Natal/RN, 01 de dezembro de 2018

Gustavo Sobral