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16/10/2018
15/10/2018
HOSPITAL PORTA FECHADA – Berilo de Castro
HOSPITAL PORTA FECHADA –
Nesses quase cinquenta anos de atividade
médica, acompanhei, presenciei e testemunhei seus grandes avanços, em
sua ininterrupta estrada de conquistas científicas. Avanços na área de
genética; novas e fantásticas técnicas de diagnósticos;
avanços extraordinários na área farmacológica; nos aprimoramentos
cirúrgicos; o avanço espetacular nos transplantes de órgãos, mais
recentemente a imunoterapia ( Prêmio Nobel – 2018), enfim, uma
interminável e benéfica evolução nessa bela e admirável arte
de curar.
Por outro lado, é bem notório que todos esses
importantes e inquestionáveis avanços não chegam a maioria da
população: a pobre, a necessitada. Ficam retidos e são de uso exclusivo
das camadas sociais de maior poder aquisitivo.
A saúde pública brasileira, com o seu Sistema
Único de Saúde (SUS), belo e eficaz (só no papel), não tem
correspondido e, muito mais, só tem piorado na sua aplicação prática –
faltou gestão desde o seu nascedouro.
Todos os dias, somos não mais surpreendidos
com situações as mais caóticas em os todos os rincões nacionais. O
descaso, a indiferença, a ausência dos governos vêm dia a dia ocupando e
fazendo mais vítimas nos hospitais públicos.
Hoje, para um cidadão comum conseguir uma
simples consulta, um exame de sangue, um exame de imagem, nem pensar!
Vai ter que esperar uma infinidade de tempo. Um internamento para uma
cirurgia nem pensar. Aí o bicho pega! Entra em
uma fila interminável. Quando, já cansado de tanto esperar, chega a sua
vez; os exames pré-operatórios realizados já estão caducos, não servem
mais. Aí começa tudo outra vez. É uma brincadeira de mal gosto, uma
ciranda desumana e cruel.
Os responsáveis administradores públicos,
vivenciando a situação, anunciam medidas midiáticas: mutirão disso,
mutirão daquilo, revelando a inércia e o não compromisso com a saúde
pública: – usando a máxima do “quanto mais, melhor”.
Deixa aumentar a fila!
E agora, recentemente, inventaram o que eles denominam – Hospital porta fechada. Que coisa louca! Que horror! O que significa?
“Fechar” a porta do maior e único hospital
público de urgências e emergências do Estado. Vamos explicar: em
determinado momento (dos mais cruéis), sem aviso prévio, como em um
passe de mágica, o maior hospital da região “fecha a
sua porta” e passa a escolher os seus pacientes. “Aqui, agora só entra
paciente traumatizado e/ou portador de acidente vascular cerebral”.
Vejam só o vexame daqueles que necessitam e procuram o Hospital. Chegam
ao nosocômio de referência com a certeza do atendimento
e são rejeitados; são orientados a procurar uma Unidade de Pronto
Atendimento (UPA) mais próxima da sua localidade. Muitos desses doentes
já sem nenhuma condição financeira e física de se locomoverem. E mais,
são encaminhados para Unidades de Saúde, onde se
sabe que não funcionam a contento. São precárias em todos os seus
aspectos. Pior ainda para aqueles que vêm do interior do Estado, que são
orientados a voltar para seu lugar de origem. Vejam só que confusão e
que humilhação! É desumano ou não é?
Entendo que Hospital porta fechada caberia
muito bem para situações onde os serviços públicos situados na periferia
da cidade funcionassem de verdade; que existisse no Estado, polos
regionais de Saúde bem estruturados, onde se realizassem
cirurgias de menores portes e riscos, equipados de UTI. Um bom e
eficiente serviço de traumatologia e ortopedia. Enfim, com uma
competente e fixa equipe médica. Aí, sim, poderíamos muito bem escolher
os doentes por tipo de doença e gravidade. Caso contrário,
vamos continuar aumentando as nossas intermináveis, sofredoras e cruéis
filas de doentes esperando os novos e mais novos mutirões da vida.
Piorou muito para a população pobre, a massa maior do nosso país.
Abram as portas dos hospitais públicos!
Berilo de Castro –
Médico e Escritor –
berilodecastro@hotmail.com.br
As opiniões contidas nos artigos são de responsabilidade dos colaboradores
14/10/2018
Marcelo Alves
PARTE 2
Viajando com a amiga (II)
Como dito no artigo da semana passada, apesar da “campanha” dos
autores de “Agatha Christie: Shocking Real Murders behind her Classic
Mysteries” (publicado pela HarperCollins Publishers/Índia em 2017) em
prol de um “turismo literário” em cidadezinhas no condado de Devon e na
Riviera Inglesa, os mistérios da Rainha do Crime não se resumiram a
essas paragens. Christie “hospedou-se” em balneários e pequenas ilhas.
Viajou por outras partes da Inglaterra. Esteve frequentemente em
Londres. Na verdade, ela foi até muito mais longe.
Não é difícil constatar isso.
Antes de mais nada, para além das cidadezinhas do tipo St. Mary Mead
(a vila fictícia criada para ser o lar de Miss Marple), Christie
ambientou seus romances em balneários ou mesmo ilhas “macabras”, que são
misturas de sua imaginação fértil com lugares identificáveis na
diversificada geografia britânica.
Para exemplificar o que eu
estou dizendo, começo citando um dos melhores títulos da Rainha do
Crime: “Evil under the Sun” (“Morte na praia”, 1941). A coisa se passa
em um hotel situado entre os condados vizinhos de Devon e da Cornualha,
no sudoeste da Grã-Bretanha. Entre os hóspedes está a bela Arlena
Marshall, que, um dia, aparece morta em uma enseada da região. Lá também
se acha Hercule Poirot, que se dispõe, claro, a desvendar o caso. E,
como registra Mark Campbell, em “The Pocket Essential Agatha Christie”
(publicado pela Pocket Essential em 2005), “vários lugares de Devon
aparecem neste livro. Torquay é chamada St. Loo, a ficcional Smuggler’s
Island é a Bigbury-on-sea’s Burgh Island (referida de novo em Ten Little
Niggers, 1939)” e por aí vai.
Aproveitando o gancho, outro
exemplo maravilhoso do que estou falando é “Ten Little Niggers” (“O caso
dos dez negrinhos”, 1939), romance sobre o qual, aliás, eu até já
escrevi aqui, em “E não se vende uma amiga”, tratando da polêmica
envolvendo o seu título. O enredo de “Ten Little Niggers” é mais do que
excelente, pelos personagens estereotipados e, sobretudo, pela
localização sinistra. Dez pessoas são convidadas para uma estada em uma
mansão na ilhota chamada Nigger Island. Os convidados chegam,
entusiasmados, em uma tarde de verão. Mas todos têm algo a esconder.
“Crimes” que a Justiça dos homens não foi capaz de punir. E logo tudo
muda, a começar pela vinda de uma tempestade que os deixa isolados na
pequena ilha. Os especialistas não têm dúvida: a ilha de “Ten Little
Niggers” não é outra senão a tal Burgh Island, de fato localizada na
costa de Devon. De minha parte, pensando bem, acho que não quero
conhecer Burgh Island.
Ademais, na obra de Christie, tem-se
também cidadezinhas que simplesmente estão localizadas em um lugar
qualquer da Inglaterra. Como exemplo, peguemos o caso de King’s Abbott, a
cidadezinha retratada por Agatha Christie em “The Murder of Roger
Ackroyd” (“O Assassinato de Roger Ackroyd”, 1926), livro que por muitos é
considerado o melhor da autora. O final desta trama, de tão engenhosa
para com o leitor, é até controversa. Mas claro que não vou contá-lo
aqui. Apenas registro que King’s Abbott, não identificada sua
localização no livro, pode ser qualquer daquelas pequenas vilas
inglesas, onde a vida passa devagar e a fofoca corre rápido.
Aliás, a quantidade de pequenas cidades “criadas” por Agatha Christie é
enorme. James Hobbs, no seu blog “Hercule Poirot Central” (www.poirot.us),
cita, entre outras: Chipping Cleghorn (“A Murder is Announced”, 1950),
Lymstock (“The Moving Finger”, 1942), Much Benham (em várias estórias de
Miss Marple), St. Loo (“Peril at End House”, 1932), Woodleigh Common
(“Hallowe'en Party”, 1969), Warmsley Vale (“Taken at the Flood”, 1948),
Market Basing (em várias estórias de Poirot), Wynchwood (“Murder is
Easy”, 1939), Much Deeping (“The Pale Horse”, 1961) e Deering Vale (“The
Mysterious Mr. Quin”, 1930). Onde elas estariam localizadas? Confesso a
vocês que não tive condições de pesquisar.
Por óbvio, a gigante
Londres, com seus incontáveis atrativos, figura em vários títulos da
Rainha do Crime. Por exemplo, eu mesmo já citei aqui a estação de trens
londrina de Paddington que, de cabeça recordo logo, aparece em ao menos
dois excelentes romances de Christie: “The ABC Murders” (“Os Crimes
ABC”, 1936) e, claro, até pelo sugestivo título, “4.50 from Paddington”
(1957). De cabeça ainda, posso dar um outro típico exemplo de “policial
londrino” de Christie com “Lord Edgware Dies” (“A morte de Lorde
Edgware” ou “Treze à mesa”, 1933), título que mencionei outro dia aqui.
Nesse que é considerado um dos melhores romances escritos por minha
amiga, com Hercule Poirot, o Capitão Hastings e o Inspetor Japp à frente
das investigações, aparecem vários cenários famosos da capital inglesa,
tais como Piccadilly, Covent Garden, Sloane Square, Regent’s Park,
Grosvenor Square e o luxuoso Claridge’s Hotel, para ficar,
aleatoriamente, em uns poucos exemplos. E, especialmente para os amantes
do direito, posso mesmo lembrar uma das peças mais famosas de Christie,
“Witness for the Prosecution” (“Testemunha de Acusação”, 1953), em que
boa parte dos atos se passa na mítica “Old Bailey”, que é, para quem não
sabe, a sede das cortes criminais (centrais) de Londres. Tudo ali bem
pertinho da famosa Fleet Street (outrora “a rua” dos jornais londrinos e
hoje sinônimo, em forma de metonímia, de “imprensa” na Inglaterra) e da
ainda mais famosa St. Paul’s Cathedral, obra-prima de Sir Christopher
Wren (1632-1723).
Na verdade, as andanças de Christie por
Londres, especialmente em companhia de seu Hercule Poirot, são
muitíssimas. Incontáveis mesmo. Afinal, diferentemente de Miss Marple,
que é uma senhorinha “local” e detetive amadora, o pequenino e arrogante
detetive belga Hercule Poirot é um profissional, com contatos na
Scotland Yard e popular em várias tribos da cidade de Londres. E
certamente por essa razão, Miss Marple e Poirot, curiosamente, nunca se
encontraram em qualquer das muitíssimas estórias imaginadas por minha
amiga Agatha Christie.
Por fim e para além disso, também é fato
que Agatha Christie e Hercule Poirot ganharam o mundo. Se Miss Marple
esteve uma vez de férias no Caribe, Poirot, com meios e recursos para
tanto, foi muito mais longe: nos Bálcãs, em Istambul, na Mesopotâmia, no
Egito e por aí vai. Mas sobre essas andanças, nessas diferentes
culturas, nós só conversaremos no artigo da semana que vem.
Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP
13/10/2018
PARTE 1
Vai texto de artigo publicado domingo retrasado, dia 30 de setembro de 2018, no jornal Tribuna do Norte (de Natal/RN):
Viajando com a amiga (I)
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP
Vai texto de artigo publicado domingo retrasado, dia 30 de setembro de 2018, no jornal Tribuna do Norte (de Natal/RN):
Viajando com a amiga (I)
É fato: nos romances da minha amiga Agatha Christie (1890-1976), nós
somos “convidados” a desvendar um crime. Seguimos os passos e o
raciocínio do seu Hercule Poirot ou da sua Miss Marple, através de um
jogo de pistas e charadas, para chegarmos a um final, quase sempre,
surpreendente. O mistério por detrás do crime é, com certeza, o mais
importante para o sucesso da estória.
É algo bem diferente do que
se dá com os policiais noir americanos, de gente como Raymond Chandler
(1888-1959) e Dashiell Hammett (1894-1961), que nos apresentam um mundo
estranho de dinheiro farto, casamentos falidos, destruição pelo álcool,
fêmeas fatais e assassinatos, misturado a um aparelho policial e
judicial corrupto, que é enfrentado pelos seus detetives durões. Nos
policiais noir, para o sucesso da coisa, o ambiente no qual estão
inseridas as personagens é tão ou mais importante do que a
trama/mistério em si.
Entretanto, por mais paradoxal que seja –
já que o ambiente onde se passa a estória, em Agatha Christie, é bem
menos importante que o mistério por detrás do crime –, para mim, uma das
coisas mais gostosas de se fazer, na companhia da Rainha do Crime, é
“viajar” nos seus romances.
Explico: em regra, o ambiente das
estórias de Agatha Christie é muito “saudável” e turístico. São casas de
campo em cidadezinhas da Inglaterra, balneários na sua “Riviera”, a
alta sociedade londrina ou mesmo o outrora pitoresco Oriente Médio. E o
turista, literário ou não, pelo menos aquele “bom da bola”, gosta de
viajar para lugares pitorescos, mas que sejam também saudáveis e
razoavelmente seguros.
É o que também pensam os autores de
“Agatha Christie: Shocking Real Murders behind her Classic Mysteries”
(publicado pela HarperCollins Publishers/Índia em 2017), que, mandando
esquecer o Nilo ou o Expresso do Oriente (aqui eu discordo), recomendam
vários sítios para se visitar, a partir das estórias da Rainha do Crime,
no sul do belo condado inglês de Devon ou mesmo na chamada Riviera
inglesa.
De fato, muitas das cidadezinhas inglesas retratadas
por Agatha Christie são visivelmente inspiradas na sua cidade natal,
Torquay, que, às margens do Canal da Mancha, em Devonshire, com seu
clima ameno, é um destino certo para os fãs da nossa amiga. O exemplo
mais visível disso é St. Mary Mead, a pequena vila fictícia criada por
Christie como lar da sua famosa detetive, uma senhorinha solteirona,
batizada de Miss Marple. St. Mary Mead aparece já em “The Murder at the
Vicarage” (“Assassinato na casa do pastor”, 1930), o primeiro caso da
querida Miss Marple, assim como em “The Body in the Library” (“Um Corpo
na Biblioteca”, 1942), também protagonizado pela detetive e que, de tão
bom, eu recomendo sem pestanejar. O mesmo se dá em “The Mirror Crack’d
from Side to Side” (“A maldição do espelho”, 1962), sem dúvida um dos
maiores sucessos de Agatha Christie. Neste romance, não
coincidentemente, o crime a ser desvendado é praticado em Gossington
Hall, antiga residência de Dolly Bantry, amiga de Miss Marple, a mesma
mansão em St. Mary Mead onde, alguns anos antes, foi encontrado o
cadáver no já citado “The Body in the Library”. Desde já eu asseguro: a
trama de “The Mirror Crack’d from Side to Side”, parcialmente inspirada
na trágica história da atriz americana Gene Tierney (1920-1991), é
simplesmente fantástica. Por fim, na fictícia St. Mary Mead também se
passa “Sleeping Murder” (“Um crime adormecido”, 1976), o último romance
publicado por Christie com Miss Marple “no comando” das investigações. E
aqui, para se ter uma ideia, o Hotel Imperial da trama não é outro
senão o famoso Hotel Imperial de Torquay, no qual, um dia, se Deus
quiser, fã da Rainha da Crime, eu de fato me hospedarei.
Mas não
foi só Miss Marple que andou xeretando por Devon e pela Riviera
inglesa. Também ali ambientados, mas com Hercule Poirot no comando das
investigações, os autores de “Agatha Christie: Shocking Real Murders
behind her Classic Mysteries” citam, entre outros, o excelente “The ABC
Murders” (“Os Crimes ABC”, 1936). Aqui, por exemplo, Poirot e Hastings
viajam, de trem, da gigante estação londrina de Paddington para a
“Churston Railway Station”, no sul de Devon, que fica não muito longe de
onde morou a Rainha do Crime. Dali dão ensejo às suas investigações.
Por aquelas bandas ainda se passa outro excelente romance de Christie,
também protagonizado por Poirot, que até já mencionei aqui, “Five Little
Pigs” (Os cinco porquinhos”, 1942). É seguro dizer que o local em que é
assassinado o pintor e hedonista Amyas Crale não é outro senão a famosa
Greenway House, a casa adquirida por Christie em 1938, perto de
Dartmouth e às margens do rio Dart, onde ela viveu idilicamente até o
explodir da Segunda Guerra Mundial. Greenway House, aliás, aparece
representada em pelo menos dois outros títulos de Christie: “Dead Man’s
Folly” (“A extravagância do morto”, 1956) e “Ordeal by Innocence”
(“Punição para a inocência”, 1958).
Por fim, é preciso lembrar
que, apesar da “campanha” dos autores de “Agatha Christie: Shocking
Real Murders behind her Classic Mysteries” em prol de Devon e da Riviera
Inglesa, os mistérios de Agatha Christie não se resumiram a essas
paragens. A Rainha do Crime passou por outras partes da Inglaterra.
Esteve frequentemente em Londres. Na verdade, como veremos na semana que
vem, ela foi até muito – e ponha muito nisso – mais longe.
Marcelo Alves Dias de SouzaProcurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP
10/10/2018
Entre o mar e o rio, cercado de água por quase todos os lados.
Uma praia, um farol This is the divider
Por Gustavo Sobral texto e Ilustração
Galinhos. Você vai precisar de protetor solar e agua mineral para escovar os dentes, é que lá a água é salobra. E disposição para somente relaxar. Vai perceber que na vida uma muda de roupa e um par de havaianas é apenas o necessário. Esqueça o barulho do trânsito, engarrafamento e coisas mais.
As ruas são de areia, o meio de transporte é andar a pé, o cavalo e a charrete, e a comida é peixe fresco. Óculos de sol e um bom livro para ler, uma cervejinha para abrir o apetite, frutos do mar para acompanhar. Rede no terraço e um sono tranquilo.
A estrada é um dos caminhos
Mas também é possível se chegar por terra, margeando a costa, via beira mar. É um outro espetáculo possível, quem já foi não esquece. Estão lá as salinas, as dunas móveis, jumentos pastando no horizonte, faróis iluminando a costa, barcos de pesca ondulando com o mar.
O sol é de rachar, seja o tempo que for e o esplendor só aparece no fim o dia: todas as cores entre o amarelo e o alaranjado. Pôr do sol em Galinhos tem que ser ao pé do farol, uma construção de 1931.
Também o povoado é coisa de ontem. Pescadores, já era o século XX, encontraram ali a abundância de peixe necessário ao sustento e fizeram a vila de casas de taipa e ruas de areia. Galinhos chamaram, porque ali havia abundância do peixe Galo. Entre o mar e o rio, fica numa península cercado de agua por quase todos os lados.
Quem segue pela estrada
Vai desbravando o RN. Partindo de Natal, é Ceará-Mirim, Poço Branco, João Câmara, Jandaíra, pode ir rodando. Se desviar no caminho, pode passar por Touros, ou entrar em Parazinho, e de lá para São Miguel ou Pedra Grande e ir cair em Caiçara do Norte. Centro de pesca, produção de sal e instalação das eólicas.
A terra no caminho é vermelha, o sol a pino cega a vista, um deserto de vegetação de pequeno porte e eólicas que crescem por todos os lados. A vegetação e o clima do sertão abraçam o manguezal, confundindo biosferas e construindo um cenário singular. A parada do carro é píer e dali embarcar pelo rio cercado pela aventura do mangue, singrando até descer em Galinhos.
A água do banho é salobra, o banho do mar, pela forte concentração do sal faz flutuar, o peixe é artigo abundante. O dia em Galinhos é calmo e lento. O resto é mar.
Para ler esse e outros escritos acesse www.gustavosobral.com.br
O resto é mar
Por Gustavo Sobral texto e Ilustração
Galinhos. Você vai precisar de protetor solar e agua mineral para escovar os dentes, é que lá a água é salobra. E disposição para somente relaxar. Vai perceber que na vida uma muda de roupa e um par de havaianas é apenas o necessário. Esqueça o barulho do trânsito, engarrafamento e coisas mais.
As ruas são de areia, o meio de transporte é andar a pé, o cavalo e a charrete, e a comida é peixe fresco. Óculos de sol e um bom livro para ler, uma cervejinha para abrir o apetite, frutos do mar para acompanhar. Rede no terraço e um sono tranquilo.
A estrada é um dos caminhos
Mas também é possível se chegar por terra, margeando a costa, via beira mar. É um outro espetáculo possível, quem já foi não esquece. Estão lá as salinas, as dunas móveis, jumentos pastando no horizonte, faróis iluminando a costa, barcos de pesca ondulando com o mar.
O sol é de rachar, seja o tempo que for e o esplendor só aparece no fim o dia: todas as cores entre o amarelo e o alaranjado. Pôr do sol em Galinhos tem que ser ao pé do farol, uma construção de 1931.
Também o povoado é coisa de ontem. Pescadores, já era o século XX, encontraram ali a abundância de peixe necessário ao sustento e fizeram a vila de casas de taipa e ruas de areia. Galinhos chamaram, porque ali havia abundância do peixe Galo. Entre o mar e o rio, fica numa península cercado de agua por quase todos os lados.
Quem segue pela estrada
Vai desbravando o RN. Partindo de Natal, é Ceará-Mirim, Poço Branco, João Câmara, Jandaíra, pode ir rodando. Se desviar no caminho, pode passar por Touros, ou entrar em Parazinho, e de lá para São Miguel ou Pedra Grande e ir cair em Caiçara do Norte. Centro de pesca, produção de sal e instalação das eólicas.
A terra no caminho é vermelha, o sol a pino cega a vista, um deserto de vegetação de pequeno porte e eólicas que crescem por todos os lados. A vegetação e o clima do sertão abraçam o manguezal, confundindo biosferas e construindo um cenário singular. A parada do carro é píer e dali embarcar pelo rio cercado pela aventura do mangue, singrando até descer em Galinhos.
A água do banho é salobra, o banho do mar, pela forte concentração do sal faz flutuar, o peixe é artigo abundante. O dia em Galinhos é calmo e lento. O resto é mar.
Para ler esse e outros escritos acesse www.gustavosobral.com.br
LAMARTINE BABO
LAMARTINE BABO, O COMPOSITOR E A SERRA
– Berilo de Castro -
LAMARTINE BABO, O COMPOSITOR E A SERRA –
Lamartine de Azevedo Babo, o Lalá, nasceu no
Rio de Janeiro, em 8 de março de 1904, na rua Teófilo Otoni, Centro.
Filho de Leopoldo Azevedo Babo
e Bernarda Preciosa Gonçalves, que juntos
tiveram onze filhos, dos quais somente três chegaram à idade adulta:
Lamartine, Leopoldo e Indiana.
Família com DNA musical, sua mãe e sua irmã
tocavam muito bem piano; sua casa era frequentada por músicos de
expressão maior, como Catulo da Paixão Cearense (que é maranhense) e
Ernesto Nazateth. Aos 13 anos compôs sua primeira valsa,
“Torturas do Amor”, e aos 16 escreveu a opereta “Cibele”. Estudou
inicialmente em escola pública, depois no Colégio São Bento e no
Colégio Pedro II, onde se formou em Letras.
Em 1916, seu Leopoldo faleceu, e Lamartine
foi morar com a sua irmã Indiana; passou a trabalhar como office-boy da
Light; um ano depois trocou de emprego, indo trabalhar numa Companhia
de Seguros, onde demorou pouco; com mais tempo
disponível, passou a se dedicar mais ao teatro de revistas e ao
jornalismo.
Em 1929, conheceu e fez apresentações com o
Bando de Tangarás, conjunto musical tendo como fundadores: Carlos
Alberto Ferreira Braga (Braguinha/João de Barro), Alvinho, Henrique
Brito (potiguar, falecido precocemente aos 27 anos,
no Rio de Janeiro/RJ), Henrique Fóreis Domingues (o Almirante).
Participou de vários programas de rádio, nos
quais fez muito sucesso, entre eles o Trem da Alegria, ao lado do
radialista Heber de Bôscoli. Foi nesse programa que recebeu o desafio
para compor um hino popular para cada clube de futebol
do Rio de Janeiro; desafio aceito e rigorosamente cumprido; com uma
curiosidade: passou seis dias trancado num apartamento e só saiu quando
os hinos estavam prontos (Flamengo, Vasco, Fluminense, Botafogo, América
– seu time de coração, sua grande paixão –
e Bangu), depois concluiu com o do Olaria, Madureira, São Cristóvão,
Bonsucesso e Canto do Rio.
Em 1951, com 47 anos, Lamartine conheceu
Maria José, com quem casou numa cerimônia fechada, e com a qual
permaneceu até o fim de sua vida.
Um fato histórico e hilário merece destaque
na vida desse expressivo compositor, referente à sua mais bela canção,
“Serra da Boa Esperança”(1937). Existem algumas versões do ocorrido,
porém passo a relatar aquela que mais se aproxima
da verdade:
Em 1935, na pequena e humilde cidade
interiorana de Minas Gerais, conhecida por Dores da Boa Esperança, vivia
um dentista/músico que tinha a mania de colecionar fotografias
autografadas de cantores e compositores famosos (os seus
verdadeiros ídolos). Lamartine fazia parte da sua galeria de famosos.
Através de cartas e mais cartas, o fã não conseguiu o seu objetivo (a
fotografia autografada). Assim sendo, criou uma artimanha para alcançar
a sua difícil missão: fraudar a correspondência,
mudando o nome e o sexo do remetente, usando sua sobrinha de apenas 10
anos, Nair Pimenta. A inusitada ideia funcionou; carta vai, carta vem,
fluindo em versos, prosas, sonetos e romance. A falsa verdade encantou
Lamartine, que, no entanto, enviou poucas
fotos, em 3×4, não satisfazendo por completo o exigente fã , que,
percebendo a dificuldade de conseguir por completo o seu objetivo,
resolveu, em nome de Nair, acabar o “romance postal”, alegando que vai
se casar e residir na cidade de São Paulo/SP.
Um ano depois (1936), o músico, não mais
usando o nome da sobrinha, mas a sua própria identidade, resolveu
convidar Lamartine para o baile de estreia da orquestra criada por ele
próprio (músico/fã).
Não houve dúvida, Lamartine se animou e
aceitou o convite, esperando encontrar a tão misteriosa e amável Nair.
Chegou um mês depois à cidade e se hospedou no Hotel da família do
músico (por sinal o mesmo endereço das correspondências
amorosas). Logo percebeu Lalá que a única Nair encontrada no local era
uma criança. A trama do músico/dentista só viria a ser descoberta após
uma inconfidência (mineira) de um dos moradores, que passou a história a
limpo.
Apesar do constrangimento e da decepção, tudo
foi esclarecido e a agradável e solidária companhia de um grupo de
vinte jovens, rapazes, moças e músicos (que depois Lalá chamaria de
“Minhas 20 saudades dorenses”), aliviaram e abrilhantaram
o encontro.
Em agosto de 1937, na despedida da cidade que
tão bem lhe acolheu, e olhando para a Serra da Boa Esperança que
emoldurava a paisagem, começou a solfejar as notas que o amigo músico/fã
ia anotando na pauta improvisada num pedaço de
papel de jornal, originando a letra de uma das mais belas canções da
música brasileira: “Serra da Boa Esperança”: “Parto levando saudades,/
Saudades deixando,/ Murchas, caídas na serra,/ Bem perto de Deus/ Oh,
minha serra,/ Eis a hora do adeus/ Vou-me embora/
Deixo a luz do olhar/ No teu luar/ Adeus!…”.
Em 16 de junho de 1963, aos 59 anos, Lamartine faleceu na cidade do Rio de Janeiro, vítima de um enfarte do miocárdio.
Berilo de Castro –
Médico e Escritor –
berilodecastro@hotmail.com.br
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