19/02/2018


 
   
Marcelo Alves

 

Ao que tudo espera...

Ao partirmos em direção à Índia, uma das coisas que mais nos empolgava era a visita à cidade de Agra, para, especialmente, conhecer o célebre Taj Mahal, belissimamente cantado na voz do nosso Jorge Ben Jor. 

Localizada no estado de Uttar Pradesh, às margens do importantíssimo rio Yamuna, Agra é – juntamente com Nova Déli e Jaipur – uma das três cidades do turístico “Triângulo Dourado” indiano. Todavia, se você for a Agra esperando encontrar uma cidade esplendorosa (ou, no mínimo, organizada), vai se decepcionar. Como fomos advertidos pelo nosso guia assim que chegamos em Déli, um tanto exageradamente, “Agra não passa de um vilarejo”. Nem tanto, até porque ela é bem grande. Mas ali a pobreza condói. O trânsito – de caminhões, carros, motos, tuc-tucs, pessoas, vacas, cães e por aí vai – é muito mais que caótico. A sujeira é gritante. E toda essa confusão, que incrivelmente funciona, faz de Agra, de fato, “outra civilização”. 

Para o turista médio, o que mais importa em Agra são os monumentos do seu passado como antiga capital do Império Mugal, que, com os seus soberanos muçulmanos, dominou grande parte da Índia por cerca de dois séculos. O primeiro desses “conquistadores” muçulmanos foi Babur, que era, segundo registra Alain Deniélou em “A Brief History of India” (Inner Traditions, 2003), descendente tanto de Tamerlão como de Genghis Khan. A ele se seguiram outros famosos soberanos, como Humayun, o grande Akbar, Jahangir, Shah Jahan (o responsável pela caríssima construção do Taj Mahal), Aurangzeb (que depôs o pai pelas “loucuras” do tipo Taj Mahal) e por aí vai. Se você for à Índia, vai ouvir muito esses nomes. 

Agra teve seu apogeu sobretudo nos séculos XVI e XVII, sob o domínio dos imperadores Akbar, Jahangir e Shah Jahan, que trouxeram à corte artistas de toda a Índia e da Ásia Central, para construção de seus belíssimos fortes/palácios e mausoléus, alguns deles declarados Patrimônio da Humanidade pela Unesco. 

Um deles é o Forte de Agra (“Agra Fort”, como ele é chamado por lá), que se espalha nas beiradas do rio Yamuna. Em arenito vermelho, ele foi edificado por Akbar, que é considerado o maior dos imperadores da dinastia Mugal, entre os anos de 1565 e 1573. Shah Jahan e, mais recentemente, os britânicos fizeram consideráveis acréscimos ao complexo de áreas públicas e privadas. Com seus portões, pátios, salões, galerias e fossos, esse forte/palácio me encantou por dar a noção de uma corte – seja do império Mugal, seja do Taj britânico – em pleno funcionamento. 

Também adorei a visita ao “místico” Fatehpur Sikri, mistura de forte, palácio, cidade e capital, situado não muito longe de Agra, cuja história já tinha visto inúmeras vezes num desses ótimos canais de TV por assinatura. Como explica o “Guia Visual Folha de São Paulo – Índia” (PubliFolha, 2015): “Fundada pelo imperador Akbar entre 1571 e 1585, em homenagem a Salim Chishti, famoso santo sufi da ordem chishti (p. 380), Fatehpur Sikri foi capital mogul por catorze anos. Ótimo exemplo da cidade murada mogul, possui áreas públicas e privadas bem definidas e portas imponentes. Sua arquitetura, uma mistura de estilos hindu e islâmico, reflete a visão secular de Akbar, assim como seu estilo de governo. Depois que a cidade foi abandonada (dizem que por falta de água), muitos de seus tesouros foram pilhados. Ela deve o atual estado de manutenção aos esforços iniciais do vice-rei, lorde Curzon, um conservacionista lendário”. Minha sensação aqui foi outra. A satisfação de ver “in loco” aquilo que assistia maravilhado pela TV, misturada com a aura de abandono e de mistério que envolve a história daquele lugar. Foi muito bom mesmo. 

E o tal Taj Mahal? 

Bom, o Taj Mahal é um dos monumentos mais badalados do mundo. Construído pelo imperador Shah Jahan, como prova de amor a sua consorte favorita, Mumtaz Mahal (falecida em 1631), ele é cantado em verso e prosa (vide a música do nosso Jorge). Finalizado em 1643, custou muitos milhões de rúpias, muito ouro e doze anos de suor de dezenas de milhares de artesãos e operários de então. E, mais à frente, também o trono do próprio Shah Jahan, nas mãos do seu filho Aurangzeb. De proporções perfeitas, esse túmulo-jardim é realmente muito belo. Belíssimo. O mármore trabalhado, o luxo das pedrarias, a caligrafia rebuscada, os tapetes, a câmara mortuária, o espelho d'água na parte de fora e tudo o mais mostram o refinamento do apogeu da arte mugal. Em termos de harmonia e elegância, difícil achar outro igual. Tiramos muitos retratos com um fotógrafo local que, pelas ordens que me dava, devia ser descendente de um dos imperadores acima citados. 

Mas sabem de uma coisa? Depois da visita, conversando, nós dois concluímos que restou uma certa sensação de decepção. Não foi tudo aquilo que esperávamos. Cogitamos que a razão disso talvez esteja no fato de o Taj Mahal ser essencialmente um túmulo e não ter a vivacidade/dramaticidade daqueles maravilhosos fortes/palácios que já havíamos visitado. 

Mas eu tenho uma explicação melhor. Simplesmente esperamos antecipadamente demais do mausoléu de amor (talvez um êxtase?). Sem ignorar a sua história, muito pelo contrário, ficamos ansiosos demais pelo calmo Taj Mahal. E assim infringimos gravemente uma das leis de Ricardo Reis/Fernando Pessoa. Afinal: “Aos que a riqueza toca, o ouro irrita a pele/Aos que a fama bafeja, embacia-se a vida/Aos que a felicidade é sol, virá a noite/Mas ao que nada espera, tudo que vem é grato”. 

Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP

UM SONHO QUE PODERÁ SE CONCRETIZAR






FACULDADE DE DIREITO DA RIBEIRA
Carlos Roberto de Miranda Gomes, ex-aluno
            Quando era precária a esperança, mercê dos problemas dos porões da burocracia, eis que surge uma luz no fim do túnel para iluminar o caminho da restauração da velha Faculdade de Direito da Ribeira, obra originária do Grupo Escolar Augusto Severo, prédio concebido pelo Arquiteto Herculano Ramos em 1907.
            Na sexta-feira passada, foi realizada proveitosa e eficiente audiência na Reitoria da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, presidida pelo Professor José Daniel Diniz Melo, em exercício, oportunidade em que, com sua equipe técnica, apresentou para os presentes e os representantes da OAB/RN Paulo Coutinho, Marcos Guerra e Carlos Gomes, as dificuldades encontradas para a realização das obras/serviços e o projeto de restauração pretendido pela UFRN, com a aprovação do IPHAN.
            Naqueles instantes fomos envolvidos por uma atmosfera de saudade da Casa que abrigou os estudantes por muitos anos e os instantes de aflição decorrentes do movimento de 1964, onde foram caçados colegas e professores, barrados os agentes da repressão pela autoridade do então Diretor Otto de Brito Guerra.
            Retornaram às nossas mentes pessoas e fatos que marcaram a vida daquele estabelecimento de ensino superior, os passos iniciais da assistência jurídica aos necessitados, das palestras e outros eventos no aconchegante auditório, nas assembleias, exposições, comentários e momentos de lazer no pátio que ficava defronte à biblioteca, criada e mantida com todo amor pelo Professor Otto.
            Foi possível avaliar a viabilidade da restauração, não apenas como recomposição de um patrimônio histórico, mas com objetivo elogiável de dar continuidade ao atendimento aos necessitados, com uma central de assistência jurídica e social, como utilização do auditório para funcionamento de sessões de arte e de cinema, além da apresentação de memoriais contando a história do Grupo Escolar e da Faculdade e dos momentos marcantes da própria UFRN, afixando para a posteridade as placas de formaturas e o painel dos perseguidos durante o estado de exceção, como ficou decidido no relatório da Comissão da Verdade da UFRN.
            A restauração marcará a recuperação do bairro histórico da Ribeira, fazendo ressurgir a sua funcionalidade e restaurando um dos períodos mais importantes da vida política, cultural e social da Cidade de Natal.
            Esta iniciativa da nossa Universidade, com a colaboração da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Rio Grande do Norte merece o aplauso da população e o anseio maior de todos aqueles que viveram os tempos de ouro da cidade presépio, ponto fundamental no conflito da 2ª Grande Guerra e berço cultural do modernismo literário, da efervescência da economia local e das imorredouras sessões da Casa de Espetáculos concebida pelo Governo Alberto Maranhão, erguido no largo histórico do bairro dos Canguleiros, por muitos anos guarnecido pela vigilância de Luís da Câmara Cascudo.

17/02/2018


Academia Norte Riograndense de Letras <academianrl@gmail.com>


EDITAL Nº 02, DE 08/02/2018.

Assembleia Geral Extraordinária

O Presidente da Academia Norte-rio-grandense de Letras, de conformidade com seu Estatuto Social e  Regimento Interno, convoca os Srs. Acadêmicos, para a Assembleia Geral Extraordinária,
no dia 22 de fevereiro (quinta-feira) do corrente ano às 16 horas,  para deliberarem sobre a seguinte pauta:


                     
1-   Apreciação dos itens do Estatuto objeto de Diligência  do Cartório 2º Ofício de Notas;
2-   Apreciação e aprovação do texto final do Estatuto
3-   Designação de  Comissão Revisora para apreciação do Regimento Interno;
4-   Definição do Calendário de Eventos de 2018;
5-   Outros Assuntos correlatos ou de interesse da Instituição.





Diogenes da Cunha Lima
Presidente

13/02/2018

UM POUCO DA NOSSA HISTÓRIA RECENTE


NOS PORÕES DA MEMÓRIA

Valério Mesquita*

01) Corria a era da graça de 1960 e lá se vão cinquenta e oito anos. Década das profundas transformações políticas e sociais no Estado e no país. Mas quero mesmo me referir à minha aldeia Macaíba que era administrada por Alfredo Mesquita Filho pela terceira vez. Estava filiado ao velho PSD e ligado politicamente ao major Theodorico Bezerra. Vencera a eleição de prefeito em 1958, renunciando ao mandato de deputado estadual numa luta extremada com o genro e sobrinho Leonel Mesquita, da UDN, prestigiado pelo governador Dinarte Mariz. Dois candidatos ao governo do Rio Grande do Norte pontificavam naquele ano: Djalma Marinho e Aluízio Alves, ambos udenistas. Alfredo Mesquita estava propenso a ficar com o segundo, não fosse a reconciliação do casal, obrigando-o, ante a divisão do seu PSD, a ficar com o candidato situacionista a fim de pacificar a família e não se repetir o sofrimento pessoal da campanha anterior. Politicamente entrou na contramão da história, mas manteve intacta a união da família pelo resto da vida, com o sacrifício da derrota eleitoral por noventa votos.
02) Em 1965, feriu-se nova batalha. Dessa vez, o próprio Dinarte Mariz pela Oposição, enfrentaria o monsenhor Walfredo Gurgel para governador. O velho contra o padre. Dessa disputa, lembro-me de uma missão do economista Roosevelt Garcia junto a Alfredo Mesquita, chancelada pelo então governador Aluízio Alves. O meu pai, ao deixar a prefeitura de Macaíba em 1963, se desfizera de sua propriedade rural “Uberaba”, no município de Macaíba, acossado pelas dívidas políticas. Eu cursava a Faculdade de Direito da UFRN aos 23 anos de idade e nunca assumira um emprego. Nem na famosa “vaga existente”. A visita significava que o “Trem Bacurau” apitava à minha porta. O maquinista era precavido e competente e sabia lidar com o temperamento do seu tio Alfredo Mesquita. Inicialmente, Roosevelt me antecipou o assunto: um cargo de fiscal de rendas em troca do alheamento de Alfredo Mesquita no pleito de outubro. De minha parte, solteiro, universitário e desempregado, a proposta era de um arcanjo e não de um parente. A conversa entre os dois, pontilhada de cautela e prudência, pude observar a curta distância, o que me permitiu ensaiar discreta torcida. Sabia que o sobrinho predileto do meu pai, era o melhor interlocutor naquele instante. Mas, a resposta do velho Mesquita foi não. Às vezes me pergunto: caso a resposta tivesse sido afirmativa, teria mudado o curso da minha vida? Só o astrólogo do universo sabe. A eleição foi perdida por quatrocentos votos, mas Alfredo Mesquita manteve-se firme na Oposição até falecer, no dia 12 de abril de 1969. A palavra dada e a fidelidade mantida eram sua marca registrada.
03) O tempo passou e quase tudo mudou. Em 1974, já prefeito de Macaíba, o meu primeiro encontro político com o senador Dinarte Mariz ocorreu na candidatura do seu filho Wanderley para deputado federal. Eu já havia me definido por Grimaldi Ribeiro, em quem votava desde 1970. O velho senador solicitou-me que dividisse os votos para deputado federal. Não concordei, alegando o meu compromisso e a dificuldade da reeleição do seu correligionário. Conversa difícil que deixou profundo mal-estar. Dinarte conseguiu outros apoios. Mas houve no curso da campanha um choque de passeatas, que resultou num discurso patético do senador contra o prefeito. “Esse rapaz”, falou, “está desenvolvendo em Macaíba uma tática comunista. Amanhã mesmo, vou comunicar ao presidente Geisel o que está se passando aqui”. O fato é que essa ameaça nunca se concretizou. Mas, me valeu o veto radical de Dinarte ao meu nome para prefeito indireto de Natal. O governador nomeado, Tarcísio Maia, que me preferia, por sugestão de Djalma Marinho, sucumbiu à imposição do velho senador que apontou Vauban Bezerra de Faria. Mais uma vez, ficou provado que a fidelidade também tem o seu preço.

(*) Escritor

                                      

12/02/2018

Madre Alves



   
Marcelo Alves



Muito obrigado. E até um dia. 



Nunca fui tão feliz quanto naquele tempo, quando todos que eu conhecia eram vivos. Criança e adolescente, o meu lugar era o Colégio Imaculada Conceição, da minha tia Carmen. Era deixado ali todos os dias, muito cedinho. Assistia e atrapalhava as aulas. Jogava bola na célebre quadra coberta e onde mais podia. Fazia judô com meus primos. Comia na velha cantina ou na mesa das irmãs. Corria até a casa dos meus avós na mesma avenida Deodoro. E até me aventurava, sem o conhecimento da tia diretora ou de meus pais, por uma Cidade Alta cheia de rostos e gostos duvidosos. Voltava para casa só tarde da noite, fatigado, qual o elefante do poeta, mas feliz. Muito feliz. Naquele tempo em que todos que eu conhecia eram vivos. 

Nunca ganhei tanto como naquele tempo. Aprendi a contar e a escrever. Descobri um pouco da geografia dos povos e mais ainda da nossa própria história. Entendi que a vida se faz com ciência, inspiração e trabalho. Passei a não duvidar dos bichos, com exceção dos humanos. No Colégio Imaculada Conceição da minha tia Carmen, com as santas irmãs doroteias e os nossos muitos professores, seres cheios de luz, fiz amigos para toda a vida. Num tempo em que todos que eu conhecia me ensinavam a ter fé. 

Tive de sair dali para a Universidade. Todos nós – meus primos e meus colegas de classe, de bola e de arengas – tivemos de fazer isso um dia. Fui trabalhar fora. Fui estudar mais longe ainda. Viajei muito. Acho que até demais. Mas voltei ao Colégio Imaculada Conceição muitíssimas vezes. Para dar chutes naquela velha quadra coberta. Ou para levar e trazer tia Carmen de sua visita quase diária à casa da sua irmã (e também minha tia) Neusa. E nessa época quase todos que eu conhecia ainda eram vivos. 

Para a irmã Carmen, tenho certeza, encerrou-se uma etapa da vida com o fechamento do Colégio Imaculada Conceição. Se foi a Cristo e a Santa Paula Frassinetti que ela dedicou sua devoção, foi ao CIC e à comunidade das Irmãs Doroteias que ela dedicou toda sua vocação. O seu amor, que era também enorme, ela dividiu com todos nós, familiares e amigos. 

Agora, no ciclo e círculo de Deus e da vida, veio o momento de ela partir para a sua última viagem. Pela sua idade avançada, 91 anos completos, a indesejada veio a galope. A tia que nos ensinou os primeiros passos, de repente parou de andar. A madre que, mesmo nos momentos mais injustos da vida, praticou o silêncio apenas por opção, de repente desaprendeu a falar. Ficou cada vez mais debilitada. Foram quatro ou cinco meses, uma dia após o outro, lutando contra a solução inexorável. Vi o empenho das minhas primas para que nada faltasse à querida tia. Na nova casa da rua Açu, vi a luta diária das irmãs doroteias (sua outra família, por opção) e das suas alegres cuidadoras. Assisti aos cuidados da direção e da equipe médica nos seus dias de internação na Casa de Saúde São Lucas. E nem preciso falar da preocupação constante, mesmo sem saber de muita coisa, mas intuitiva, da minha mãe. Eles e elas se doaram e fizeram de tudo. Mas não deu. Tia Carmen foi para junto dos pais, dos irmãos de sangue já falecidos, das suas irmãs de fé já desencarnadas, de Santa Paula e de Deus. 

De minha parte, só tenho a agradecer a tia Carmen e a Deus por ter estado muito próximo dela nos seus últimos dias. É verdade que aquele olhar que me seguia, pedindo não sei dizer o que, me cortava o coração. Também não foi fácil esconder da minha mãe a gravidade da coisa. E ainda me pego chorando ao lembrar – e sentir, num misto de aflição e saudade – os seus últimos momentos no hospital. Mas tia Carmen, mesmo nesses últimos meses de despedida, ainda me deu e ensinou muito: reuniu de novo nossa família, me deu muitos sorrisos enquanto alisava o nosso cão (que ela tanto amava), me deu esperança de sairmos daquele martírio hospitalar, me fez querer ser bom e me permitiu retribuir, ainda que minimamente, tudo aquilo que ela – numa mistura de mestra, tia, madrinha e segunda mãe – fez em abundância por mim. 

Ontem voltei à casa das irmãs doroteias, talvez inconscientemente querendo que tudo isso não passasse de um sonho, e eu ainda pudesse pegar tia Carmen para dar mais uma volta de carro pelas estradas e esquinas da nossa memória. Espero um dia poder encontrá-la novamente. Quando todos aqueles que eu conheci estarão juntos de novo. 

Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP

11/02/2018

   
Marcelo Alves

 


Os livros da Índia 
Quando surgiu a oportunidade de viajarmos à Índia, num pacote em que praticamente pagaríamos um e iríamos dois, eu fiquei ressabiado. Embora muito barato e eu jamais estivesse estado lá, a Índia é um país para nós muito distante e, para dizer o mínimo, exótico. Acabamos indo, tentados, em grande parte, pela oportunidade de viajarmos bem e barato, eu confesso. 

Simplesmente adoramos. “É outra civilização”, eu diria imitando o nosso Manuel Bandeira (1886-1968), embora a Índia não seja bem a “Pasárgada” do poeta. A Índia que conhecemos, basicamente o chamado “Triângulo Dourado” (que tem como cidades de referência Nova Déli, Agra e Jaipur), nos surpreendeu, quase sempre positivamente, em muitíssimos aspectos. Ela é aquilo que lhe contaram, ou você viu em filmes, e muito mais, pode ter certeza. 

Uma das coisas que me surpreendeu positivamente na Índia, talvez a mais prosaica delas, foi a “facilidade” que tive para comprar livros ali, coisa que não esperava de maneira alguma. Não que eu compreenda híndi, urdu, sânscrito ou qualquer outra das mais de vinte línguas oficiais daquele país. Mas o fato é que lá se fala também, oficial e corriqueiramente, o bom e jovem (sobretudo se comparado com o ancestral sânscrito) inglês, um legado deixado pelo “Raj” (reinado) britânico, de 1858 a 1947, quando do domínio colonial do grande Império (britânico) sobre o continente indiano A consequência disso é que lá também se publica muito em inglês. E o mais interessante: livros que são dificilmente encontrados no Reino Unido ou nos Estados Unidos da América. 

Descobri isso logo que chegamos a Nova Déli, uma cidade, pelo seu tamanho e pelo seu trânsito, quase inviável para o turista apressado. O nosso hotel, certamente para que o turista não precise se aventurar pela loucura da cidade, possuía, no que parecia ser a mistura do seu térreo e subsolo, um pequeno shopping e um supermercado. Esse supermercado, surpreendentemente, numa seção até grande, vendia livros. Comprei coisas interessantíssimas. Entre elas um “Agatha Christie: Shocking Real Muders behind her Classic Mysteries”, publicado pela HarperCollins Publishers da Índia, agora em 2017. Parte da uma série (“Real Crime Casebooks”), realizado com base nos arquivos do jornal Daily Mirror, ele, entre outras coisas, revela a inspiração da Rainha do Crime em fatos reais para a elaboração dos seus adoráveis mistérios. Mesmo nos meus anos em Londres, não me lembro de ter topado com algo parecido. Outro livro que comprei foi “A Brief History of India” (publicado pela Inner Traditions em 2003, a partir do original em francês “L'Historie de l'Inde”), do renomado historiador, musicólogo e indiologista francês Alain Deniélou (1907-1994). Se eu desejava conhecer um pouco da história da Índia pela perspectiva de um ocidental, não haveria coisa melhor. E tudo foi muito barato. Coisa de 500 rúpias indianas cada livro, e ainda tinha um desconto no caixa de 25%. No final, paguei algo entre 15 e 20 reais por cada belezinha. 

Algo parecido também se deu em Agra, para onde fomos em seguida a Déli. O hotel em que lá ficamos também possuía um pequeno shopping, onde o turista menos corajoso poderia se distrair – e comprar, claro –, sem ter de enfrentar o trânsito, a visível sujeira e a confusão desta cidade que, embora abrigue o Taj Mahal e o Forte de Agra, às vezes ainda lembra um vilarejo dos tempos do Império Mugal. Havia uma pequena livraria escondida entre as lojas de sedas e assemelhados. E lá comprei “The Discovery of India” (Peguin Books, 2004), livro escrito por ninguém menos que Jawaharlal Nehru (1889-1964), o Primeiro-Ministro da independência da Índia e por mais dezessete anos, até o seu falecimento, no cargo, em 1964. Um tijolão de mais de 600 folhas, por uns 25 reais, que me foi e me tem sido útil para entender, nem que seja minimamente, aquele surpreendente país. Concebido enquanto Nehru estava preso no Ahmednagar Fort, publicado pela primeira vez em 1946, é um clássico, formando, juntamente com “Autobiography” e “Glimpes of World History”, a tríade dos mais famosos livros do “pandit” (professor) indiano. 

Mas foi em Jaipur – uma cidade indiana “viável” para o turista, de tamanho humanamente explorável e, sobretudo, muito bela e agradável – que fiz minha festa. Antes de mais nada, adoramos Jaipur. Os seus palácios e fortes. Os seus monumentos. Os seus tuc-tucs. O seu gigante mercado. Sobre Jaipur, especificamente, nós conversaremos aqui um dia, eu prometo. 

E Jaipur, descobri quase sem querer, tem um mercado de livros. Na verdade, um lado quase inteiro de uma rua do seu grande mercado/bazar, a Chaura Rasta Road, dedicado ao comércio de livros. Um tanto caótico, como não poderia deixar de ser, o que me deixou no começo, confesso, quase doidinho. Mas achei o meu “fornecedor” em Jaipur num tal “Shiv Book Depot” (Chaura Rasta, nº 167), um dos muitos comércios de livros (misto de livraria com sebo) encarrilhados no mercado da cidade, mas afortunadamente especializado também em direito. O meu “fornecedor” está ali desde 1953, imaginem. 

Eu me dei muitíssimo bem. Adquiri uma “Introduction to the Constitution of India”, do grande jurista indiano Durga Das Basu. Um clássico, cuja edição que comprei, novinha em folha, da LexisNexis, de 2015, é a sua vigésima segunda. Devo ter pago umas 300 e poucas rúpias nessa joiazinha. Coisa de 15 reais. Ou seja, baratíssimo. Também pus na sacola alguns livros de filosofia geral e filosofia do direito, de editoras e autores indianos, entre os quais destaco: “Jurisprudence (Legal Theory)”, do professor Nomita Aggarwal, publicado por uma tal Central Law Publications em 2016; e “Studies in Jurisprudence and Legal Theory”, do professor N. V. Paranjape, este publicado por uma tal Central Law Agency, também em 2016. São livros novinhos, registre-se. Cada um, coisa de 300 a 400 rúpias ou 15 reais. De graça para tijolões de quinhentas e tantas páginas. Tão diferente dos caríssimos livros de direito aqui no Brasil. É quase revoltante. 

Arrependi-me apenas de não ter comprado mais. Ando consultando pela Internet os catálogos das editoras jurídicas indianas. Mas talvez isso sirva de pretexto para voltar àquela terra, sei lá. 

Bom, uma coisa é quase certa, esses livros são inéditos aqui por Natal. E se vocês me virem citando filosofias diferentes por aqui, não se preocupem, eu não perdi o juízo. Tá tudo nos livros.

Marcelo Alves Dias de Souza 
Procurador Regional da República 
Doutor em Direito (PhD in Law) pelo King’s College London – KCL 
Mestre em Direito pela PUC/SP

09/02/2018

INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO RN IHGRN <ihgrn.comunicacao2017@gmail.com>
Caros sócios,

O palestrante da quinta-feira (15/02), será o escritor HONÓRIO DE MEDEIROS e não como consta no texto do e-mail. 
17h00
Coronelismo e Cangaço no Rio Grande do Norte.
Ministrada pelo escritor Honório Medeiros
No Calendário Cultural 2018.1, o nome do referido palestrante está grafado corretamente.
Pedimos desculpas pelo erro de digitação.

ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO




CALENDÁRIO CULTURAL – 2018.1

EVENTOS
25/01
17h00
Abertura dos trabalhos de 2018
Lançamento do sítio do IHGRN

22/02
17h00
Lançamento “Catálogo do IHGRN"

28/03
19h00
Sessão Solene de aniversário
Lançamento da Revista do IHGRN


PALESTRAS – QUINTA CULTURAL
22/02
17h00
Coronelismo e Cangaço no Rio Grande do Norte.
Ministrada pelo escritor Honório Medeiros
08/03
17h00
O Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte
Ministrada pelo professor e pesquisador Cláudio Galvão
05/04
17h00
Câmara Cascudo e o Símbolo Jurídico do Pelourinho
Ministrada pelo jornalista Vicente Serejo
19/04
17h00
O Atol das Rocas
Ministrada pela professora Zélia Sena
17/05
17h00
História do Rio Grande do Norte
Ministrada pelo historiador Luiz Eduardo B Suassuna (Coquinho)
14/06
17h00
O Arquipélago de São Pedro e São Paulo
Ministrada pelo professor José Lins

EXPOSIÇÕES
25/01
17h00
Nossas Velhas Figuras – ENCERRADA
Acervo do IHGRN
15/02
17h00
Nordeste de São Sebastião
Telas do acervo particular do médico, escritor e artista plástico Iaperi Araújo
15/03
17h00
Minérios do Rio Grande do Norte
Mostra da coleção particular de Pedro Simões Neto Segundo, com explicação e distribuição de catálogo sobre o assunto.