A INTOLERÂNCIA EM NOSSOS DIAS
PADRE JOÃO MEDEIROS FILHO
É comum ouvir: “Onde iremos parar com tanta intolerância”? Esta se
manifesta principalmente na agressividade e no radicalismo. Não é o
conflito de gerações, que ocorre em família e na sociedade. É
desrespeito ao pensar, à expressão e ao ser do outro. Atualmente,
torna-se cada vez mais difícil conviver. As pessoas estão armadas
interiormente e explodem à menor contestação. É preciso controlar esse
mal que está levando ao ódio. Nasce da incapacidade de aceitar o
próximo, possuidor também dos mesmos direitos. Seu crescimento nos
diversos segmentos da sociedade causa perplexidade e desafia os limites
do bom senso e da civilidade. Tem levado muitos a cometer
arbitrariedades e injustiças. A partir daí, aumentam os atos de
violência e barbárie em casa, nas ruas e em vários ambientes. Ela tem
causado atritos, inimizades, divisões nos lares, nas escolas, no
trabalho, nas religiões etc. Nas passeatas há, inevitavelmente,
expressões da intolerância, que grassa na sociedade. Decretou-se o
reinado do monólogo. As redes sociais estão contagiadas por palavras e
atitudes intransigentes. Em lugar de aproximar, acabam afastando. Hoje,
evitam-se certos contatos, pois não é fácil manter uma convivência
civilizada. Os investimentos morais e materiais em educação e na
formação da cidadania – modeladores da consciência da vida em sociedade –
não têm sido suficientes para mitigar a agressividade gerada pelo
aumento de radicalismos. Assistimos impotentes ao avanço dos filhos da
intolerância: arrogância, tirania, individualismo exacerbado e
consciência social deturpada.
É urgente que especialistas do comportamento humano analisem as
causas de sua gênese, assim como neutralizá-las. Por vezes, parece
originar-se do simples ato de fixar-se na defesa cega das próprias
convicções, rechaçando as perspectivas divergentes. É fruto do egoísmo,
que beira à sanha da ditadura. E, como consequência disso, advém o
desprezo ou a antipatia pelos demais. Conduz à negação do pensamento e
da vontade de outrem. Essa postura aprisiona o ser humano e o incapacita
para os diálogos construtivos. Isso compromete o alcance de
entendimentos para preservar o bem comum.
A rigidez na compreensão e no acolhimento do divergente leva à
insensibilidade, que contamina. É uma forma de absolutismo, que ataca
muitos. Trata-se da exaltação do eu e da anulação do nós. Atualmente,
manifesta-se de forma acentuada no debate político, cultural, pedagógico
e até religioso. Percebe-se, assim, que a mentalidade inflexível
embrutece e destrói o exercício da liberdade, a qual garante a todos a
oportunidade de participar dos diferentes processos importantes da vida
social. Mas, para isso, exige-se a capacidade de leitura solidária das
relações humanas, do inegociável respeito ao pensamento de outrem,
incluindo a aceitação dos seus valores e aqueles das instituições.
Na raiz da intolerância está a rejeição das diferenças,
comprometendo o convívio humano e social. Isso tem levado ao desrespeito
individual ou coletivo, fonte de loucuras e arbitrariedades, que
precipitam a sociedade para o crime. E desse modo, cada um se elege como
parâmetro exclusivo das definições, escolhas e opções. O resultado de
tudo é um quadro insano, em que ninguém abre mão da sua própria opinião.
Essa estreiteza de horizontes desenvolve a estagnação social, gerada
essencialmente pela ausência de diálogo. Para alcançar a paz social, o
ser humano precisa contribuir significativamente com a cultura do
encontro, que pressupõe a convivência harmoniosa entre pessoas que
pensam diferentemente. O passo inicial para que isto aconteça é a
isenção de preconceitos e julgamentos precipitados ou levianos. Eis um
caminho para combater as diversas formas de intolerância e promover o
respeito aos direitos e à dignidade humana. Os intolerantes definem como
seu lema: “Sou mais eu”. Inspiram-se em Jean Paul Sartre, quando
afirmou “L´enfer, c´est les autres” (os outros são o inferno), por isso
mesmo devem ser evitados e descartados. Portanto, negam a doutrina
cristã que prega a multiplicidade de carismas. “Há diversidades de
dons... ministérios... atividades... A cada um é dada uma palavra de
sabedoria... em vista do bem de todos” (1Cor 12, 4-7). O apóstolo Paulo
aconselha aos cristãos de Éfeso: “Sejam humildes, dóceis, pacientes,
tolerando [suportando] uns aos outros no amor” (Ef 4, 2).