16/08/2017

SABEDORIA


A INTOLERÂNCIA EM NOSSOS DIAS
PADRE JOÃO MEDEIROS FILHO 


É comum ouvir: “Onde iremos parar com tanta intolerância”? Esta se manifesta principalmente na agressividade e no radicalismo. Não é o conflito de gerações, que ocorre em família e na sociedade. É desrespeito ao pensar, à expressão e ao ser do outro. Atualmente, torna-se cada vez mais difícil conviver. As pessoas estão armadas interiormente e explodem à menor contestação. É preciso controlar esse mal que está levando ao ódio. Nasce da incapacidade de aceitar o próximo, possuidor também dos mesmos direitos. Seu crescimento nos diversos segmentos da sociedade causa perplexidade e desafia os limites do bom senso e da civilidade. Tem levado muitos a cometer arbitrariedades e injustiças. A partir daí, aumentam os atos de violência e barbárie em casa, nas ruas e em vários ambientes. Ela tem causado atritos, inimizades, divisões nos lares, nas escolas, no trabalho, nas religiões etc. Nas passeatas há, inevitavelmente, expressões da intolerância, que grassa na sociedade. Decretou-se o reinado do monólogo. As redes sociais estão contagiadas por palavras e atitudes intransigentes. Em lugar de aproximar, acabam afastando. Hoje, evitam-se certos contatos, pois não é fácil manter uma convivência civilizada. Os investimentos morais e materiais em educação e na formação da cidadania – modeladores da consciência da vida em sociedade – não têm sido suficientes para mitigar a agressividade gerada pelo aumento de radicalismos. Assistimos impotentes ao avanço dos filhos da intolerância: arrogância, tirania, individualismo exacerbado e consciência social deturpada. 
É urgente que especialistas do comportamento humano analisem as causas de sua gênese, assim como neutralizá-las. Por vezes, parece originar-se do simples ato de fixar-se na defesa cega das próprias convicções, rechaçando as perspectivas divergentes. É fruto do egoísmo, que beira à sanha da ditadura. E, como consequência disso, advém o desprezo ou a antipatia pelos demais. Conduz à negação do pensamento e da vontade de outrem. Essa postura aprisiona o ser humano e o incapacita para os diálogos construtivos. Isso compromete o alcance de entendimentos para preservar o bem comum. 
A rigidez na compreensão e no acolhimento do divergente leva à insensibilidade, que contamina. É uma forma de absolutismo, que ataca muitos. Trata-se da exaltação do eu e da anulação do nós. Atualmente, manifesta-se de forma acentuada no debate político, cultural, pedagógico e até religioso. Percebe-se, assim, que a mentalidade inflexível embrutece e destrói o exercício da liberdade, a qual garante a todos a oportunidade de participar dos diferentes processos importantes da vida social. Mas, para isso, exige-se a capacidade de leitura solidária das relações humanas, do inegociável respeito ao pensamento de outrem, incluindo a aceitação dos seus valores e aqueles das instituições. 
Na raiz da intolerância está a rejeição das diferenças, comprometendo o convívio humano e social. Isso tem levado ao desrespeito individual ou coletivo, fonte de loucuras e arbitrariedades, que precipitam a sociedade para o crime. E desse modo, cada um se elege como parâmetro exclusivo das definições, escolhas e opções. O resultado de tudo é um quadro insano, em que ninguém abre mão da sua própria opinião. Essa estreiteza de horizontes desenvolve a estagnação social, gerada essencialmente pela ausência de diálogo. Para alcançar a paz social, o ser humano precisa contribuir significativamente com a cultura do encontro, que pressupõe a convivência harmoniosa entre pessoas que pensam diferentemente. O passo inicial para que isto aconteça é a isenção de preconceitos e julgamentos precipitados ou levianos. Eis um caminho para combater as diversas formas de intolerância e promover o respeito aos direitos e à dignidade humana. Os intolerantes definem como seu lema: “Sou mais eu”. Inspiram-se em Jean Paul Sartre, quando afirmou “L´enfer, c´est les autres” (os outros são o inferno), por isso mesmo devem ser evitados e descartados. Portanto, negam a doutrina cristã que prega a multiplicidade de carismas. “Há diversidades de dons... ministérios... atividades... A cada um é dada uma palavra de sabedoria... em vista do bem de todos” (1Cor 12, 4-7). O apóstolo Paulo aconselha aos cristãos de Éfeso: “Sejam humildes, dóceis, pacientes, tolerando [suportando] uns aos outros no amor” (Ef 4, 2).

13/08/2017

SOS REVISTA DO IHGRN


PAIS


OS PASSOS JÁ NÃO SÃO TÃO FIRMES,
MAS O CORAÇÃO AINDA PULSA INCESSANTEMENTE,
PORQUE AINDA EXISTEM OS FILHOS PARA ABRAÇAR.
ALGUNS ATÉ JÁ PARTIRAM PARA OUTRA DIMENSÃO DA VIDA
MAS PERSISTEM NA MEMÓRIA DOS QUE LHE AMAM.
FELIZ DIA DOS PAIS

COISAS DE MACAÍBA!



BATERIA, POR QUE CHORAS?



Valério Mesquita*




José Paulino de Brito, magro, moreno, vulgo “Banga”, apelido que o credenciava tanto como ponta esquerda do Cruzeiro F.C. ou - no comando da bateria do regional musical - tocava as festas do Pax Club ou em qualquer lugar. Era o acrobata do tarol. Nos desfiles da banda de música municipal pela cidade, desde os anos cinquenta, não somente tocava, mas, se exibia com jeitos e trejeitos como se buscasse o aplauso fácil, espontâneo, provocando a impaciência do maestro. Nas temporadas dos circos em Macaíba, ver Banga contorcer-se na bateria acompanhando uma caliente rumba olhando fixo - ali bem perto, os quadris carnudos da rumbeira rebolativa - era um espetáculo à parte. Cheio de “pinga” Banga deixava-se hipnotizar pelo bumbum, caprichando na percussão da bateria tal e qual um falo frenético em cada movimento sensual da arte erótica da rumbeira circense. Doente do pulmão, Banga viveu de reminiscências, na rua Rodolfo Maranhão, antigo bas-fond macaibense. Os seus olhos, refletiam as luzes dos bailes e circos de sua vida.

Banga ao falecer, desapareceu um dos últimos expoentes do lirismo humano e musical de Macaíba, onde pontificaram Pereira (piston), Rey (trombone), Neif Nasser (sax), Chicozinho (cavaquinho), Belchior (banjo), Geraldo Paixão (contra-baixo), Tião (surdo), Perequeté (pratos), Paraca, Jessé, Edivan e tantos outros que integravam a banda de música da prefeitura que Cornélio Leite Filho ironizava apelidando de: “a peidona”. José Paulino de Brito foi servidor municipal (porteiro da câmara de vereadores). Aposentado, fazia biscates como garçom e em casas de jogo.

Era filho do casal seu Paulino (barbeiro) e Hilda, fiel eleitora de seu Mesquita. Fui amigo de infância de seus irmãos: Raimundo (Prego), Dione, Canindé e Toinho Chimba. Com a sua morte, a cidade perdeu um pouco a identidade boêmia, na pessoa de um autêntico notívago e pastorador de auroras das ruas antigas de sessenta anos passados. Como ponta esquerda do Cruzeiro, o azul celeste dos gramados do futebol, armava as jogadas simples e complicadas sob a orientação técnica de Nestor Lima. Ao lado dos atletas Bedé, Tota, Passarinho, Loreto, Chico Cobra, Malheiro, Edílson, Magela, Mauro, Aguinaldo (Barbosinha), Galamprão, Caíco e muitos, que formam na minha mente, uma sinfonia provinciana de humanismo e simplicidade de um tempo de ouro, retalhos de cetim.

Os jovens daquela época ainda sobreviventes como eu, testemunhas ou notários públicos, hoje podem relembrar e testemunhar as figuras citadas desse universo semidesaparecido: Cícero Martins de Macedo Filho, Armando Leite de Holanda, Karl Mesquita, Dickson e Nássaro Nasser, Silvan Pessoa, Eudivar Farias, além de tantos que não dá para citar.

A lembrança de José Paulino de Brito, emite sons e sinais de que o tempo apaga lentamente as impressões digitais da antiga Macaíba. Banga, mesmo na sua humildade de nascimento e vida, a sua morte diminui uma fase áurea. Apaga nas ruas e as paredes dos bares da cidade a memória dos simples. Não são somente os notáveis, os ricos ou os ambiciosos de todo o gênero que fazem a história de uma cidade, estado ou país. Lembrem-se que na historiografia da humanidade, somente os pobres se assemelham aos mártires.



(*) Escritor.

11/08/2017


   
Marcelo Alves
11 de agosto às 14:00
 

Bibliotecas espanholas (I)
Na minha última estada na Espanha, em 2015, para participar do 3º Encontro Internacional da Associação Nacional dos Procuradores da República/ANPR (que teria lugar sobretudo em Madrid), aproveitei para chegar uns dias antes e fazer um “tour” pelas regiões de Castela e Leão e Castela-La Mancha, que ficam ao derredor da capital do país. Se a memória não me prega uma peça, antes de aportamos em Madrid, estivemos em Ávila, Salamanca, Zamorra, Leão, Burgos, Predaza, Segóvia, San Lorenzo del Escorial e Toledo, entre outras belezuras.

Nesse giro todo, tivemos a oportunidade de visitar três excelentes bibliotecas espanholas.

Sobre uma delas eu até já escrevi aqui: a “Biblioteca Nacional de España”, cuja sede principal fica no Paseo de Recoletos, 20-22, na “Madrid dos Bourbon” (estações de metrô Colón e Serrano). É uma “biblioteca de trabalho”, ou seja, não é só um lugar para apreciação do ambiente e de belos livros. Tricentenária, gigante, ela é depósito legal de todos os livros publicados na Espanha, além de possuir, claro, uma riquíssima coleção de livros raros, manuscritos, jornais, desenhos, fotografias, partituras, gravações sonoras etc. O museu da Biblioteca Nacional, antigo “Museo del Libro”, à semelhança dos museus de outras grandes bibliotecas (o exemplo que logo me vem à memória é o da British Library), é fantástico. Como já sugeri aqui, vale a pena passear, vagarosamente, por cada uma de suas salas, sobretudo as denominadas (à época em que lá estivemos) “La Biblioteca a través de la historia”, “La escritura y sus soportes” e “La memoria del saber”. A BNE está aberta de segunda a sábado até as 20 horas e também aos domingos pela manhã. E o melhor: a entrada é gratuita.

O segundo “templo” dedicado aos livros que visitamos nessa estada na Espanha foi a “Biblioteca do Monastério Real de San Lorenzo del Escorial”. A noroeste de Madrid, cerca de uma hora de carro, a cidade de San Lorenzo del Escorial em si, que visitamos num dia frio mas ensolarado, é pequenina (menos de 20 mil habitantes) e sem muito atrativos “mundanos”, por assim dizer. O que ali nos atrai, sem dúvida, é o seu palácio/monastério, “El Escorial”, que, para muitos espanhóis, sobretudo os mais antigos, é a oitava maravilha do mundo.

A história do palácio/monastério – que está indissoluvelmente ligada à majesdade de Filipe II de Espanha (1527-1598, e rei a partir de 1556 até a sua morte) – é longa e complicada para ser aqui resumida. Mas é fato que, edificado entre os anos de 1563 e 1584, “El Escorial” foi concebido mais como museu, retiro espiritual e mausoléu do que como residência para a dinastia Habsburgo. A mistura de monastério e palácio não era uma ideia original, é verdade. Mas, no caso do “Escorial”, o sucesso da austeridade pretendida, pela manifesta falta de ornamentação, fez dele um dos edifícios mais belos, importantes e influentes da história da arquitetura europeia, em especial espanhola, e modelo de um novo estilo de edificação. Como registram os autores de “A biblioteca: uma história mundial” (Edições Sesc, 2016, e cujo título original é “The Library: a World History”), James W. P. Campbell (texto) e Will Pryce (fotografias), “'não existe nada parecido com o Escorial, nem Windsor, na Inglaterra, nem Peterhof, na Rússia, nem Versalhes, na França', escreveu Alexandre Dumas, pai, em 1846. 'Sem similares, criado por um homem que dobrou sua própria época a sua vontade, um devaneio moldado em pedra, concebido durante as horas insones de um rei em cujo reino o sol nunca se põe'”.

Na concepção do prédio do “Monastério Real de San Lorenzo del Escorial”, ao lado da Basílica e do Panteão Real, a sua “Biblioteca” tem um papel fundamental. Idealizada pelo próprio rei Filipe II, a concepção da dita cuja (da biblioteca, refiro-me) reflete o espírito renascentista desse grande soberano. Uma das últimas etapas da construção do Monastério, foi efetivamente projetada e construída, entre os anos 1575 e 1583, por Juan de Herrera (1530-1597), arquiteto que substituiu Juan Bautista de Toledo (1515-1567) como inspetor de monumentos da Espanha. Como acrescentam os autores de “A biblioteca: uma história mundial”, o teto da bilbioteca “tem afrescos de Pellegrino Tibaldi [que são um aspecto mais que fundamental para a maravilha do conjunto] e foi finalizado, provavelmente, por volta de 1585. Consiste em um espaço único com abóbada de berço, com 68m de comprimento e janelas da altura das paredes intercaladas de ambos os lados. Trechos compridos de parede entre as janelas dão espaço para grandes estantes bem encaixadas. Embora enormes e construídas contra as paredes, as estantes são, para todos os efeitos, grandes peças de mobília, cada uma formando uma unidade autônoma. No entanto, diferem radicalmente de armários de biblioteca anteriores: os livros agora estão em exposição, tornando-se parte da decoração”. Realmente, harmonizando com os deslumbrantes afrescos do teto, as estantes, finamente trabalhadas, nem claras nem escuras, são belíssimas.

No mais, como apontam Guillaume de Laubier e Jacques Bosser, em “Bibliothèeques du monde” (Éditions de La Martinière, 2014), para o sobredito rei espanhol, “o conhecimento não residia apenas nos livros, mas também nas cartas, nos mapas, nas pinturas, nos instrumentos científicos e nas mil e uma curiosidades e maravilhas que seus navios lhe trouxeram das mais longínquas expedições”. Segundo os mesmos autores, “se o acervo atual da biblioteca real não passa de 45000 obras impressas, ela é enriquecida com 5000 manuscritos. Sua extraordinária qualidade [mais uma vez] reflete as ambições de Filipe II, apaixonado por seus livros e pela escrita em geral”.

Por derradeiro, informo que a terceira biblioteca que visitamos nesse nosso périplo – pela capital e pelas regiões espanholas de Castela e Leão e Castela-La Mancha, relembro – foi a “Biblioteca da Universidade de Salamanca”. Mas sobre ela, por falta de espaço hoje, papearemos somente na semana que vem.

Marcelo Alves Dias de Souza
Procurador Regional da República
Doutor em Direito pelo King’s College London – KCL
Mestre em Direito pela PUC/SP

10/08/2017

11 DE AGOSTO - DIA DO ADVOGADO



A criação dos cursos jurídicos em 11 de agosto de 1827 permitiu o surgimento de ideais corporativistas à imagem da Ordre des Avocats da França, berço cultural dos bacharéis do Brasil, ávidos por uma regulamentação profissional, uma vez já existente em atuação, um certo número de advogados, provisionados e de solicitadores, que não possuíam formação acadêmica oficial, mas para exercerem a advocacia faziam exames teóricos e práticos.
A data de 11 de agosto, por conseguinte, foi escolhida para comemorar essa grande iniciativa, considerada como O Dia do Advogado, consagrando as forças do primitivo ideal do Parlamento do Império – alforriar, além da independência política que fora conquistada, também a liberdade intelectual, através dos Cursos de Direito de Olinda, Recife e São Paulo, como verdadeira Carta Magna, que nos ofereceram os sempre lembrados Bacharéis Teixeira de Freitas, José de Alencar, Castro Alves, Tobias Barreto, Ruy Barbosa, o Barão do Rio Branco, Joaquim Nabuco, Fagundes Varella, dentre tantos outros e que inspirou o Mestre Prado Kelly a dissertar:

“... só há justiça, completemos, onde possa haver o ministério independente, corajoso e probo dos advogados. Tribunais de onde eles desertem, serão menos o templo do que o túmulo da Justiça.”