16/10/2014

ASSEMBLEIA GERAL ORDINÁRIA DO IHGRN 

REALIZADA, COM SUCESSO, EM 15-10-2014.








Sob o comando do Presidente VALÉRIO ALFREDO MESQUITA e  assistência do Secretário-Geral Carlos Roberto de Miranda Gomes foi realizada a Assembleia Geral Ordinária do IHGRN, em seu salão nobre reformado, que cumpriu a seguinte pauta:

Ordem do Dia: 
A) Apreciação e Aprovação do Relatório de Gestão e Demonstração de Resultado da Diretoria do IHGRN - período de 15 de março a 31 de dezembro de 2013;

 B) Apreciação da Resolução nº 01/2014, de 04 de julho de 2014, de aumento da anuidade para o exercício de 201;
 C) Outros assuntos correlatos.
As matérias foram APROVADAS e houve manifestações de vários sócios dando sugestões, a saber Públio José, Lívio Oliveira, Antônio Luiz, Carlos Gomes, Carlos Adel, Ormuz Simonetti, Gutenberg Costa, Severino Vicente, Odúlio Botelho, Eduardo Villar, Adalberto Targino, Claudionor Barbalho, Eduardo Gosson, Tomislav Femenick e Edgard Dantas. Estiveram presentes os membros da Diretoria e Conselho Fiscal e do contador Jônatas Fernandes.
O Presidente, após a leitura do seu Relatório e Prestação de Contas, teceu comentários sobre os propósitos para o ano de 2015 e comunicou a pauta de eventos para este final de ano.
A sessão foi registrada pela máquina da confreira Lúcia Helena Pereira.


15/10/2014


Mais um casarão da Ribeira

Elísio Augusto de Medeiros e Silva

Empresário, escritor e membro da AEILIJ
elisio@mercomix.com.br
Era uma construção antiga de tetos altos. Tudo no prédio nos remetia a glória passada da Ribeira. Nas paredes exteriores, descascadas, dava para ver os enormes tijolos vermelhos à mostra. De aspecto envelhecido, aquele velho casarão sempre nos atraíra.
Segundo alguns antigos moradores ribeirinhos ali funcionara, nos finais do século XIX, o escritório de uma importante firma inglesa, que se dedicava ao comércio de importação de algodão.
Com ordem dos atuais proprietários do imóvel, chegamos para uma visita ao local – à procura de objetos marcados pelo tempo.
Segundo John Chadwick: “A vontade de descobrir segredos está profundamente enraizada na alma humana; até o menos curioso dos espíritos se inflama diante da ideia de deter uma informação proibida a outros”. E, no nosso caso, essas incursões históricas nos fascinavam!
Depois de atravessarmos um pequeno jardim, tentamos girar a lingueta do cadeado da porta de entrada. Em vão, nem se buliu, devido às ferrugens acumuladas pelo tempo sem uso. Cortamos o cadeado.
Em seguida, forçamos a porta emperrada e, finalmente, ela se abriu com estrondo. O mau cheiro do interior do prédio chegou até nós. Aguardamos uns instantes, para nos aventurarmos a entrar.
Através das vidraças sujas, os raios de sol penetravam em jorros na sala principal e dali se espalhavam pelos cômodos adjacentes. Muitas teias de aranhas nos deixaram em alertas.
Algumas paredes apresentavam rachaduras, sinal claro que as fundações do antigo sobrado estavam abaladas. Muita poeira caía do teto, carcomido de cupins.
Fotos antigas de pessoas estavam expostas em molduras ovais nas paredes das salas – deveriam ser os antigos moradores. Da sala percebemos um imenso pátio interno, em que o mato predominava. Giramos os calcanhares e caminhamos sobre o piso de ladrilhos hidráulicos, através das paredes seculares, invadindo os demais recantos do casarão.
A aceleração da pressão sanguínea irradiava nossos cérebros e corações. Entramos em um dos vários quartos – um forte cheiro de mofo estava no local. Vários móveis ainda se encontravam ali. Mas, nada que sugerisse ter sido um escritório comercial.
Pelos reflexos de luz, que vinham através das janelas, percebemos uma velha cômoda, ao lado de uma cama. Sobre o tampo do móvel, um par de alianças de ouro, com iniciais gravadas e legíveis, que resistira à ação do tempo.
Apesar da pouca luz do ambiente, conseguimos ler as iniciais da parte interna das alianças: “L. & C. 1887”. A quem teriam pertencido?! Não sabemos, mas, com certeza, terão pertencido a um casal cujo amor já se dissolveu nas areias do tempo.
Do quarto seguimos até um recanto amplo, atulhado de livros, revistas e maços de jornais amarelecidos e mofados. Com certeza, era o que tanto procurávamos – a biblioteca do casarão.
O primeiro livro que vimos foi uma antiga Bíblia – velha e bastante manuseada, com as pontas empenadas e as folhas mofadas pela umidade do local. As bordas das suas páginas eram douradas e começavam a clarear após os anos de uso. Folheamos as suas páginas e ao soltarmos as folhas reluzentes cintilavam como uma cascata de ouro.

14/10/2014

IHGRN

 
CONVOCAÇÃO PARA SESSÃO DE ASSEMBLÉIA GERAL ORDINÁRIA.
 
EDITAL
 
 
O Presidente do INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO RIO GRANDE DO NORTE – IHGRN, na conformidade das disposições combinadas dos artigos 10, parágrafo único e 15, letra “d” do Estatuto vigente, convoca os seus sócios que estejam em pleno gozo de seus direitos sociais estabelecidos no referido Estatuto, para se reunirem em Sessão de Assembleia Geral Ordinária, que se realizará no dia 15 de outubro (quarta-feira) de 2014, no auditório da Instituição, à Rua da Conceição, 622 – Cidade Alta, nesta Capital, às 15,30h (quinze horas e trinta minutos) em primeira convocação, com presença da maioria absoluta dos sócios; trinta minutos após, em segunda convocação, com qualquer número dos sócios, a fim de discutir e deliberar sobre a seguinte Ordem do Dia:

A) Apreciação do Relatório de Gestão e Demonstração de Resultado da Diretoria do IHGRN – período de 15 de março a 31 de dezembro de 2013;
B) Apreciação da Resolução nº 01/2014, de 04 de julho de 2014, de aumento da anuidade para o exercício de 2015;
C) Outros assuntos correlatos.
Natal/RN, 29 de setembro de 2014
 
Valério Alfredo Mesquita
Presidente
 
 

13/10/2014

Economia


O paradoxo da reforma agrária

Tomislav R. Femenick – Contador, mestre em economia e historiador.


Plantar e colher alimentos foram ações determinantes para a evolução do processo civilizatório da humanidade. A posse da terra teria sido decisiva para a formação das famílias, dos clãs e das nações. Inicialmente propriedade comum a todos os componentes do grupo, depois a propriedade da terra tomou o caráter individual; isso em decorrência da imposição das armas ou das leis. Friedrich Engels, o amigo mais intimo de Karl Marx, aborda esse assunto em seu famoso livro “Origem da família, da propriedade privada e do Estado”.
Todavia, os excluídos da posse da terra sempre se insurgiram contra essa situação. A historiografia registra lutas de camponeses em diversas épocas, sendo a mais citada a liderada pelos irmãos Tiberio e Caio Graco no século II, antes de Cristo. Os detalhes dessa revolta é que são importantes e, paradoxalmente, geralmente ocultados: embora plebeus, Tiberio e Caio eram integrantes de uma importante e aristocrática família romana e a reforma por eles pregada era a distribuição das terras tomadas pelas invasões romanas (notadamente nas regiões de Tarento e na Cápua), que estava concentrada nas mãos da nobreza.
Durante toda a Idade Média, a Igreja adotou a postura de limitar o direito de propriedade com base no bem comum e no direito do indivíduo a uma vida digna, porém ela mesma era uma das maiores detentora do direito sobre a terra. Essa contradição, bem como o enfraquecimento da autoridade dos reis e o fortalecimento do poder dos senhores feudais sepultaram as frágeis tentativas de conquista de posse da terra pelos trabalhadores rurais. O resultado foi um retrocesso no desenvolvimento da economia.
Esse estado de coisa começou a mudar no século XVIII com a Revolução Francesa, que aboliu a servidão rural, reformulando as relações de trabalho no campo. Outro grande avanço ocorreu em 1862 nos Estados Unidos, quando foi sanciona a lei que concedeu terras públicas a pequenos fazendeiros, a baixo custo. Não por acaso ainda hoje a França é considerada o celeiro da Europa e os Estados Unidos são os maiores produtores agrícolas do mundo; claro que à solução do problema fundiário se somaram a facilidade do crédito e o desenvolvimento tecnológico.
Na Ásia, até a Segunda Guerra, Japão, Taiwan e Coréia apresentavam sérios problemas de concentração da posse da terra e de escassez de alimentos. O problema japonês foi resolvido pelas forças de ocupação norte-americanas que impôs a reforma agrária, modelo que foi transplantado para Taiwan, onde em poucos anos foi transferido aos agricultores o equivalente a 13% do PIB. Na Coréia do Sul o governo forçou os proprietários a transferirem a posse da terra aos antigos arrendatários, o que provocou recorde na produção de alimentos e grãos.
De volta a Europa, há que se citarem os êxitos obtidos com a redistribuição da terra na Itália, Finlândia, Alemanha e Países Baixos – sempre acompanhada de assistência técnica e juros baixos. Porém, não se poderia deixar de falar nas reformas agrárias promovidas nos países de governos socialistas, principalmente na antiga União Soviética e China. Na URSS houve duas fases distintas. Na primeira os camponeses ocuparam as terras dos antigos latifundiários em nome da revolução, depois o governo as expropriou em nome da coletivização, uma experiência que custou a vida de cerca de seis milhões de pessoas e resultou numa colossal ineficiência produtiva. Na China de Mao de Mao Tse-tung, a reforma agrária obrigou os camponeses a se agruparem em gigantescas “comunas agrícolas”, o que teria causado a morte pela fome, de 20 a 40 milhões de pessoas, até 1962.
Essa conjunção de fatos históricos nos leva a uma conclusão: a reforma agrária é necessária, deve vir com assistência creditícia e tecnológica e só dá certa quando realizada sob a ótica do capitalismo.
 

12/10/2014


As causas da deposição do jornalista Pedro Avelino

João Felipe da Trindade
jfhipotenusa@gmail.com

Este artigo complementa dois outros, aqui publicados, de uma entrevista que o jornalista Pedro Avelino deu, após seu retorno de Acre, onde exerceu o carto de Prefeito do Departamento do Alto Juruá.

Após a descrição do Acre e do Departamento do Alto Juruá, na entrevista para o jornal " A Imprensa", o major Pedro Avelino fez nova pausa.
- O Sr. Já falou ao Sr. Presidente da República e ao Sr. Ministro do Interior? Perguntamos.

- É justamente por não o ter feito que estou a pensar até onde iremos com esta palestra.

Perdão! Tendo o Sr. sido deposto, é natural o nosso desejo de saber as causas e os autores desse golpe, na pessoa do Prefeito que foi... E não seria indiscreto indagar?

- Ora, eu lhe conto: essa ideia de autonomia do Acre é o eixo em torno do qual giram as explorações e conclama aos magotes aqueles aventureiros de vasa moral de que lhes falei, encabeçados por meia dúzia de indivíduos que sabem, com artimanhas de todo o feitio e despudor galvanizado, fingir importância.

Em lá chegando, encontrei as explorações dessa horda, a título de autonomia:acabaram de depor o prefeito, Sr. João Cordeiro, iniciando um tremendo movimento desorganizador do governo; este movimento foi sufocado pelo Sr. Capitão Guapindaia, comandante da força federal que à frente da mesma e armado de metralhadoras, o dominou, arvorando-se com a fuga do Sr. João Cordeiro, em prefeito. Substituiu o Sr. capitão Guapindaia, no comando da força federal, o Sr. capitão Júlio Serpa, que por seu turno, se fez prefeito; recebi o governo da Prefeitura deste militar, que me acolheu sem nenhuma solenidade, nem mesmo do estilo, numa parcimônia da manifestação, que traia com clareza, o seu dissabor em se ver despojado do cargo que não era seu, como não era do seu colega antecessor.

Logo que tomei posse, este Sr. capitão Júlio Serpa exigiu o meu endosso aos atos que praticou na qualidade, que não tinha, de prefeito – e exigindo clamava em tom de gabolice – “ o povo me adora”!; protelei o endosso, examinando os papéis que eram de nomeação, substituições de cargos, de concessões, de favores; enquanto protelava, em dias  que se seguiram, o Sr. capitão Serpa andava a apregoar pelas ruas, em rodas de seus amigos e conhecidos, que eu lhe havia de aprovar os atos, porque a força era ele e a ele o povo adorava. Naturalmente, tratei de observar, de indagar, de sindicar dos hábitos das autoridades e das suas relações públicas e particulares com a população e concluí, e lá toda gente vê e sabe, como eu vi e sei, que a mais desenfreada desordem reinava permanentemente entre os comandados e o comandante da força federal; os soldados indisciplinados são comparsas dos magotes políticos e tomam parte nas suas festas e são seus comensais, sendo tidos como personalidades de muito valor. 

Nem se diga que os soldados figuram nessas festas e nesses banquetes apenas decorativamente, não: um soldado aqui é amigo intimo e do particular carinho de um político ali; outro soldado acolá é amigo intimo e companheiro assíduo de outro político adiante; daí a indisciplina que o próprio comandante não corrige, porque o político amigo particular  do soldado intervém, cumulando o comandante de agrados e de presentes caros, de obséquios repetidos: e suborna pela bajulação. O Acre é o paraíso do soldado.

Compreendendo a situação aprovei os atos do Sr. capitão Serpa, contemporizando e procurando com jeito restabelecer o princípio de autoridade. Neste trabalho obtive a instauração de inquérito contra os soldados recalcitrantes na indisciplina e os remeti presos para o comandante da região militar, em Manaus, o Sr. coronel Rego Barros; aos soldados indisciplinados porém, este coronel não deu corrigenda alguma, caso que ocorre no Alto Juruá. No dia 14 de julho do ano próximo findo, o Sr. capitão Serpa, mancomunado com os Srs. Djalma Mendonça, juiz substituto, Carlos Gomes Rebello Horto, promotor público; João Craveiro Costa, solicitador, Borges de Aquino, solicitador, chefiando os chamados revoltosos autonomistas, que são aquele pessoal,  que conhecemos, excluindo o coronel Mâncio Lima, que é homem de bem, tentou a minha deposição. O movimento, felizmente, falhou, devido as precauções que tomei, por ter conhecimento do que se tramava e pela coincidência da chegada do Sr. capitão José Menescal de Vasconcellos, que, a meu pedido ao Sr. coronel Rego Barros, vinha substituir interinamente, o Sr. capitão Serpa.

O Sr. capitão José Menescal de Vasconcellos foi um militar sisudo, correto e digno, mantendo sempre uma nobre linha de independência  e prestigiando a minha autoridade de prefeito.

Aqueles elementos de subversão, entretanto, não desacoroçoou ante o insucesso do golpe que iam dar com a chefia do Sr. capitão Serpa, e nos dias 7 e 8 de novembro do ano próximo findo, tentaram, mais uma vez, a minha deposição; falho mais este golpe, e falhou porque o Sr. capitão Menescal de Vasconcellos, comandante interino da companhia  da força federal, e o Sr, João Júlio da Silva, comandante da policia do departamento, sufocaram, com energia, o movimento.

Cooperou do seu lado pelo malogro da pseudo revolução, a chegada do Sr. capitão Polydoro Rodrigues Coelho, comandante efetivo da companhia da força federal e de  seu imediato no comando, Sr. tenente Cândido Thomé Rodrigues. Retirou-se, pois, o comandante interino, Sr. capitão Menescal de Vasconcellos. 

Gorado o movimento, os seus cabecilhas, em 11 de novembro, três dias depois abandonou o departamento, e os que ficaram, temendo o justo castigo aos seus atos, impetraram ordem de ”habeas corpus” – dezoito pedidos – ao juiz de direito da comarca, dr. Lymério Celso da Trindade, que é um íntegro magistrado.

O Sr. capitão Polydoro Rodrigues Coelho, - continuou o Sr. major Pedro Avelino, - de índole autoritária e violenta, logo após a sua posse no comando, aparentou correção no cumprimento de seus deveres para com a prefeitura; à proporção, porém, que passava o tempo, se foi ele a imiscuir, e conviver com os indivíduos da amizade do Sr. capitão Serpa, e o seu companheiro de armas, Sr. tenente Cândido Thomé Rodrigues, fez tamanha relação com o solicitador Borges de Aquino, conhecido elemento subversivo da ordem, que passou mesmo a morar em casa deste.

Deste ponto em diante a situação mostrava outras faces: eu compreendia, eu estava farto de compreender, que os tais autonomistas não passavam, nem passam de uns embaçadores, que se aproveitavam de uma falsa compostura política regional para explorar, à vontade, todos os meios de lucros, favorecendo simultaneamente, os baixos instintos da patuléia dos aventureiros inferiores e à vaidade de alguns seringueiros e a ignorância dos soldados de “pret” da força federal e o espírito autoritário dos comandantes dessas praças. Todavia, agi como me foi possível e como me aconselhava a consciência: semanas após minha chegada, verificando a existência do Lyceu Affonso Penna, estabelecimento secundário, mantido pela prefeitura e consumindo cento e quarenta contos por ano, fui visitá-lo. Nessa visita inteirei-me de que o estabelecimento não possuía o número de alunos suficiente que justificasse a sua existência, tanto que, para esconder este grave fato, mantinham curso de primeiras letras.

Feita a visita e cientificado do que sucedia, nomeei uma comissão dos Srs. Dr. José Joaquim de Oliveira, Belizário de Sousa Junior, Antônio de Salles Ferreira, e tenente Luiz Souto, todos altos funcionários da Prefeitura, a fim de inspecionar o estabelecimento sob todos os aspectos e me apresentar o relatório.

Ante este relatório, que acusava a inutilidade do estabelecimento, suspendi a função do mesmo, submetendo o meu ato ao governo federal, que o aprovou.

Originou-se deste caso a campanha de ataques e de difamações à minha administração promovida pelo solicitador Craveiro Costa, e outros professores do Lyceu, que se viram privados da pensão do governo, que recebiam sob pretexto do exercício do magistério, sendo estes cavalheiros membros da Associação Comercial de Cruzeiro do Sul, fizeram desta uma das suas melhores armas contra mim. Foi uma campanha tenaz, sistemática, aproveitando todos os precedentes da administração da prefeitura com os meus antecessores, captando solidariedade da força federal por meio de adulações, presentes ao comandante, aos soldados, campanha que fazia a sua tecla mais alta, para efeitos de descrédito da conduta do ex-prefeito Sr. coronel João Cordeiro, meu antecessor, que, como é sabido, dos quatrocentos contos de réis da verba “material”, do exercício de 1910, apenas aplicou ao departamento do Alto Juruá, cento e tantos contos, conforme consta da escrituração arquivada na prefeitura.

Assim correram os acontecimentos até o dia 2 de dezembro do ano próximo findo, quando o Sr. capitão Polydoro Rodrigues Coelho, iniciou uma espécie de impertinência, enviando, a qualquer propósito, ofícios em termos insólitos à minha pessoa na qualidade de prefeito, até que ousou, finalmente, alegando a instauração de inquérito, exigir que lhe mandasse apresentar o comandante da policia da prefeitura, sob pena (isto ele fizera constar nos pontos de palestra, para que me chegasse ao conhecimento), sob pena  do comandante comparecer à sua presença ainda que arrastado.

Era demais, e como não desejasse eu entrar em luta, porquanto possuía só vinte homens, ao passo que ele possuía oitenta, bem armados e municiados, alem das metralhadores assestadas provocantemente  para o edifício da prefeitura, resolvi no dia 5 de dezembro enviar a ele, Sr. capitão Polydoro Rodrigues Coelho, por intermédio do juiz de direito e do Sr, coronel Félix Fleury, um ofício comunicando-lhe que me sentindo desautorado, retirava-me do Cruzeiro do Sul, abandonando o cargo de prefeito do departamento do Alto Juruá.

No dia seguinte embarquei para Manaus, chegando a 21 de dezembro e de Manaus parti a 18 de janeiro ultimo, chegando ontem no Rio de Janeiro: o Acre odeia e repele o regímen prefeitural não de um ódio decorrente de uma serena convicção, mas o ódio preparado, fomentado por uma sinistra soborte (talvez sorte) de tenebrosos exploradores.

11/10/2014


AFLIÇÃO E MORTE NA PRAIA (1)

Jurandyr Navarro

Do Conselho Estadual de Cultura


O mar tem vida e dá vida. Tendo vida, sofre e ama. Quem soluça a sua dor, senão, as suas vagas noturnas? Quem exprime a alegria do seu coração inquieto, senão as "espumas sorridentes" das suas ondas matinais?!
O mar, que dá vida, pode, também, ocasionar a morte ou causar o desespero.
Das praias natalenses a mais perigosa delas é a chamada Praia do Meio, compreendendo a orla marítima que se derrama da Ponta dos Morcegos à Praia do Forte, pontos extremos das praias de nomes: dos Artistas e do Poço do Dentão.
Desde menino que ouço falar em afogamentos de banhistas por aquelas bandas. A minha mãe guardava um recorte de jornal, do seu tempo, em que narrava um afogamento não consumado, ali, em  que papai figurava como salvador de uma pessoa. Depois, muitos casos havidos de salvamentos por intervenção miraculosa de terceiros.
Parece existir, nessa área, uma nova Medusa fabulosa, habi­tando aquelas locas e caldeirões, petrificando os nadadores incau­tos que lhes miram os olhos ardentes, arrastando-os para o rede­moinho da morte. Ou, então, caravelas róseas-violáceas, envene­nando com seus raios e tentáculos letais, a quem se adentra no oceano bravio.
Quantos não já perderam a vida, em minutos, dominados pelo pânico paralisante e tragados pelas ondas traiçoeiras; e que, meio submersos, com os pulmões cheios d'água, foram levados pela correnteza até a distante Praia da Redinha!
Quantos amigos e parentes, que alegres vão desintoxicar o corpo e o espírito na Praia e são sobressaltados com os afogamen­tos, retornando aos lares envoltos pelo véu da tristeza.
Narro, aqui, três episódios diferentes e verídicos em que a morte e o desespero rondaram aquela área litorânea.
Conheci Milu, rapaz cheio de vida e de alegria contagiante. E presenciei o seu mergulho para a morte. Foi numa manhã de domingo de Verão. Pilotava ele um pequeno avião Teco-Teco, como era chamado, na época, nos idos de 1950, mais ou menos. Depois de algumas acrobacias e voos rasantes, numa curva rápi­da, o vento forte partiu-lhe uma das asas. E o pássaro metálico rodopiou, vertiginosamente, mergulhando nas águas frias da Ponta dos Morcegos, ali perto dos negros rochedos, como ícaro precipitou-se, derretidas as asas, no mar Egeu.
Vi o lance como se fora numa tela de cinema. E nadei com alguns amigos até bem perto do local e só vimos os destroços da pequena aeronave e o alvoroço da tragédia.
O cadáver do co-piloto fora resgatado. E Milu teve o mar como sepultura, como os têm os heróicos marinheiros. Jamais o seu corpo aflorou às águas...
Este caso isolado não se configurou num afogamento natu­ral, por ter sido um desastre.
Porém, incontáveis são os registros de afogados naquela linha d' água.
Outro caso foi o da poetisa Zila Mamede. Minha com­panheira de praia, nos verões da Areia Preta, nos anos quarenta, Zila, com seu corpo esguio, era uma exímia nadadora.
Igualmente aos outros, o seu pálido corpo foi arrastado pela correnteza à Praia da Redinha; boiando, qual o de Ofélia shakespeariana, com os cabelos amarfanhados e de rosas cobertos; e, como a meiga Ofélia, inconscientemente cantando estrofes de antigas árias...
Não houve notícia de alguém ter presenciado a sua agonia, desfalecendo no mar. Continua envolta em mistério, como os caprichos da urna da fatalidade, a deusa da Noite.

A sua dor a todos aturdiu. E a cidade chorou o pranto amar­go pela morte inesperada e misteriosa da sua poetisa maior.

10/10/2014

Presos Políticos


MOSSORÓ E OS PRESOS POLÍTICOS DO 1º DE MAIO

Por: Gileno Guanabara, sócio efetivo do IHGRN

A cidade de Mossoró já não se lembra, não faz ideia de como aconteceu, nem faz tanto tempo. Foi na madrugada do dia 1º de maio, Dia do Trabalhador, do ano de 1970. Ao amanhecer o dia, a notícia se espalhou: dois bancários e três que se diziam camponeses tinham sido presos juntos, durante a madrugada, por policiais do esquadrão militar. O flagrante se dera no instante em que distribuíam um manifesto apócrifo, em comemoração ao dia do trabalhador, cuja cópia era enfiada nas brechas das portas de quem era trabalhador e, naquela hora, dormia. O texto do panfleto exaltava a comemoração da data e exortava os trabalhadores a resistirem à ditadura. Os bancários eram Jonas e Ricardo, filhos de famílias simples, natural de Aracati e de Natal, respectivamente, ambos escriturários do Banco do Brasil, lotados na Agência de Mossoró. Hoje passado tanto tempo, estão aposentados.  Os camponeses atendiam pelos codinomes Baraúna, Santa Cruz e Da Fé, e seus nomes verdadeiros eram: Francisco Aurélio, Lourival Alves e José Henrique. Dois nascidos no povoado de Jucuri e, o terceiro, na cidade de Apodi, nos altos da Chapada que tem o mesmo nome. Deles não se teve mais notícia.

Cientificado da prisão, Cortez Pereira, então Governador do Estado, deslocou o Coronel Edmilson Holanda, chefe do Gabinete Militar, para efeito de, ainda pela manhã trasladar os presos para Natal e alojá-los em celas do Quartel da Polícia Militar. Dado o caráter atentatório aos preceitos da Lei de Segurança Nacional então vigente (Decreto-Lei nº 898/69), a ocorrência foi imediatamente comunicada as autoridades da 7ª Circunscrição da Justiça Militar, no Recife, a quem competia processá-los e julgá-los.

A denúncia que o Auditor Militar da 7ª Auditoria atribuiu aos acusados referia-se à infringência da Lei de Segurança Nacional. A defesa coube as Dra. Mércia Albuquerque e, no final, a Dra. Elizabeth Diniz. Ocorreram as audiências de instrução, no Recife. No mês de agosto, o Conselho Judiciário da Auditoria se reuniu e decidiu pela improcedência da denúncia e absolveu os três camponeses e um dos bancários, Jonas, os quais foram libertados imediatamente. O bancário Ricardo foi condenado a dez meses de reclusão, preso recorreu ao Superior Tribunal Militar-STM. Em relação a parte da sentença que os absolveu, o Ministério Público Militar também recorreu.

Somente em fevereiro de 1976, o STM, reunido em sessão secreta, sob a Presidência do Ministro Tenente-Brigadeiro do Ar, Carlos Alberto Huet de Oliveira Sampaio, (Apelação Nº 38.216/70), por maioria de votos, negou provimento ao recurso do Ministério Público e manteve a sentença na parte que não condenou. Para os Ministros Faber Cintra, Honório Magalhães e Sylvio Moutinho, que manifestaram votos divergentes, mas foram vencidos, era de ser mantida a parte condenatória da sentença em relação a um dos acusados, como também se proclamaram pela sua reforma, a fim de rever a absolvição dos demais e condená-los a igual pena. Ao apreciar o recurso impetrado por parte do bancário apenado, a decisão do STM foi pelo acolhimento, para efeito de também absolvê-lo da acusação, contrariamente aos votos divergentes. O bancário Ricardo já cumprira integralmente a pena e já se achava em liberdade.

Integravam a composição do STM e participaram do julgamento os Ministros Amarílio Salgado (Relator), Jurandyr de Bizarria Mamede (revisor), Alcides Carneiro, Syseno Sarmento, Faber Cintra, Rodrigo Octávio Jordão Ramos, Honório Pinto Pereira de Magalhães Neto e dos Ministros cujos votos foram vencidos.

Durante a prisão, os réus receberam o conforto de amigos comuns, alguns deles subscreveram e recolheram declarações de pessoas ilustres da cidade, em que afirmavam a conduta profissional, o coleguismo dos bancários, tudo para efeito de defesa junto à Justiça Militar. O Banco do Brasil, através de sua direção nacional, não demitiu os servidores, os quais, ao final da instrução e com a sentença de absolvição, retornaram aos seus cargos naquela instituição bancária.

Dos camponeses presos e absolvidos não se tinha conhecimento de quais ideias os movia, a razão ideológica que os inspirava, ou até da influência nas lides da política sindical. Nem mesmo eram sabidas as suas filiações partidárias, da militância clandestina que os vinculasse à causa dos bancários. Durante os interrogatórios, os acusados bancários portaram-se com dignidade, não acusaram. De outro lado, os camponeses que se fingiam incapazes de entender e explicar os fatos a que respondiam. Utilizando-se de uma artimanha convincente, no momento em que eram submetidos à inquisição, as respostas articuladas que davam era de não entenderem, de serem inocente útil dos acontecimentos. No Recife, durante uma audiência, um Auditor Militar, que procedia o interrogatório, esgotou a paciência diante da leniência de um acusado. Encarou-o e perguntou: O senhor conhece um Volkwagem? ... O camponês, a par do seu fingimento, retrucou de bate pronto: Eu nunca vi Volkwagem, quem é doutor? ... O Auditor abufelou-se, deu um murro na mesa e dirigindo-se aos demais juízes: Trata-se de um inocente. Se num dia de hoje ele não sabe, nem nunca viu um Volksawem na rua, não pode saber de nada. Estou satisfeito. Nesse diapasão, os camponeses foram inocentados, por ausência de dolo e por se mostrarem incapazes de reconhecer o objeto do crime cometido. A absolvição foi uma mera decorrência.

A conduta romântica de fazer política por contaminação foi determinante nos atos praticados por aqueles militantes, presos no dia 1º de Maio de 1970, na cidade de Mossoró. A improvável existência de uma aliança operário/camponesa não possuía substância de aliar aos anseios românticos da classe média os arrufos pseudo/revolucionários de camponeses não letrados e pouco politizados, ainda que bem intencionados, para contestar o poder militarizado e, ainda mais, de forma clandestina. Durante o governo do General Médici, a luta armada a que setores da esquerda aderiram tornou a repressão mais seletiva e implacável. Não foram poucos os militantes desviados pelo espontaneismo cego, pela insensatez do radicalismo infantil, que se deixaram conduzir para a lamentável reta da confrontação política desigual. Pela dignidade da causa que os moveu, no entanto, saúdo a todos eles.