A Coluna do General Miguel
Costa/Prestes (I)
Luiz Gonzaga Cortez.
Um dos poucos registros
confiáveis sobre a passagem da Coluna Miguel Costa/Prestes, em São Miguel, no
Oeste do Rio Grande do Norte, em 1926, é de autoria de José Guedes do Rêgo, que
foi vice-prefeito de Pau dos Ferros, em 1957. Ele foi testemunha ocular dessa
história. Escreveu um depoimento de cinco páginas datilografadas sobre o que
viu e ouviu, sem embromações. Vou transcrever o longo depoimento da forma mais
fiel possível cortando as repetições dos fatos e dos nomes das pessoas já
devidamente identificadas, sem “livrar” a cara de ninguém, seja lá de quem foi. Por isso, vou dividir em capítulos. “Zé
Guedes”, como era conhecido em Pau dos Ferros e em Natal, como assim o seu
relato:
“Aos dois dias do mês de
fevereiro de 1926, o Chefe Político daquela cidade snr. João Pessoa de
Albuquerque, conhecido por João Leite, recebeu do Governador do Estado (1) Dr.
José Augusto de Medeiros, um telegrama, comunicando que, de acordo com
telegrama recebido do Governador do Estado do Ceará, havia passado em
Suçuarana, região do município de Iguatú naquele estado, 70 bandidos
desmuniciados rumando a fronteira deste Estado e para garantia seguia naquele
dia um contingente de 700 praças da policia, comandado pelo Tenente Joventino,
para aquartelar-se em S. Miguel. Diante de tal telegrama, a população agitou-se
e logo foram preparando para hospedar tão grande número de praças, coisa nunca
vista pela população”.
Começam as divergências de
interpretação, uns acreditando, outros combatendo e dizendo tratar-se da Coluna
Prestes. Ouvi o comerciante Manoel Vieira de Carvalho, diser ao chefe, “o snr
não pense nem de leve que é bandidos, é a coluna Prestes, pois venho
acompanhando pelos jornais, a marcha dessa gente”.No dia 3 as 11 horas mais ou
menos, chegava um cidadão conhecido por Antonio de Chica, que vinha de uma
pescaria no sitio Malhada de Bois, pé da serra de Pereira, Estado do Ceará;
vinha referido homem espantado e chegou a casa do chefe político e disse: seu João Leite, o pé da
serra está todo tomado de homens armados, o chefe respondeu: “Tu és tolo, isto
os cangaceiros que passaram em Suçuarana; ele respondeu: seu João é os
revoltosos, é gente que não cabe aqui dentro da cidade”. Baseando-se o chefe no telegrama, reuniu seus
amigos e concordaram em mandar uns homens armados empiquetar tal pessoal na
ladeira denominada do Engenho, município de Pereiro, Estado do Ceará, embora o
comerciante Manoel Vieira de Carvalho lutasse muito contra as demais opiniões, enquanto
os outros concordavam para tal medida, ele era de opinião se preparar
amigavelmente para receber aquele pessoal com recepção. Conseguiram juntar 25
homens armados e às 14 horas mais ou menos o seguinte o contingente, chefiado
por Francisco Moreira de Carvalho, ex-genro do coronel João Pessoa, quase todo
esse pessoal era gente das principais famílias daquela cidade, inclusive José
Pessoa de Carvalho e Francisco Moreira Filho, filhos de Francisco Moreira de
Carvalho e Francisco Queiroz, comerciante. Ao chegarem no sítio Engenho,
distante 3 léguas de S. Miguel, propriedade de do snr. Manoel Pinheiro Barbosa,
juntaram-se mais homens, que não recordo a quantidade,
seguindo rumo a tal ladeira, numa serra muito difícil de passar, somente uma
pessoa atrás do outro e para um lado e outro somente pedras e mato; aconteceu
que antes de atingir ao objeto almejado- a ladeira – e no lugar chamado Canta
Galo, ao passar uma curva da estrada, depararam com um contingente de homens
armados, diante de tamanha surpresa, o elemento que vinha a frente dos
inimigos, sacou de duas armas curtas e disparou-as de uma só vez. Travou-se o
tiroteio, com poucos minutos, os revoltosos recuaram, isto ameaçando com gritos
muito altos que já voltavam para dá o troco. Neste momento o pessoal de S.
Miguel foi examinar o campo da luta e lá encontraram vários objetos, como
cantis, manta de lã de ovelha, usadas no Sul, aí, então um dos elementos de
nome José Felix, conhecido por José Ferreiro, alarmado disse “seu Chico
Moreira, nós não estamos brigando com cangaceiros e sim com o exército e vamos
embora se não nós não contaremos vitória”. Chico Moreira, um homem que não
corria pouca coisa, respondeu: “deixa de
ser mole negro, esta canalha já correu a primeira vez e corre a segunda”.
Quando estavam nessa conversa, ouviram
gritos alarmantes, avança, avança e então dizem eles que parecia um grande
estrondo a procura deles e a estrada vinha cheia que não se contava três
pessoas tamanha era multidão e por todos os lados, por dentro do mato, apesar
de um pouco fechado, gritava gente
dizendo avança, avança, tiveram
que correr, como o chão era muito acidentado e pedregoso, bastava encubrir-se
poucos metros mato adentro, ninguém via mais e foi assim que escapuliu a maior
parte deles, tendo o Francisco Moreira Filho, recebido um balaço em um braço,
coisa leve. Junto aos 25 homens foi também José Augusto Pessoa, filho do
coronel João Pessoa, cidadão que nunca se envolveu em luta para ter quem
corresse primeiro do que ele e foi o que aconteceu. A luta foi a tardinha e
antes das 7 horas da noite passava ele de volta na cidade, noticiando o caso do
Canta Galo e dizendo que o único que havia escapado tinha sido ele e passou
direto”.
Notas – 1) Na época, o Governador
do Estado era Presidente de Província.