Verdades
cruzadas - IV
CARLOS ROBERTO DE
MIRANDA GOMES, Professor aposentado do Curso de Direito da UFRN e Presidente da
Comissão da Verdade. Sócio do IHGRN.
Mesmo derrotado no período do Estado Novo, continuou na
política alcançando vitória no Parlamento do Brasil e o retorno à curul do
Poder Executivo que o levou à morte de forma trágica – o suicídio.
Foi-se o homem, mas ficou a fama.
O Brasil sem Vargas era
uma incógnita eleitoral nas semanas que se seguiram ao suicídio. Alguns
pensavam que Getúlio continuaria a eleger ‘post-mortem. O udenismo tinha
esperanças de que o poder bem manipulado poderia alterar o rumo dos
acontecimentos, extirpando as raízes do PTB órfão e retirando a motivação do
PSD, que não se privaria das condições de se beneficiar do poder.
Claudio Bojunga. JK o artista do impossível. RJ:
Objetiva, 2001
Nesse
clima de incerteza foi realizado o pleito para escolher o novo Presidente da
República, saindo vencedor Juscelino Kubitschek de Oliveira, pela legenda do
PSD, contra Juarez Távora (UDN-PDC), Adhemar de Barros e Plínio Salgado. Com
ele assume o Vice-Presidente João Goulart (PTB).
Sua
gestão é iniciada em pleno estado de sítio, com a deposição do Presidente
interino Carlos Luz e substituição por Nereu Ramos. Mas, apesar de muita
turbulência, inclusive de duas rebeliões armadas – Jacareacanga, no Estado do
Pará, provocada por militares da Aeronáutica e Aragarças, no Estado de Goiás,
respectivamente, em 1956 e 1959, conseguiu chegar ao final do seu governo com
grande aplauso do povo e reconhecimento da Nação, transferindo a Capital da
República para Brasília em 21 de abril de 1960, de onde, em 31 de janeiro do
ano seguinte, no Palácio do Planalto (DF) transferiu a faixa presidencial ao
seu sucessor Janio Quadros, vencedor da eleição pela coligação
UDN/PR/PL/PDC/PTN, tendo como Vice-Presidente o Senhor João Goulart
(PSD/PTB/PST/PSB/PRT) que fazia parte da chapa do seu principal opositor
Henrique Teixeira Lott (PSD/PTB/PST/PSB/PRT), Marechal do Exército brasileiro e
que se apresentava como exceção à regra dos militares de alta patente.
Concorreu
nesse pleito, ainda, o conhecido político paulista Adhemar de Barros (PSP).
Janio
Quadros assume o governo num clima de democracia e com a presença de grande
concentração popular, iniciando uma gestão marcada pela expedição de atos
excêntricos e procedimentos contraditórios, que abreviaram o exercício do seu
mandato, abruptamente terminada com a sua renúncia no dia 25 de agosto de 1961
– Dia do Soldado, cuja solenidade marcou o seu derradeiro ato presidencial,
pois logo no início da tarde anunciava a renúncia: “Forças terríveis
levantam-se contra mim e me intrigam ou difamam, até com a desculpa de
colaboração.”
Seu
gesto foi comunicado aos três ministros militares pelo General Pedro Geraldo e
em seguida ao Senador Moura Andrade pelo Ministro Oscar Pedroso Horta, sendo
encarregado ao jornalista Murilo Melo Filho fazer a entrega de cópia à Câmara
Federal na pessoa de Abelardo Jurema.[1]
Nessa
emergência assume o governo o Deputado Ranieri Mazzili, uma vez que o
Vice-Presidente João Goulart encontrava-se em viagem ao exterior, gerando
expectativas durante treze dias de incertezas, pois forças militares se opunham
à sua investidura, sob o comando do Marechal Lott e incontrolável pressão das
forças populares lideradas por Leonel Brizola e pelos estudantes. A solução
política encontrada naquela ocasião foi a aprovação, em regime de urgência
urgentíssima, no dia 2 de setembro, da Emenda nº 4 à Constituição, restringindo
os poderes da Presidência da República e da instauração de um regime de
gabinete (parlamentarismo), inteiramente fora das tradições brasileiras.
Com
esse novo formato, João Belchior Marques Goulart assume a Presidência da
República Federativa do Brasil no dia 7 de setembro de 1961, tendo como seu
Primeiro Ministro o Senador Tancredo Neves.
O
novo Presidente era pressionado para formar um governo à esquerda, com projetos
de reformas de base no campo agrário – organizam-se ligas camponesas com
atuação no nordeste através de Francisco Julião e da nacionalização de empresas
e bancos; criação da SUDENE e da CHESF, apontando para o início da
industrialização do Nordeste. Para isso Leonel Brizola percorria todo o Brasil
em pregação dessa ideologia.
Em 6
de janeiro de 1963 um plebiscito derruba o regime parlamentar e restaura o
presidencialismo dando ao Presidente o maior respaldo de que ansiava para
complementar as suas ideias reformistas, que foram o estopim para o início de
um clima de violência política, com realização de comícios inflamados – um dos
quais em 26 de fevereiro de 1964, promovido por Brizola com resultado de
pessoas feridas – era a radicalização inevitável.[2]
[1]
Registram os historiadores que a renúncia de Jânio seria um golpe, para, em seguida desistir dela, e retornar
mais forte ao governo, oportunidade que não lhe foi dada.
[2]
Os analistas políticos apontam o pouco preparo político e ideológico de JG –
“latifundiário com saudável preocupação social”, porém vacilante, fraco,
apavorado, demagogo, corrupto, populista de pouco talento, ambíguo – herdeiro
do legado de Getúlio.