31/07/2013

Pesquisa histórica

Por que Leônidas Hermes da Fonseca?


João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor da UFRN e membro do IHGRN e do INRG
Está completando 100 anos que houve, aqui no Rio Grande do Norte, a campanha eleitoral mais conturbada, para governador do Estado, de toda nossa existência. Nos jornais do Rio de Janeiro, sede do governo federal, a presença do Rio Grande do Norte era constante no noticiário, com destaques para o capitão J. da Penha e o tenente Leônidas Hermes da Fonseca. Que méritos tinha o jovem Leônidas para ser sugerido como candidato?

Conta Itamar de Sousa, no livro “A República Velha no Rio Grande do Norte”: Dizem os coevos que o desiderato de Dona Orsina Francione da Fonseca, esposa do marechal, era ver o filho Leônidas governador do Rio Grande do Norte. E José da Penha, amigo da família, militar e norte-rio-grandense de Angicos, fora escolhido para cumprir essa missão histórica. Aconteceu, porém, que Dona Orsina falecera em 1912 e a campanha sucessória realizou-se no ano seguinte.

Em outro trecho do seu livro, Itamar diz que a imprensa situacionista lembrava ao capitão José da Penha que a Lei nº 254 impedia ele e Leônidas de serem candidatos ao governo, por não residirem aqui, há pelo menos quatro anos.

Em fevereiro de 1910, J. da Penha era tenente e Leônidas, ainda, aspirante a oficial. Em março do ano seguinte, Leônidas é promovido de aspirante a oficial para 2º tenente e, em setembro, casa com a potiguar Adélia Cavalcanti de Albuquerque. Em fevereiro de 2012, ficou a disposição do Presidente da Republica, Hermes da Fonseca, seu pai, a fim de servir no estado maior do mesmo (casa militar). Em março, do mesmo ano, passou a ajudante de ordem, em substituição ao irmão Mário Hermes, eleito deputado federal pela Bahia. Na data de 29 de setembro de 1913, outra notícia dava conta que no dia 26, daquele mês e ano,  tinha nascido Leônidas, filho do tenente Leônidas.

O 2º tenente Leônidas Hermes aparece, várias vezes, no noticiário do Rio de Janeiro, por conta de seu interesse por cavalos: foi escolhido para representar o Ministério da Guerra, em um concurso hípico; importou cavalos da Inglaterra e comprou junto com Oldemar Lacerda, o potro inglês de três anos, Seythian, filho de Roquelaure e Seythia.

Em nenhum dos jornais antigos apareceu qualquer notícia que enaltecesse as qualidades do jovem Leônidas.

Houve, em janeiro de 1913, um incidente entre o tenente Leônidas Hermes e o deputado Raphael Pinheiro, por conta de acusações feitas por este ao irmão daquele, deputado Mário Hermes. Nesse incidente, Leônidas, fazendo menção de tirar uma arma, avançou para o Sr. Raphael, que, por sua vez, esperou-o de revolver em punho.

 “O Paiz”, de 29 de abril de 1913, noticiava: o povo de Natal, solidário com a maioria dos coestaduanos, que aclamam em todos os municípios o nome do tenente Leônidas Hermes, levantou hoje, em meeting, a sua candidatura, livre e espontaneamente, certo de que evitará com este nome, benquisto aos próprios governistas, as perturbações provocadas por outras candidaturas, sendo ele estranho as lutas regionais e ligado por laços de família ao Estado que não permitirá de forma alguma a continuação da oligarquia com o seu representante senador Ferreira Chaves.

De vários municípios do Rio Grande do Norte saíram telegramas apelativos para o marechal Hermes da Fonseca. Entre eles um de Macau, datado de 26 de abril de 1913, nos seguintes termos: Apelamos para o nobre sentimento e patriotismo de V. Ex. a fim de evitar a perturbação de paz do Estado e de sua liberdade. O povo abraça espontaneamente a candidatura Leônidas Hermes. Respeitosas saudações, Francisco Honório, Manuel Fonseca, Antonio Honório Filho, Joaquim Cardoso, Nicolau Tibúrcio, Eduardo Azevedo, Manuel Caetano, José Brito, José Bezerra e Leocádio Queiroz.

A resposta veio de imediato: Respondendo ao vosso apelo não compreendo que, no interesse da paz do Estado do qual sois filho, procureis um estranho que nem sequer conhece esta região e teria o grande inconveniente de ser descendente do Presidente da República. Não parece, pois, nem digno nem justo o vosso gesto, que viria criar uma grande oligarquia, sistema de governo contra o qual sempre protestei. Hermes Rodrigues da Fonseca.

Mesmo diante da manifestação do Presidente, a campanha prosseguiu. O capitão J. da Penha pretendia lançar a candidatura, no dia 12 de maio, dia do aniversário do Marechal Hermes da Fonseca. Ainda em junho, o capitão declarou que o tenente Leônidas Hermes chegaria brevemente a capital a fim de pleitear a sua eleição ao cargo de governador.
Nesse mesmo 12 de maio, J. da Penha escrevia para as filhas: O nosso Leônidas, filhinho de peixe, nada muito bem. À imprensa uma coisa e para mim outra pelos telegramas. O povo está correto, com entusiasmo e sem medo. Não retirarei mais o nome de Leônidas nem que chova tapioca ou qualquer outra coisa. Há de subir ou cair comigo, a Nação, vendo que tínhamos um pacto. Minha boca não se abre para dizer que ele não quer porque juraria falso.

Em agosto, em outra carta para as filhas: O povo coagido pela polícia começa a desanimar. Tudo se reanimaria, salvando-se, de repente, o que já naufragou, se Leônidas viesse, como se comprometeu e era necessário.

Em outro momento, escreveu sobre Pinheiro Machado, que influenciava o Presidente contra a candidatura de Leônidas: Quanto ao monstro Pinheiro Machado, Senhora Dona Annita (uma das filhas), seu pai ainda viu, agora, melhor do que os politiqueiros e os cobardes. Não é nem será nunca o presidente da República.

Por fim, Leônidas não apareceu por aqui. Por que, então, o capitão J. da Penha escolheu  figura tão apagada?


28/07/2013

Panzer


  História incrível -  

Tanque russo
                      
Não é sempre que se tira um tanque da Segunda Guerra de um lago, ainda mais um que foi usado por russos e alemães. Mesmo tendo ficado submerso por muitos anos, com uma 'ajeitadinha' o motor movido a diesel conseguiu funcionar.
 

Um Komatsu D375A-2 puxou um tanque abandonado do fundo do lago perto de Johvi,Estonia. O tanque soviético mod. T34/76A ficou estacionado no fundo do lago por 56 anos. De acordo com as especificações, é uma máquina de 27 toneladas que pode chegar à velocidade máxima de 53km/h.

De fevereiro a setembro de 1944, pesadas batalhas foram travadas na estreita faixa de 50 km de largura, na frente de Narva na parte noroeste da Estônia. Mais de 100.000 homens morreram e 300.000 feridos. Durante batalhas no verão de 1944,o tanque foi capturado do exército soviéitico e usado pelo exército alemão.(Este é o motivo de estar pintado com as cores alemãs na parte externa do tanque)  Em 19 de Setembro de  1944, tropas alemãs iniciaram uma retirada organizada ao longo da frente de Narva. Suspeita-se que deliberadamente jogaram o tanque dentro do lago, quando seus captores abandonaram a área.

Nessa época, um menino local, caminhado à beira do Lago Kurtna Matasjarv, notou rastros de um tanque em direção ao lago, mas sem sinais de saída. Por dois meses ele viu bolhas de ar saírem do lago. Isso lhe deu motivos de acreditar que deveria haver um veículo no fundo do lago. Alguns anos atrás, ele contou a história para o chefe local do clube de história da guerra 'Otsing'. Junto com outros membros do clube, o Sr. Igor Shedunov iniciou pesquisas de mergulhos no fundo do lago aproximadamente um ano atrás. Na profundidade de 7 metros eles descobriram o tanque enterrado debaixo de 3 metros de camada de turfa.

Entusiastas do clube, com a liderança do Sr. Shedunov, decidiram puxar o tanque para fora. 

A operação resgate começou às 09:00 e foi concluída às 15:00, com diversas paradas técnicas. O peso do tanque em conjunto com a declividade dificultou o trabalho, exigindo muito esforço. O peso do tanque, todo equipado com armamentos, chega a 30 toneladas, exigindo esforço similar. A preocupação era da escavadeira de 68 toneladas ter peso suficiente para não deslizar enquanto tracionava o tanque monte acima.

Depois que o tanque aflorou à superfície, viram que era  um troféu de guerra, que tinha sido capturado pelos alemães durante a batalha de Sinimaed (Blue Hills) seis meses antes de ser afundado no lago. Juntas, 116 conchas foram encontradas a bordo. Surpreendentemente, o tanque estava em boas condições, sem NENHUMA FERRUGEM,e TODOS OS SISTEMAS (COM EXCEÇÃO DO MOTOR) estavam em condições de uso. Essa é uma máquina muito rara, ainda mais considerando que lutou em ambos os lados com russos e alemães. Existem planos de fazer uma restauração total do tanque. Ele será exposto no museu de história de Guerra que sera fundado na vila de  Gorodenko na margem esquerda do Rio Narv.
      
  Não fazem mais destes!




26/07/2013

Gutenberg Costa

O Sócio Efetivo do nosso IHGRN, Gutenberg Costa convida confrades e confreiras para sua formatura. 
 
 

25/07/2013

Nossa história



Adélia Cavalcanti de Albuquerque, a esposa de Leônidas da Fonseca


João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor da UFRN, sócio do IHGRN e do INRG

O capitão J. da Penha, já eleito deputado, no Ceará, veio capitanear, aqui no Rio Grande, a luta contra a oligarquia Maranhão, movimento que se espalhava de maneira semelhante em outros estados. O que não parece claro, para muitos, é a razão da escolha, como candidato a governador, do filho do Presidente da República Hermes da Fonseca. Quem era, de verdade, Leônidas Hermes da Fonseca para ser escolhido, se isso parecia uma contradição com a luta contra as oligarquias? Resolvi pesquisar nos velhos jornais alguma informação que justificasse tal escolha. Em primeiro lugar procurei descobrir quem era a esposa de Leônidas, dada como natural do Rio Grande do Norte, pois nem o nome dela eu sabia.

Do jornal “O Paiz”, datado de 10 de setembro de 1911, extraí a informação que o 2º tenente Leônidas Hermes da Fonseca, filho do marechal Hermes da Fonseca, Presidente da República, casou, no dia 9 de setembro de 1911, no Palácio Guanabara, com Adélia Cavalcanti de Albuquerque, sobrinha do capitão Joaquim Brilhante, ajudante de ordem do Sr. chefe de Polícia. O ato civil foi às 2 horas da tarde, servindo de testemunhas, da noiva, o Dr. Belisário Távora, o general Percílio da Fonseca, o coronel Cyrillo Brilhante (tio da noiva), e o capitão Luiz Lobo, e do noivo, o senador Pinheiro Machado, o Dr. Álvaro de Teffé e o Dr. Sebastião de Lacerda. O ato religioso foi as 3horas e 30 minutos, na rica capela, armada no salão à esquerda da sala de espera, servindo de padrinhos, da noiva, a Exma. Sra. D. Orsina Hermes da Fonseca (mãe do noivo) e o capitão Joaquim Brilhante, e do noivo, o deputado Fonseca Hermes e a Exma. Sra. D. Honorina Brilhante (esposa de Joaquim).

Na notícia acima, nenhuma informação sobre os pais da noiva. Outro jornal do Rio de Janeiro dizia, apenas, que “a gentilíssima senhorita Adélia Cavalcanti de Albuquerque pertencia a distinta família do norte.

No jornal “A Época”, de 23 de março de 1913, foi postado, de Recife, por Paulino Guedes, Juiz de Direito “aposentado pelo governo dos Maranhões”, um artigo que contém o seguinte trecho: Como político do Rio Grande do Norte, venho pedir ao vosso conceituado jornal permissão para dar verdadeira informação do que se vai na política potiguar: - De Natal telegrafaram ao tenente Leônidas Hermes que a indicação de seu nome para governador daquele Estado não passava de exploração e que ele não acreditasse no valor da oposição; que viesse incógnito percorrer o centro do Estado para se convencer de que qualquer candidato anti-oligarquia seria derrotado etc...Em primeiro lugar devemos declarar que o candidato a governador de nosso Estado ainda não foi definitivamente escolhido, mas se essa escolha recair no tenente Leônidas onde estará a exploração?... Pois esse ilustre militar será indigno de administrar a querida terra de sua digna esposa? Não estará no gozo dos seus direitos políticos? Que exploração, pois haverá na escolha do seu nome?

Sem nenhuma informação sobre os pais de Adélia e a confirmação da naturalidade dela, solicitei ajuda aos colegas do grupo GenealBr. Recebi, então, de Pedro Auler informação que tinha encontrado no “Diário da Noite”, a notícia do falecimento de Adélia, e, pela data, foi procurar os registros da época no familysearch, cujo link me enviou, de onde extraí que: faleceu, em 8 de setembro de 1951, Adélia de Albuquerque Fonseca, com sessenta e seis anos, sete meses de idade, natural do Rio Grande do Norte, viúva de Leônidas Hermes da Fonseca, filha de Francisco Cavalcanti de Andrade e de Júlia Leopoldina Cavalcanti. Constava ainda que ela tinha deixado três filhos maiores.

Nos jornais mais antigos daqui, que examinei, a única informação que tinha, dava conta que Francisco Cavalcanti de Andrade tinha obtido uma licença por ter aberto seu estabelecimento em 1888.

Pelas informações acima, fui procurar no livro de batismos da catedral, ano de 1891, algum possível registro de Adélia. Encontrei, então, o seguinte registro: Aos vinte e oito de junho de mil oitocentos e noventa e um, na Matriz da Senhora da Apresentação, batizei, solenemente, a párvula Adélia, nascida aos 7 de março do mesmo ano, filha legítima de Francisco Cavalcanti d’Andrade e Júlia Leopoldina Cavalcanti, sendo padrinhos José Zacharias Vieira de Mello e Joanna Vieira de Mello. Fiz escrever este assento e assinei. Pe. João Maria Cavalcanti de Brito.

Estava confirmada a naturalidade de Adélia, mas que família era essa, aqui no Rio Grande do Norte? Fui, então, em busca do casamento dos seus pais. Encontro um registro que parece ser o casamento deles, mas na parte referente aos nubentes a imagem está com defeito. No documento está registrado que o casamento foi em 16 de abril de1887, na capela da Piedade, no Quartel Militar, sendo os pais do noivo, João Baptista d’ Andrade e Rozaura Cavalcanti d’Andrade e da noiva, Manoel Brilhante da Motta Cavalcanti e Ana Paula Cavalcanti d’Albuquerque. Júlia era natural de Timbáuba, Pernambuco.
Manoel Brilhante e Ana (ou Antonia) eram pais, também, de Amália Brilhante d’Albuquerque, Manoel Brilhante d’Albuquerque, João Brilhante d’Albuquerque, Cyrillo Brilhante d’Albuquerque e Joaquim Antonio Brilhante, estes dois últimos presentes no casamento de Adélia.

24/07/2013

JORNAL "HORA DO POVO" (FINAL)





15. A Prisão do Capitão Euclides
 
Sensível às 72 toneladas de granadas de artilharia que abarrotavam os paióis da fortaleza, o ministro da Guerra propõe uma conversação de paz, aceita pelos insurretos.
                O major Egídio Moreira de Castro e o tenente-aviador Pacheco Chaves são enviados pelo governo. No momento em que o tenente Newton Prado cruza o  portão para recebê-los, dois hidroaviões da Marinha sobrevoam o forte, bombardeando-o. A missão de paz degenera em conflito verbal e físico entre os embaixadores.
            Indignado, o capitão Euclides Hermes toma o telefone e protesta. Calógeras desculpa-se, argumenta que foi um engano: a Marinha não fora devidamente informada sobre a trégua. Lembrando as relações cordiais que mantinham até o início do levante, propõe um  encontro pessoal entre ambos. A oferta é aceita pelos revolucionários.
            Depois de passar o comando do Forte ao tenente Siqueira Campos, o capitão Euclides, a bordo do táxi 231, transpõe as linhas governistas sem ser molestado. Chegando à residência de seu pai, em Botafogo, telefona a Calógeras, que pede para aguardá-lo. Mas quem comparece é o capitão Marcolino Fagundes que lhe dá voz de prisão e o conduz ao Palácio do Catete. Lá, visivelmente embaraçado, Calógeras explica que: por decisão posterior do Presidente da República era forçado a prendê-lo, devendo também o Forte render-se incondicionalmente.
            Às 12h30, o capitão Euclides, por telefone, comunica a Siqueira Campos o resultado da missão de paz:
Estou preso, Siqueira. Eles traíram a palavra de honra dada... Eles querem que os oficiais se rendam, que deixem o forte, marchando desarmados,  um a  um, até se entregarem às tropas legais.
As mais próximas se encontravam na Praça Serzedelo Correia, a mais de    um quilômetro de distância. A oligarquia cafeeira pretendia liquidar a fatura com uma lição exemplar e definitiva. Em troca de suas vidas, à guarnição rebelada não bastaria render-se. A humilhação era o preço a ser pago por haverem levado a luta até aquele ponto.
           
16. A Decisão que Mudou a História
 
            Na sala de comando reúnem-se os quatro últimos oficiais que se mantinham em armas pela revolução. Todos eram tenentes. Nenhum tinha mais de 25 anos. Dois eram membros da guarnição original do Forte Copacabana: Siqueira Campos e Newton Prado. Outros dois haviam se juntado a ela no momento da sublevação: Mário Carpenter e Eduardo Gomes. Reinava uma paz temporária, pois o dispositivo legal recebera ordens de aguardar a rendição.
A decisão que sai da reunião é ousada, surpreendente, e muda o rumo da história, transformando a derrota do levante numa esmagadora vitória moral dos revolucionários.
Ao invés de rendição, a resolução é a de marcharem contra a tropa governamental, armados de fuzis e revólveres. Se fossem atacados, reagiriam. Se não, a parada seria no Palácio do Catete. O ânimo retorna e os preparativos são realizados em ritmo febril.
            Siqueira pede ao sergipano Manoel Ananias dos Santos, o soldado 108, e ao praça José Olympio, que desçam a bandeira do Forte. Dividiu-a em 29 pedaços, dando um a cada revolucionário presente - cujos nomes foram gravados a prego e bala numa das paredes internas da fortaleza. O último guardou-o consigo, para o capitão Euclides. Todos se municiaram, enchendo os bolsos com cartuchos. Ninguém deixou de levar menos de 200 tiros. Os oficiais barbearam-se, ajustaram seus uniformes, e desfizeram-se das insígnias do grau militar. Naquele momento, eram todos soldados.
            As 13h30, antes de transpor as barricadas, Siqueira fala aos companheiros:
Eles têm que atirar primeiro... Não se dá nenhum tiro antes... Deixa eu conversar com quem chegar primeiro... Agora, se derem um tiro na gente, não precisam esperar ordem de fogo
           
17. Arrancada Final
 
Marcharam pela rua e a calçada que margeia a praia de Copacabana. A avenida Atlântica, na época, tinha poucas construções, mas não estava deserta.  No caminho falavam aos moradores sobre seus motivos. Lenços brancos eram acenados das janelas. De longe, oficiais e praças do 3º Regimento de Infantaria lhes gritavam que se rendessem. Foram assim até o hotel Londres, onde pararam para beber água. Já haviam percorrido mais de um quilômetro.
Ao reiniciar a marcha, Siqueira verifica que alguns haviam desistido. Mas isso já não tinha importância.
Antes de atingirem a rua Barroso, o jovem engenheiro gaúcho Otávio Correia se aproximou do grupo. Dirigindo-se a Siqueira, a quem conhecera na casa da escritora Rosalina Coelho Lisboa, falou:
 Vou com vocês Antônio, preciso de uma arma...
Newton Prado entregou-lhe o fuzil que trazia e sacou a parabellum, que passou a empunhar na mão direita.
Ao chegarem na esquina da rua Barroso, hoje Siqueira Campos, uma surpresa. O tenente Segadas Viana, comandante de um dos três pelotões da 6ª Companhia do 3º Regimento de Infantaria, surge diante deles.
A 6ª Companhia, estacionada na praça Serzedelo Correia, havia recebido ordens de preparar-se para deter a marcha dos revolucionários, enquanto se providenciavam mais reforços. Seu comandante, o capitão Pedro Crisol Fernandes Brasil, dispôs então um pelotão na rua Barroso, comandado pelo tenente Segadas; outro na rua seguinte, Hilário de Gouveia, chefiado pelo tenente Miquelina; e o terceiro manteve na praça, sob comando do tenente Sawen.
Algum tempo depois, o tenente Segadas recebeu ordem de descer pela rua Barroso, em direção à praia, para observar a progressão dos reforços. Tendo atrás de si, a uns 30 metros, seu pelotão, logo que chegou na esquina deparou-se com os insurretos. Ao verem o tenente legalista, três soldados  tentaram dominá-lo. Ele sacou a arma, mas o tenente revolucionário Mário Carpenter, seu colega no 3º Regimento, ordenou aos praças que se detivessem. Enquanto isso, os 40 membros do pelotão apontavam suas armas contra os revoltosos e vice-versa.
Nessas circunstâncias iniciou-se um diálogo. Siqueira e Carpenter exortavam Segadas a acompanhá-los e este procurava fazer com que se rendessem. Esgotados os argumentos, o destacamento revolucionário retomou a marcha, mas, vindo da Hilário de Gouveia, surge o capitão Brasil que acaba dando a ordem de "fogo" ao pelotão do tenente Segadas. Um soldado obedeceu e disparou. A bala matou pelas costas o soldado Pedro Ferreira de Melo. Siqueira virou-se e devolveu o tiro. O combate começou.
 
18. Combate na Praia
 
Depois de sustentarem o tiroteio por alguns minutos em pé, na rua, os revolucionários pularam para a areia e se entrincheiraram por trás do paredão da calçada da avenida Atlântica. A esta altura, eram 15. Ali iriam se manter por mais de uma hora enfrentando o fogo combinado do Exército, da Polícia Militar e do Batalhão Naval.
Os pelotões do tenente Segadas e Miquelina, da 6ª Companhia, sofrem imediatamente várias baixas, inclusive seis mortes.
As forças legalistas acorrem em massa à praça Serzedelo Correia, em socorro aos pelotões do 3º Regimento de Infantaria. Até mesmo a tropa de guarda do Palácio do Catete foi deslocada para essa finalidade. Ao todo, 4.000 homens foram mobilizados contra os 18 do Forte.
Embora a desproporção entre as forças fosse esmagadora, o paredão representava excepcional proteção aos revolucionários. E a motivação com que pelejavam dava às suas ações a objetividade que faltava às forças governistas.
O voluntário Joaquim Maria Pereira Júnior, que sobreviveu ao combate, relatou:
"O tiroteio foi renhido, mas atirávamos com calma e precisamente... as forças do governo avançavam lentamente".
O primeiro revolucionário atingido pela fuzilaria foi Eduardo Gomes, o único que não sofreu um ferimento mortal. Teve o fêmur partido por uma bala, mas seguiu combatendo. Depois tombou o gaúcho Otávio Correia, com um tiro no coração.
Considerando a dificuldade de sufocar os revoltosos, foi cogitada a carga de baionetas. Os oficiais, no entanto, recusaram-se a empregá-la contra aqueles que, mesmo na condição de inimigos, lutavam tão corajosamente. Que se rendessem ou fossem mortos a tiros, nunca estripados.
A luta prosseguiu, até que a munição dos rebeldes se esgotou. Já havia caído o sargento José Pinto de Oliveira, com uma bala na fronte. O tenente Mário Carpenter, atingido no tórax, mergulhara na inconsciência. Estavam feridos também os praças Hildebrando da Silva Nunes e Manoel Antônio dos Reis - corneteiro, cujos toques de clarim vibravam duros golpes no moral das tropas governistas.
Siqueira Campos - com um ferimento na mão esquerda - e o tenente Newton Prado - baleado no abdome e na perna - ainda guardavam a última bala em seus revólveres. Aos demais combatentes já não restava nenhuma.
 
19. Retirada dos Praças
 
O tenente Siqueira Campos ordena, então, aos praças e voluntários civis, que que cada qual tome um rumo, mas não se deixem prender.
Dois conseguem fazê-lo com êxito.
O soldado 108, Manoel Ananias dos Santos, respirou fundo, saltou para cima do paredão e desviando-se das balas atravessou a avenida em busca de abrigo. "Os legalistas deram uma rajada contra mim, mas não acertaram", conta ele, quarenta e dois anos mais tarde ao jornalista Glauco Carneiro, da revista O Cruzeiro. "Consegui alcançar e pular o  muro de uma casa... havia no  jardim uma corda estendida com vários calções de banho." Disfarçado de banhista, ele conseguiu atravessar o túnel, por volta das 16h30, chegando em seguida à residência de um sargento, na rua Mena Barreto, Botafogo.
O voluntário Joaquim Maria Pereira Júnior escapou pelo mar:
"Esgotada a minha munição, ordenou o tenente Siqueira Campos que eu me retirasse... Atirei o meu fuzil ao mar e logo adiante nadei até um lugar abrigado, onde alguns operários humanitários me vestiram à paisana".
Preso, ao tentar romper o cerco, o soldado João Anastácio Falcão de Melo fez um significativo relato do acontecimento:
"Quando não tinha mais munição fui avançado, com um bruto ferimento na perna, mas com um punhal na mão. Me pegaram logo adiante e um oficial legalista me chamou de bandido. Aquilo moeu-me a alma. Lutara de peito descoberto contra gente armada em número muito superior e aquele homem a chamar-me de bandido! Depois, sendo da Paraíba, de uma terra em que  o  inimigo é seguro pelo nariz e degolado a frio, eu nunca tinha matado ninguém até aquele dia".
O inquérito policial registra também as prisões dos soldados Francisco Ribeiro de Freitas, Benedito José do Nascimento, Heitor Ventura da Silva e do civil Lourival Moreira da Silva. Em seus depoimentos eles admitem que estavam na praia no momento dos combates, porém negam terem feito uso das armas que portavam.
 
20. A Última Bala
   
Como os revolucionários não respondiam mais aos disparos, o capitão Brasil e o tenente Segadas Viana suspenderam o fogo e iniciaram um avanço    lento e cuidadoso em sua direção. Já tinham caminhado cerca de vinte metros quando, repentinamente, um contingente de 100 homens do 3º Batalhão de Infantaria da Policia Militar, sob o comando do coronel Tertuliano Potiguara, sai da rua Barroso, em veículos de transporte apelidados de viuvinhas. Em alta velocidade, chegam ao local onde se encontram Siqueira Campos e seus companheiros.
Calar baioneta! Avançar! Foi a ordem de Potiguara.
Debaixo de uma gritaria infernal os atacantes se precipitam contra uma fortaleza sem muralhas guarnecida por mortos e feridos. Mas a surpresa ainda os espera.
A última bala do tenente Newton Prado é certeira, derrubando para sempre o atacante mais afoito. Siqueira aguarda até o último instante para disparar a sua, atingindo na boca o sargento Lindolfo Garcia Godinho que lhe enterrara a baioneta no fígado.
Levantem os vivos! Os vivos levantem! - uivam os comandados de Potiguara, tomados de histérico frenesi.
Não há quem os possa atender.
Junto ao corpo inerte do tenente Mário Carpenter jaz o seu quinhão da bandeira do Forte. Nele está escrito:
                        "Forte Copacabana - 6 de julho de 1922
Aos queridos pais ofereço um pedaço da nossa bandeira em defesa da qual resolvi dar o que podia…minha vida".
 
21. Epílogo
 
O jornal Gazeta de Notícias foi o primeiro a dar a notícia de que o número de heróis que participaram da saga foi de 18. Não seria a primeira nem a última vez em que o rigor histórico haveria de ceder lugar à lenda. Cantado em verso e  prosa, o feito dos 18 do Forte incendiou corações e mentes e ganhou a força do mito.
Apesar de mortalmente ferido, Siqueira Campos sobreviveu. Em breve estaria comprovando que não fora precipitado o juízo expresso pelo escritor Coelho Neto, no artigo Arrancada Radiante. Mesmo opondo-se aos objetivos do levante, ele conclui:
"Que povo não se orgulharia de possuir na raça tais leões?"
A oligarquia cafeeira perdera as condições de exercer tranqüilamente o seu poder autocrático. Mais radicais e mais amplas, novas revoluções se sucederiam até a sua derrocada em 1930.
 
SÉRGIO RUBENS DE ARAÚJO TORRES