20/07/2013

João Barbosa Pimentel, bisneto de João Lostau Navarro


João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Professor da UFRN, sócio do IHGRN e do INRG
Hélio Galvão listou, no seu livro “História da Fortaleza da Barra do Rio Grande”, os seguintes filhos de Francisco Lopes e Joanna Dornelles: Paula Barbosa, casada com Theodósio de Grasciman; Manoel Lopes Pimentel, casado com Maria Pinta; Joanna Lopes; Gregório Lopes Pimentel; Izabel Dornelles, casada com Manoel de Abreu Friellas; Francisco Dornelles, casado com Maria da Silva Figueiredo; e Cipriano Lopes Pimentel, casado com Tereza da Silva. Já fizemos um artigo sobre Francisco Lopes, genro de Manoel Rodrigues Pimentel e Maria Lostau, esta filha do francês João Lostau de Navarro.

A maioria dos estudos sobre os descendentes de João Lostau de Navarro é dedicada a Cipriano Lopes Pimentel, que gerou Cipriano Lopes Galvão, ou a Paula Barbosa, por suporem, que o marido dela, Theodósio de Grasciman, era filho do holandês Joris Garstman. Entretanto, outro filho de Francisco Lopes e Joana Dorneles, não constante da lista de Hélio Galvão, deixou descendência no Rio Grande do Norte, mas seu nome escapuliu das anotações dos nossos historiadores. Seu nome, João Barbosa Pimentel.

O primeiro registro que encontro, sobre João Barbosa Pimentel, é o batismo de Constantino, filho de Felipe da Costa e Helena da Silva, em 20 de fevereiro de 1695, no qual ele foi padrinho junto com Pascoal Gomes de Lima. Nesse registro ele aparece como filho do sargento-mor Francisco Lopes. Posteriormente, nesse mesmo livro de batismos, encontro registros de três filhos do dito João Barbosa Pimentel com sua mulher Mariana de Azevedo Cerqueira, batizados na Capela de Nossa Senhora do O’, da Aldeia de Mipibú.

Francisco foi batizado, em 17 de abril de 1704, tendo como padrinhos Manoel de Abreu Friellas e o capitão João de Carvalho Marinho; Antonia foi batizada, em 14 de junho de 1708, tendo como padrinhos, o Padre Francisco Lopes e Florença de Grasciman (filha de Theodósio); Thereza foi batizada, em 5 de novembro de 1709, tendo como padrinhos Faustino Tinoco, e Catarina de Azevedo, filha da viúva Maria de Araújo Barros.

Encontramos outros filhos através de registros de casamento: Em 22 de junho de 1729, Joana Dornelles, filha do capitão João Barbosa e de Mariana, casou com o Alferes Nazário Lopes da Cunha, filho de Estevão Lopes, falecido, e Úrsula Borges; ele viúvo de Antonia Xavier e, ela de Manoel da Silva Porto; em 18 de agosto de 1734, Apolônia Dornelles de Jesus, filha de João Barbosa e Mariana, casou com o capitão Francisco de Sousa Gusmão, filho do Doutor Dionísio Peres de Gusmão e Leonarda Peres de Gusmão.

Não encontrei mais registros sobre Thereza e Francisco, mas Antonia, que se tornou Antonia Barbosa de Azevedo, em 6 de junho de 1747, casou, na Capela de Nossa Senhora do O’, com Nazário Lopes da Cunha, filho de Nazário Lopes da Cunha e Antonia Xavier. Isto é, Antonia casou com o enteado de sua irmã, Joana Dornelles. Pela idade, Antonia não deve ter tido filhos.
Dois sobrenomes aparecem na descendência de Manoel Rodrigues Pimentel e Maria da Costa Maior, filha de João Lostau, sem que se saiba de onde provinha: Barbosa e Dornelles. Um detalhe é que não se sabe, também, quem era a esposa de João Lostau.

Da mesma forma encontramos o sobrenome Barbosa Pimentel, em outras pessoas, sem descobrir sua relação com os filhos de Francisco Lopes e Joanna Dornelles. Um exemplo é o que segue: em 14 de dezembro de 1751, na capela de Nossa Senhora do O’, Manoel Barbosa, filho de João Barbosa Pimentel, e Antonia Neta, casou com Izabel Maria do Anjos, filha de Gonçalo Fernandes das Neves, falecido, e Maria Antunes, sendo testemunhas João de Oliveira Freitas e o capitão Manoel da Costa Travassos, casados. Quem era esse João Barbosa Pimentel, casado com Antonia Neta, que não se repete, posteriormente, nos registros existentes?

Outro registro diz que: em 15 de julho de 1778, nascia Helena, filha do tenente José Barbosa Pimentel e Josefa Francisca Bezerra, do Assú, neto paterno de Manoel Rodrigues Pimentel e Clara Barbosa de Sousa, e pela paterna de Francisco Calheiros e Ana Maria da Conceição, do Assú, sendo testemunhas Joaquim de Morais e sua mulher Maria Soares. Em de abril de 1778, Helena, com 7 dias, faleceu. Manoel Rodrigues Pimentel e seu filho José parecem descender de Francisco Lopes, diferentemente de um certo Manoel Rodrigues Pimentel que foi exposto e criado na casa de Brízida Rodrigues, que talvez não tenha nenhuma relação com a família.

Como escrevemos em artigo anterior, na Fazenda Santo Antonio, da freguesia de Santana do Matos, José Barbosa Pimentel, de 30 anos, casou com Maria Rita Bezerra, de 25 anos, dispensados do parentesco em que estavam ligados, no ano de 1824. Ele era filho de José Barbosa Pimentel, mas não há no registro o nome da esposa (seria Josefa Francisca Bezerra, acima?). Era desse casal Jose Barbosa Pimentel e Maria Rita que nasceu outro José Barbosa Pimentel Junior (28 de fevereiro de 1832), que casou com Maria dos Anjos Pereira Fagundes, filho de Lopo Gil Fagundes.

José Barbosa Pimentel Junior e Maria dos Anjos geraram, entre outros, os seguintes filhos: Maria, nascida em 22 de novembro de 1851, tendo como padrinhos Major José Martins Ferreira e sua mulher Josefina Maria Ferreira (meus trisavós); Valentim, nascido em 4 de fevereiro de 1862, tendo como padrinhos Antonio Toscano Barbosa Pimentel (deve ser o irmão de José Barbosa Junior, que nasceu em 19 de abril de 1833) e Jerônimo Cabral de Oliveira Câmara; Jerônimo, nascido em 3 de maio de 1868, tendo como padrinhos Nossa Senhora e Manoel José Pereira Fagundes; Maria, nascida em 6 de Junho de 1864, tendo como padrinhos Pe. Elias Barbalho Bezerra e Francisca das Chagas de Jesus; José, que faleceu, na idade de 4 meses, em 1853.
João Barbosa Pimentel, fº de Francisco Lopes

19/07/2013

JORNAL "HORA DO POVO" V



11. Malogra a insurreição
Na Vila Militar estava aquartelado o 1º Regimento de Infantaria, principal corpo de tropa a partir do qual os revolucionários pretendiam irradiar o levante às demais unidades da 1ª Divisão de Infantaria.
O comandante do regimento era o coronel Nestor Sezefredo Passos, oficial governista que, às 22h15 do dia 4, recebeu ordens para prender diversos oficiais que haviam tomado o trem na Estação Central com destino à Vila Militar. O coronel Sezefredo incumbiu o tenente-coronel Álvaro Mariante de organizar patrulhas para aprisionar os insurretos, antes que esses sublevassem o regimento.
Assim, quando desembarcaram na Vila Militar, foram presos o capitão Agenor Aguiar, os tenentes Aníbal Duarte, Leônidas Hermes da Fonseca e outros três revoltosos. Também num alojamento da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais, conhecida como Baiúca, as patrulhas do tenente-coronel Mariante detiveram vários oficiais. Desse modo, mais de uma centena de revolucionários foi sendo detida, desarticulando o levante.
O tenente João Alberto Lins e Barros, que poucos anos mais tarde se converteria num destacado expoente do Movimento Tenentista, integrava, na época, o 1º Regimento de Artilharia Montada, sediado na Vila Militar. Eis o testemunho que apresenta sobre o seu malogrado batismo de fogo:
"No dia 4 de julho, durante a noite, todos nós, revolucionários, estávamos a postos para erguer a tropa ao primeiro sinal... Éramos poucos, dentro de um regimento considerado legalista e precisávamos de um apoio vindo de fora do quartel para fazer o levante... fomos presos com a impressão de que o movimento abortara. Só depois de transferidos de unidade, quando nada mais podíamos fazer, soubemos que a Escola  Militar e o Forte Copacabana estavam revoltados".
À meia-noite, no cassino do 1º Regimento de Infantaria, estavam reunidos vários grupos de oficiais. Entre eles encontrava-se o 2º  tenente Frederico Cristiano Buiz. Pouco antes da 1h, Buiz dirigiu-se à sua companhia, armou os  praças e formou dois pelotões. O  primeiro recebeu a  missão de guarnecer a frente do quartel. Com o outro sob seu comando, retornou ao cassino. O objetivo era prender o coronel  Sezefredo e os oficiais governistas  que ali se encontravam.
O cassino foi  cercado. Irrompendo pela porta, pistola à mão, seguido por praças de armas embaladas, Buiz surpreendeu os oficiais, mas não conseguiu dominar a situação. Após um cerrado tiroteio, no qual foi  mortalmente atingido o capitão José Barbosa Monteiro, Buiz acabou dominado. Falhara o levante do 1º Regimento de Infantaria.
Nas demais unidades o quadro não era alentador. O capitão Luís Gonzaga Borges conseguiu sublevar a Companhia de Pontoneiros do 1º Batalhão de Engenharia, mas não logrou assumir o controle da unidade. O tenente Luís Carlos Prestes, outro futuro vulto da história nacional, responsável pela rebelião no 1º Batalhão Ferroviário, contraíra tifo, no dia 13 de junho, ficando fora de combate. Na Escola de Aviação Militar, quando os pilotos e observadores se dirigiam para o campo, a fim de experimentar os motores das aeronaves, um batalhão governista ocupou os hangares, neutralizando a rebelião. Também na Escola de Sargentos de Infantaria, Fortaleza de Santa Cruz e 15º Regimento de Cavalaria, unidades cuja adesão era esperada, os oficiais revoltosos retraíram-se frente aos reveses iniciais.
Às 6h do dia 5, o marechal Hermes da Fonseca e o general Joaquim Inácio são presos num sítio, onde aguardavam contato com os comandantes das unidades rebeladas. O sítio de propriedade de um dos quatro filhos do marechal, o deputado Mário Hermes, ficava próximo à Vila Militar, nas imediações da estação ferroviária cujo nome lhe rendia homenagem - Marechal Hermes.
A Escola Militar ainda sustentava um desigual duelo de artilharia com as forças da Vila. Às 9h empreenderia a retirada, seguida da rendição ao meio-dia. Só no Forte Copacabana a bandeira da revolução seguia desfraldada.
A guarnição militar do Mato Grosso havia cumprido o compromisso de sublevar-se, concentrando em Três Lagoas, na fronteira paulista, a Divisão Provisória Libertadora, formada a partir das diversas unidades rebeladas. No entanto, surpreendida pela evolução desfavorável dos acontecimentos no Rio de Janeiro, permaneceu estacionada até a deposição das armas, em 13 de julho
12. Falam os Canhões
            Na manhã do dia 5 os disparos do Forte continuam a atingir pontos da cidade, com uma precisão que alarmou as autoridades e assombrou os membros da Missão Militar Francesa.
            Durante a fase de organização do levante, Siqueira Campos e outros oficiais do Copacabana haviam preparado cuidadosamente novas tabelas para o tiro de canhões, com redução de carga, para modificar a trajetória dos projéteis, encurtando seu raio de ação. Os cálculos foram revisados por um antigo professor de balística da Escola Militar. Com isso os canhões do Forte tornaram-se aptos a atingir alvos da cidade considerados invulneráveis.
Às 9h, o general Carneiro de Fontoura, chefe da 1ª Região Militar, nomeia o coronel Nepomuceno da Costa comandante das Forças de Assalto ao Forte Copacabana, e encaminha uma intimação à sua guarnição.
A resposta foi um disparo sobre o quartel-general situado no edifício do Ministério da Guerra, na praça Duque de Caxias. O tiro não foi preciso, atingiu os fundos do prédio da Light and Power e a casa número 216 da rua Barão de São Félix.
O ministro da Guerra, Pandiá Calógeras, tomou então a iniciativa de telefonar para o Forte, a fim de protestar contra o bombardeio. Calógeras não era militar. Não percebeu que sua reclamação indicava com precisão a localização do alvo atingido. Com a informação prestada pelo ministro, os revolucionários prontamente refizeram os cálculos, ajustaram a pontaria e realizaram novo disparo. O impacto do obus destruiu parte da ala esquerda do Palácio da Guerra. Em seguida, mais dois tiros explodiram no pátio interno do prédio, onde tropas do Exército e da Marinha estavam estacionadas, espalhando morte e destruição. Rapidamente o quartel-general foi transferido para o Corpo de Bombeiros, do outro lado do Campo de Santana,  e,  em seguida,  para o quartel-auxiliar do Largo de Humaitá.
13. O Forte esta isolado
Às 4h da madrugada do dia 6, o capitão Euclides Hermes reúne todos os oficiais que participam da defesa do Forte e expõe claramente a situação vivida. O levante da Vila falhara. A Escola Militar tinha deposto as armas. O mesmo ocorrera com o 15º de Cavalaria. A fortaleza de Santa Cruz não havia aderido. O marechal Hermes e o general Joaquim Inácio estavam presos. O Forte Copacabana era a única unidade que se mantinha rebelada. Estava completamente isolado. Poderia resistir por mais tempo, em virtude de seu imenso poder de fogo, mas as chances de vitória eram inteiramente nulas.
O capitão prosseguiu declarando que, em vista da precariedade da situação, não se considerava no direito de sacrificar seus companheiros. Facultava, portanto, a cada um, a opção pela resistência ou pela retirada.
Desse modo, dos 301 homens que iniciaram a insurreição do Forte Copacabana, restaram apenas 29 - cinco oficiais, dois sargentos, um cabo, dezesseis praças e cinco voluntários civis. Os demais deixaram as armas e se retiraram.
14. Contra-Ataque Mortífero
Pouco tempo depois, a Marinha inicia uma ofensiva contra o Forte.
Os encouraçados São Paulo e Minas Gerais, escoltados pelo destróier Paraná, cruzaram a barra. Os revolucionários são atacados pelo fogo dos canhões de 305 milímetros do São Paulo. O impacto das granadas chega a estremecer o solo. Ao organizarem o contra-ataque, os 29 defensores constatam que o motor que movimenta seus canhões de 305 milímetros está inutilizado. Então, manobrando a braço os canhões de 190 milímetros, a guarnição responde ao fogo.
O São Paulo é atingido. O tiro disparado pelo tenente Siqueira Campos explodira na torre de comando. A esquadra recua para uma distância segura, e não volta a entrar em ação. O Forte faz novos disparos contra a Ilha das Cobras, o Forte do Vigia, o Palácio do Catete.

18/07/2013

"LUMEN FIDEI" (LUZ DA FÉ)

PADRE JOÃO MEDEIROS FILHO (pe.medeiros@hotmail.com)

A primeira Carta Encíclica de Francisco dá o tom de seu estilo pastoral, apesar do projeto inicial ter sido concebido por Bento XVI, que ali traçou algumas ideias. No entanto, o uso de certas expressões, a riqueza de imagens a que faz referência, algumas citações de autores antigos e modernos fazem desse texto uma introdução ao pensamento do atual Pontífice, permitindo melhor compreensão de sua visão teológica.
No documento, Francisco emprega três verbos: caminhar, construir, confessar. São os mesmos de sua primeira homilia aos cardeais, no dia seguinte de sua eleição. De certa forma, podemos dizer que a encíclica está estruturada sobre este eixo. Dividida em quatro capítulos, mostra que se deve continuar a experiência que a Igreja viveu durante O Ano da Fé, com tantos fatos significativos.
Há encíclicas que se tornaram famosas pelo seu conteúdo, por exemplo, a Rerum Novarum, de Leão XIII (1891). Outras passarão à história pelo caráter inédito de sua gênese. É o caso da Lumen Fidei. O texto escrito “a quatro mãos” tem de insólito o fato de que os dois protagonistas estão vivos: um papa emérito e outro reinante. Não seria um caso sem precedentes, se Bento XVI fosse falecido, pois a primeira Carta de Ratzinger (Deus caritas est) utilizou material póstumo de João Paulo II. A novidade, portanto, está no fato da Lumen Fidei ter dois coautores. É o que expressa Francisco no começo do documento: Bento XVI “já tinha completado praticamente uma primeira redação desta carta encíclica sobre a fé. A ele agradeço de coração e, na fraternidade de Cristo, assumo o seu precioso trabalho, acrescentando ao texto algumas contribuições”.
No século XX, Pio XI bateu recorde em matéria de encíclicas, escrevendo quarenta e uma. No entanto, Francisco é o papa que publica a primeira em menos tempo, quase quatro meses, após ser eleito. Mais rápido ainda que João Paulo II, ao escrever Redemptor hominis, no sexto mês de seu pontificado
Desde sua eleição como Papa, Bergoglio vem insistindo sobre a centralidade da fé. Parece-nos que seu programa está sintetizado na última parte da encíclica: “A luz da fé não nos leva a esquecer dos sofrimentos do mundo. Quantos homens e mulheres de fé receberam a luz das pessoas que sofrem! São Francisco de Assis, do leproso; a beata Madre Teresa de Calcutá, dos seus pobres”. 
Talvez pudéssemos resumir a Lumen Fidei em poucas palavras: um humanismo evangélico. “A fé não é a luz que dissipa todas as nossas trevas, mas é uma lâmpada que guia nossos passos na noite e isto basta para o caminho. Não é prestar assentimento a um conjunto de verdades abstratas, mas fazer a vida entrar em comunhão plena com o Deus vivo”. A fé não é obscurantista, tampouco intransigente. É a primeira vez que um papa fala nisso, contradizendo a tese de alguns: “o catolicismo não pode se separar da intransigência”.  Na Lumen Fidei, o Papa diz claramente que o católico não pode ser arrogante. Ao contrário, deve ser humilde, pois se refere a uma verdade que não lhe pertence: o Deus do Amor e da Misericórdia. Sem dúvida, é uma mensagem cheia de paz, sabedoria e bondade.
Francisco, pouco a pouco, está ocasionando mudanças na Igreja e na relação desta com a sociedade. Seus gestos têm mostrado uma nova face do catolicismo. Assim o fez, quando afirmara que deseja uma Igreja pobre e para os pobres ou anunciou que “para minha própria saúde mental, fico morando em Santa Marta, porque não quero viver isolado”. Ou, ainda, quando, em audiência para seis mil seminaristas,  noviços, num discurso improvisado, proferiu estas palavras: “dói ver uma freira ou um padre com o último modelo de carro”. Em Roma, há quem antecipe que, após a Lumen Fidei, logo virá outra, tendo como eixo a bem-aventurança bíblica dos pobres.

AS ROCAS



AS “ROCCAS”                                      Gileno Guanabara.

As Roccas, mantida a grafia da época, foi um dos primeiros bairros da Cidade do Natal.  Possível que o nome tenha derivado de “rocha”, os arrecifes em que foi construída a Fortaleza dos Reis. Começava desde o “Alto da Castanha”, ao Noroeste do morro e vinha margeando em dunas curvas, até a Praia do Canto do Mangue. Ocupava uma área de terrenos alagados. Casas e coqueiros vistos nas partes altas, enquanto as casas de frente eram banhadas pelas águas do Rio Potengi, dando-lhe a aparência de canais venesianos. Na lembrança dos mais antigos, as Roccas fora “cama de baleia”.

 A principal artéria chamou-se de Rua São João, nome derivado das fogueiras e da animação das festas de São João. No alto do morro foi edificada a capela de São João, o nome do padroeiro. Apesar de as águas do Rio Potengi banharem o eito das casas, formando canais, não impedia de ser a Rua São João a mais movimentada. Sua população era composta de operários e pescadores, conhecidos por “canguleiros” dada o consumo do peixe cangulo.

Além da Rua São João, a Rua Dr. Pereira Simões, direcionada no sentido do Nascente, foi também importante para a consolidação do Bairro. Seu nome original era “Rua Cordão Azul”. Iniciava-se às margens do Rio Potengi, provavelmente onde se edificou o cais do porto, passando pela Estação da Estrada de Ferro Central, indo até o alto do Monte Petrópolis, onde está o Hospital Onofre Lopes (ex-Hospital Juvino Barreto). Tem provavelmente hoje o percurso que vai pela atual Rua do Motor, passando onde está situada o Clube Araruna de Danças Semi-Desaparecidas.

Das primeiras ruas tem-se ainda a “Rua Paraense”. Eam poucas casas edificadas pelo capitão João Fernandes de Almeida, conhecido por “Joca do Pará”, policial truculento e de muita valentia, de que derivou o nome da Rua, correspondente a atual Rua Expedicionário José Varela.

Mais ao Norte da Praia do Canto do Mangue existia a praia denominada “As Limpas”, à margem direita do Rio Potengi, entre o canal que separava as dunas do Forte dos Reis Magos. “As Limpas” corresponde hoje à sede do Iate Clube e do quebra-mar ao longo do Quartel de Regimento de Obuzes do Exército.

Ao Sul de “As Limpas” foi edificada durante a Segunda Grande Guerra a base de abastecimento e manutenção dos hidroaviões que pousavam no Rio Potengi. Na margem do Rio, havia a torre de controle e a pista de acesso, através de que eram rebocadas as aeronaves. O declive de acesso, nos quais os aviões eram içados do Rio Potengi, designou o local que ficou conhecido como “A Rampa”. A desativação da “Rampa” ocorreu com a construção da Base Militar de Parnamirim.

Em direção ao centro, no lugar mais alto de “As Limpas”, foi construída a capela de Santo Reis, por iniciativa dos Capitães Julião Bento da Costa e Antônio Milhomens. Durante o dia de Santo Reis - dia 06 de janeiro – os católicos acorriam em romaria à capela, a pé, a cavalo, ou através do Rio Potengi. O percurso de dois quilômetros era feito em pequenas embarcações a remo, devidamente enfeitadas, até as “Limpas”, a fim de participar da missa e outros atos religiosos.

“Canguleiro”, nascido na “Roccas”, João Café Filho defendeu operários, criou sindicatos e fez política. Revolucionário de 1930, se pronunciou contra o golpe do “Estado Novo” de 1937. Perseguido, exilou-se na Argentina. Foi eleito, no ano de 1950, Vice-Presidente da República. Com o suicídio de Vargas, assumiu o cargo de Presidente. Moradores ilustres das “Roccas”: “Toré”; “Saquinho”,“Badidiu”; “Biró”, “Paulo Izidro”, e “Jorginho”, foram estrelas do futebol anteriores a Pelé.

O Bairro das Roccas é o berço das manifestações culturais. As comemorações de Santo Reis; de São João; os cultos de “Umbanda”; o carnaval dos cordões e das tribos de índios, são parte do calendário da cidade. Cornélio Campina preservou, durante anos, o Clube Araruna de Danças Antigas e Semi-desaparecidas. Na atividade gastronômica, o pirão escaldado da cabeça de peixe representou o prato predileto servidos nas peixarias de mesas rústicas, de chão batido e cobertas de palha da Rua São João.

Desde cedo a atividade industrial do algodão e da fibra de agave se instalou nas Roccas (Anderson Clayton; Whorton Pedrosa; Machine Cook; João Câmara). Outros espaços se incorporaram desde os campos cultivados da Lagoa do Jacó: o Estádio do João Câmara; a Vila Ferroviária, interligados ao “Areal” e ao Monte Petrópolis.

 À Feira das Rocas acorriam os moradores das praias de Pitangui, Barra do Rio e Muriu. Embalados pelos ventos do mar, adormeciam nas areias do morro de Genipabu.  Cedo atravessavam o Rio Potengi.  Traziam cestas de camarão, peixe moqueado, mangaba, cambuim, ubaia doce, pitomba e beiju de mandioca. O Mercado Público e a feira semanal, que se realizavam na Rua Almino Afonso (STTU), passaram para o pátio do Mercado das Roccas, local onde permanecem até hoje.

17/07/2013

JORNAL "HORA DO POVO" IV




8. A Prisão do Marechal Hermes
               
Às 23h, por ordem do Presidente da República, o marechal Hermes é preso e recolhido ao 3º Regimento de Infantaria, na Praia Vermelha. A afronta viria colocar mais lenha na fogueira, e sua libertação, ao meio-dia do dia 4, não detém a marcha dos acontecimentos.
A truculência empregada pela oligarquia cafeeira para sufocar o questionamento à fraude eleitoral que patrocinara voltava-se contra ela.
O líder das bancada fluminense, senador Irineu Machado, pronuncia inflamado discurso que conclui dizendo:
"Espero dos acontecimentos e da história os grandes dias em que arrancaremos desse pântano mefítico a nossa nacionalidade. Será essa, ainda uma  vez, a obra  grandiosa do Exército".
Também o líder da bancada gaúcha na Câmara Federal, deputado Otávio Rocha, não poupa adjetivos para incentivar a resposta revolucionária que está prestes a ser desencadeada:
"De joelhos, nunca. De pé e de frente eu encaro o ditador...  fiquem para todo e sempre malditos os que... tiveram a ilusão de que os césares eram eternos e o poderio da Terra o supremo bem"..
                A única pessoa a quem foi permitido visitar o Marechal Hermes, durante a sua estada de dezessete horas na prisão, foi o ex-presidente Nilo Peçanha. A conversa foi reservada e não há relato sobre o que foi discutido. Porém o marechal Hermes não deixou o 3º Regimento de Infantaria com a mesma firmeza de propósitos que havia demonstrado até antão. Talvez porque Nilo de alguma forma o tenha feito entender que tanto ele quanto o governador Borges de Medeiros, que até então vinham apoiando seus pronunciamentos, consideravam inoportuno o recurso à insurreição naquele momento.
            Borges formalizaria essa posição em manifesto publicado no dia 7, no jornal gaúcho A Federação:
"Nada mais absurdo nem mais condenável do que corrigir uma violência com outra violência"...
                Declarando-se "solidário com os vencidos", Nilo Peçanha empregaria seus últimos vinte meses de vida na defesa dos tenentes rebelados, e em conversações que conduziriam à eclosão de novo levante, na cidade de São Paulo, dando início à Revolução de 1924.
                 
9. O Forte Está Pronto
À noite, cerca de duzentos oficiais, praças e voluntários civis começam a cruzar os portões do Forte, para reforçar a sua guarnição. Às 22h toda uma bateria do Forte do Vigia, situado na outra extremidade da praia de Copacabana, bairro do Leme, integra-se nesse esforço. São 54 homens comandados pelo tenente Fernando Bruce.
Às 23h30 o general Bonifácio Gomes, comandante do 1º Distrito de Artilharia de Costa, chega ao Forte com ordem expressa de destituir o capitão Euclides Hermes do comando da unidade. Vem acompanhado do capitão José da Silva Barbosa, a quem pretende investir na função. Ambos são presos.
Uma companhia do 3º Regimento de Infantaria, que havia sido deslocada para apoiar a missão do general, é intimada a recuar. O tenente Mário Carpenter, que integra a companhia, confraterniza com os revoltosos e também adere ao levante.
À 1h15 de 5 de julho, um disparo para o céu anunciava o compromisso do Forte Copacabana com a revolução. Conforme o combinado, as outras fortalezas deveriam confirmar o apoio disparando também os seus canhões. A resposta é o silêncio.
Mas o Forte não se deixa impressionar. Seus canhões alvejam a desabitada ilha de Cotunduba. Depois começam os tiros para valer: os dois primeiros, dirigidos ao 3º Regimento de Infantaria e ao Forte do Vigia.
10. O Levante da Escola Militar
               
Às 23h do dia 4 teve início o levante da Escola Militar de Realengo. Por iniciativa do corpo de oficiais instrutores, composto por diversos protagonistas das futuras rebeliões tenentistas, entre os quais os tenentes Victor César da Cunha Cruz, Ricardo Hall, Caio de Albuquerque Lima, Edmundo Macedo Soares e Juarez Távora, cerca de 600 cadetes de várias armas entram em forma e começam a ser armados e municiados.
Patrulhas foram destacadas para vigiar a residência de oficiais sabidamente contrários ao movimento.
Foram detidos o comandante da Escola, general Monteiro de Barros, e um cadete que se recusou a participar do levante.
À meia-noite, sob o comando do coronel Xavier de Brito, diretor da Fábrica de Cartuchos de Realengo e veterano da campanha de Canudos, a Escola deslocou-se pela estrada São Pedro de Alcântara em direção à Vila Militar - a 10 quilômetros de distância. Antes de alcançar a parada de Magalhães Bastos,  um elemento de ligação trouxe a informação de que toda a tropa aquartelada na Vila estava de prontidão, e sob o completo controle dos oficiais governistas.
            Cinqüenta anos mais tarde, Juarez Távora descreveria o episódio, com as seguintes palavras:
"Soube-se mais tarde que apenas alguns elementos de uma Companhia do 1ºRegimento de Infantaria haviam sido sublevados por um dos seus   oficiais, o tenente Frederico Cristiano Buiz....
Diante dessa grave situação, o comando da Escola deslocou a marcha da Coluna para ocupar posição no morro da Caixa d'Água, com bom domínio sobre toda a Vila  Militar... Ao clarear do dia 5, o comando da Escola determinou o disparo de alguns tiros de shranpnel da artilharia, sobre os quartéis da Vila... A reação não demorou... Por volta das 9h, a situação estava claramente definida; toda a tropa da Vila se movimentava contra a Escola. Entre os elementos desta já havia um morto - o cadete Fedorval Xavier Leal - e um outro ferido... Seria insensato e desumano prosseguir naquele duelo desigual... A retirada foi feita em ordem".
                       

16/07/2013

GESTOS DO PAPA FRANCISCO

PADRE JOÃO MEDEIROS FILHO (pe.medeiros@hotmail.com)
São Francisco de Assis converteu-se, ao ouvir o Crucifixo da capela de São Damião lhe dizer: “Francisco, vai e restaura a minha casa. Ela está em ruínas” (cf. Legenda Maior II, 1). No inicio, não entendeu a revelação e tomou ao pé da letra as palavras, reconstruindo a igreja da Porciúncula. Após meditar e rezar, compreendeu que se tratava de algo espiritual: reconstruir a “Igreja que Cristo resgatou com seu sangue” (op.cit). Foi então que começou um movimento de renovação da Igreja. Morou com os hansenianos e de braço com um deles percorria as ruas e estradas, anunciando o Evangelho. Não era sacerdote, mas simples leigo. Os papas de sua época proibiam aqueles que não eram ordenados de pregar. Por isso, quase no final de sua vida, aceitou ser diácono para se tornar ministro da Palavra de Deus.
O Cardeal Bergoglio inspirou-se na vida do Santo de Assis. Percebeu uma Igreja mergulhada em ataques, críticas e escândalos. Então, sentiu que tinha como missão restaurá-la. Por isso, Francisco não é apenas um nome, escolhido pelo Papa. É muito mais. Representa uma visão de Igreja simples, pobre, humilde e maternal, que trata a todos indistintamente como filhos.
São Francisco foi obediente à Igreja, mas, seguiu seu próprio caminho, ensinando um evangelho de pobreza, caridade e simplicidade. Bento XVI, ainda quando era simples padre, escreveu que a vida do “Poverello de Assis” é um “protesto profético”. Não fez discursos, pronunciamentos eloquentes, simplesmente mostrou uma nova face da Igreja, voltada para os que sofrem, despojada, preocupada com o Evangelho e não com a honra e a glória.
Na sua primeira aparição em público, Francisco mostrou que tem em mente uma Igreja fora dos palácios e dos símbolos do poder. Não usou a mozeta, bordada e com brocados de ouro. Chegou simplesmente vestido de branco e com a cruz de bispo. Pediu humildemente que rezassem por ele. Somente após orar com o Povo de Deus, abençoou os fiéis reunidos na Praça de São Pedro. Aparece como servidor, “servo dos servos de Deus”, como se escreve nos documentos oficiais da Igreja. Evitou a pompa e a exaltação. Passou uma imagem de serenidade, ternura, bondade e amor. Irradiava paz e confiança Não usou da retórica vaticana. Falou como um pastor ao seu rebanho.
Recentemente, alguns jornais italianos publicaram uma foto do Papa preparando-se para celebrar uma missa, cujos convidados eram os jardineiros e o pessoal de limpeza do Vaticano.  No início da celebração, pede a todos que rezem em silêncio por ele e por todos. Levanta-se da cadeira presidencial e vai sentar-se no final da capela para fazer sua  oração. Prefere que contemplem a verdadeira razão da sua existência: o Cristo Eucarístico. Na foto, vê-se a diferença entre o lider e o chefe. Este sempre se coloca em evidência, pondo-se à frente para que todos o vejam e lhe obedeçam. O líder sabe quando sentar atrás. É capaz de desaparecer no momento oportuno, para que outros cresçam e se voltem para quem é verdadeiramente importante. Na fotografia, o admirável Francisco está de costas.  Talvez muitos desejassem vê-lo de frente, mas quis ficar naquela posição e volver a face para Cristo, o irmão de todos.
Quantos chefes, até mesmo eclesiásticos, terão a postura de ir sentar-se numa cadeira, no fundo da sala? Terão coragem e humildade de voltar às costas aos aplausos, aos cliques dos fotógrafos, aos microfones, às câmeras, aos elogios, às palmas e mostrar um coração despido de vaidade e ostentação?

Natal no início do século XX



Elísio Augusto de Medeiros e Silva


Empresário, escritor e membro da AEILIJ


Natal no início do século XX vivia a tranquilidade de seus dois bairros: Ribeira e Cidade Alta. Cidade de topografia pequena, pouco mais de 20.000 habitantes compunham o seu acervo populacional.

A Ribeira terminava na Rua Silva Jardim, nas proximidades do atual cais do Porto. Depois, as Rocas, bairro de pescadores isolados pelo mangue. Em 1908, foi criado o bonde, puxado a burros, passando com um curioso tilintar nos trilhos lembrava o som de uma campainha.

A luz elétrica havia sido instalada em 1911, no segundo mandato de Alberto Maranhão, mas alguns ainda usavam a iluminação a gás acetileno. Nesse ano foram criados os bondes elétricos.

Nessa época, surgiram na cidade os primeiros gramofones, RCA Victor, movidos à manivela, e de voz desagradável, rouquenha.

As serenatas nas noites escuras tinham os seus autores preferidos: José Lucas, Aristóteles Deolindo Lima, ao lado de violinistas não menos famosos, como Heronides França e Cavalcanti Grande.

Nas residências os “assustados” eram alegres, divertidos, porém dentro do maior respeito, indo até no máximo meia-noite, quando já se narrava o local da próxima festa.

As poesias tinham os seus declamadores, um costume muito em moda em nossa Capital.

Na Ribeira, nas proximidades da Igreja do Bom Jesus, havia a lapinha mais famosa do bairro, frequentada pelo poeta Ferreira Itajubá, que ali fazia as suas exibições.

Na época, existiam vários cantões na Cidade Alta e Ribeira, e cada um tinha seu feitio próprio, onde os amigos conversavam de tudo. Alguns, até de política.

Na Avenida Rio Branco existia um cantão que ficava na residência do Urbano Hermilo, onde não se falava de política, e sim de arte, literatura. Os frequentadores mais assíduos eram: Alberto Maranhão, Celestino Wanderley e Segundo Wanderley (irmãos), Manoel Dantas, Pinto de Abreu, Henrique Castriciano e Pedro Soares.

Os rapazes vindos do interior para a Capital, a fim de estudar, hospedavam-se nas repúblicas.

O “Diário de Natal”, de Elias Souto, circulava, e a sua redação funcionava na Rua da Conceição – era um jornal oposicionista a Pedro Velho.

O jornal “A República” também já circulava, sob a direção de Pedro Velho. Depois, surgiu a “Gazeta do Comércio”, direção de Pedro Avelino e Augusto Leite, tendo a sua sede à Rua 13 de Maio.

As roupas da época eram de tecido francês ou inglês, pois tudo que era bom era importado - o País ainda era carente de indústrias. A moda normalmente era ditada por figurinistas franceses.

A garotada daquele tempo usava canivetes Rodgers. Não existiam judô, nem caratê, as brigas eram resolvidas no murro, pau ou rasteira. As brigas domésticas, entre irmãos, eram resolvidas pelos pais na base da vara de goiabeira.

O carnaval de rua ainda era na Avenida Tavares de Lira e na Praça Leão XIII, ambas na Ribeira. Apenas em 1936, ele passaria para a Cidade Alta, primeiro na Rua Vigário Bartolomeu, e depois na Avenida Rio Branco.

Em Natal, sempre havia um circo na cidade, cujos palhaços e trapezistas davam uma volta, anunciando o espetáculo noturno e gritando: “O palhaço o que é?”. A garotada respondia: “É ladrão de mulher”. “Hoje tem marmelada?”. “Tem sim, senhor”.

Já se jogava ping-pong em Natal nos melhores clubes da época. O rádio era coisa nova, e televisão nem existia.

Nas antigas livrarias da Ribeira, os livros de Machado de Assis, Humberto de Campos, Euclides da Cunha, Dostoiévski eram os preferidos da pequena elite literária.

A moda que se iniciava entre os rapazes era tocar violino, flautas e clarinetes. As moças preferiam o piano.

Na Ribeira todos aguardavam ansiosos a chegada dos trens e, ocasionalmente, dos cargueiros que vinham descarregar e apanhar mercadorias no Porto.

O comércio da Ribeira atraía os fregueses da Capital e os que vinham do interior para as compras. Na Rua Frei Miguelinho, a firma Góes & Filho vendia ferragens para luz de acetileno (arandelas, zinco, cotovelos, torneiras e carbureto), ao lado de óleos, tintas e perfumarias.

Com a abertura do cinema Polytheama, inaugurado em 1911, novos hábitos começaram a surgir entre a população, que descobria uma moderna opção de lazer – o cinema mudo.

À noite, as famílias reuniam-se nas calçadas com os vizinhos e amigos para a prosa habitual, que se encerrava às vinte e uma horas. A partir desse horário, só os boêmios ficavam nos bares e casas de prostituição.

Na Ribeira, os palacetes lindos e imponentes, recuados e com estilo próprio, ladeavam a Praça Augusto Severo, de jardins amplos e bem cuidados, assim como o coreto, que a tudo assistia.

Assim diz a memória do tempo!