16/03/2015

UM POUCO DA CIDADE DE NATAL DO PASSADO

8.9.08


Pioneiros do Vale-Tudo e Jiu-Jítsu em Natal. (Texto)

Mais uma página da história de Natal ...

Foto: O lutador Aderbal Bezerra..
No nosso ''torpedo'' 037, falamos das Lutas de Jiu-Jítsu e Vale-Tudo nos fins dos anos 50 e início dos anos 60. Omiti o nome de um lutador, seridoense de Serra Negra do Norte: Aderbal Bezerra. Sua filha, Aderleth enviou uma mensagem, muito interessante sobre os pioneiros do Vale-Tudo e Jiu-Jítsu na nossa cidade.
Fatos como este coroam o sucesso do Natal de Ontem, resgastando informações que poderiam se perder. Obrigado Arderleth. 

Manoel Cavalcanti Neto 
.
."Manoel Neto,

Fiquei muito feliz quando vi no Diário de Natal de hoje, 7 de setembro de 2008, a reportagem da criação do blog "nataldeontem".
No quadro quem não lembra... Uma referência as lutas de Bernardão, Takeo Yano, Waldemar Santana, e tantos outros que animaram a cidade de Natal, principalmente, nos fins da década de 50 e início dos anos 60.
"Época de ouro", como é referida por alguns desses saudosos lutadores!
Quero aqui registrar a atuação de mais um desses lutadores, quem não lembra... De Aderbal Bezerra que também integrava essa trupe de lutadores que tanto agitou as noites natalenses!
Sou filha dele, e quero aqui deixar registrado o começo dessas lutas, que se deram em Natal, principalmente, no final da década de 50. Takeo Yano foi um grande ícone dessa época, foi quem trouxe o jiu-jítsu para o RN, quando ele aqui chegou as lutas já aconteciam, não se sabe ao certo mais provavelmente chegaram por aqui pelos lutadores da Marinha do Brasil, e dois deles foram Aderbal e Bernardão, tem registro de grandes combates nos arquivos do jornal A República, Diário de Natal e A Tribuna. Vendo esses registros, pesquisando e fazendo entrevistas com pessoas da época, foi que pude sentir a emoção que despertavam essas lutas aqui em Natal.
Waldemar Santana, Pinheirão, Euclides da Cunha, Bernardão, Aderbal, Ivan Gomes, Touro Novo, Takeo Yano, e tantos outros, foram importantes ídolos desse esporte tão agressivo e fascinante para o público, era um misto de esporte e agressividade que despertava delírio no público.
Eram homens de estatura e porte físico que fascinavam pela força e coragem, diferentes para sua época.
Aderbal ( meu pai) deixou um acervo fotográfico de mais de 150 fotos, as quais estão sob minha responsabilidade, e na cidade de Serra Negra do Norte na Casa de Cultura existe uma mostra fotográfica de 70 fotos dessas lutas, a cidade ganhou este acervo por ser a cidade natal de Aderbal.
Mando algumas dessas fotos para que você publique em seu blog.
Abraços. Aderleth Bezerra de Araújo"

15/03/2015


DO QUOTIDIANO  EU FAÇO CRÔNICAS – I
Por Eduardo Gosson(*)
JACINTO, UM HOMEM BOM

Para quem não sabe Jacinto é o meu barbeiro ou melhor dizendo o nosso barbeiro. Ele mora e corta cabelo lá  na Rua Juvino Barreto, próximo  ao restaurante do SESC, quase no lugar onde viveu o poeta Antonio Pinto de Medeiros. Jacinto tem uma particularidade que o distingue: ele corta os cabelos dos nossos homens  de letras e a sua cadeira é mais disputada do que as da Academia  Norte –Rio-Grandense de Letras. Na barbearia do seu Jacinto funciona uma pequena biblioteca de autores potiguares, sem burocracia. Vejamos os escritores que ajeitam o seu visual com Jacinto: Deífilo Gurgel (in memoriam). Tem vários livros autografados pelo nosso poeta e folclorista; Moacyr Cirne (in memoriam) foi uma indicação minha. Encontrei-me com o papa do Poema-Processo em plena Avenida Rio Branco e este me disse que gostaria de cortar o cabelo e aparar a barba com um barbeiro tradicional. Foi e gostou. Nunca mais deixou de ir; Eduardo Gosson, Ubiratan Queiroz, irmão da cineasta Jussara Queiroz, entre outros.
Mas o que mais chama atenção em seu Jacinto são três elementos: simplicidade, humildade e bondade. Quando vou até lá cortar os poucos cabelos que restam não dá mais vontade de ir embora. Seu Jacinto  ao contrário do poema de Luís Carlos Guimarães não é necessariamente funcionário publico, mas tem mulher, filhos (o3) e (05) cinco netos. E também não mora no Edifício Flor das Laranjeiras; seu Jacinto mora em nosso coração!
Viva o povo brasileiro!
(*)Eduardo Gosson é poeta. Presidiu a União Brasileira de Escritores – UBE (2008-2013) e é Diretor Financeiro do IHGRN.

12/03/2015

GUARAPES: VALE A PENA PEDIR DE NOVO

 

Valério Mesquita*


 

Capa da frente desta TN, semana passada, do monumento dos Guarapes, em Macaíba, ouviu-se novo gemido.

A visão de quem passa pelo empório testemunha um tipo inexprimível de mistério, grandeza e história, que não se manifesta apenas na visibilidade dos olhos. Espelho e sombra nos envolvem totalmente. Reflete a casa perdida da infância de qualquer um de nós, mesmo que distem quase duzentos anos de nascença. As cores da vida vêm de dentro. Ao derredor da construção principal, aflora o lirismo vegetal e memórias mil de luares. Diante dos Guarapes paraliso o corpo e silencio a boca ante a emoção e a paz emblemática onde nascem, depois, todas as palavras. Templário erguido ao comércio, ao labor, à vida, à riqueza, ao capital, nele somente restando, hoje, a raiz e o cupim, sem jardim, sem teto, gasto em sombras, sem rumor, apenas um eco antigo e longínquo da voz imaginária do grande capataz dos mistérios circundantes: Fabrício Gomes Pedroza.

“Feliz do homem que conhece a terra onde será enterrado”, disse o saudoso Dom Nivaldo Monte, já perto de sua partida e despedida. Ele não tinha nas mãos o acento da desesperança. Reescrevo novo texto sobre os Guarapes movido pela aflição de um vento novo, ressurgente, após a longa noite da burla, do engodo e do humano ressentimento. Segundo os pesquisadores, os técnicos, as prospecções ao redor da área indicam um dominó de ocorrências ainda desconhecidas. Estão invisíveis, dissipadas e espalhadas no ar fino das brumas do rio Jundiaí soprando na paisagem do nunca-mais. Queremos vê-la restituída, reerguida, alongada até o antigo cais e a capela, até desfazer todas as incertezas. Tudo, para sentirmos o peso da criação do homem que investiu e inovou a economia de Macaíba e do Rio Grande do Norte.

O esforço recriado de restaurar os Guarapes, congregam-se o Conselho de Cultura, o Instituto Histórico e Geográfico e a Academia de Letras, verdadeira confraria habituada às longas viagens repetidas. Para essa plêiade não interessam equívocos e murmúrios. Basta que a lembrança retorne submissa ao velho empório que repousa em clarões e longos esquecimentos. Sobre a história do monumento já falei em textos anteriores.

A constelação de todos que se mostram envolvidos na obra constitui o fulgor da partida, do início de uma peleja. Naquela colina se ouvirão, logo mais, vozes diárias entre arcos voltaicos de sua beleza e significado para a história do Rio Grande do Norte. Desde o tempo dos holandeses, do temível Jacob Rabbi, disse-me o geólogo Edgar Ramalho Dantas que os Guarapes e Jundiaí, juntos, desafiam os estudiosos pelo circuito de circunstâncias no chão sagrado dos antepassados, a suscitarem descobertas, grutas, ecos irresignados, águas novas e subterrâneas. Atravessando o rio, vê-se de frente o memorial de Uruaçu, santuário dos mártires e bem perto dali as ruínas de Extremoz. Para trás, o Solar do Ferreiro Torto, já restaurado. Chega-se à conclusão de que o entorno de Natal, naquele tempo, foi o maior teatro de operações da produção de alimentos, comércio, moldura de dissídios e lobisomens, que somente os Guarapes renascido pode restituir pelo olho e pelo tino do estudo e da pesquisa, já em campo. Ao novo governo de bons propósitos avisamos que a mesa da boa vontade já está servida.

 

(*) Escritor.

INFORMES DA UBE-RN

C O N V I T E E S P E C IA L

14 de Março é Dia Nacional da Poesia




A UNIÃO BRASILEIRA DE ESCRITORERS – UBE/RN , o  INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO RIO GRANDE DO NORTE - IHGRN e a ACADEMIA NORTE-RIO-GRANDENSE DE LETRAS-ANLconvidam Vossa Excelência/Vossa Senhoria para Sessão Solene  de entrega de Diploma de Sócio Efetivo aos novos associados da UBE-RN. Após o evento haverá um sarau no Largo Desembargador Vicente de Lemos, oportunidade em que será comemorado o DIA DA POESIA. Traga seu poema preferido para recitá-lo.

A data foi criada em homenagem a CASTRO ALVES, poeta brasileiro nascido em 14 de março de 1847, que ficou conhecido como o poeta dos escravos por ter lutado arduamente pela abolição da escravatura no Brasil.

Tomarão posse na União Brasileira de Escritores- UBE/RN os confrades e as confreiras a seguir relacionados na classe dos Sócios Efetivos:

Aline Gurgel

Carlos Rostand de França Medeiros

Cícero Martins de Macedo Filho

Diulinda Garcia de Medeiros Silva

Dione Maria Caldas Xavier

Eulália Duarte Barros

Geraldo Ribeiro Tavares

Ion de Andrade

José Ivam Pinheiro

José Evangelista Lopes

Liacir dos Santos Lucena

Luiz Gonzaga CortezGomes de Melo

Maria Audenôra das Neves Silva Martins

Moacir de Lucena

Odúlio Botelho Medeiros

Luciano Lucimar de Oliveira

Rinaldo Claudino de Barros

Thiago Gonzaga dos Santos

_______________________________________________________________________

DATA: 12 de março (quinta-feira)HORA: 18h às 20h - LOCAL: INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO RN – IHGRN - Rua da Conceição, 622 – Centro

UBE-RN- Roberto Lima de Souza - Presidente

IHGRN - Valério Mesquita– Presidente

ANL - Diógenes da Cunha Lima- Presidente

A conta da UBE-RN
CAIXA ECONÔMICA
*Ag. 0033*
*Op. 003*
*C/c 874-0*
*CNPJ   11.034.721/0001-39*

*ANUIDADE PARA 2015*

*01.**  (Sócios adimplentes)  *
*Valor R$  150,00 - 30,00  = 120,00*
*02. (Sócios Inadimplentes) *
* Valor R$  150,00*

*03. (Sócios Inadimplentes) *
* até  três anos a Diretoria da UBE-RN*
* aprovou **a seguinte  proposta:*

*Ano  2015 = R$ 150,00  até 30.01.2015*
*Ano  2014= R$ 60,00 até 28.02.2015*
*Ano 2013 =R$  60,00 até 30.03.2015*

*Pedro Lins Neto*
* Tesoureiro *

11/03/2015

Eu também sou Lessa


João Felipe da Trindade (jfhipotenusa@gmail.com)
Matemático, sócio do IHGRN e do INRG.
 
Em artigo anterior, vimos que Silvério Martins Ramos, quando enviuvou da primeira esposa, casou com Anna Joaquina de Maria, filha de João Baptista do Espírito Santo e Maria Alves Lessa. Este último casal casou em 1836, como podemos ver do registro a seguir.

Aos (?) dias do mês de fevereiro de 1836, pelas duas horas da tarde, na Boca do Rio, em presença do Padre Frei José de Sam Gualberto, Carmelitano, e das testemunhas abaixo nomeadas, de minha licença, se receberam por esposos presentes, João Baptista e Maria Gomes Leça, meus paroquianos: o esposo de idade de 26 anos e filho de João Rodrigues do Espírito Santo, e Margarida Francisca de Oliveira; a esposa de 22 anos, filha legítima de Joaquim Álvares Lessa, já falecido e Anna Gomes, naturais e moradores nesta Freguesia de São João Baptista do Assú, onde se fizeram as denunciações nupciais, e logo lhes deu as benções nupciais, sendo presentes por testemunhas o capitão João Martins Ferreira, e Silvério Martins de Oliveira, casados; todos desta Freguesia do Assú, e para constar fiz este assento em que me assinei. Joaquim José de Santa Anna, pároco do Assú.

Os registros da Igreja não mantinham coerência com relação aos nomes dos seus fregueses. A cada momento alguns nomes eram modificados. No caso do nubente acima, omitiram o sobrenome Espírito Santo. No caso da nubente, em vários outros registros ela aparece como Maria Alves Lessa. O pai dela já era falecido em 1829, pois nesse ano houve o seguinte casamento: Aos dezoito dias do mês de janeiro de 1829, pelas cinco horas da tarde na Ilha de Manoel Gonçalves, em minha presença, e das testemunhas abaixo nomeadas, se receberam por esposos presentes Manoel Ignácio Lima, viúvo de Antonia Maria, e Anna Gomes, viúva de Joaquim Álvares Lessa. O esposo de idade de sessenta e cinco anos; e a esposa de idade de trinta e dois anos, naturais e moradores nesta freguesia de São João Baptista do Assú, onde se fizeram as diligências nupciais, sem impedimento, sendo confessados e examinados na Doutrina Cristã, presentes por testemunhas Antonio Caetano Monteiro e Manoel Fernandes Carvalho, casados, todos deste Assú, e para constar fiz este assento em que me assino Joaquim José de Santa Anna.

Esse Joaquim Álvares Lessa suponho que era irmão de Josefa Clara Lessa e, que ambos eram filhos do português de Leça da Palmeira, José Álvares Lessa, que em 1810 comandava a Ilha de Manoel Gonçalves. No inventário de Domingos Affonso Ferreira Junior consta que ele tinha falecido sem bens e com muitas dívidas, tendo essas sido herdadas pelo capitão João Martins Ferreira, meu tetravô, que foi casado com minha tetravó, Josefa Clara Lessa. Há um batismo, em 1790, em Recife, de Rita filha de José Álvares Lessa e de Francisca Xavier, onde são nomeados os avós paternos dela, como Manoel Álvares da Costa e Clara Rodrigues.

Naquele artigo anterior, citamos como filhos de João Baptista do Espírito Santo e Maria Alves Lessa: Joanna, nascida em 1843; as gêmeas Cosma e Damiana, nascidas em 1854; e Josefa Rodrigues Lessa, que casou com Idalino Tranquilino de Sousa.

Dona Maria Alves Lessa faleceu em 1860, com a idade de 51 anos. João Baptista voltou a casar como se depreende do jornal Correio do Assú, de 1873. Nele, Padre Elias Barbalho Bezerra declarou que recebeu de Joaquim José Lessa, procurador de Dona Anna Barbosa de Sousa, cinquenta mil réis, que estava em poder do seu finado marido, João Baptista do Espírito Santo, que foi separado no inventario da finada Anna Gomes da Costa (mãe de Maria Alves Lessa) para celebrar-se por sua alma, meia capela de Missas. Nesse mesmo jornal, Joaquim José Lessa, pagou a quantia de três mil e duzentos réis, de que era devedor o seu finado pai, João Baptista do Espírito Santo a Josefa Damas da Conceição.

Encontramos vários filhos de Joaquim José Lessa com Rosa Carolina Lessa: Pio, nascido em 1861, teve como padrinhos João Rodrigues do Espírito Santo e Victoriana Maria da Conceição; Aprígio, nascido em 1862, teve como padrinhos Manoel Roque Rodrigues Correa e Maria Juliana da Conceição; Luiza, nascida em 1863, teve como padrinhos José Alves Martins e Francisca Martins de Oliveira;  Maria, nascida em 1864, teve como padrinhos José Rodrigues Ferreira e Maria dos Passos Lessa.

Um registro de casamento noticia que em 1859, João Alves Lessa casou com Maria Marcelina da Costa, sendo ele filho de Joaquim José Lessa e Anna Gomes da Costa. Acredito que houve um equívoco nesse registro, pois Dona Anna Gomes da Costa foi casada com Joaquim Álvares Lessa. Nesse casamento, uma das testemunhas foi Joaquim José Lessa.  João Alves Lessa deveria ser, portanto, tio dessa testemunha.  Maria Marcelina era filha de Manoel da Costa Ramos e Lina Maria da Conceição.

Em 1860, José Alves Lessa casou com Maria do Ó Fernandes, sendo testemunhas as mesmas do casamento de João Alves Lessa, isto é, Joaquim José Lessa e José Fragoso de Medeiros. Não nomearam os pais dos nubentes. Desse casamento nasceram: Marcionila, em 1861, tendo com padrinhos Francisco Antonio Fernandes Braga e Claudina Maria do Espírito Santo; Manoel, em 1862, tendo como padrinhos João Baptista do Espírito Santo e Marciana Rodrigues Lessa; outra Maria, em 1863, cujos padrinhos foram Francisco Antonio Braga e Maria de Santana Fernandes.

Há, também, um Manoel Alves Lessa que casou com Maria Manoela da Costa e geraram Luiz em 1834, que morreu afogado, em 1855, com 21 anos.
O fato de muitos documentos não conterem os nomes dos pais dos nubentes gera dificuldades para quem quer fazer sua genealogia. O desaparecimento de antigos livros é outro empecilho para nosso trabalho. Podemos cometer erros quando deduzimos algumas relações de parentesco. 

A dívida de José Álvares Lessa a cargo de João Martins Ferreira


10/03/2015

B E M P E R T O D E B U E N O S A I R E S



GILENO GUANABARA, sócio efetivo do IHGRN

Mês de dezembro de 1968, em Natal. O Cinema Rio Grande apresentou uma das obras primas de Luís Buñuel: La Belle de jour (A Bela da Tarde-1967, com Catherine Deneuve).  Tratava de uma adaptação do que se chamou “romance burguês”, escrito por Josefh Kessel que, na visão de Jean-André Fieschi, (La Nouvelle Critique, n. 58, 1972), comporta a vida de três mulheres – Célestine, Séverine, e Trinstane. Uma delas, ao mais se aproximar do pecado mais cria força e personalidade. No caso, a vida dupla de uma mulher, do lar durante a maior parte do dia e prostituta, ao anoitecer, quando então recebia os clientes sadomasoquistas num quarto de bordel. Um drama real feminino que retratava a força que muitas mulheres sentem numa sociedade repressora e em crise de valores morais. O drama solitário de uma transformista se valoriza pelo rigor da dúvida com que Buñuell suscita com humor sobre o que faz a trama da vida em cada um.
O viés pecaminoso individual torna-se maior, na resposta cinéfilo-pantagruélica do mesmo Buñuel, com o filme Le Charme Discret de la Bourgeoisie (O Discreto Charme da Burguesia – 1972). Neste, um Buñuel que aborda os princípios do adultério burguês, no conflito entre o real e o sonho, quando confessa estar no real, (mas) estamos no irreal. Buñuel, o moralista, em busca dos falsos semblantes só comprováveis nas rígidas formas de civilidade burguesa, coisas próprias da coisificação inerentes ao egoísmo humano, já observado em La Belle de Jour.
Na Argentina da atualidade temos a História del Miedo (A História do Medo), de Benjamím Neishtat, que no circuito brasileiro recebeu o título de Bem Perto de Buenos Aires. O autor se arrasta na abordagem do limite humano, o medo, através de um suspense pesado, tema já observado pela sua conterrânea Lucrécia Mortel, em O Pântano. A fita retrata os efeitos da conurbação urbana e os grupos sociais, os problemas na violência, presentes em grandes metrópoles sul-americanas, a que Buenos Aires está incluída.
Brasil e Argentina, irmãs siamesas dos mesmos problemas, quadro decorrente da crise econômica que se prolonga anos após anos, lá e cá, revelam o esgotamento atual de seus projetos políticos mais recentes. Na Argentina contemporânea, em final do ciclo político kirchneriano, a questão que mais preocupa é a violência, embora a Argentina não se mostre ainda um palco acirrado de violência urbana. Está mais entre nós do Brasil, bem próximo da Argentina, no subconsciente coletivo o poder da violência e do crime.
São questões atuais da explosão social por que passam as megalópoles latino-americanas, onde os ricos se resguardam e criam seu diálogo em condomínios fechados, horizontais ou verticais, cercados de seguranças e de cercas, luxuosos, verdadeiros subterfúgios, onde trocam a linguagem do medo. A dimensão do clima de insegurança social entre ricos e pobres contamina também os excluídos em suas insatisfações, ao verem as suas vidas miseráveis abortadas de um sem-sentido, o que pode passar a ser moeda político/eleitoral da linguagem demagógica, já ultrapassada, porém vigente. Foi assim, com efeito, os “descamisados” do peronismo. É assim com as gangues dos jovens de rua, em Puerto Rico, menos politizadas do que os camisas pretas fascistas, na Europa do século passado.
A realidade urbana atual contrapõe a convivência dessas massas, alocadas em favelas ou cortiços aproximados de seus locais de trabalho, diante de condomínios verticais inteligentes, próprios para o apartheid social, cujos habitantes são detentores de condições econômicas que contrastam com os seus vizinhos. Desde as transformações posteriores a 1930, no Brasil, o Estado Social interveio, tendo em vista amenizar o conflito iminente, com o peso do intervencionismo da burocracia estatal (Ministério do Trabalho; legislação e Justiça do Trabalho; sindicalismo; instituições de previdência e assistência social, etc.).
Ao contrário do esperado, as ações estatais de protecionismo estimularam ainda mais as demandas, aumentando o número de contendas. A lei trabalhista alavancou, de ano para ano, um volume cada vez maior de postulações na justiça do trabalho, provocado pelo conhecimento disseminado dos direitos outorgados. O custo os empregadores agregaram no valor final da produção, gerando, de um lado, a expectativa de conquista econômica por parte dos assalariados e, do outro, de ônus transferido para o custo final a ser pago por todos, via inflacionária.
A partir da primeira metade dos anos de 1950, o modelo desenvolvimentista/populista começou a se exaurir, seguindo-se as várias crises políticas, a contar do ano de 1950, com a nova eleição de Getúlio Vargas, que teve como candidato ao cargo de vice-presidente, de fragilíssima representatividade nacional, integrante do quadro do PSP paulista, o então Deputado Federal pelo Rio Grande do Norte, João Café Filho. O cenário político agitado contaminou governos sucessivos, dado o confronto entre setores conservadores, liderados pela UDN, e o trabalhismo, aí incluídos os comunistas. Ao final, o desfecho trágico, o golpe de 1964, após as variadas tentativas golpistas anteriores, a par de um momento de convivência pacífica, durante o governo de Juscelino. Restou a industrialização sob a consagração da Petrobrás e a usina metalúrgica de Volta Redonda; a criação do polo metalúrgico; a inflação crescente; e a frágil política monetária que, apesar de tudo, favoreceu o avanço da fronteira econômica, arcando os altos custos da interiorização da Capital Federal, no Estado de Goiás.
Enquanto isso, as províncias de outrora se agigantaram, face a migração das massas engalanadas e atraídas pelo desenvolvimentismo econômico. Através do processo de emigração rural intenso, dos anos de 1950/60, tornaram-se metrópoles ingovernáveis, tal o recrudescimento das demandas sociais e da explosão da violência.
Observa-se em a História del Miedo o cuidado de não sediar os interesses sociais que visa, em se tratando de uma produção multinacional, o que facilita serem conduzidos de forma equidistante os personagens comuns e identificáveis nas grandes cidades sul-americanas e suas populações, com destaque a Argentina. No entanto, a crise urbana que reina nas grandes metrópoles da América do Sul facilita identificar os verdadeiros atores ou os seus bufões. Para isso, nada melhor do que lutar pela democracia.